Flávio Werneck: “Tentativa de esvaziar a Polícia Federal beneficia o crime organizado”

Flávio Werneck, diretor de Estratégia Sindical, da executiva da Federação Nacional dos Policiais Federais; Foto: Divulgação

Flávio Werneck, diretor de Estratégia Sindical, da executiva da Federação Nacional dos Policiais Federais, declarou ao HP que o novo texto do relatório do deputado Guilherme Derrite ainda mantém uma tentativa de esvaziamento das prerrogativas da Polícia Federal no combate às facções criminosas.

Segundo Werneck, “a proposta tira da União (e, portanto, da PF) o controle sobre a venda e a distribuição de bens de luxo, carros e propriedades apreendidas dos criminosos”. Essa é a principal arma para quebrar financeiramente as facções. Sem dinheiro, o crime enfraquece; e o relatório quer justamente dificultar isso, denunciou.

A estratégia do crime

A ideia do relatório é criar uma “ação civil autônoma” para confiscar esses bens, declarou o tarimbado líder sindical. “Na prática, é uma nova burocracia que vai atrasar em anos os processos, impedindo que os recursos do crime sejam rapidamente convertidos em investimento para a própria polícia”.

Flávio afirmou que o relatório abandona o conceito de “facção criminosa”, já previsto no projeto original, e inventa um termo vago: “domínio social estruturado”, para tirar o foco do verdadeiro inimigo, as facções, fragilizando todo o combate.

Werneck considera esse relatório de Derrite uma tentativa de presentear o crime organizado: “Não há segurança pública com uma Polícia Federal fraca, sem autonomia e amarrada por manobras políticas”.

Leia, a seguir, a entrevista exclusiva de Flávio Werneck ao Jornal Hora do Povo.

CARLOS PEREIRA


HP Por que, na sua opinião, a oposição bolsonarista é contra a participação da Polícia Federal nas investigações do chamado crime organizado?

Weneck: A oposição teve um posicionamento contra o Brasil. Antipatriótico. A PF hoje é a instituição com mais capacidade técnica, logística e aptidão para atuação interestadual em combates contra as grandes organizações criminosas. A Polícia Federal é a principal força no enfrentamento a essas organizações transnacionais, e enfraquecê-la é, na prática, proteger o crime organizado.

HP Existem indícios de envolvimento de políticos com mandato com crime organizado?

Werneck: Sim, já apontaram nomes. Existem investigações em andamento, como as operações que apuram o envolvimento com o crime organizado no setor de resíduos sólidos em Santa Catarina, Além disso, há fortes indícios de permeabilidade e incentivo político, como o caso do Deputado Estadual no Rio de Janeiro. Ele foi alvo de operações que investigavam suas ligações com as organizações criminosas. Estes são apenas exemplos de um problema estrutural que precisa ser encarado com coragem.

HP O que avança na PEC do governo em relação à legislação atual?

Werneck: A PEC 18/2025 é uma oportunidade histórica, pois, pela primeira vez, pauta de forma concreta um trabalho em cooperação sistêmica entre as polícias. Ela avança ao criar um marco legal que incentiva a atuação integrada e o compartilhamento de inteligência. Reconhecemos que o texto pode e deve ser melhorado, mas seu princípio é fundamental para superar a fragmentação que hoje beneficia o crime.

HP Dá para enfrentar o crime organizado com a atual estrutura e salários da Polícia Federal e das polícias estaduais?

Werneck: Não! A estrutura atual é defasada, o que gera desmotivação e fuga de cérebros. O enfrentamento eficaz exige investimento massivo em tecnologia, inteligência e na valorização salarial e funcional dos agentes. A PEC 18, mais uma vez, se apresenta como uma oportunidade para catalisar esse debate e pressionar por essas melhorias essenciais.

HP – É possível o efetivo combate ao crime organizado com os maiores juros do mundo, metade da força de trabalho, sem emprego formal ou a ausência de ao menos um plano de desenvolvimento do país?

Werneck: É impossível dissociar segurança pública de desenvolvimento social. Um combate efetivo ao crime se faz com urbanização, educação de qualidade, saúde acessível, serviços públicos eficientes e, acima de tudo, com geração de emprego e valorização do trabalho. O crime encontra seu caldo de cultura na exclusão e na falta de oportunidades. Portanto, sem um projeto de país que ataque essas causas estruturais, qualquer ação policial será sempre insuficiente.

HP – A matança no Rio de Janeiro, na sua opinião, teve motivação política, tendo em vista o desgaste do bolsonarismo com as condenações pela tentativa de golpe de estado?

Werneck: Uma operação em que morrem quatro policiais (com mais 13 no hospital) já é, por si só, um fracasso tático, consequência de um planejamento que não levou em conta todos os problemas que poderiam ser enfrentados. No caso específico do Rio, não houve uma retomada territorial efetiva, e os resultados efetivos para a população foram baixíssimos: a quantidade de armas e drogas apreendidas foi ínfima, se comparada a outras operações com letalidade baixa ou zero.

Apenas 5 alvos foram capturados dentre mais de 60 investigados. A população daquela região, dominada pelo crime, clama por ajuda do Estado há mais de 20 anos. É inegável que, em um contexto de desgaste político intenso, operações de grande impacto midiático podem ser instrumentalizadas. Cabe à sociedade questionar, cobrar se o objetivo real era a segurança da população ou a geração de uma cortina de fumaça.


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