Caso ocorrido no distrito de Viseu ganhou repercussão após denúncia nas redes sociais. Polícia teria classificado fato como “acidente”.
O menino brasileiro José Lucas, de nove anos, teve parte de dois dedos amputados após ser agredido por colegas dentro da Escola Básica de Fonte Coberta, em Cinfães, distrito de Viseu, Portugal. O caso, narrado pela mãe, Nívia Estevam, à reportagem do Portal g1, expõe uma sequência de violências sofridas pelo menino, a suposta negligência da instituição escolar e a demora no atendimento, culminando em uma mudança forçada da família, agora amparada por parentes.
De acordo com o relato de Nívia, o incidente mais grave ocorreu na última segunda-feira (10). José Lucas foi seguido por dois colegas até o banheiro da escola, onde estes teriam fechado a porta com força sobre sua mão, pressionando-a até causar a amputação parcial de dois dedos. Em meio à dor intensa, o menino teria se arrastado para fora do local até ser encontrado por funcionárias.
“A primeira [funcionária] entrou em choque. A segunda, quando viu, disse: ‘Por que eu vim mais cedo para a escola?’”, contou a mãe, com base no relato que colheu. A professora da turma, Sara Costa, teria entrado em contato com Nívia informando, de forma minimizada, que a criança estava “brincando” e “amassou o dedo na porta”. No fundo da ligação, no entanto, a mãe ouviu alguém pedindo por uma ambulância.
Ao chegar à escola, que fica a poucos minutos de sua casa, Nívia encontrou o filho nos fundos do prédio, gritando de dor, com a mão enfaixada e mordendo uma atadura. “Meu filho não bate em ninguém, é uma pessoa boa. Vou ensinar meu filho a bater?”, questionou ela, ao relatar sua conversa com a equipe da escola.
DEMORA NO SOCORRO E PERDA IRREVERSÍVEL
O socorro dos bombeiros, segundo Nívia, levou entre 30 e 40 minutos para chegar. Parte dos dedos amputados foi guardada pela escola e entregue aos paramédicos, que orientaram a mãe a transportar outros fragmentos em uma luva até o hospital. Apesar dos esforços, os cirurgiões comunicaram que não seria possível o reimplante. José Lucas passou por uma cirurgia de três horas e perdeu parte do dedo indicador e do dedo maior. “O dedo maior ficará sem unha e o indicador ficará com apenas a metade”, detalhou a mãe.
Após a cirurgia, o hospital acionou a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), que abriu um processo de investigação. A assistente social do caso recomendou à família que retirasse o menino da escola. “Se puder mudar de escola e de cidade, faça isso”, teria dito a profissional, segundo Nívia.
A busca por justiça e apoio, no entanto, esbarrou em obstáculos. A polícia local, de acordo com a mãe, classificou o ocorrido como um “acidente”, reproduzindo a versão inicial da escola. Na segurança social, foi informada de que um processo de apoio poderia levar “cinco a seis meses”.
A reviravolta no caso veio após um desabafo de Nívia nas redes sociais, publicado durante a madrugada. O relato comoveu a comunidade luso-brasileira e ganhou ampla visibilidade, pressionando as autoridades.
A família, que já vivia com medo, decidiu deixar o distrito de Viseu e agora reside temporariamente com parentes. Nívia, que se mudou para Portugal há sete anos em busca de “uma vida melhor”, vê-se obrigada a recomeçar. “Estou com medo”, confessou.
Ela acredita que a violência sofrida pelo filho foi motivada por discriminação. José Lucas, que é brasileiro, preto, gordo e estava no seu primeiro ano na escola, já era alvo de bullying desde o início do ano letivo. Nívia relatou um episódio anterior em que o menino voltou para casa com marcas roxas no pescoço. “Eles prenderam meu filho contra a parede e estouraram as veias, deixando marcas roxas”, disse. Apesar de ter comunicado a professora, afirma que nenhuma medida efetiva foi tomada.
INVESTIGAÇÃO
Em nota, a Direção do Agrupamento de Escolas de Souselo, gestora da unidade, informou que está ciente do episódio e que abriu uma investigação interna, “dando cumprimento à legislação em vigor”.
Enquanto isso, José Lucas tenta se recuperar longe da escola. A mãe descreve que ele sofre crises de choro, especialmente à noite. “Durante o dia, ele fica bem, mas à noite pergunta por que fizeram isso e quem vai pagar. Eu tento acolher, mas ainda estou digerindo tudo”, relatou Nívia.











