Bolsonaristas da Câmara deturparam o projeto para beneficiar chefes das facções e enfraquecer a Polícia Federal. Senado não quer “contaminação” na discussão do projeto
Depois da lambança feita pelo deputado bolsonarista, Guilherme Derrite (PP-SP), que deturpou o projeto do governo Lula de combate às facções criminosas, o senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente do Senado, afirmou, nesta terça-feira (18), que a relatoria do projeto que tramitará em breve na Casa será ocupada pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE).
Segundo Alcolumbre, a escolha é para evitar a contaminação política do projeto. Derrite usou o seu relatório, aprovado na Câmara dos Deputados na noite de terça-feira (18), para tentar esvaziar a atuação da Polícia Federal e dificultar o estrangulamento econômico das facções criminosas. Um dos artigos de seu relatório dificultava abertamente o arresto de bens dos criminosos por parte da Justiça e da Polícia. A medida foi vista como uma ajuda importante de Derrite aos líderes do crime organizado.
Outra medida favorável aos criminosos foi o esvaziamento do Funad, o Fundo Nacional Antidrogas. O deputado bolsonarista impediu que os recursos obtidos durante as investigações abastecesse esse fundo. A Polícia Federal considera esse esvaziamento do Funad uma tentativa de enfraquecer a ação da PF. A medida, defendida por Derrite, deve ter sido muito bem recebida pela cúpula do crime organizado.
Especialistas afirmam que a recusa por parte do deputado bolsonarista em tipificar o crime de “facção criminosa” é outro benefício aos chefões do crime que farão questionamentos sobre a existência de mais de uma legislação. No chamado “marco legal de combate ao crime organizado”, Derrite trata sobre as condutas de “organização criminosa ultraviolenta”, “milícia privada” ou “grupo paramilitar”. Para os especialistas, esta redação vai gerar conflitos com tipificações que já existem hoje.
Esse novo marco, segundo o governo e os especialistas, repete crimes e conceitos que já existem em outras legislações. Integrantes do governo afirmam que essa estrutura aumenta o risco de duplicidade, decisões contraditórias e dificuldade para aplicar corretamente a lei — já que condutas semelhantes passariam a existir em textos diferentes.
Os bolsonaristas querem garantir que as benesses aos chefes das facções, incluídas no projeto, sejam mantidas pelo Senado. Não por acaso, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o rei das rachadinhas e conhecido parlamentar ligado às milícias do Rio de Janeiro, se apresentou para relatar o projeto. Flávio homenageou com a Medalha Tiradentes o miliciano Adriano Nóbrega, que era chefe do Escritório do Crime, espécie de central de assassinatos das milícias do Rio. Além dele, o senador Sérgio Moro, ex-ministro de Bolsonaro, também se apresentou para relatar o projeto. Alcolumbre recusou os dois nomes para evitar a demagogia que se viu na Câmara.
“O senador Flávio Bolsonaro, assim como senador Moro e outros senadores, me solicitaram para que eles pudessem relatar essa matéria”, afirmou. Alcolumbre disse ainda que a escolha de Vieira foi tomada de maneira “equilibrada e consciente”. “Na condição de presidente do Senado Federal eu gostaria de proteger esse projeto do debate que nós estamos vivenciando infelizmente na Câmara dos Deputados entre situação e oposição. Proteger esse projeto, proteger esse relatório, é defender verdadeiramente os brasileiros”, disse Alcolumbre.
O presidente do Senado também deu declarações para mostrar o respaldo a Alessandro Vieira, mencionando que ele também é relator da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Crime Organizado e que trabalhou na área. “Se o Senado teve com sabedoria a capacidade de escolher um delegado que serve o Brasil como senador da República para ser relator da CPI, eu tenho certeza absoluta de que todos nós estaremos representados por esse delegado senador como relator dessa matéria importantíssima”, destacou o presidente do Senado.
O Projeto de Lei Antifacção do governo Lula, mesmo com toda a deformação trabalhada pelos bolsonaristas, ainda consegue aumentar as penas para membros de facção ou milícia para 20 a 40 anos, podendo chegar a 66 anos para os líderes das organizações criminosas. O substitutivo também eleva em 85% da pena o tempo necessário para progressão de regime. O texto também proíbe graça, anistia, indulto ou liberdade condicional para membros dessas organizações criminosas.











