O Brasil também. Saldo positivo do Caged contrasta com renda média de R$ 2.304. Apenas 1,52 salário mínimo. Juros de 15% travam consumo e investimento. Organismos internacionais apontam que, sem elevar produtividade e renda, o País seguirá preso ao baixo crescimento
MARCOS VERLAINE*
Para além das comemorações, os números do emprego divulgados pelo Caged 1 escondem dura realidade. Assim, é preciso lançar olhar para além dos números e desvendar ou enxergar o que esses não revelam numa visão meramente superficial.
O Brasil encerra mais um ciclo com aumento no emprego formal, segundo o Caged. Em qualquer economia emergente, esse seria dado inequívoco de avanço. Mas não é bem assim. Vamos explorar melhor esses dados, em perspectiva crítica.
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Aqui, porém, esse é acompanhado de fator que impede comemoração plena: a renda média dos trabalhadores permanece em apenas R$ 2.304, o equivalente a 1,52 salário mínimo.
Economistas como Monica de Bolle (Peterson Institute) e Laura Carvalho (USP) têm insistido há anos na mesma tecla: crescimento baseado apenas em ocupação, sem aumento de renda e produtividade, produz expansão frágil e insustentável.
E é exatamente isso que os dados brasileiros revelam: economia que emprega, mas não emancipa.
RENDA ESTAGNADA: PROBLEMA ESTRUTURAL
O Banco Mundial e a OCDE destacam repetidamente que o Brasil é um dos países com maior desalinhamento entre produtividade e remuneração. Enquanto a produtividade brasileira cresce em ritmo lento há quase 4 décadas, os salários se arrastam ainda mais.
Relatórios recentes desses organismos mostram que:
- A renda real dos trabalhadores brasileiros estagnou ao longo dos últimos 10 anos;
- O Brasil tem um dos piores índices de mobilidade social da América
Latina; e - Setores de baixo valor agregado concentram a maior parte da mão de
obra formal.
R$ 2.304 não cobre o custo de vida básico em grandes centros urbanos, e mesmo em cidades médias a renda é tragada por aluguel, energia e alimentação; itens que puxaram a inflação estrutural nos últimos anos, como destacam boletins do Ipea.
O resultado é paradoxo cruel: o trabalhador está empregado, mas continua pobre. A formalização, embora bem-vinda, não garante dignidade econômica.
JUROS DE 15%: A ECONOMIA NÃO SUPORTA
A taxa básica de juros (Selic) na casa dos 15% coloca o Brasil na contramão do mundo. Enquanto Estados Unidos, Europa e países latino-americanos reduzem juros para proteger consumo e investimento, o Brasil segue com política monetária restritiva, regressiva e extorsiva.
Segundo o FMI, juros elevados por longos períodos reduzem o potencial de crescimento, desestimulam inovação e penalizam pequenas e médias empresas, motores de qualquer economia emergente.
Os efeitos são claros:
- Crédito caro – famílias desistem de financiar bens duráveis;
- PME (Pequenas e Médias Empresas) paralisadas – empresários deixam
de investir, contratar e expandir; - Menor consumo interno – principal variável que explica 60% do PIB
brasileiro; e - Economia patina – alimentando círculo vicioso de baixo crescimento.
O economista André Lara Resende, ex-diretor do Banco Central, resume a situação: “Juros tão altos por tanto tempo não controlam inflação — controlam crescimento e oportunidades.”
CRESCIMENTO QUE NÃO DISTRIBUI
Ipsos, Cepal e OCDE têm reiterado que o Brasil vive armadilha: cresce pouco porque produz pouco; produz pouco porque paga mal; paga mal porque não investe em inovação nem tampouco em qualificação.
E a política monetária atual exacerba esse quadro.
A geração de empregos é passo importante, mas insuficiente. Sem salário digno, o País não cria mercado consumidor robusto, condição fundamental para qualquer ciclo de desenvolvimento sustentado.
BRASIL PRECISA ESCOLHER ENTRE PRESENTE E FUTURO
O cenário exige escolhas estratégicas:
- Política de renda que reduza a defasagem salarial;
- Aceleração da produtividade, via educação, inovação e crédito barato;
- Reformas que reduzam o custo Brasil; e
- Sobretudo, juros compatíveis com a realidade produtiva, não apenas
com a ortodoxia financeira.
Gerar vagas é positivo. Gerar renda é transformador. São necessárias ambas.
Enquanto essa transformação não ocorrer, o Brasil seguirá comemorando empregos que mantêm milhões no mesmo lugar: empregados, mas ainda pobres. Com a imensa maioria pobre, o Brasil segue também pobre, embora seja rico, porque a renda está concentrada.
E assim não distribui riqueza. Trata-se de ciclo vicioso e não do ciclo virtuoso, porque clama o povo brasileiro.
(*) Jornalista, analista político, assessor parlamentar do Diap e redator do HP











