STF barra decisão ilegal que livrou o mandato de Carla Zambelli

O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes (Foto: Luiz Silveira - STF)

“Trata-se de ato nulo, por evidente inconstitucionalidade, presentes tanto o desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, quanto flagrante desvio de finalidade”, diz o ministro Alexandre de Moraes sobre a votação na Câmara

A decisão da Câmara dos Deputados, que rejeitou, por insuficiência de votos, a cassação da deputada Carla Zambelli (PL-SP), na quarta-feira (10), é nula, decidiu o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, “em respeito à Constituição Federal”.

A decisão do ministro se deu na noite desta quinta-feira (11).

Moraes determinou, assim, a perda imediata do mandato da parlamentar bolsonarista.

“Na presente hipótese, em respeito à Constituição Federal, é o Poder Judiciário quem determina a perda do mandato parlamentar condenado criminalmente com trânsito em julgado, cabendo à Mesa da Câmara dos Deputados, nos termos do §3º do artigo 55 da Constituição Federal, tão somente DECLARAR A PERDA DO MANDATO, ou seja, editar ato administrativo vinculado”, afirma o ministro na decisão.

Segundo o ministro, a votação pela Câmara dos Deputados que preservou o mandato da deputada “ocorreu em clara violação” à Constituição.

“Trata-se de ATO NULO, por evidente inconstitucionalidade, presentes tanto o desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, quanto flagrante desvio de finalidade”, diz o ministro sobre a votação.

Moraes também determinou que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), dê posse ao suplente da deputada em até 48 horas.

O ministro solicitou ainda que o presidente da Primeira Turma do STF, ministro Flávio Dino, agende para esta sexta-feira uma sessão virtual em que os demais ministros confirmem ou rejeitem a decisão.

A Câmara contrariou uma ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo fim imediato do mandato da deputada, automaticamente.

Para ser cassada, eram necessários 257 votos. Porém, 227 deputados votaram nesse sentido, enquanto 170 foram contrários, além de 10 abstenções. Faltaram 30 votos para tirar seu mandato, com os bolsonaristas trabalhando para derrubar o quórum necessário pela cassação. 104 deputados de vários partidos não compareceram para votar, reduzindo o quórum.

A rigor, como mostra Moraes, sequer era necessário ir à votação na Câmara a perda do mandato da parlamentar, como é determinado pela Constituição. Era uma decisão que deveria ser tomada pela Mesa da Câmara. Simplesmente declarar a perda do mandato.

“A decisão do Supremo é uma decisão muito clara. Não era para ter ido à CCJ, e o presidente Hugo Motta [presidente da Câmara] acabou criando um problema para si próprio. Não era para ter ido para o plenário”, afirmou o deputado Lindbergh Farias (RJ), líder da bancada do PT, após a votação.

O jurista Miguel Reale Jr, ex-ministro da Justiça, afirmou na manhã desta quinta-feira (11) que a decisão da Câmara de livrar a deputada Carla Zambelli (PL-SP) foi “absolutamente inconstitucional” e pode ser revista pelo STF. “O Supremo pode cassar essa decisão da Câmara”, defendeu o jurista.

Lindbergh apresentou uma ação ao ministro Alexandre de Moraes para obrigar a Mesa Diretora da Câmara a afastar Zambelli.

CONDENAÇÕES

A Câmara pôr em votação a perda do mandato de Zambelli é uma decisão grotesca.

Ela não está no Brasil, está foragida desde julho. Foi condenada pelo STF a 10 anos de prisão, em trânsito julgado (sem mais recursos), por mandar invadir os sistemas da Justiça. Há duas condenações em trânsito julgado contra ela.

No caso de condenações criminais, quando não são mais passíveis de recurso, há a suspensão dos direitos políticos. O réu fica sem a possibilidade de votar ou de se candidatar a cargo eletivo enquanto durar a pena.

A condenação determina a perda do mandato após trânsito em julgado. Mas a Mesa da Câmara, presidida pelo deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), não seguiu o rito, enviando o caso para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e depois para o plenário.

Zambelli também foi condenada pelo plenário do STF, por 9 a 2, a 5 anos e 3 meses de prisão pelo episódio dantesco em que, na véspera da votação do segundo turno da eleição em 2022, discutiu e perseguiu de arma em punho o jornalista negro Luan Araújo, eleitor de Lula, nas ruas próximas à Avenida Paulista, centro de São Paulo.

O STF declarou em 30 de outubro deste ano o trânsito em julgado deste acaso também.

Nada disso foi observado pela Presidência da Câmara, deixando Zambelli gastar R$ 521 mil do dinheiro público desde que se evadiu, sem trabalhar.

MOTIVOS DE MORAES

Na decisão que anulou o ato da Câmara, o ministro relatou os motivos:

1) Desde 2012, o STF tem o entendimento de que os parlamentares perdem o mandato de forma automática a partir do trânsito em julgado do processo, quando condenados criminalmente, porque os direitos políticos são suspensos quando são condenados;

2) O entendimento desde 2017 de que nos casos em que a pena seja cumprida em regime fechado e não seja possível ao condenado progredir para o trabalho externo durante o tempo restante da legislatura, a perda do mandato é automática;

3) Que no caso como o de Carla Zambelli, a Constituição Federal define que é o Poder Judiciário quem determina a perda do mandato parlamentar condenado criminalmente com trânsito em julgado, cabendo à Mesa da Câmara dos Deputados, somente declarar a perda do mandato;4) Que a decisão da Câmara é nula e inconstitucional porque violou a Constituição, que determina a perda de mandato de parlamentar que for condenado criminalmente com trânsito em julgado.

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