O neoliberal Nasry Asfura, do Partido Nacional, ostensivamente apoiado pela Casa Branca, foi declarado na véspera de Natal “vencedor” das eleições presidenciais em Honduras por dois integrantes do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), apesar de os outros dois candidatos mais votados, o centrista Salvador Nasralla, do Partido Liberal, e a governista Rixi Moncada, do Partido Liberdade e Refundação, assim como a atual presidente, Xiomara Castro, denunciarem estar em curso um “golpe eleitoral”.
A dois dias da ida às urnas, o presidente Donald Trump ameaçou os hondurenhos com “consequências” se não votassem no candidato Asfura e, para deixar claro que não estava blefando, anistiou de imediato o ex-presidente Juan Orlando Hernandez, conhecido como ‘JOH’, e do mesmo partido de Asfura.
JOH, condenado em 2024 nos EUA a 45 anos de cadeia por tráfico de cocaína para “entupir o nariz dos gringos”, 400 toneladas ao longo de oito anos de mandato, já está livre, leve e solto.
E isso em plena escalada de Trump no Caribe, sob o pretexto do “combate ao narcotráfico” e acusação a dois presidentes, o venezuelano Nicolás Maduro e o colombiano Gustavo Petro, de serem “chefes de cartéis”.
ROBÔS NAS PLATAFORMAS TOCAM O TERROR
A campanha do preferido de Trump, por sua vez, acionou os robôs nas plataformas sociais ameaçando que, se Asfura não fosse eleito, os EUA iriam sustar a remessa de dinheiro dos imigrantes para as famílias em Honduras, que corresponde a 25% do PIB hondurenho – inominável chantagem à empobrecida população hondurenha.
Há ainda a chantagem de Trump de deportar 250.000 hondurenhos que vivem nos EUA supostamente “de forma ilegal”.
Trump, em suas diatribes, também chamou a candidata da presidente Xiomara Castro, Rixi Moncada, de “comunista e narcoterrorista”, como parte do exercício de seu recém anunciado “corolário” à Doutrina Monroe. De Nasralla, disse que “fingia ser anticomunista”.
A entronização de Asfura no dia 24 de dezembro foi prontamente aclamada pelo secretário de Estado, Marco Rubio, que aproveitou para exigir que ninguém ousasse se opor. No dia 19, o Departamento de Estado sancionara o representante do partido Libre no CNE, Marlon Ochoa, e o presidente do Tribunal de Justiça Eleitoral, Mario Morazán, com retirada de visto de entrada nos EUA, por pressionarem pela recontagem de votos.
INTERRUPÇÕES NA APURAÇÃO E MILHARES DE ATAS FRIAS
Além da chantagem da supressão das remessas de dinheiro às famílias, a candidatura Asfura também foi beneficiada por interrupções inexplicadas na apuração, discrepâncias em milhares de atas e outras irregularidades. Inclusive a apuração demorou 24 dias, com diversas paradas.
Segundo a mídia, a pesquisa de boca de urna indicara a vitória de Nasralla. Este se recusou a reconhecer o resultado pinçado pelo CNE, denunciando as “milhares de folhas de apuração com inconsistência”, as fraudes no sistema de Transmissão de Resultados Eleitorais Preliminares (TREP) e exigindo a contagem completa dos votos das atas com discrepâncias. Chegou a falar em “roubo”.
A “vitória” de Asfura foi pela minúscula diferença de 26.348 votos em uma eleição com 3,8 milhões de votos. Segundo o resultado final do CNE, Asfura teve 1.481.517 contra 1.455.169 votos de Nasralla, respectivamente 40,26% a 39,55%. Rixi Moncada, teve 19,6% dos votos.
Resultado que foi anunciado antes que se completasse a contagem de votos questionados exigida por Nasralla e Moncada. Outros dois candidatos de pequenos partidos tiveram menos de 1% dos votos. O comparecimento às urnas foi 58%.
Na sessão do pleno do CNE realizada no dia 23, as magistradas Ana Hall (Partido Liberal) e Cossette López (Partido Nacional) recusaram a revisão ou qualquer impugnação de aproximadamente 10 mil atas com inconsistências.
Também a presidente Xiomara classificou a situação de “golpe eleitoral”, diante da “interferência de Trump” e indulto a JOH, mais as irregularidades e o quadro de coação aberta sobre os eleitores.
Moncada afirmou que não reconhece o desfecho do processo, advertindo contra a “interferência estrangeira” e que as eleições não foram livres. Seu partido, o Libre está reivindicando a anulação das eleições.
UM PÉ EM CADA CANOA
Por sua vez, Nasralla – que na eleição de 2021, ao retirar sua candidatura, possibilitou a vitória de Xiomara, que disputava então com Asfura – disse em entrevista ao New York Times “dividido” entre contestar formalmente o resultado e o receio de fortalecer o partido de esquerda no poder, o Libre. “Estou em um dilema. Gostaria de recorrer, porque quase dois milhões de pessoas votaram em mim. Não quero incentivar os comunistas”.
Já no final de outubro, o vazamento de áudios com conversas entre a representante do CNE, Cossette López, o deputado Tomás Zambrano, do Partido Nacional, e um oficial militar, chamara a atenção para os planos de “manipular o voto popular”. Zambrano alegou que as gravações seriam “completamente falsas, fabricadas… manipuladas [com] inteligência artificial”.
BASE DOS EUA EM HONDURAS
Em 2009, o então presidente Manuel Zelaya, então no Partido Liberal, foi derrubado por um golpe militar e embarcado à força em um avião e deportado, por almejar uma política mais soberana e menos desigual para Honduras. Um golpe nitidamente apoiado pela então secretária de Estado, Hillary Clinton. Depois, Zelaya uniu a oposição e fundou o Libre, partido pelo qual sua mulher, Xiomara Castro, foi eleita em 2021.
Na década de 1980, durante a guerra suja dos EUA contra os levantes populares em El Salvador e na Nicarágua, Honduras funcionou como uma espécie de porta-aviões inafundável para os norte-americanos, com sua base aérea em Soto Cano.
JOH, o chefão do narco indultado por Trump, inacreditavelmente – e, claro, sob a bênção dos EUA – governou ilegalmente por um segundo mandato, que não existe em Honduras, entre 2018 e 2022.
Asfura, mais conhecido pelo seu lema de “Papi, ao seu dispor”, foi ex-prefeito da capital, Tegucipalga, e em suas funções públicas foi acusado de corrupção em duas oportunidades, além de figurar na relação do escândalo dos Pandora Papers, as offshore no Panamá.
FRAUDE E IMPOSIÇÃO ESTRANGEIRA
Moncada , em mensagem nas redes sociais, enfatizou que “ em Honduras, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), seguindo instruções do império, assassinou nossa jovem democracia , mas nosso povo não é ingênuo: a proclamação do ‘presidente eleito’ é uma fraude e uma imposição estrangeira. Traíram a nação”. Ela ressaltou que o mundo “precisa saber” que o presidente eleito em Honduras “é um dos empresários que solicitaram a intervenção” de Trump.
Moncada também denunciou que, durante o período de cinco dias de “silêncio eleitoral” destinado à reflexão dos hondurenhos sobre o voto, líderes empresariais “pagaram por mensagens ameaçadoras em massa contra eleitores que recebem remessas”, com o objetivo de “distorcer a vontade popular”.
Moncada exigiu ainda que as 26 gravações de áudio que vazaram em outubro sejam investigadas em sua totalidade.
OPERAÇÃO AÇULADA PELOS PARASITAS DE MIAMI E POR TRUMP“
O secretário de Planejamento Estratégico do atual governo, Ricardo Salgado, chamou a proclamação de Asfura como presidente de Honduras de “um novo tipo de golpe de Estado”.
“O fascismo, alimentado pelos parasitas de Miami e por Donald Trump, realizou uma operação psicológica e militar sem precedentes em Honduras ”. Para ele, o conflito não é contra partidos de direita, mas sim “contra o império e todas as forças fascistas de língua espanhola”. Ele observou, ainda, que Asfura “não fez campanha eleitoral” e foi apelidado de “candidato mudo”.
Por fim, Salgado concluiu: “Se aprendermos bem a lição de Honduras, isso poderá ser interrompido mais cedo do que qualquer um imagina.”











