CAMILA SEVERO, de Madri
Milhares de franceses voltaram às ruas neste sábado (24) para protestar contra os aumentos do diesel e a perda do poder de aquisitivo gerado pelas reformas econômicas do presidente Emmanuel Macron. Iniciado no sábado (17), o movimento dos “Gilets Jaunes” (coletes amarelos) já mobilizou mais de 300 mil pessoas no país, e pede a redução do preço do combustível além da saída do presidente.
O diesel, combustível mais utilizado na França, subiu 23% nos últimos 12 meses, chegando ao valor mais alto desde 2000, enquanto a inflação no país é inferior a 2%. Nas bombas, o preço varia de €1,32 a €1,71 (R$ 5,70 a R$ 7,40), uma média de €1,51 por litro (R$ 6,53). Em julho de 2017 o valor médio por litro estava em € 0,97 (R$ 4,20).
Além disso, o governo anunciou que a partir de 1º de janeiro de 2018 fará um novo aumento no preço: +6,5% no diesel e +2,9% na gasolina (que já teve alta de 15% nos últimos 12 meses). A medida foi à gota d’água para a população, causando revolta e contribuindo para derrubar a popularidade de Macron, que agora é aprovado por apenas 25% dos eleitores.
Há outro fator importante: na Europa, os preços dos combustíveis flutuam de acordo com o mercado internacional e o câmbio e isso significa que desde que o preço do barril de petróleo começou a subir, passando de US$ 61, em fevereiro para US$ 81 em novembro, os preços também estão em disparada. Uma possível alternativa do governo francês para que a população não pague a conta poderia ser a redução da carga tributária que representa 56% do preço do litro do diesel, e de 62% da gasolina. Mas a consequência direta da falta de atuação foi a explosão do preço nos postos para o consumidor final, que está completamente insatisfeito.
Não é à toa que os protestos dos “coletes amarelos” contam com um enorme apoio da população. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Elabe, 75% dos entrevistados disseram que apoiam as manifestações e outros 70% querem que o governo francês reverta os aumentos nos preços dos combustíveis. “As expectativas e o descontentamento em relação ao poder de compra são gerais. Não é algo que preocupa apenas a França rural ou as classes mais baixas”, afirma Vincent Thibault, do instituto Elabe.
Grande parte da população afirma que não tem escolha senão usar o carro para ir trabalhar. Na França, mais de um quarto da população (cerca de 18,8 milhões de habitantes) vive em “áreas brancas de mobilidade”, onde não há plano de transporte público, diz o Centro Estudos e Expertise em Riscos, Mobilidade e Planejamento (Cerema). Nestes territórios, as distâncias para viajar para o trabalho continuaram a crescer e oferta de transporte continua a ser inadequada.
Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos (INSEE), 70,6% dos franceses vão trabalhar de carro e metade declara fazê-lo “por necessidade”. Todos os dias, mais de 10 milhões de moradores de áreas rurais ou de regiões metropolitanas não têm outra opção para chegar ao trabalho em outra cidade. A perspectiva é que a partir do início de 2019, as despesas das famílias francesas com transporte cresçam entre 100 e 250 euros por mês (de 430 a 1000 reais), principalmente para aquelas que vivem em zonas afastadas dos grandes centros e têm o carro como único meio de transporte.
Outro fator que contribui para este descontentamento geral é que desde a eleição de Macron o poder de compra na França caiu para 99% da população, segundo estudo do Public Policy Institute (PPI), que avaliou recentemente os orçamentos franceses de 2018 e 2019. Segundo o PPI, a queda foi mais acentuada para a população 20% mais pobre e para os aposentados, atingidos pela reforma dos benefícios habitacionais, a sub-reavaliação dos benefícios sociais e aumento dos impostos sobre energia e tabaco. Ao mesmo tempo, o 1% mais rico teve aumento no poder de compra.
A explosiva combinação entre aumentos de impostos que afetam a maioria das famílias e cortes de impostos para os mais ricos (principalmente o imposto sobre a riqueza), serviram como pólvora para a ira da população.