Não durou mais que meia hora a cúpula extraordinária da União Europeia em Bruxelas que carimbou o acordo de saída da Grã Bretanha do bloco, com a decisão central tomada “em segundos”, conforme a descrição do jornal inglês The Guardian. No dia 14, a primeira-ministra Theresa May anunciara sua rendição ao acordo empurrado por Bruxelas – melhor dizendo, por Berlim – que mantém a tutela sobre a economia britânica, depois de ter tido sua proposta recusada na “humilhação em Salzburg” de setembro.
Agora, a pressão se volta contra o Parlamento britânico, cujo controle May perdeu (os conservadores estão bastante divididos, os unionistas de Belfast ameaçam votar contrae o líder trabalhista Jeremy Corbyn já anunciou o voto contrário dos parlamentares do partido), com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker “convidando” os deputados a ratificar o acordo, cuja votação será em dezembro, advertindo-os de que “é o único acordo possível”. E repetiu: “é o único acordo possível”.
Na semana passada, o próprio responsável pela negociação e mais vários ministros do governo conservador inglês renunciaram em rechaço ao acordo May/UE, que tem 585 páginas e 185 artigos, mais uma declaração genérica de intenções e termos vagos.
Uma das principais condenações do acordo partiu do próprio negociador-chefe inglês, Dominic Raab, que alertou que na formal atual “dá à UE o poder de veto da nossa capacidade de sair”. “Nenhuma nação democrática jamais se inscreveu para se comprometer com um regime tão extensivo”.
A questão à qual se refere Raab é a disposição do acordo que estabelece um período de transição, cuja duração não é fixa, no qual a Grã Bretanha não é mais considerada um membro da UE, mas será forçada a se submeter às suas regras, incluindo as que virem a ser aprovadas (e sobre as quais não terá evidentemente voz.
O líder da oposição trabalhista, Corbyn, afirmou que se trata de “um mau acordo para o país”, que é o resultado de una negociação fracassada “que nos deixa com o pior de todos os mundos”. “É incontestável que dá menos voz ao nosso futuro e coloca em risco empregos e padrões de vida”.
A única certeza contida nessas páginas – completou – é que o período de transição terá de ser estendido ou “acabaremos com um ‘backstop’ e sem saída” na fronteira interirlandesa.
O acordo também obriga Londres a pagar multa de 39 bilhões de libras esterlinas por deixar a UE.
Conforme o jornal progressista inglês The Morning Star, a principalidade de May nas negociações foi “o pacote de prioridades exigido pelo setor financeiro, a City londrina”. O jornal advertiu ainda que o acordo, que segue o neoliberalismo que impera na UE, restringe os auxílios estatais à indústria e os investimentos públicos.
Desde o início, a UE deixou claro que o acordo do Brexit seria de molde a dissuadir outros países de deixaram a prisão de povos em que o bloco se tornou e os ditames da Troika. Na cúpula, Juncker chamou a saída da Grã Bretanha de “tragédia” e “momento triste”.
May, que no início das negociações dizia que um não acordo era melhor do que um mau acordo, agora assevera que qualquer acordo é melhor que nenhum. Ela ameaçou o parlamento inglês de “volta à estaca zero”, se não engolirem seu acordo Brexit.
A cúpula de Bruxelas optou por passar ao largo da possibilidade de rejeição do acordo pelo parlamento britânico. O Brexit foi aprovado no plebiscito de 2016 com quase 52% dos votos e o acordo endossado por May desrespeita seu principal significado: o repúdio à desindustrialização que grassa desde o regime Thatcher, o rechaço à austeridade e à especulação e a disposição de retomar o controle sobre a economia britânica. Estavam presentes na cúpula deste domingo (25) os 27 chefes de governo e de Estado da UE. A Espanha, que ameaçava vetar o acordo, aderiu, após garantia de que terá voz sobre qualquer questão relativa a Gibraltar, a fortaleza ocupada pelos ingleses há 300 anos. O presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, prometeu a sua votação em “fevereiro-março”.
A. P.