O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o ex-presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, tornaram-se réus na Justiça Federal de Brasília por causa das pedaladas fiscais – atraso no repasse a bancos públicos de dinheiro destinado ao pagamento de despesas do governo – que levaram ao impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
Além deles, o ex-secretário do Tesouro, Arno Augustin, e o ex-subsecretário de Política Fiscal do Tesouro Nacional, Marcus Pereira Aucélio, vão responder por crime contra as finanças públicas.
A decisão é do juiz Francisco Codevila, da 15ª Vara Federal de Brasília, que aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF). Na decisão, o magistrado afirma que os quatro agiram dolosamente, ou seja, com intenção e em coautoria.
Segundo o MPF, eles foram responsáveis “por ordenar, autorizar e realizar operações de crédito interno sem prévia autorização legislativa”. A peça acusatória ressalta que “as pedaladas” foram praticadas por agentes públicos do alto escalão do governo nos últimos anos do primeiro mandato de Dilma, especialmente no exercício de 2014.
“Tais operações consistiram na concessão e utilização indevida de recursos do BNDES [Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social] para o pagamento de benefícios de responsabilidade da União no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento”, aponta.
A denúncia também se baseia na utilização de recursos do Banco do Brasil para o pagamento do Plano Safra e no atraso no repasse de royalties do petróleo, recursos para geração de energia elétrica e do salário educação para municípios, estados e o Distrito Federal.
O MPF diz que Mantega “assinou, como ministro da Fazenda, portarias que postergaram o pagamento das obrigações do Tesouro, a fim de, dolosamente, dar aparência de legalidade a operações de crédito vedadas”. E também afirma que Bendine, como presidente do Banco do Brasil em 2014, “permitiu que as referidas operações de crédito se perpetuassem meses a fio, submetendo o patrimônio do Banco do Brasil a condições flagrantemente lesivas e ilegais, pois a instituição que dirigia passou a assumir contas de responsabilidade da União”.
Bendine assumiu a presidência do Banco do Brasil em abril de 2009, a convite de Lula. Ficou no cargo até fevereiro de 2015, quando foi indicado por Dilma Rousseff para a presidência da Petrobrás, onde permaneceu até maio de 2016. O homem de confiança da então presidente, “o doutor Bendine”, foi escolhido pelo “desempenho no Banco do Brasil, que era um elemento, para mim, bastante valioso”, disse Dilma em depoimento a Moro, como testemunha de defesa de Bendine, em outubro do ano passado.
O MPF ressaltou ainda que deixou de denunciar Dilma Rousseff e o ex-presidente do BNDES, Luciano Coutinho, porque a pena já teria prescrito desde 2016 em virtude da idade acima de 70 anos dos dois. Ao aceitar a denúncia, o juiz reconheceu a prescrição no caso de ambos, mas disse que se trata de uma “incoerência do sistema legal”.
Francisco Codevila questiona: “Como explicar à sociedade que a conduta que resultou na perda do cargo de presidente da República e gerou tanta celeuma para o país, agora não acarrete qualquer consequência na esfera penal?” e conclui: “evidentemente, há algo errado”.
“Ou seja, o mesmo ato pode levar a presidente da República a perder o cargo, no juízo político, e a pagar uma cesta básica, no juízo comum. Evidentemente, há algo errado! Ora, se o mesmo fato pode levar à consequência extrema da perda do cargo de presidente da República, não é razoável que seja apenado com o mero pagamento de uma cesta básica”, escreveu o juiz.