169 mil criminosos seriam beneficiados, diz o Conselho Nacional de Justiça
A liminar, concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF, suspendendo a execução de penas após a condenação em segunda instância, não é apenas esdrúxula, como disseram alguns – substituindo a palavra “maluca” por outra mais elegante.
Como diziam os juristas da Antiga Roma, a quem aproveita essa decisão?
Antes de tudo, a todos os condenados no âmbito da Operação Lava Jato, que, se essa liminar for levada à prática, poderão usar o dinheiro que roubaram do povo para nunca ser presos, postergando indefinidamente a sua punição, com recursos atrás de recursos.
Esse seria o caso de Lula, Eduardo Cunha, Sérgio Cabral – e todos os outros ladrões do dinheiro do povo que foram condenados por algum de seus crimes em primeira e segunda instâncias.
Houve quem argumentasse que Cunha e Cabral, apesar de condenados pela segunda instância – ambos pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) – não seriam beneficiados pela decisão de Marco Aurélio, pois estão sob prisão preventiva.
Trata-se de uma meia verdade. Tanto Cunha quanto Cabral já começaram a cumprir suas penas (v. TRF4 nega Habeas Corpus que buscava a suspensão da execução da pena do ex-deputado Eduardo Cunha e CABRAL – EXECUÇÃO DE PENA).
Portanto, nos processos em que já começaram a cumprir a pena, eles seriam beneficiados.
No entanto, em outros processos, nos quais ainda não foram julgados, eles estão sob prisão preventiva. Por isso, não seriam soltos imediatamente com a liminar de Marco Aurélio.
Mas, evidentemente, é muito mais fácil derrubar uma prisão preventiva do que o cumprimento de uma pena que resultou de condenação em duas instâncias da Justiça – veja-se a legião de corruptos que foram soltos por decisões de Gilmar Mendes (em quem, aliás, Marco Aurélio estribou a sua liminar).
Porém, se esse fosse o caso, não é pouco soltar somente Lula, com a pororoca de provas que existe do seu roubo, da propina que recebeu.
No entanto, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), se essa liminar prevalecer, serão soltos 169 mil condenados pela primeira e segunda instâncias da Justiça.
DESRESPEITO
Mas não é somente isso.
A decisão de Marco Aurélio desrespeita inteiramente o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), cujo plenário, por quatro vezes, decidiu pela legalidade e constitucionalidade da prisão após a condenação pela segunda instância: em fevereiro de 2016, outubro de 2016, dezembro de 2016 e em abril de 2018.
A alegação de Marco Aurélio de que pretende, com a decisão, “reconhecer a harmonia” do Código de Processo Penal com a Constituição, é quase um abuso de autoridade.
Essa missão cabe, de acordo com a Constituição, a todo o Supremo Tribunal Federal (STF) – e não apenas a um ministro, por mais iluminado que seja.
De que adiantaria o plenário do STF decidir alguma coisa – e por quatro vezes – se fosse lícito a um único ministro decidir, depois, o contrário? Desde quando o desrespeito às decisões do plenário de um Tribunal – mais ainda do Supremo Tribunal – tornou-se uma norma judicial aceitável?
Pior ainda a alegação de que a decisão de abril de 2018, que negou um habeas corpus para soltar Lula, não configuraria uma maioria no Supremo, pois a ministra Rosa Weber, ao votar contra soltar o condenado, ressalvou sua posição pessoal sobre a tese geral de cumprimento da pena após a condenação em segunda instância.
Foi exatamente essa a jurisprudência vencedora em abril, com a ministra Rosa Weber deixando claro que votava com a “colegialidade”, ou seja, com as decisões anteriores do STF, com a jurisprudência do STF que autoriza a execução da pena após a condenação em segunda instância.
O que Marco Aurélio está fazendo, portanto, é passar por cima daquela decisão.
Há dois dias o presidente do STF, Dias Toffoli, marcou para o dia 10 de abril do próximo ano a discussão e julgamento a respeito da tese geral de cumprimento da pena após a condenação em segunda instância.
Entretanto, Marco Aurélio passou por cima também da decisão de Toffoli.
A decisão de Marco Aurélio foi em ação proposta pelo PCdoB.
A Procuradoria Geral da República, através de sua titular, Raquel Dodge, anunciou, no começo da tarde, que estava recorrendo da decisão de Marco Aurélio.
C.L.
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