“A polícia antimotins está tentando entrar no canal de TV 100% Notícias. Estão entrando. Há paramilitares no segundo andar. Estamos reportando nestes momentos”, foi a última transmissão da chefe do setor de comunicação da TV, Lucia Pineda Ubau, nos instantes em que a polícia orteguista tomava o prédio da TV às nove da noite do dia 20.
Minutos mais tarde, o jornal Confidencial, através de seu site, informava que o diretor da TV, Miguel Mora, a jornalista Ubau e a esposa de Mora, Verónica Chávez, também jornalista, e o motorista da empresa, Joseph Hernandez, foram levados pela polícia.
Horas mais tarde, somente a jornalista Verónica Chávez foi liberada.
Segundo o advogado Pablo Cuevas, que defende o diretor da TV, Mora foi levado, na manhã d dia 21 perante “um juiz do Sexto Distrito Penal de Audiências”. Cuevas não informou o nome do juiz, mas diz que a acusação a Mora é de “fomentar e incitar o ódio e a violência”.
O procurador geral da República da Nicarágua, Alberto Novoa contesta a prisão e diz que não há base legal para as acusações contra o jornalista. “Não tem nenhuma base a detenção e agora acusação contra Mora. O artigo 510 [Código Penal] que fala em ‘incitação ao ódio’ é muito amplo e passível de interpretação subjetiva. Mora não tem sido um incitador de ódio. Ele está exercendo sua profissão ou ofício, uma atividade que consiste em obter e transmitir informação. Ele não inventou as notícias”, destacou Novoa.
Outro ataque a um veículo que tem noticiado a agressão da ditadura em que o governo de Daniel Ortega se tornou, o El Confidencial, dirigido pelo jornalista Carlos Chamorro, se deu no dia 15, quando entraram de madrugada nas instalações do periódico e levaram computadores e papeis contábeis e com anotações dos jornalistas, além de ocuparem o prédio.
No mesmo prédio eram produzidas as revistas Niú e Esta Semana.
A jornalista Leticia Gaitán, que também trabalha para o canal 100% Notícias, informa que “os agentes da polícia continuam dentro do canal e em seus arredores. A entrada do prédio está selada com laminas de zinco”.
Segundo o Instituto Nicaragüense de Telecomunicaciones y Correos (Telcor), o governo ordenou que a partir das 21:00h da sexta-feira, 20 de dezembro, a programação do canal fosse tirada do ar.
Ao mesmo tempo a polícia entrou no prédio e desativou as câmaras de segurança.
Os canais 9, 10 e 11, que transmitiam o fechamento da 100% Notícias, tiveram o sinal temporariamente cortado.
Há já algum tempo que a TV informava de assédio policial contra jornalistas deste meio, desde que começaram a noticiar as manifestações que começaram quando, em abril deste ano, os nicaraguenses foram informados de uma “reforma previdenciária” que elevava as contribuições e cortava em 5% as aposentadorias em geral.
Nos dias que antecederam o ataque à TV, homens ficavam horas parados em carros civis diante do prédio da emissora. Detido antes deste último episódio, o diretor Mora já afirmara que “o objetivo do regime é assediar e violentar a liberdade de imprensa”.
Em entrevista concedida ao jornal Confidencial, no início do mês, Mora afirmou: “Me acusam de mentiroso, instigador de mentiras e ódio no povo. O plano do governo é cortar todas as liberdades públicas. É um Estado policial, paramilitar”.
O bispo auxiliar de Manágua, mosenhor Silvio Báez, declarou: “Meu repúdio ante o grave atentado contra a liberdade de imprensa com a invasão de 100% Noticias e a retirada de seu sinal de TV”.
No dia 14 de dezembro entidades nicaraguenses foram proibidas de atuar, entre elas o Centro para Direitos Humanos da Nicarágua que vinham denunciando as mortes, desparecimentos, ferimentos e prisões políticas dos nicaraguenses que se opõem ao regime de Ortega.
Em carta dirigida em junho ao líder uruguaio, Pepe Mujica, o nicaraguense poeta e líder da Revolução Sandinista já afirmava: “O mundo deve saber e se pronunciar sobre o que está ocorrendo na Nicarágua: uma verdadeira crise de direitos humanos e terrorismo de Estado”.