A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a condenação do ex-ministro Geddel Vieira Lima (MDB) a 80 anos de prisão. O emedebista e seu irmão, deputado federal Lúcio Vieira Lima (MDB/BA), são réus no processo sobre o “bunker” de R$ 51 milhões descoberto pela Polícia Federal em um apartamento em Salvador.
Nas alegações finais à ação penal, a chefe do Ministério Público Federal se manifestou, ainda, contra o pedido da defesa de Geddel para revogar sua prisão preventiva. Ele está preso desde 8 de setembro de 2017.
A procuradora-geral argumenta que há risco de fuga e a possibilidade de Geddel cometer novos crimes. Pois Geddel “já deu mostras suficientes do que, em liberdade, é capaz de fazer para colocar em risco a ordem pública e vulnerar a aplicação da lei penal”.
E exemplifica, mostrando que ele: a) tentou impedir a colaboração premiada do doleiro e operador de propina Lúcio Funaro; b) manteve oculto os R$ 51 milhões; c) manteve secretários parlamentares trabalhando como empregados domésticos (peculato); d) mandou destruir provas em anotações, agendas, documentos e outros.
Para Lúcio Vieira Lima, Dodge pediu pena de 48 anos e seis meses.
Geddel, Lúcio, a mãe dos emedebistas, Marluce Vieira Lima, e o empresário Luiz Fernando Machado Costa Silva foram denunciados pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa em dezembro de 2017, três meses após a deflagração da Operação Tesouro Perdido, que apreendeu os R$ 51 milhões em dinheiro vivo. As digitais do ex-ministro foram encontradas no dinheiro. Para Luiz Fernando, a PGR pediu condenação de 26 anos de prisão.
“A partir do ano de 2010 e comprovadamente até 05/09/2017, GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA, LÚCIO QUADROS VIEIRA LIMA e MARLUCE VIEIRA LIMA associaram-se em Salvador (BA) para o fim de cometer crimes de ocultação da origem, localização, disposição, movimentação e a propriedade de cifras milionárias de dinheiro vivo, proveniente de infrações penais como corrupção, peculato, organização criminosa, além de outros ciclos anteriores de lavagem de dinheiro e também de operações lícitas”, diz o texto da Procuradora-geral.
As investigações apontam que os R$ 51 milhões localizados no apartamento eram oriundos de diversos esquemas de corrupção, como os investigados nas operações Lava Jato e Cui Bono? – esta relacionada a fraudes na liberação de créditos pela Caixa Econômica Federal.
Geddel foi vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa na gestão de Dilma Rousseff. Foi ministro da Integração de Lula e ministro-chefe da Secretaria de Governo de Temer.
No montante, também havia recursos desviados da Câmara dos Deputados – 80% do salário pago a um assessor de Lúcio Vieira Lima era direcionado à família dos emedebistas.
Segundo o MPF, há provas da prática de crimes ocorridos entre 2010 e 2017, em pelo menos seis contextos. Um deles é relacionado à incorporadora imobiliária Cosbat, do empresário Luiz Fernando da Costa. A família Vieira Lima repassou R$ 12,7 milhões à empresa em contratos falsos para dissimular a origem ilegal do dinheiro.
“Junto com a família Vieira Lima, Luiz Fernando Machado Costa Silva utilizou valores provenientes de infrações penais e lavou dinheiro sujo na aquisição de unidades imobiliárias por empresas de Geddel Quadros Vieira Lima, Marluce Vieira Lima e de Lúcio Quadros Vieira Lima, por solicitação deles”, afirmou a procuradora.
Mais trechos:
“Mais do que meramente ser escondido, o dinheiro sujo era ocultado por eles para, dentre outros fins, ser aplicado em investimentos no mercado de incorporação imobiliária de alto luxo na capital baiana, por meio do Grupo COSBAT – Construção e Engenharia. Pelo menos R$ 12.778.895,49 (doze milhões, setecentos e setenta e oito mil, oitocentos e noventa e cinco reais e quarenta e nove centavos) foram usados por eles para adquirir cotas de participação de empreendimentos da COSBAT, em Salvador (BA), mediante o uso de interpostas pessoas jurídicas ligadas a GEDDEL (GVL e M&A) e a Lúcio (VESPESIANO)”.
“GVL, M&A e VESPASIADO foram empresas usadas para a lavagem de dinheiro. De acordo com o Relatório de Pesquisa n° 1970/2017 SPEA-PGR, GVL foi constituída em 15/03/20113, ano da parceria com COSBAT. Em 2015, o nome foi alterado para M&A Empreendimentos e participações Ltda. (Relatório n° 1970 de fls. 2032 e ss). Ambas são de responsabilidade de MARLUCE VIEIRA LIMA. O outro sócio é GEDDEL QUADROS VIEIRA LIMA. Também criada em 2011, a VESPASIADO Empreendimentos e Participações Ltda., de acordo com o Relatório de Pesquisa n° 1969/2017 (fls. 2039 e ss), é cadastrada como empresa de pequeno porte (EPP). Seus sócios são MARLUCE VIEIRA LIMA e Lúcio QUADROS VIEIRA LIMA. Nenhuma dessas empresas possui automóveis, imóveis nem empregados. O suposto endereço de todas as três é o mesmo: Av. Centenário, 2883, sala 705, Chame-Chame, Salvador (BA)”.
“Enfim, são empresas sem qualquer respaldo para ter gerado, da noite para o dia, riqueza da ordem de quase treze milhões de reais — valor dos investimentos na COSBAT. Foram, portanto, criadas para ser parte do ciclo de lavagem de dinheiro. Tais ciclos de lavagem concluíram-se.”
“A instrução judicial confirmou’ que os aportes ilícitos, escamoteados sob o manto de contratos formais de cotas de participação, foram investidos na economia formal e geraram o desejado retorno da riqueza (lucro) aos lavadores, na forma de dividendos. Portanto, dinheiro de origem ilícita ficou limpo”.
O MPF sustenta que “apenas no caso envolvendo a Caixa Econômica Federal, a participação de Geddel teria rendido pagamentos de propina de R$ 170 milhões a agentes públicos”.
Raquel Dodge também pediu ao ministro Edson Fachin, relator do caso, a rejeição do pedido da mãe de Geddel para que seu processo seja redistribuído para Salvador e não para a Justiça do Distrito Federal como foi determinado pelo ministro. “Vislumbro em mais essa irresignação uma última manobra da defesa para atrasar o processo e se esquivar da competência do STF”, diz Raquel.
“Com efeito, Lúcio VIEIRA LIMA não foi reeleito deputado federal. Assim, a reversão da decisão de cisão em relação à mãe (provimento do agravo) retroagiria o processo à instrução (interrogatório), tomando sem efeito a intimação para alegações escritas, marco processual que preserva a competência de foro do STF quando a autoridade perde a prerrogativa”.
“Em termos práticos, o sucesso de tal manobra significaria anos até o efetivo cumprimento de pena por eventual condenação”, argumenta a procuradora-geral.
A procuradora pediu perdão judicial para Job Brandão, ex-secretário parlamentar, “pela postura colaborativa adotada durante todo o processo”. Job deu informações cruciais para desbaratar o esquema dos Vieira Lima.
WALTER FÉLIX
Leia a íntegra da manifestação da PGR aqui