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“Tenho vontade de quebrar a minha espada quando vejo
que ela não me pode servir para desafrontar o meu país.”
(Caxias ao Visconde do Rio Branco, durante a Questão Christie)
Lembro-me da excelente reputação – de homem inteligente, de democrata e patriota – do general Eduardo Villas Bôas, quando estive na Escola Superior de Guerra (ESG), representando a HORA DO POVO, a convite – para nós, muito honroso – daquela instituição militar.
Um amigo do general Villas Bôas e colaborador do HP – daqueles que, há décadas, desde o interior do Rio Grande do Sul, fazem a trajetória de nosso jornal – transmitiu-nos, sempre, a mesma impressão.
No entanto, as declarações do general Villas Bôas – na passagem do Comando do Exército ao general Edson Leal Pujol – de que Bolsonaro “traz a necessária renovação e a liberação das amarras ideológicas que sequestraram o livre pensar e nublaram o discernimento e induziram a um pensamento único”, não honram a sua reputação de homem inteligente ou democrata ou patriota.
Com certeza, compreendemos a situação do general, atingido por uma doença cruel, impiedosa, que, mesmo assim, não o fez desertar de seu dever.
Porém, Bolsonaro é um ex-oficial do Exército, que saiu das Forças Armadas após um ato de indisciplina e deslealdade, ou seja, mentira – onde tramou a colocação de bombas de baixo teor explosivo em instalações militares para pressionar o Alto Comando, e, depois, apesar das provas, mentiu diante de um Conselho de Justificação (v. Terrorismo de baixa potência).
Somente não foi expulso do Exército porque, no Superior Tribunal Militar (STM), encontrou-se uma fórmula de acordo – porém, sua situação, dentro do ambiente castrense, ficou tão difícil, que ele preferiu sair do Exército.
Esta é a razão porque o general Ernesto Geisel e outros oficiais superiores tinham desprezo por Bolsonaro: porque era um mau oficial, naquilo que os militares mais prezam – a disciplina, sem a qual é impossível ir à guerra ou manter-se vigilante na paz.
Portanto, o general Villas Bôas, ao elogiar esse indivíduo de maneira que não corresponde à realidade – pelo contrário, é uma inversão da realidade – não contribuiu para desenvolver a disciplina, tão cara ao marechal Duque de Caxias, a quem, na ponte de Itororó, com as tropas imersas em sangue, foi suficiente uma frase (“Sigam-me os que forem brasileiros”) para que fizéssemos aquela travessia.
Pior ainda, além de indisciplinado, Bolsonaro é o que pode haver de mais obscurantista, de mais antinacional e de mais indigente – ou mais amarrado ideologicamente – em nosso país.
Bolsonaro é o oposto da civilização, tão cara ao primeiro ministro da Guerra – e primeiro ministro da Instrução Pública – da República, Benjamin Constant Botelho de Magalhães.
Aliás, Bolsonaro não é mais que ideologia e a gana de impor a sua ideologia aos outros – a começar pelas escolas – e acabar com qualquer discussão, com qualquer debate, vale dizer, com qualquer democracia.
Chamou-se “pensamento único” àquela ideologia que, a partir do início da década de 90, pregava que não havia alternativa, exceto submeter-se ao fabuloso – e desesperado – mundo dos cartéis e monopólios financeiros imperialistas.
Por isso, essa infâmia antinacional foi chamada de “pensamento único”: porque seus adeptos diziam que nada existia, nem podia existir, além dela.
É algo bastante parecido com o que Bolsonaro quer fazer no país – sendo que sua versão do “pensamento único” é pior, pela grosseria e pelo método que quer usar para implantá-lo: pura e simplesmente, na paulada, se o leitor nos permite uma palavra excessivamente suave, apenas para evitar outra mais chula.
Entretanto, o general Villas Bôas parece acreditar que “pensamento único” era o do PT. Mas é um engano: o PT não tem pensamento próprio. Exceto se a aderência ao roubo do dinheiro e do patrimônio públicos, para perpetuar-se no poder, pudesse ser chamada de pensamento.
Fora isso, o que Lula & cia. acham do mundo é apenas uma versão submissa da mesma visão que têm os donos de Bolsonaro, apenas com algumas migalhas supostamente “sociais”.
Bolsonaro, necessário dizer outra vez, é ainda pior.
Não apenas pela tentativa de instalar uma base militar dos EUA em nosso país.
Não apenas pela subserviência sem limites a Trump e ao rebotalho dos EUA, esse refugo que causa repugnância até mesmo à parte principal da elite norte-americana.
Não apenas pela maluquice anticientífica, que pretende voltar ao período anterior a Copérnico, falecido em 1543, que estabeleceu que a Terra girava em torno do Sol (sem falar naquela parte dos bolsonaristas para os quais a Terra é plana…).
Não apenas por um ministro das Relações Exteriores que acredita que o grande problema da política externa é combater o “ódio a Deus” – e que esse Deus está encarnado nos EUA de Trump (cf. Ernesto Araújo, Trump e o Ocidente, Cadernos de Política Exterior, ano III, número 6, 2º semestre 2017, pp. 323-356).
Não apenas por um ministro da Educação que é contra a Educação – ou seja, contra as escolas – ou por uma ministra da Mulher que é contra que as mulheres saiam da cozinha.
Além disso e de outras coisas: se até agora só a pequena corrupção foi detectada – um Queiroz aqui, um Lorenzoni ali – é apenas porque só agora os bolsonaristas tiveram acesso aos grandes cofres do país.
Naquilo que tiveram acesso, eles já se esbaldaram…
Aliás, em uma semana já houve coisa suficiente para fazer o ex-presidente Sarney desconfiar que Bolsonaro “não ficará seis meses no cargo”.
Nós não sabemos. Nem nos atrevemos a previsões. Mas que o objetivo de Bolsonaro é implantar uma ditadura pessoal, sobre civis e militares, para submeter o país ao lixo dos EUA – e até a um protetorado dos EUA, como Israel -, acabar com qualquer discussão democrática e arraigar a treva medieval mais cerrada sobre o Brasil, nem é lícito ter dúvidas.
Afinal, não foi o que ele disse durante os últimos 30 anos?
Quando foi que ele se arrependeu ou mudou a sua posição?
Perto dele, Salazar era um filósofo do Iluminismo.
NOSTALGIA
Ainda sob a ditadura, na sucursal da HORA DO POVO de Fortaleza, recebi, ao chegar, o aviso de que alguém telefonara da 10ª Região Militar, e deixara o número do telefone.
Um pouco apreensivo – claro – liguei para o número.
Atendeu um coronel, bastante simpático, que chefiava uma das seções da 10ª RM, não lembro qual.
Há meses, nós enviávamos para a 10ª RM alguns jornais – acho que cinco – a cada edição.
O coronel me fez um pedido: aumentar o número de jornais que enviávamos, pois havia oficiais que queriam ler o que publicávamos, mas não conseguiam, pois eram poucos os exemplares.
Ri, com alívio, e concordei: passei a enviar o dobro do que antes enviávamos.
Posteriormente, por razões que nada tiveram a ver com o HP, conheci o general que comandava a 10ª RM.
Posso assegurar que não precisei concordar nem com o coronel, muito menos com o general, para conversar civilizadamente com eles.
Não era uma época muito boa – e, apesar de gostar pessoalmente desses interlocutores, jamais achei que iria sentir saudades desse período.
Pois tive um acesso de nostalgia ao ouvir o novo comandante da Marinha, Ilques Barbosa Júnior, dizer que “nós estivemos juntos [com os EUA] em três guerras mundiais. Essa é a parceria que nós estamos dando continuidade”.
Isso, evidentemente, não é exato: o Brasil declarou guerra aos “países centrais”, na Iª Guerra Mundial, devido a uma agressão a nossos navios, assim como declarou guerra ao “eixo”, na IIª Guerra Mundial, pela mesma razão.
Ambas as decisões não foram tomadas para ficar “junto” com os EUA. Foram tomadas em resposta a uma agressão contra o nosso país.
Quanto a chamar a “guerra fria” de guerra mundial e dizer que o Brasil esteve do lado dos EUA, parece uma excentricidade histórica do novo comandante.
Se bem que, quanto ao último aspecto, a luta do Brasil, como até hoje, foi para conquistar a sua independência plena. O alinhamento com os EUA era exatamente – como hoje – o oposto dessa independência plena.
Portanto, nós não “estivemos juntos” com os EUA na “guerra fria”. Nós estivemos, após 1964, submetidos aos EUA, como já reconheceram vários oficiais que participaram daqueles acontecimentos (um deles, o general de exército Antônio Carlos de Andrada Serpa, cunhou a definição mais sintética sobre esse período: “em 64, nós seguramos a vaca para os americanos mamarem”).
Entrevistado, depois, o novo comandante da Marinha disse que não disse o que disse. Literalmente:
“Eu não disse isso. Eu disse do ponto de vista histórico” – isto é, supomos, sob o ponto de vista de quem entrou primeiro na guerra.
Mas, se é assim, tanto os EUA quanto o Brasil entraram na IIª Guerra Mundial após a União Soviética…
C.L.
Aguardava. há. tempos. um comentário. seu sobre a situação atual. Lido o seu. texto,o que poderia eu. acrescentar. diante. de tal. preciosidade
Nada alem. de parabeniza lo. Valentim. falou .