A China reagiu ao anúncio de que os EUA vão formalmente apresentar até 30 de janeiro o pedido de extradição da diretora financeira da gigante dos equipamentos de telecomunicações Huawei, Meng Wangzhou, ressaltando que Washington e Ottawa “abusaram arbitrariamente” de seu acordo de extradição e convocando o governo canadense a imediatamente libertá-la e, ao regime Trump, a que cancele o mandato de prisão e desista da extradição.
“Que a vergonha caia sobre o Canadá por ser o yes-man dos EUA”, desancou em editorial o jornal China Daily, que classificou a investida contra a Huawei como uma decorrência da “ansiedade dos EUA sobre o crescente poderio tecnológico da China”. O jornal acusou Washington de “não poupar esforços para demonizar a companhia chinesa” e pressionar outros países “a não usarem” os produtos da Huawei.
“O risco dos produtos da Huawei serem usados para espionagem é um mero pretexto: os EUA nunca encontraram qualquer prova para sustentar essa alegação”, assinalou o CD. Ao deter Meng, o Canadá “age como cúmplice” na tentativa de deter o avanço chinês e até mesmo quebrar a Huawei, acrescentou.
Pretexto ainda mais cínico, depois de dez anos das revelações de Edward Snowden de que é Washington, com a NSA, que grampeia o planeta inteiro em tempo integral. As novíssimas redes 5G são a base para a ‘internet das coisas’ e a intensificação da digitalização dos sistemas produtivos sob a chamada revolução industrial 4.0.
O virtual sequestro de Meng, que é filha do fundador da Huawei e foi retirada de um vôo de conexão em Vancouver no dia 1º de dezembro do ano passado, por supostas “violações das sanções dos EUA contra o Irã”, é revelador de até que ponto Washington se dispõe a ir na tentativa de deter o avanço da gigante chinesa.
Ainda mais no momento em que operadoras no mundo inteiro estão decidindo que empresa irá fornecer os equipamentos para as novíssimas redes 5G de telefonia celular. Ao que se acresce o fato de que a Huawei, recentemente, desbancou a Apple e se tornou a segunda maior fabricante de celulares do mundo, depois da Samsung, além de ser uma das três maiores empresas de equipamentos para redes do planeta.
Desde o dia 11 de dezembro, Meng está detida em uma residência que possui em Vancouver, após ter pago fiança de US$ 7,5 milhões. O pretexto usado para o seqüestro foi ainda mais cretino porque foi Trump que, unilateralmente, abandonou acordo com Teerã sacramentado pelos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, em 2015 e assinado por seu antecessor, Obama, e cujo estrito cumprimento desde então é atestado pela mais rigorosa inspeção já realizada pela AIEAA, a agência da ONU sobre contenção nuclear.
Também o chanceler russo, Sergei Lavrov, se manifestou em dezembro contra a acintosa extraterritorialidade das leis norte-americanas. “Esse hábito de aplicar leis dos EUA a outros países revolta a grande maioria das pessoas e Estados normais”, afirmou o chefe da diplomacia russa. “É uma política arrogante e chauvinista, que ninguém no mundo aceita, e já está espalhando rejeição até entre os mais próximos aliados dos EUA”. “Isso tem que acabar”, exortou.
Apontada como a maior empresa privada da China, a Huawei tem 180 mil funcionários e presença em mais de 100 países. A empresa também tem desenvolvido com intensidade as áreas de ponta, como Inteligência Artificial, Realidade Virtual e semicondutores de última geração. No ano passado, a Huawei vendeu 153 milhões de smartphones. A receita do grupo esperada para este ano é de US$ 102 bilhões, 9,3% a mais em relação a 2017.
Como aponta o China Daily, depois do estardalhaço feito sobre a extradição de Weng e sobre o ‘risco de espionagem’, operadoras mais susceptíveis das pressões dos EUA – no caso empresas européias sob ameaça de guerra comercial que chegaria à tarifação extra de carros europeus de 25% – descartaram o uso dos produtos Huawei nas suas redes de 5G, como a francesa Orange e a alemã Deutsche Telekom.
Operadoras ligadas à rede internacional de espionagem Five Eyes (EUA, Canadá, Grã Bretanha, Austrália e Nova Zelândia), cumprindo o mantra de ‘o que o seu mestre mandar, faremos todos’, descartaram o uso de equipamento da Huawei. No clima pré-Brexit, a British Telecom disse que iria até mesmo desativar paulatinamente os equipamentos chineses já em uso em suas redes 4G.
Não é a primeira vez que Trump atropela tudo para sustentar as combalidas empresas ianques da concorrência. Em abril do ano passado, Trump proibiu por decreto o fornecimento de semicondutores de fabricação norte-americana à empresa chinesa ZTE, causando a paralisação de sua linha de montagem e quase a quebrando, o que só foi revertido com acordo com Trump, depois de pagamento de multa de US$ 1,4 bilhão e mudança na diretoria.
Não é difícil depreender que um aspecto vital da guerra comercial de Trump contra a China é tentar deter o “Made in China 2025”, o programa que visa dotar o grande país asiático do domínio da alta tecnologia, o que é visto por Washington como uma ameaça direta contra sua ordem global unilateral, que definha a olhos vistos.