O senador sabe que a mulher que ele diz ser “honesta” transferiu de mão beijada para a Shell e a Total o campo de Libra, o maior do mundo. Porém, agora que ele está atrás dos votos do PT, flexibiliza seu próprio julgamento sobre a negociata realizada em 2013. O problema é que a defesa, verdadeiramente sincera, dos interesses nacionais não comporta a adoção de dois pesos e duas medidas.
Disse o senador Roberto Requião, em discurso da tribuna senatorial, que “fui, neste plenário, o primeiro senador a apoiar e a conclamar o apoio à Operação Lava Jato. (…) Mas, sobretudo, desde o início, apontei a falta de compromisso da Operação, de seus principais operadores, com o país. Dizia que o combate à corrupção descolado da realidade dos fatos da política e da economia do país era inútil e enganoso”.
O compromisso de policiais federais, procuradores e juízes – que formam a Operação Lava Jato – com o país, consiste em investigar, denunciar, condenar e colocar na cadeia os que roubam o dinheiro e a propriedade pública. Não pode ser outro o seu compromisso com o país, pois essa é a sua função social – e é isso que se chama “combate à corrupção”.
É exatamente o que a Lava Jato tem feito – de Lula, Dirceu e Vaccari a Temer, Geddel e Aécio; do PP ao PT, PMDB e PSDB; dos corruptores da Odebrecht aos corruptores da JBS – um roubo de algumas dezenas de bilhões de reais.
A “realidade dos fatos da política e da economia” que a equipe da Lava Jato tem que levar – e tem levado – em consideração, é a existência de um amplo e disseminado esquema para assaltar a Petrobrás e outras empresas ou instâncias públicas, em que alguns monopólios ou candidatos a monopólio passavam uma parte do roubo, como propina, a políticos e partidos – que, com essas propinas, abusavam (e abusam) do poder econômico para ficar no poder.
Obviamente, não existe corrupto “progressista” ou “de esquerda”. Ninguém recebe propina para fazer a revolução social. A política reacionária, neoliberal, do PT possui relação direta com a corrupção.
Essa é a realidade dos fatos. Mas não é essa a “realidade dos fatos” que o nosso velho amigo, senador Requião, quer que a Lava Jato leve em consideração.
Então, o que significa a menção sobre a suposta “falta de compromisso da Operação, de seus principais operadores, com o país”?
O país não é composto de corruptos, de ladrões da coisa pública. Por isso, em um período de agruras, uma das poucas coisas com que o país está satisfeito é, exatamente, a Operação Lava Jato.
Então, com quem o senador acha que a Lava Jato não tem compromisso?
Certamente, não é com o país – pelo menos, não com o país real.
A questão é que qualquer combate à corrupção feito com dois pesos e duas medidas não é um combate à corrupção. Por que um ladrão do PT mereceria ser tratado de forma diferente de um ladrão do PSDB ou do PMDB? Por que teríamos de suportar o roubo da Odebrecht ou da JBS, enquanto enviamos alguns ladrões de galinha para a prisão?
O compromisso dos policiais, procuradores e juízes da Lava Jato com o país está, exatamente, em não usar dois pesos e duas medidas.
Obviamente, não acreditamos que o senador Requião seja a favor de um combate seletivo à corrupção.
Por isso, achamos estranho que o senador denuncie a corrupção de Temer por passar campos de petróleo no pré-sal, que valem bilhões de dólares, para multinacionais, e chame Dilma de “presidente honesta” – logo Dilma, que passou o campo de Libra, o maior do Planeta, no pré-sal, para a Shell e a Total.
Somente o entreguismo de Temer é corrupção, mas não o de Dilma?
Por que o senador esqueceu o que ele mesmo disse na época do leilão de Libra?
Requião também acusa os procuradores de “fugir da realidade” ao denunciar Temer por corrupção, mas não por “desbaratar o patrimônio nacional de forma tão açodada, irresponsável e suspeita”. Literalmente, disse ele: “Mas suas excelentíssimas excelências acima citadas não estão nem aí. Por que, entendem, não vem ao caso…”.
Denunciar um sujeito que está na Presidência da República e expô-lo como o que é, um ladrão, não é pouca coisa. O próprio Requião reconhece isso. No entanto, exige dos procuradores que façam aquilo que não é tarefa sua, mas de outras autoridades – por exemplo, do presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional, que vem a ser o senador Roberto Requião.
Por fim, o senador é injusto consigo mesmo, ao dizer que “fui, neste plenário, o primeiro senador a apoiar e a conclamar o apoio à Operação Lava Jato”, e, ao mesmo tempo, que “desde o início, apontei a falta de compromisso da Operação, de seus principais operadores, com o país”.
A caça por votos – e votos do PT! – faz, às vezes, com que as pessoas não percebam o seu próprio valor. Temos certeza que o senador jamais apoiou (muito menos “conclamou o apoio”) a algo que tivesse “falta de compromisso com o país”. O que aconteceu é que ele mudou sua posição sobre a Lava Jato (veja-se, por exemplo, o discurso em que lembra o Caso Banestado, que tinha Sérgio Moro como juiz, em nossa edição de 25/03/2016).
Porém, mudar de opinião, ainda que para pior, é um direito seu.
CARLOS LOPES