O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), arquivou nesta sexta-feira pedido da defesa do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e liberou o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) para prosseguir com investigações criminais que envolvem o filho do presidente Jair Bolsonaro por movimentações financeiras suspeitas. Inicialmente o Conselho de Acompanhamento Financeiro (Coaf) havia detectado um movimento de recursos de Fabrício Queiroz, assessor no gabinete de Flávio na Assembléia Legislativa do Rio (Alerj), de R$ 1,2 milhão, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
Depois, seguindo nas investigações, o órgão descobriu que, na verdade, o assessor de Flávio havia movimentado um total R$ 7 mihões, sem a menor condição financeira que explicasse esses valores. Nos dois anos anteriores a janeiro de 2016, o Coaf mostra que passaram pela conta de Queiroz R$ 5,8 milhões. O que significa uma média de R$ 2,3 milhões por ano, entre 2014 e 2017. E descobriu mais. Que funcionários, boa parte fantasmas, lotados no gabinete depositavam regularmente, em datas coincidentes com recebimento de salários, na conta de Queiroz. O funcionário depois depositava o dinheiro em espécie em outras contas. Um desses depósitos, de R$ 24 mil, foi feito por ele na conta de Michelle Bolsonaro, mulher de Jair Bolsonaro.
“Neste processo, a leitura da inicial revela que o reclamante desempenhava, à época dos fatos narrados, o cargo de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, tendo sido diplomado Senador da República no último dia 18 de dezembro. A situação jurídica não se enquadra na Constituição Federal em termos de competência do Supremo”, disse Marco Aurélio na decisão, divulgada nesta sexta-feira, primeiro dia da volta do recesso do Judiciário.
Além de não ter direito ao foro privilegiado, que ele tanto criticava, Flávio, mesmo eleito senador, continua não tendo esse privilégio. A nova regra do foro privilegiado, instituída em maio do ano passado pelo STF, determina que as investigações relacionadas a senadores e deputados federais devem correr no Supremo apenas se os fatos investigados tiverem ocorrido no mandato atual e por decorrência do cargo. Os crimes cometidos por ele ocorreram antes de sua eleição e não tinham nada a ver com o mandato.
A decisão de Marco Aurélio acaba com a manobra de Flávio Bolsonaro, que se utilizou do STF para tentar barrar as investigações sobre a movimentação financeira milionária feita em seu gabinete na Alerj.
No dia 17 de janeiro, o presidente interno do STF, Luiz Fux, tinha determinado a suspensão da apuração pelo MPRJ tendo como principal justificativa o fato de que o Ministério Público do Rio de Janeiro teria pedido informações ao Coaf de dados bancários sigilosos sobre o filho do presidente Jair Bolsonaro mesmo após ele ter sido eleito senador. Marco Aurélio já havia adiantado que pedidos como este “eu jogo na lata do lixo.”
O senador eleito acionou o STF alegando que o Ministério Público do Rio de Janeiro “utilizou-se do Coaf para criar ‘atalho’”, realizando verdadeira burla às regras de quebra de sigilo bancário e fiscal.
O Ministério Público do Rio de Janeiro rebateu as alegações de Flávio e disse que as irregularidades foram cometidas quando ele era deputado no Rio e que as informações do Coaf não significavam quebra ilegal de sigilo financeiro. As falcatruas de Flávio Bolsonaro foram descobertas no âmbito da Operação Furna da Onça, que investiga corrupção na Alerj e acabou levando dez deputados para a cadeia.
No último dia 18, logo após a suspensão do processo feita pelo ministro Fux, veio a público que em um mês 48 depósitos em dinheiro foram feitos numa conta de Flávio entre junho e julho de 2017. A suspeita é a de que funcionários dos gabinetes, gerenciados por Fabrício Queiroz, devolviam todo, ou parte, dos salários, numa operação conhecida da polícia como “rachadinha”. Foram 48 depósitos em espécie na conta do senador eleito, “concentrados no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Alerj, e sempre no mesmo valor: 2 mil reais”, num total de R$ 96 mil depositados em cinco dias.
No dia seguinte, em entrevista à TV Record, Flávio deu uma explicação de que as movimentações eram resultado de vendas de imóveis. Ele levou papéis para confirmar sua versão, mas não quis mostrá-los, afirmando que a imprensa não é o foro adequado para esse tipo de esclarecimento. No entanto, ele faltou aos convites do Ministério Público para prestar explicações. Queiroz também não compareceu aos quatro depoimentos convocados pelo MP e a família dele, toda lotada no gabinete de Flávio, também não foi prestar depoimento nas datas marcadas. Depois ficou constatado que o imóvel que teria servido de justificativa para os depósitos, havia sido vendido muito antes e o dinheiro foi recebido por Flávio Bolsonaro três meses antes das operações suspeitas no caixa da Alerj.
Perguntado em Davos, na Suíça, por uma jornalista do Washington Post, durante sua participação no Fórum Econômico Mundial, sobre as irregularidades e lambanças do filho, Jair Bolsonaro mostrou sua enorme irritação com as investigações e as denúncias e respondeu com uma patada: “não é da sua conta”, disse ele.
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