Passada uma semana do rompimento da barragem da Vale na Mina do Feijão, em Brumadinho – MG, os bombeiros e as equipes de busca que atuam na região realizaram uma homenagem às vítimas da tragédia provocada pela mineradora.
No oitavo dia após o rompimento, o número de mortes chegou a 115. Ainda há 248 pessoas desaparecidas. Dos mortos, 71 já foram identificados.
As cerimônias de homenagens começaram às 13h, horário próximo ao do rompimento da barragem (12h28min), com um breve ato ecumênico na base de operações das equipes de resgate. Após isso, dez helicópteros, que atuam na busca das vítimas, partiram para a região onde estão concentradas as buscas.
No local, o Corpo de Bombeiros hasteou as bandeiras do Brasil e do estado de Minas Gerais e os soldados que atuam na região prestaram continência em memória das vítimas do desastre.
Pétalas de flores foram jogadas dos helicópteros na área em que estão sendo realizadas as buscas. Elas foram doadas pela população da região a pedido dos bombeiros.
A TRAGÉDIA
Nesta sexta-feira, dois vídeos de câmeras de segurança da região foram divulgados pela Rede Bandeirantes e Rede Globo. As imagens dão ideia da dimensão do desastre provocado pela mineradora Vale em Brumadinho.
Na sexta-feira passada (25), a barragem 1 da Mina do Feijão se rompeu, despejando cerca de 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos de mineração na área da mina e devastando a região do Rio Paraopeba, que abastece dezenas de cidades da região oeste de Minas Gerais.
Funcionários da mineradora e moradores da região foram os primeiros atingidos pelo rompimento da barragem. A lama destruiu o refeitório e a sede administrativa da Mina, que ficava embaixo da barragem.
De acordo com porta-voz do Corpo de Bombeiros, Pedro Aihara, a lama chegou a atingir 80 km por hora após rompimento.
“A velocidade atingida variou entre 70 e 80 quilômetros por hora. Essa velocidade muda em cada ponto. Quando a lama passa por elementos como árvores ou carros, por exemplo, esses obstáculos tiram a velocidade”, diagnosticou.
Nas imagens, é possível ver a área estática até o momento que a lama começa a destruir tudo que está na frente. O relógio da câmera marcava 12h28 e 31 segundos. No vídeo é possível ver uma estrutura da Vale, veículos e alguns funcionários. Um carro branco e uma máquina tentam escapar, mas logo são cercados pelo “mar de lama”.
Na quinta-feira, a mineradora confirmou as denúncias dos atingidos de que não houve qualquer tipo de alerta à população. As sirenes simplesmente não funcionaram.
“Devido à velocidade com que ocorreu o evento, não foi possível acionar as sirenes relativas à barragem 1″, disse a empresa de mineração, em nota enviada à BBC News Brasil. Segundo a Defesa Civil de Minas Gerais, a barragem 1, a principal, tinha 11,7 milhões de metros cúbicos de rejeito de minério de ferro.
A BBC News Brasil perguntou à Vale, na quarta-feira, se as sirenes não deveriam funcionar independentemente da velocidade do rompimento da barragem. Também solicitou detalhes sobre o funcionamento do sistema de alerta – por exemplo, que condições fariam a sirene disparar e como era seu acionamento (manual ou automático).
Mas até o momento, não houve resposta da Vale.
AVANÇO DA LAMA
A mancha de lama de restos de mineração lançados no meio ambiente não para de avançar pelo Rio Paraopeba. Uma alta concentração de metais pesados foi confirmada em boletim divulgado pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), após monitoramento da qualidade dos recursos do rio, produzido com a Agência Nacional de Águas (ANA), Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e a Copasa desde o desastre.
As maiores concentrações verificadas no Paraopeba após a contaminação com a lama de rejeitos de minério foram de chumbo total e mercúrio total, de 21 vezes acima do limite permitido pelas normas ambientais. Também foi constatada a presença no rio de outros metais, como níquel, cádmio e zinco, acima dos valores considerados toleráveis.
Diante do estudo feito pelo Igam, ANA e Copasa, o governo do
estado alertou que a água do manancial “apresenta riscos à saúde humana e
animal” e não deve ser consumida em estado bruto. A Defesa Civil estadual
atestou que nenhuma cidade do estado está sujeita a cortes de abastecimento, e
que municípios que eventualmente façam captação no Paraopeba recorrerão a
fontes alternativas enquanto os parâmetros estiverem alterados.
Já o abastecimento de pessoas e comunidades que usavam diretamente a água do
rio deve ser suspenso de imediato. Para essas pessoas, o estado deve garantir o
fornecimento com a ajuda de 50 caminhões-pipa e orientações de 40 técnicos da
Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais
(Emater). O governo estadual informou ainda que, diante dos resultados e, “por
segurança à população”, “deve ser respeitada uma área de 100 metros das
margens” do Paraopeba.
PARAOPEBA
Com uma área de quase 13 mil quilômetros quadrados, o Paraopeba passa por 48 cidades, sendo 35 na sede da bacia, atingindo as áreas Central e Oeste de Minas. É responsável por abastecer 2,3 milhões de pessoas. Diante das recomendações, vários municípios já se mobilizam em buscas de planos alternativos para que o abastecimento de água não seja interrompido. As iniciativas vão de criação de grandes reservatórios provisórios à utilização dos poços artesianos e outros mananciais para evitar eventuais problemas de falta de água no futuro.
Uma das cidades mais afetadas, Pará de Minas, no Centro-Oeste do estado, desativou o sistema de abastecimento localizado no distrito Córrego de Barro, que provinha do Paraopeba, e só vai usá-lo novamente quando o governo de Minas certificar que a bacia não está contaminada. Nesse caso, a alternativa têm sido os ribeirões Paiva e Paciência e diversos poços artesianos. A concessionária Águas de Pará de Minas afirmou que essas fontes de fornecimento serão suficientes para atender a população de cerca de 100 mil pessoas.
Em nota, a Copasa assegurou que o fornecimento para a Região Metropolitana de Belo Horizonte não será modificado. A empresa conta para isso com as represas do Rio Manso, Serra Azul, Vargem das Flores e com a água do Rio das Velhas, feita em Nova Lima, sem barragem, em sistema conhecido como captação a fio d’água. Na manhã de ontem, a Fundação SOS Mata Atlântica iniciou uma expedição pelo Paraopeba para tentar dimensionar os impactos ambientais do mar de lama, além de verificar seu potencial de chegar a outras regiões. Nos próximos dias, a equipe de água da organização, em parceria com o laboratório de Poluição Hídrica da Universidade de São Caetano do Sul, vai analisar a qualidade de água por 356 quilômetros, do local onde a lama entrou pelo leito até a usina de Três Marias, passando pela hidrelétrica de Retiro Baixo, em Pompéu.
ANDRÉ SANTANA