(HP 10/12/2014)
O crescimento econômico depende – sobretudo em país do tamanho e com os recursos do Brasil – da política econômica.
Por isso, o anúncio de que o governo reviu a “previsão” de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015 para 0,8% – inferior ao crescimento da população – nada tem a ver com “realismo”.
Quer dizer apenas que o governo acabou com qualquer limite à política econômica recessiva, desbragadamente favorável ao parasitismo financeiro, contra a produção, contra a produtividade – e servil aos monopólios privados externos a ponto de destruir o que resta da indústria nacional.
Mais do que 0,8% em 2015, a revisão do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) – enviada pelo governo ao Congresso na quinta-feira da semana passada – também indica crescimentos medíocres, insuficientes para as necessidades do povo e do país em 2016 (2%) e 2017 (2,3%), o que significa um crescimento médio anual de 1,7% (e podemos apostar que, na cabeça de farinha dessa gente, a 2018 só não foi atribuído “crescimento” semelhante porque há uma eleição nesse ano).
O crescimento econômico do país no primeiro governo Dilma será o mais baixo de um período presidencial (na melhor das hipóteses, média de 1,6% ao ano). O que está na revisão do PLDO mostra que o objetivo é repetir essa performance no segundo governo (outra vez, na melhor das hipóteses).
Dilma, realmente, conseguiu em Joaquim Levy o ministro da Fazenda ideal, uma espécie, de imagem no presente da própria Dilma: burocrata, sem vestígio de raciocínio, ignorante crasso, papagaio dos manuais neoliberais dos americanos – e servil até os cueiros à quadrilha financeira.
Não que Mantega fosse muito diferente, exceto que era incompetente até como vigarista – e não se pense que isso é um ponto a seu favor. O importante é que, do fato de que os números do sr. Mantega eram uma vigarice, não se conclui que as metas e números do sr. Joaquim Levy sejam melhores.
Até porque esses números não existem: na revisão do projeto de LDO, o governo desiste de qualquer meta ou previsão própria, tornando oficiais as “previsões” que constam do Boletim Focus – isto é, a mediana do que desejam os porta-vozes dos bancos privados, pois é isso o Boletim Focus.
O Ministério do Planejamento, no press-release que anunciou a revisão, é até mais explícito: “As estimativas para crescimento do PIB e inflação, e demais parâmetros para os próximos anos, utilizados para a atualização de proposta de meta baseiam-se nas projeções de mercado, apuradas pelo relatório Focus do Banco Central” (grifo nosso).
Assim, passamos a ser governados diretamente pelos bancos. São eles, agora oficialmente, que estabelecem as metas e as “previsões” (isto é, o que eles querem da economia).
É a “previsão” do Boletim Focus (28/11/2014) que a revisão do PLDO adota – o que foi imediatamente aceito pelo relator do projeto na Comissão Mista de Orçamento, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB). Apesar de representar um Estado nordestino de brilhante tradição combativa, o senador não notou, ou não se importou, com o que isso significa para os seus eleitores: o acirramento da recessão, com desemprego, falências e fome.
[A propósito, o relatório do senador Vital do Rêgo, em alguns trechos, é completamente alucinado. Por exemplo: “Em que pese o esforço do governo no sentido de gerar estímulos aos investimentos e à produção doméstica, mediante a adoção de uma política fiscal fortemente expansionista, o balanço final de seus resultados mostraram-se limitados“. A que país – ou a que governo – o senador estará se referindo? Na verdade, a nenhum. Trata-se apenas de uma fraudulenta justificativa (?) do arrocho, como se este fosse necessário devido a uma suposta prodigalidade de Mantega. Desde janeiro de 2011, estamos debaixo de uma política de derrubada do crescimento, de corte nos gastos e investimentos públicos, de ataque à produção nacional, tão contracionista que todo o dinheiro em circulação mais os depósitos à vista (os meios de pagamento do chamado “agregado M1”) monta apenas a 6% do PIB (cf. BC, Relatório de Política Monetária de outubro, Quadro XXXVII). As desonerações, que, como o senador ressalta, “representaram, só neste ano, um volume de renúncia de receitas tributárias da ordem de R$ 75,7 bilhões“, somente confirmam que essa era a política, pois serviram para aumentar a margem de lucro das filiais de monopólios multinacionais e sua remessa de lucros para suas matrizes, não o seu investimento no país.]
Aqui, é inevitável uma observação: ao “projetar” míseros 0,8% de crescimento em 2015, antes do início do ano, é evidente que Levy, Dilma et caterva pretendem provocar algo abaixo disso, uma taxa negativa, provavelmente. Qual foi o ministro ou presidente neoliberal que “projetou” uma taxa de crescimento, ainda mais antes que o ano começasse, que não fosse superior àquela a que se chegou? Nenhum. Todos “projetam” uma taxa acima da que pretendem chegar – quando mais não seja, para evitar o contato com pedras e outros materiais desagradáveis ao andar pela rua, ainda que só andem na rua em resorts e outros locais “diferenciados”.
Na mesma “revisão” do PLDO, o governo projeta uma taxa básica de juros média de 12,17% para 2015 – a mesma “prevista” pelos bancos (v. Boletim Focus, 28/11/2014).
Portanto, uma taxa superior à atual, que já é a mais extorsiva de todo o mundo. Descontada a inflação projetada pelo Boletim Focus (6,49%), isso significaria a monstruosa taxa real de 5,33%.
Hoje, a média internacional dos juros básicos é -1,1% (menos 1,1%), ou seja, 123,5% mais baixa que a atual taxa real do Banco Central da senhora Rousseff. O governo quer aumentar essa taxa real – ou seja, aumentar o ganho dos bancos e demais rentistas.
Obviamente, o juro básico é o piso dos juros. A taxa média para empréstimos a “pessoas físicas” estava, em outubro, em 103,05% ao ano (uma descomunal taxa real de 90,55%, se descontarmos o IPCA projetado para este ano). Diz a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (ANEFAC): “tendo em vista o Banco Central ter elevado a taxa básica de juros (Selic) em sua última reunião bem como a tendência é de termos novas elevações da mesma é provável que as taxas de juros das operações de crédito voltem a ser elevadas nos próximos meses“.
Sobre os juros básicos “previstos” na revisão do PLDO, pode-se dizer o mesmo que para a taxa de crescimento, só que ao inverso: nesse caso, eles sempre projetam taxas abaixo do que é a sua intenção.
Esse é o significado do sr. Joaquim Levy no Ministério da Fazenda: ao consumar o estelionato eleitoral mais despudorado da história da República, Dilma, na revisão do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias, esclarece – para os que não tinham ainda notado – a que política econômica aderiu.
Quanto ao vácuo moral, continua o mesmo: é mentira completa – e desavergonhada – que a revisão do projeto se deva à “mudança do cenário macroeconômico ocorrida após o envio do PLDO, em abril“.
Depois de abril, houve uma campanha eleitoral em que Dilma acusou seus adversários de tudo o que agora está fazendo antes mesmo da posse no segundo mandato. Como não houve qualquer “mudança do cenário macroeconômico”, essa frase é uma confissão de que o projeto enviado em abril era outra fraude eleitoral.
CARLOS LOPES