Na Nicarágua, o governo de Daniel Ortega e um setor da oposição realizaram, na quinta-feira, 28 de fevereiro, o segundo dia de diálogo no qual se limitaram a discutir as regras que direcionarão a negociação para sair da grave crise que afeta o país há meses.
Na quarta-feira Ortega liberou 100 dos cerca de 700 presos políticos. Não houve, porém, comunicado oficial ou documento legal que respalde a soltura. As pessoas foram simplesmente levadas para suas casas e não sabem ainda qual é sua situação jurídica atual.
O advogado da Comissão Permanente de Direitos Humanos (CPDH), Julio Montenegro, pediu que as ações contra eles sejam anuladas. “Esse aceno não desmobilizará a oposição”, frisou.
As negociações giraram em torno da discussão em detalhe dos pontos pendentes de tratar, informou a opositora Aliança Cívica pela Justiça e a Democracia (ACJD), sem aprofundar o debatido.
Um ponto de discrepância foi a exigência da oposição de contar com a presença de observadores internacionais nas discussões com o governo, entre eles uma representação da ONU, para garantir o cumprimento do que ficar acordado, mas a informação é de que o governo rechaça essa possibilidade.
Entre as questões que a oposição presente ao diálogo, assim como a que tomou as ruas em rechaço à ditadura encabeçada por Ortega, considera preliminar é a liberação de todo os presos políticos, dos quais 300 estão detidos sem qualquer acusação formal.
Nos encontros participaram seis delegados oficiais, encabeçados pelo chanceler Denis Moncada, e seis representantes da ACPD, que é presidida pelo ex-diplomata Carlos Tünnermann. Como “testemunhas” do diálogo assistem Waldemar Sommertag, indicado pelo Vaticano, e ainda o cardeal Leopoldo Brenes.
Até esta sexta-feira, o diálogo se realizava a portas fechadas na sede do Instituto Centro-americano de Administração de Empresas (INCAE), em Manágua, sem acesso aos meios de imprensa e sem informação sobre o conteúdo das negociações.
As reuniões ocorrem oito meses depois da suspensão das negociações após os amplos protestos antigovernamentais que Ortega atribuiu a uma tentativa de golpe de Estado.
As manifestações contra Ortega e sua esposa e vice-presidente, Rosario Murillo, começaram em 18 de abril do ano passado, repudiando a tentativa de impor reformas que cortavam o orçamento das universidades, salários e demitiam professores, além de mexerem com a Previdência, aumentando a idade mínima para as aposentadorias, encarecendo as contribuições tanto para os trabalhadores quanto para os patrões. Foi o estopim.
Personalidades como Ernesto Cardenal, Dora María Téllez, Víctor Hugo Tinoco, Mónica Baltodano, Jaime Wheelock, Alejandro Bendaña, Sergio Ramírez ou Henry Ruiz, todos lideranças históricas da Frente Sandinista no momento da revolução que depôs o ditador Somoza, condenam a política vigente na Nicarágua nos dias de hoje. “O atual governo da Nicarágua usa algumas vezes um discurso de esquerda, uma estridência nas palavras que nada tem a ver com sua prática real, muito distante de um projeto progressista. Pelo contrário, na Nicarágua se fortalecem e enriquecem os banqueiros, a oligarquia tradicional e grupos econômicos formados de elementos que participaram da revolução antisomozista, mas que renegaram seus princípios e se tornaram especuladores. Têm se aproveitado disso, os mais reacionários da hierarquia católica”, assinalou a outrora comandante guerrilheira Mónica Baltodano.