Na última quarta-feira (3), o ministro da Educação Ricardo Vélez Rodríguez negou, em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, que houve golpe militar em 1964 e afirmou que ocorrerão mudanças no conteúdo sobre o tema nos livros didáticos utilizados nas escolas do Brasil.
Para o ministro, o golpe militar foi “foi uma decisão soberana da sociedade brasileira”.
Segundo o jornal, Vélez diz acreditar que a mudança de regime, há 55 anos, não foi um golpe, e sim uma “mudança de tipo institucional”. Além disso, teria dito que o período que seguiu a posse do general Castello Branco não seria ditadura, e sim um “regime democrático de força”.
De acordo com o colombiano, indicado pelo astrólogo Olavo de Carvalho para chefiar o Ministério da Educação, os bolsonaristas pretendem reescrever os livros didáticos que são fornecidos nas escolas para apresentar “uma versão da história mais ampla”.
“Haverá mudanças progressivas na medida em que seja resgatada uma versão da história mais ampla. O papel do MEC é garantir e regular a distribuição do livro didático e preparar o livro didático de forma tal que as crianças possam ter a ideia verídica, real, do que foi a sua história”, disse Vélez, em entrevista ao jornal Valor.
Esse discurso não é diferente do adotado por Jair Bolsonaro, que além de defender as atrocidades cometidas pelo regime militar, tem uma trajetória política marcada por exaltar torturadores, como Carlos Alberto Brilhante Ustra.
Na última semana, Bolsonaro orientou que os quartéis brasileiros celebrassem o aniversário de 55 anos do golpe no país que, em 31 de março de 1964, destituiu do poder o presidente João Goulart e deu inicio a ditadura militar no país, que durou 21 anos.
A posição do ministro foi criticada.
O presidente da Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos (Abrale), Cândido Grangeiro, ressaltou que todos e qualquer livro didático deve, por regra, ser baseado em ampla consulta acadêmica, e não por opiniões.
“O que sempre deve nos guiar é o rigor acadêmico na produção dos materiais didáticos, para que os alunos tenham acesso a conteúdo pautado em pesquisa”, disse Grangeiro. “A Abrali é contra qualquer tipo de revisionismo que seja baseado em opiniões.”
Para o pesquisador e especialista em educação do Instituto Expert Brasil, Afonso Galvão, a revisão dos livros didáticos seria um retrocesso.
“A história não pode ser inventada. A ditadura militar aconteceu, todos os elementos constituidores de um golpe militar e de uma ditadura militar estão ali pressentes e é isso que tem que ser ensinado não só às crianças, como a todas as pessoas”, disse o educador Afonso Galvão.
Para o especialista, alguns livros trazem divergências em alguns pontos, mas nenhum nega e não pode negar que houve um golpe e uma ditadura.
“Temos de aprender fundamentalmente o que é uma ditadura militar, até para que consigamos ter em nós todos os elementos do estado democrático de direito ao qual devemos ser fiéis e defender sempre”, conclui Afonso.
Além de especialistas em história, a afirmação do ministro também não agradou os militares.
Segundo informações do jornal Folha de S. Paulo, a fala do ministro irritou a cúpula militar. Eles enxergaram a manifestação de Vélez como “um desgaste desnecessário” e “apenas uma tentativa dele para manter-se no cargo”. A Folha ainda afirma que os militares “farão chegar ao presidente Jair Bolsonaro que a paciência com o ministro acabou”.
A crise da gestão Vélez no MEC se arrasta desde que o ministro assumiu. Na disputa com o setor aliado do guru de Bolsonaro, Olavo de Carvalho, a pasta já contabiliza 16 exonerações em cargos de alto escalão.
Nesta quinta-feira (7), a Casa Civil exonerou Bruno Garschagen, um de seus principais assessores. Ele era responsável pela comunicação e contato com a imprensa. Garschagen é jornalista e muito ligado a Olavo de Carvalho. É autor de um livro intitulado Pare de Acreditar no Governo. Os agradecimentos iniciais incluem o guru dos bolsonaristas “pela amizade” e o atual ministro “pelas preciosas observações e sugestões”.