Continuamos com a ação do governo João Goulart, iniciada na edição passada (v. 100 anos de Jango: o homem no governo (1)).
A questão agropecuária, pelas circunstâncias da época – circunstâncias, aliás, após o golpe de 1964, não superadas ainda – era de grande complexidade. Assim, além dos gráficos e tabelas, transcrevemos alguns trechos do texto de “Ação Governamental de João Goulart”.
AGROPECUÁRIA
“Não obstante a atual estrutura agrária do País o Governo João Goulart tem desenvolvido esforços para alcançar maior rendimento neste setor de atividade econômica, principalmente no que se refere às culturas básicas para alimentação.
“Deve-se frisar que apenas 3 milhões de brasileiros são proprietários de terras cultiváveis, e estas, em grande parte, vêm sendo utilizadas como veículo de especulação imobiliária, desviadas do seu principal objetivo, ao passo que a menor porção lavrada apresenta rendimento médio sofrível.
“O ponto básico da ação governamental, até que se atualize a legislação vigente sobre o campo com a implantação da Reforma Agrária, foi a reestruturação do Ministério da Agricultura, a fim de emprestar a esse órgão da administração pública maior dinamismo em sua atuação, ao lado da execução de nova politica assistencial pela Carteira de Crédito Agrícola e Indústria do Banco do Brasil, com o seu desdobramento em diretorias para as regiões Norte, Centro e Sul, e o crédito móvel, levado em unidades volantes ao pequeno lavrador.
“Pelo Decreto nº 52.810, de 8 de novembro de 1963, o Presidente da República aprovou o regimento da Comissão de Planejamento da Politica Agrária (CPPA), já instalada, com a finalidade específica de traçar as diretrizes das atividades agrárias no País, ajustando-as à política do Governo.
“A CPPA, através das Coordenações Regionais (tantas quantas as regiões fisiográficas do País) e das Delegacias Federais de Agricultura, levará a todas as Unidades da Federação essas diretrizes, que visam, sobretudo, ao melhor aproveitamento de nossos recursos naturais e humanos”.
CULTIVO
“As culturas básicas de alimentação deverão ter suas áreas de plantio elevadas, até 1965, em mais 4,5 milhões de hectares, relativamente à extensão cultivada em 1960 com esses produtos, que abrangem, entre outros, arroz, batata, cana-de-açúcar, feijão, mandioca, milho, trigo, banana e laranja.
“Por outro lado, o incentivo à prática do cooperativismo e outras formas de associação das atividades camponesas, com o auxílio do Poder Federal, tenderá a eliminar, gradativamente, o intermediário que opera especulativamente, influindo na majoração acelerada dos preços em prejuízo do consumidor”.
CAFÉ
“Os fatores que vinham determinando menor rendimento da lavoura cafeeira foram equacionados pelo atual Governo, criando-se o Grupo Executivo de Racionalização da Cafeicultura (GERCA) , ao mesmo tempo em que se revia a posição do nosso produto no mercado internacional, encaminhando-se gestões junto aos organismos mundiais no sentido de restringir as barreiras impostas ao comércio e consumo do produto.
“A partir de junho de 1962 foram erradicados pelo GERCA cerca de 365 milhões de cafeeiros improdutivos, no valor de 5 bilhões de cruzeiros.
“Os 23 milhões de sacas da safra referente ao o ano agrícola 1963/64, deverão subir, segundo as previsões, a 31 milhões de sacas para o de 1964/65 e 33 milhões para o 1965/660”.
CACAU
“O cacau, cuja lavoura foi encontrada em princípio de esfacelamento pelo Governo do Presidente João Goulart, por efeito da política de preços desfechada pelos produtores africanos associados a consumidores tradicionais do produto, e também das pragas que atacaram as plantações, recebeu o necessário amparo governamental, consubstanciado em medidas prontamente adotadas.
“A Comissão Executiva do Plano de Recuperação Econômico-Rural da Lavoura Cacaueira (CEPLAC) foi autorizada a promover a consolidação, a longo prazo, das dívidas dos produtores de cacau, atendidas pela destinação de verba de 4 bilhões de cruzeiros.
“As aplicações do Fundo do Cacau passaram a ser reguladas dentro do seguinte critério:
“50% à CEPLAC e o restante para defesa das cotações do produto, através da Carteira de Comércio Exterior.
“Em dezembro de 1962 o Presidente da República assinou os Decretos n.os 1.960 e 1.961, que autorizam a CEPLAC a utilizar recursos a ela destinados na construção de um Centro de Pesquisas do cacau em Itabuna, BA, e a conceder empréstimos especiais para combate à doença ‘podridão parda’”.
PRODUÇÃO AGRÍCOLA
“A tabela especifica a produção, no triênio 1960/62, de algumas culturas agrícolas.
“No caso do arroz, por exemplo, verifica-se que, de uma produção de 4.795 toneladas no primeiro ano do triênio, em 1961 já se elevava a 5.382 toneladas, para alcançar, em 1962, o nível das 5.557 mil toneladas.
“Outra cultura que vem sendo grandemente incrementada é a do milho. De 8.672 mil toneladas em 1960, evolveu para 9.036 mil t no ano seguinte, atingindo 9.580 mil t em 1962.
“A cana-de-açúcar apareceu na pauta, em 1962, com uma produção de 62.535 mil toneladas, quando no ano anterior alcançara o nível das 59.377 mil t, contra 56.927 mil t em 1960.
“Também aumentou consideravelmente a cultura do tomate, cuja produção somou 487 mil toneladas em 1962. Os dados de 1960 e 1961 assinalaram os totais de 397 e 390 mil toneladas, respectivamente”.
CENSO AGRÍCOLA
“Em 1º de setembro de 1960, data do último Recenseamento Geral, havia, no País, 3.349.484 unidades de exploração agropecuária, nas quais trabalhavam 15.521.701 pessoas.
“Estes dados evidenciam que se registrou, em relação ao Censo anterior (1950), apreciável incremento no número de estabelecimentos recenseados.
“Com efeito, no decênio anterior, o número de unidades agrárias alcançava 2.064.642, ocupando área total de 232.211.106 hectares e 19.095.057 de lavouras, enquanto em 1960 a área total já atingia 265.450.800 hectares e a de lavouras – 29.759.785.
“A expansão experimentada pela área total ocupada pelos estabelecimentos foi de 33.239.694 hectares; já a área de cultivo aumentou de 56%”.
EXPLORAÇÃO DA TERRA
“Verificamos que existem 2.994.093 estabelecimentos agrícolas com área inferior a 100 ha.
“No entanto, estas pequenas unidades de produção, que representam 89,39% do total dos estabelecimentos agrícolas do País, exploram uma área ínfima de 20,20% da terra e cultivam 58,08% da área dedicada à lavoura.
“Por outro lado, os latifundiários (proprietários de mais de 1000 ha) possuem 47,29% das terras e exploram somente 11,49% da área da lavoura.
“Enquanto milhões de brasileiros, em péssimas condições de trabalho, geram riquezas, uma pequena minoria detém em suas mãos, as mais das vezes improdutivamente, a metade das terras”.
SUPRA
“Atualmente, o Governo do Presidente João Goulart se acha empenhado em modificar a estrutura agrária do País, tendo, para esse fim, criado um órgão especializado – a Superintendência de Política Agrária (SUPRA).
“A nova política governamental, nesse setor básico de atividade, objetiva eliminar as desigualdades extremas na distribuição das explorações agropecuárias, facilitando a adoção de novos processos técnicos”.
ÍNDICES DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA
“O atual governo defrontou-se primariamente com o condicionamento básico do setor e que urge ultrapassar: a deficiente estrutura agrária do País.
“Mesmo assim, tomando-se para ano-base o de 1953, verifica-se que os índices de agricultura, que atingiam 155,9 em 1961, elevaram-se a 159,3 em 1962.
“Tais índices foram conseguidos, a despeito de irregularidades climáticas imprevisíveis e bastante intensas.
“Os créditos agrícolas foram expandidos, não só em número como em valor.
“O Banco do Brasil, através de sua Carteira de Crédito Agrícola e Industrial dedicou às atividades agropastoris, nos primeiros nove meses de 1962, um montante global da ordem de 85,2 bilhões de cruzeiros, distribuídos por 227 mil empréstimos.
“Esses dados representam substanciais acréscimos relativos ao ano anterior, quando o mesmo estabelecimento acorreu às necessidades rurais com um valor global de 41,1 bilhões de cruzeiros, referentes ao atendimento de 141 mil pedidos.
“Observa-se desse modo, entre um ano e nove meses do outro, um incremento da ordem de 44,1 bilhões de cruzeiros – mais de 100%, portanto – e 186 mil empréstimos.
“Esses créditos concedidos pelo setor governamental discriminam-se em 63,2 bilhões à agricultura e 21,0 bilhões à pecuária.
“Dentro do plano de fomento da expansão agrícola, do total de 63,2 bilhões, 42,3 bilhões destinaram-se ao custeio de entressafra, 1,9 bilhão à fundação de lavouras, 4,8 bilhões ao melhoramento das explorações agrícolas, 11,7 bilhões para a aquisição de máquinas, veículos e utensílios agrícolas, restando para aplicações diversas o total de 2,5 bilhões.
“À exceção dessa última rubrica, todas as demais apresentaram incremento que oscilou em torno dos 100% relativamente aos valores do ano anterior.
“O poder governamental teve participação nitidamente majoritária na concessão de empréstimos à lavoura e à pecuária pela rede bancária brasileira.
“Em setembro de 1962 haviam sido concedidos empréstimos a esse setor da economia num total de 27,6 bilhões de cruzeiros, dos quais 20,9 bilhões correram por conta do Banco do Brasil.
“O total geral representa um acréscimo de 78% sobre idêntico valor para o ano de 1961, que permaneceu na marca dos 15,5 bilhões de cruzeiros, Assinala-se, em complementação, que este incremento de 78% está muito acima do correspondente aumento dos preços verificados em idêntico período.
“Paralelamente, o Governo João Goulart levou avante, com êxito, uma política realista e mais criteriosa de preços mínimos.
“Para maior eficácia de sua ação, teve o poder público a preocupação de fixar esses preços, no momento em que os lavradores preparam a semeadura.
“Os preços foram fixados também acima dos indicados pelos índices gerais do País com o objetivo – alcançado – de servir de estímulo às colheitas.
“Foram incentivadas medidas de aumento do índice de mecanização da lavoura e aplicação de técnicas mais avançadas de tratamento do solo.
“Ambos os objetivos foram melhor atendidos graças aos estímulos dados pelo governo aos esforços de industrialização interna. De um lado, a mecanização da lavoura foi influenciada diretamente pelo desenvolvimento, no País, da indústria de tratores, máquinas e implementas agrícolas, e de outro, a melhoria do solo agrícola, pela maior disponibilidade de fertilizantes e inseticidas, graças à expansão do respectivo setor fabril”.
REBANHO BOVINO
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