As investigações da Polícia Federal (PF) sobre o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho (MG), cumpriu, nesta terça-feira (16), cinco mandados de busca e apreensão.
Os mandados foram expedidos pela 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte. Dois em Belo Horizonte e os outros três em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ).
“As medidas visam a apreender documentos, mídias e outros elementos de convicção que guardem relação aos fatos apurados”, informou a Polícia Federal. A casa do presidente afastado da Vale, Fabio Schvartsman, foi um dos alvos das buscas, em São Paulo. Foi a primeira vez que a PF inspecionou o endereço de Schvartsman.
Além de Schvartsman, as casas do diretor da Vale Peter Poppinga e outros executivos da mineradora também são alvo dos mandados. Segundo o colunista do jornal carioca, a Vale internamente dava essa ação como favas contadas, mas não na manhã desta terça-feira. A mineradora aguardava uma operação dessa magnitude logo após o rompimento das barragens.
Em 25 de janeiro, a barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, rompeu, matando 229 pessoas, deixando até o momento 48 desaparecidos e contaminou o Rio Paraopeba, um dos afluentes do Rio São Francisco. Os rejeitos destruíram a área administrativa da mineradora, incluindo o refeitório, onde muitos trabalhadores almoçavam na hora que a enxurrada de lama devastou o local.
A PF não informou os alvos das buscas e apreensões.
Em comunicado, a PF afirma que “as medidas visam a apreender documentos, mídias e outros elementos de convicção que guardem relação aos fatos apurados”.
Desde o início das investigações 13 suspeitos chegaram a ser presos, duas vezes, pela força-tarefa que apura os motivos da queda da barragem, formada pela Polícia Civil, Ministério Público e Polícia Federal. Todos foram soltos por habeas corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Do grupo preso, 11 eram funcionários da Vale diretamente envolvidos com a segurança da barragem em Brumadinho e dois eram consultores da empresa alemã Tüv Süd, que atestaram a segurança da estrutura.
Secretário diz em CPI que foi enganado
O secretário estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais, Germano Luiz Gomes Vieira, afirmou nesta segunda-feira (15), na CPI do desastre da Vale em Brumadinho, que se sentiu enganado pela Vale ao se referir aos laudos da mineradora que garantiam a estabilidade da barragem. Germano, o único secretário de Fernando Pimentel (PT), que continuou no governo de Romeu Zema (Novo), é acusado de favorecimento à Vale na liberação das licenças das barragens.
Uma norma assinada em dezembro de 2017 por Germano Vieira reduziu etapas do licenciamento ambiental e a mineradora se beneficiou da medida.
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O secretário disse que o licenciamento para descomissionamento da barragem da Mina Córrego do Feijão, não havia sido concluído quando houve o rompimento. E que por isso naquele momento a mineradora só tinha autorização para monitorar a barragem.
Segundo a secretaria, o licenciamento havia sido aprovado, mas ainda faltavam documentos para concluir o processo.
“É isso que as investigações vão nos dizer. Não tinha-se a licença ambiental, portanto todas as condicionantes não tinham sido outorgadas. E não poderiam fazer se não tivessem feito antes a revisão periódica. A lei é muito clara. Se tiverem feito, a ANM tinha que interditar a barragem”, afirmou Germano.
Em depoimento à CPI, o chefe de Segurança de Barragens de Mineração da Agência Nacional de Mineração (ANM) em Minas, Wagner Araújo Nascimento, disse que o número de fiscais do setor no Estado deverá aumentar de três para oito até meados de maio. Minas abriga o maior número de barragens consideradas como de alta capacidade de dano no Brasil, cerca de 130.
Parentes de vítimas estavam presente e levaram faixas com nomes de 48 pessoas que ainda não foram encontradas. “Nós viemos acompanhar a CPI e pedir Justiça. Agilidade na identificação dos corpos, porque além de eles terem assassinado quase 300 pessoas estão matando os familiares também. Nós estamos morrendo um pouco a cada dia”, afirmou a professora Andresa Rodrigues.
VIOLAÇÃO DE DIREITOS
A Vale diz que tem colaborado com a justiça respeitado os direitos dos atingidos. Entretanto, o comitê civil “Gabinete de Crise”, criado por ambientalistas e ativistas para monitorar as ações da empresa nas regiões, aponta descaso da mineradora privada com as vítimas. A forma como a mineradora Vale lida com as populações atingidas pelo rompimento de suas barragens constitui uma forma de “terrorismo e viola direitos”.
“Após o rompimento de Córrego do Feijão, ninguém mais tem certeza. As sirenes tocam quando o alerta está em nível 2 (barragem instável, com perigo de rompimento), quando está em nível 3 (risco iminente de rompimento), as pessoas são removidas, deixam suas casas, escolas e trabalhos”, afirmou o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH-Rio das Velhas), Marcus Vinícius Polignano, também membro do Gabinete.
“A insegurança é muito grande. A incerteza gera esse terrorismo. Pessoas ficam sendo conduzidas a hotéis, como se isso resolvesse a sua vida. Quando essas pessoas terão informações sobre a sua situação? Não tem cronograma de nada. É preciso que a Vale mostre o que vai ser feito”, completou Polignano.
A advogada Letícia Aleixo, da Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) denuncia que a Vale atua para o enfraquecimento das comunidades atingidas ou vulneráveis. “Se conversar com qualquer atingido, os relatos são semelhantes. A Samarco se movimentou para desarticular as comissões de atingidos e desvincular os habitantes dos centros urbanos como não atingidos. Não é preciso que a barragem se rompa para desarticular”, disse.
Letícia Aleixo ainda aponta uma série de violações sofridas pelas pessoas atingidas. “Percebemos o aumento de drogadicção, alcoolismo, encarceramento e violência doméstica. E quem paga essa conta não é a Vale, é o estado. Tribunais entendem grandes violações à reparação integral. É obrigatório ao causador e o poder público deve zelar pelo cidadão. Não é só indenizar”, afirmou.
Segundo a advogada, as ações da Vale deveriam contemplar pontos considerados essenciais para retomar a vida e isso não acontece, desde Mariana, em 2015. “O primeiro é a restituição de direitos (apropriação da liberdade). Em seguida, a compensação. Por exemplo, uma pessoa que tinha um terreno plano onde plantava, não pode ser levada para um lugar acidentado, onde não conseguirá exercer a atividade que o sustentava. A reabilitação, que não pode ser contabilizada como indenização, a satisfação e adoção de medidas de não repetição”.