“Eu prefiro morrer de fome a mudar minha opinião a esse respeito. E quando digo isso, quero dizer literalmente”, afirmou Chelsea Manning ao juiz, em audiência na Virgínia. Manning denunciou crimes de guerra dos EUA no Iraque
Depois de 62 dias de prisão por ‘desacato’ por se negar a mentir para incriminar o jornalista Julian Assange e curto intervalo de uma semana em liberdade, a denunciante dos crimes de guerra dos EUA no Iraque e Afeganistão, Chelsea Manning, voltou a ser presa por ordem de outro juiz, sob a mesma imposição, a que ela segue se negando.
“Eu prefiro morrer de fome a mudar minha opinião a esse respeito. E quando digo isso, quero dizer literalmente”, afirmou Manning, durante audiência em outro tribunal de fancaria na Virgínia, montado às pressas pelo regime Trump para perseguir o fundador do WikiLeaks.
Na tentativa de dobrar Manning, o juiz determinou multa de US$ 500 por dia se continuar se recusando a mentir contra Assange – o que chama cinicamente de ‘cooperação’ – após 30 dias de cárcere. Após dois meses de cárcere, a multa subirá para US$ 1000 por dia.
Manning se recusa a trair seus princípios, pelos quais foi mantida no cárcere por sete anos e torturada durante quase um ano, e já relatou a uma corte marcial, extensamente, tudo o que ocorreu e porque decidiu que tinha que levar ao conhecimento do povo norte-americano e dos povos do mundo o que o Pentágono, a CIA e a Casa Branca vinham escondendo.
Como o vídeo da chacina, por um helicóptero de guerra dos EUA de uma dezena de civis desarmados, inclusive dois jornalistas da Reuters, em 2007, sob orientação do comando central, o famoso ‘Assassinato Colateral’.
Na prática, se repete o monstrengo jurídico de que Manning ficará presa até que fale o que a santa inquisição de Trump quer.
Ao júri anterior, Manning declarou que a ideia “de que eu tenho a chave da minha própria cela é absurda, conforme me deparo com a perspectiva de sofrer de um ou outro modo devido a esta intimação desnecessária e punitiva: posso ir para a prisão ou trair meus princípios”.
Antes da audiência, Manning afirmou que o objetivo claro do governo é “relitigiar a corte marcial” e reiterou que seguirá se recusando a depor, “para sempre, indefinidamente” e jamais se submeterá a esse júri. A corte marcial a condenou a 35 anos, pena comutada no final do governo Obama.
A também denunciante e ex-agente do FBI Colleen Rowley disse à RT jamais ter ouvido falar em “prender uma testemunha por tanto tempo”. Ela chamou a chantagem de “draconiana”, já que se o prazo do novo júri durar 18 meses, as multas podem ultrapassar “meio milhão de dólares”.
Para Rowley, a prisão de Manning ou é uma “retaliação ilegal” do governo Trump, ou o caso contra Assange “é tão fraco que eles precisam de qualquer jeito do testemunho de Manning para firmar essas acusações capciosas”.
Assange, após entregue à polícia inglesa pelo presidente equatoriano Moreno, encontra-se num presídio de segurança máxima e foi sentenciado a quase um ano de cárcere por ter pedido asilo. O governo Trump divulgou pedido de extradição de Assange no dia mesmo em que foi arrancado da embaixada em Londres, após anos de júri secreto contra o jornalista.
A promotoria sueca, que havia retirado pela segunda vez a acusação contra Assange em 2017, reapresentou o caso e o pedido de extradição. Vazou que o Equador no próximo dia 20 entregará à CIA celulares e computadores subtraídos de Assange, e permitirá uma revista em seu quarto, numa completa violação dos princípios do asilo político.
Até aqui, para facilitar a extradição, o ‘crime’ de que é acusado Assange é de ‘tentar ajudar Manning a violar uma senha’ dos arquivos com a ingerência do Departamento de Estado nos outros países. Mas é notório que o jornalista será acusado de ‘espionagem’, como Manning já foi, sujeito a prisão perpétua e até pena de morte.
As duas alas do establishment odeiam Assange. O ex-diretor da CIA e secretário de Estado Mike Pompeo chama o WikiLeaks de ‘entidade de inteligência não-estatal hostil’ e ‘não protegida’ pela liberdade de imprensa, enquanto Hillary Clinton, quando ocupava o mesmo cargo, chegou a propor que fosse silenciado ‘com drone’.
Juristas, jornalistas e entidades de defesa das liberdades democráticas advertem que se Assange for condenado por mostrar crimes de guerra, estará criado o precedente para que os EUA persigam jornalistas em qualquer local do planeta, já que ele é australiano e o WikiLeaks não tem sede nos EUA.