Em carta ao colega inglês Gordon Dimmack, o jornalista Assange diz: “estou cercado por assassinos. Os dias em que eu podia ler e falar, defender meus ideais e meu povo acabaram até que eu esteja livre. Conto com você e outros de bom caráter para salvar minha vida”. O fundador do WikiLeaks está em solitária, numa prisão de segurança máxima
“A verdade, no final das contas, é tudo o que temos”, afirma o jornalista Julian Assange, em carta ao jornalista britânico Gordon Dimmack, em que pede que “todos os demais assumam meu lugar”, acrescentando que “os dias em que eu podia ler e falar e organizar para me defender, defender meus ideais e meu povo acabaram até que eu esteja livre”.
Assange disse ainda que está “contando com você e outros de bom caráter para salvar minha vida”, após reconhecer que está “indefeso”. Na semana passada, o procurador-geral assistente (vice-ministro da Justiça) de Trump, John Demers, tornou pública 17 acusações a Assange por ‘espionagem’ por ter publicado as provas dos crimes de guerra dos EUA no Iraque e no Afeganistão, o que o ameaça com 170 anos de cárcere.
A acusação anterior, para o pedido de extradição, era de ter “tentado ajudar” a denunciante Manning a quebrar uma senha. A ‘Lei de Espionagem’, da época da I Guerra Mundial, e sem uso há décadas, foi ressuscitada pelo governo Obama contra denunciantes, e agora, com Trump, contra jornalistas.
Assange, que está preso em regime de isolamento solitário numa penitenciária de segurança máxima na Inglaterra, pela condenação de 50 semanas por ‘violação de fiança’, na verdade, por ter ido se exilar na embaixada do Equador, afirmou que tem enfrentado “uma superpotência” que “vem se preparando há nove anos com centenas de pessoas e incontáveis milhões gastos”.
Desde 11 de abril, ele se encontra “isolado de toda a capacidade de se defender, sem laptop, sem internet, sem computador, sem biblioteca até agora”.
Um dos objetivos dele seguir preso nessas condições draconianas é exatamente dificultar ao máximo a preparação de sua defesa contra o pedido de extradição feito por Washington, após anos de processo secreto no mesmo tribunal que persegue Edward Snowden e e já condenou o denunciante de tortura, John Kiriakou.
Na cínica exposição de Demers, o fato de as denúncias de crimes de guerra, de vigilância em massa e de complôs no mundo inteiro terem ido parar nas manchetes dos principais jornais do mundo e nos noticiários de tevê “arriscaram sérios danos à segurança nacional dos Estados Unidos em benefício de nossos adversários”.
Ainda segundo o regime Trump, a proteção à liberdade de imprensa (1ª Emenda à Constituição dos EUA) não se aplica a Assange e o WikiLeaks é uma “organização não estatal hostil de inteligência”. Os principais jornais do planeta publicaram as denúncias junto com o WikiLeaks.
PILGER: ‘FASCISMO QUEBRA A CASCA’
Como denunciou o cineasta e escritor John Pilger, que é australiano como o fundador do WikiLeaks, “a guerra contra Julian Assange é agora uma guerra contra todos. Dezoito acusações absurdas, incluindo espionagem, enviam uma mensagem ardente a todos os jornalistas, editores … o fascismo moderno está quebrando a casca”.
Entidades de defesa das liberdades democráticas, juristas e jornalistas no mundo inteiro têm advertido que, com tentativa de extraditar Assange por publicar fatos verdadeiros, o regime Trump está buscando criar o precedente pelo qual, em qualquer lugar do mundo, os jornalistas estariam ameaçados de serem extraditados para julamento por uma lei norte-americana, caso publiquem o que Washington não quer, como o vídeo, do próprio Pentágono, do assassinato de uma dezena de civis desarmados por um helicóptero Apache no Iraque.
O regime Trump, além de ter cooptado o presidente equatoriano Moreno para entregar Assange à polícia inglesa e seus pertences, inclusive celulares, ao Departamento de Justiça, também providenciou um pedido de extradição e, do nada, um procurador sueco requentou acusação já vencida contra o jornalista. Em paralelo, a denunciante Chelsea Manning foi presa pela segunda vez por um tribunal por ‘desacato’ por se negar a mentir incriminando Assange e ficará presa pagando multa de US$ 500 por dia enquanto não se dobrar.
A CARTA DE ASSANGE A DIMMACK:
“Eu fui isolado de toda a capacidade de me preparar para me defender, sem laptop, sem internet, sem computador, sem biblioteca até agora, mas mesmo que eu tenha acesso, será só por meia hora com todo mundo uma vez por semana. Apenas duas visitas por mês e leva semanas para colocar alguém na lista de chamadas e pegadinhas para conseguir os detalhes deles para que passem pela segurança. Em seguida, todas as chamadas, exceto advogado, são gravadas e têm duração máxima de 10 minutos e, em um tempo limitado de 30 minutos por dia, em que todos os presos competem pelo telefone. E crédito? Apenas algumas libras por semana e ninguém pode ligar.
Uma superpotência que se prepara há 9 anos com centenas de pessoas e incontáveis milhões gastos no caso. Eu estou indefeso e conto com você e outros de bom caráter para salvar minha vida.
Eu estou, literalmente, cercado por assassinos. Os dias em que eu podia ler e falar e organizar para me defender, meus ideais e meu povo acabaram até que eu esteja livre. Todos os outros devem tomar o meu lugar.
O governo dos EUA, ou melhor, aqueles elementos lamentáveis nele que odeiam a verdade, a liberdade e a justiça querem fraudulentamente minha extradição e morte ao invés de deixar o público ouvir a verdade pela qual eu ganhei os maiores prêmios em jornalismo e fui nominado sete vezes para o Prêmio Nobel da Paz.
A verdade é em última instância tudo o que temos.”