Iniciamos hoje, neste caderno especial, ao qual seguirá outro na próxima edição, a publicação dos capítulos da “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS” referentes à construção do socialismo naquele país. O texto corresponde à íntegra das duas seções finais do capítulo VII e dos capítulos VIII, IX, X, XI e XII da obra, publicada em 1938 na URSS.
Na segunda metade da década de 30 do século XX, o Partido Comunista da União Soviética, que tinha – nas palavras de seu fundador, Lenin – a honra de chamar-se “bolchevique”, já havia, em poucos anos, percorrido um longo e extraordinário caminho. Em pouco mais de 30 anos, desde sua formação a partir dos círculos de revolucionários que lutavam contra o absolutismo czarista, o partido vencera o oportunismo dentro do movimento operário no princípio do século – de onde veio a palavra “bolchevique”, membros da maioria revolucionária do antigo Partido Operário Social Democrata Russo -, havia liderado o levante do povo durante a Revolução de 1905 e estado à frente da classe operária e do campesinato na primeira revolução socialista da História, em outubro de 1917.
Foram anos de luta heroica e abnegada, em condições extremamente difíceis. Nenhum outro partido do mundo havia, na época, conseguido formular com tal clareza a teoria – a estratégia e a tática – da revolução democrática e da revolução socialista, assim como a justa resolução das questões nacionais, e resgatado o marxismo, escamoteado pela direção da II Internacional após a derrota da Comuna de Paris.
Pouco após a morte de Lenin, em 1924, José Stalin, no prefácio de seu livro “Fundamentos do Leninismo”, sintetizaria: “a Rússia tinha de converter-se no ponto de convergência das contradições do imperialismo, não apenas no sentido de que, precisamente na Rússia, essas contradições colocavam-se explicitamente com maior facilidade por causa do seu caráter especialmente monstruoso e intolerável, e não só porque a Rússia era o apoio mais importante do imperialismo ocidental, o alicerce que unia o capital financeiro do Ocidente com as colônias do Oriente, mas também porque apenas na Rússia é que existia uma força real capaz de resolver as contradições imperialistas pela via revolucionária”.
Esta força real era o proletariado russo, à frente do qual estava Lenin – e o partido bolchevique.
No entanto, apesar da grandeza das batalhas anteriores, a próxima seria muito maior. Seria, aliás, a maior já travada na História da Humanidade. Lenin já havia apontado que a tomada do poder, apesar de todas as vicissitudes enfrentadas pelos bolcheviques, era relativamente fácil quando comparada ao que em seguida era necessário empreender: a construção, pela primeira vez na face da Terra, do socialismo, um novo modo de produção, uma nova sociedade – solidária, consciente, coletivista, sem exploração e radicalmente democrática.
É esse feito titânico, realizado pelo povo soviético, do qual emerge a gigantesca figura de José Stalin, que é relatado nos capítulos da “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS” que hoje oferecemos aos nossos leitores.
Como seria e é inevitável, a construção do socialismo na URSS foi reiteradamente vilipendiada pelos imperialistas, pelos exploradores, e por aqueles que se fizeram seus agentes e porta-vozes. Mais do que vilipendiada, tanto no plano externo, onde montou-se um cerco para asfixiar o país dos sovietes, quanto no plano interno, onde aqueles poucos que não conseguiram superar seu alucinado individualismo passaram à sabotagem e ao terrorismo contra o Estado socialista, contra o partido e contra a sua direção, a construção do socialismo fez frente a uma acirrada, aguda e criminosa resistência, mais criminosa ainda após o golpe de Hitler na Alemanha e a articulação dos sabotadores internos com o nazismo. Naturalmente, não se poderia – e não se pode – esperar que os inimigos da revolução a apóiem e a aplaudam…
Porém, era evidente para Stalin e para o partido que novas provas se aproximavam para o povo soviético, e que, por mais difíceis que fossem, seria necessário superá-las. Em 1938, quando o Comitê Central do partido aprovou a publicação da sua História, o mundo estava à beira da mais cruel e sangrenta guerra até então já travada. Era necessário vencer o imperialismo na sua forma mais degenerada – o nazismo. Para isso, a condição era que o partido e o povo estivessem, antes de tudo, conscientes de sua trajetória, de sua luta, de suas conquistas e de sua capacidade de vencer os mais inauditos desafios que a realidade lhes colocassem. Não se defende um país, ou o quer que seja, senão quando se acha que vale a pena defendê-lo. A debacle de vários países da Europa diante de Hitler provaria à exaustão esta verdade elementar. Porém, mais ainda ela seria demonstrada pelo heroísmo em massa e pela vitória do povo soviético contra o mesmo inimigo.
Essa foi a função que assumiu a “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS” e, não por acaso, o próprio Stalin coordenou a comissão do partido que a redigiu, contribuindo para ela com o seu capítulo mais conhecido, a profunda síntese das questões fundamentais do marxismo posteriormente editada em livro sob o nome “Materialismo Dialético e Materialismo Histórico”.
A força da “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS” está em seu rigoroso apego à verdade. Caso contrário, seria impossível que ela tivesse o efeito que teve no partido e no povo soviéticos. Estes haviam vivido os acontecimentos relatados pela obra. O mesmo impacto causado pela verdade foi percebido por outros povos do mundo – principalmente depois da II Guerra – e o leitor poderá comprová-lo, quase 70 anos depois, ao ler o que agora publicamos.
CARLOS LOPES
A luta pela consolidação do poder soviético – A paz de Brest-Litovsk – O 7º Congresso do Partido Bolchevique
Para consolidar o poder soviético era necessário demolir o antigo aparelho do Estado burguês e substituí-lo pelo novo aparelho do Estado Soviético. Era necessário, também, liquidar os restos do regime de castas e de opressão nacional, abolir os privilégios da Igreja, derrotar a imprensa contra-revolucionária e as organizações contra-revolucionárias de todo gênero, tanto legais como ilegais, e dissolver a Assembléia Constituinte burguesa. Por último, era necessário nacionalizar toda a grande indústria, e, sobretudo, sair da situação de guerra, acabar com a guerra, que era o maior obstáculo que se opunha à consolidação do poder soviético.
Todas estas medidas foram levadas à prática no transcurso de uns quantos meses, desde fins de 1917 a meados de 1918.
Rompeu-se e liquidou-se a sabotagem dos funcionários nos velhos ministérios, organizados pelos social-revolucionários e os mencheviques. Foram suprimidos os ministérios, criando-se, para substituí-los, órgãos soviéticos de administração e os correspondentes Comissariados do Povo. Criou-se o Conselho Supremo de Economia Nacional, encarregado de dirigir a indústria do país. Organizou-se a Comissão Extraordinária de Toda a Rússia (a “Tcheca”) para combater a contra-revolução e a sabotagem, pondo-se à frente dela F. Dzerzhinski. Baixou-se um decreto criando o Exército Vermelho e a Marinha Vermelha. Dissolveu-se a Assembleia Constituinte, que tinha sido eleita, fundamentalmente, antes da revolução de Outubro, e tinha se negado a confirmar os decretos do 2º Congresso dos Soviets sobre a paz, sobre a terra e sobre a instauração do poder soviético.
Com o objetivo de liquidar definitivamente os resíduos do feudalismo, do regime de castas e da desigualdade de direitos em todos os graus da vida social baixou-se uma série de decretos abolindo os privilégios de casta, suprimindo as restrições nacionais e religiosas, separando a Igreja do Estado e a Escola da Igreja, e concedendo igualdade de direitos às mulheres e às diversas nacionalidades da Rússia.
Em um decreto especial, que se conhece com o nome de “Declaração de Direitos dos Povos da Rússia”, se estatuiu como lei o livre desenvolvimento dos povos de toda a Rússia e sua plena igualdade de direitos.
Com o objetivo de minar a força predatória da burguesia e de organizar a nova economia nacional e, sobretudo, a nova indústria soviética, foram nacionalizados os bancos, as estradas de ferro, o comércio exterior, a marinha mercante e toda a grande indústria, em seus diversos ramos: indústria carbonífera, metalúrgica, petrolífera, química, de construção de maquinaria, têxtil, açucareira, etc.
Com o objetivo de emancipar o país da dependência financeira e da exploração pelos capitalistas estrangeiros, foram anulados os empréstimos exteriores contraídos em nome da Rússia pelo czar e o governo provisório. Os povos do país soviético não tinham porque pagar as dívidas contraídas para prolongar a guerra de rapina que havia entregado o país escravizado às garras do capital estrangeiro.
Todas estas medidas e outras semelhantes atacavam pela base as forças da grande burguesia, dos latifundiários, da burocracia reacionária e dos partidos contra-revolucionários, consolidando consideravelmente o poder soviético no interior do país. Mas a situação não estaria plenamente resolvida, enquanto a Rússia se achasse em estado de guerra com a Alemanha e a Áustria. Para consolidar definitivamente o poder soviético era necessário pôr fim à guerra. Por isso, o Partido começou a luta pela paz desde os primeiros dias do triunfo da Revolução de Outubro.
O governo propôs a “todos os países beligerantes o estabelecimento de negociações imediatas para uma paz justa e democrática”. Mas os “aliados”, a Inglaterra e a França, se negaram a aceitar a proposta. Em vista da negativa da França e da Inglaterra de entabular negociações de paz, o governo soviético decidiu entrar em negociações com a Alemanha e a Áustria. As negociações começaram no dia 3 de dezembro, em Brest-Litovsk. Em 5 de dezembro se assinou o convênio de armistício, isto é, de suspensão temporária das hostilidades.
As negociações de paz se desenrolaram numa situação em que a economia nacional entrava em descenso, em que todo o país estava cansado da guerra, as unidades militares abandonavam as trincheiras e as frentes desmoronavam. Durante as negociações se tornou claro que os imperialistas alemães pretendiam apoderar-se de enormes porções do território do antigo império czarista e converter a Polônia, a Ucrânia e os países do Báltico em estados vassalos da Alemanha.
Continuar a guerra nestas condições equivalia a jogar numa única cartada a existência da República Soviética, que acabava de nascer. Apresentava-se à classe operária e aos camponeses a necessidade de aceitar as duras condições de paz e recuar ante o mais perigoso bandoleiro daquele momento, o imperialismo alemão, para obter uma trégua, robustecer o poder soviético e criar um novo exército, o Exército Vermelho, capaz de defender o país contra os ataques de seus inimigos. Todos os contra-revolucionários, começando pelos mencheviques e os social-revolucionários e acabando pelos guardas brancos mais caracterizados, desencadearam uma furiosa campanha de agitação contra a assinatura da paz. Sua linha era clara: aspiravam romper as negociações de paz, provocar a ofensiva dos alemães e expor a um golpe o nascente poder soviético, pondo em perigo as conquistas dos operários e camponeses.
Nesta empresa tenebrosa, tinham como aliados Trotsky e seu escudeiro Bukharin. Este, com Radek e Piatakov, encabeçava o grupo antibolchevique que se disfarçava com o nome de grupo dos “comunistas de esquerda”. Trotsky e o grupo dos “comunistas de esquerda” travaram no seio do Partido uma luta furiosa contra Lênin, exigindo a continuação da guerra. Estes indivíduos faziam claramente o jogo dos imperialistas alemães e dos contra-revolucionários dentro do país, uma vez que trabalhavam para expor a nascente República Soviética, desprovida ainda de exército, aos golpes do imperialismo alemão. Era, verdadeiramente, uma política de provocadores, habilmente disfarçada com frases esquerdistas.
Em 10 de fevereiro de 1918, se interromperam as negociações de paz de Brest-Litovsk. Embora Lênin e Stalin insistissem, em nome do CC do Partido Bolchevique, para que se assinasse a paz, Trotsky, que era presidente da delegação soviética de paz enviada a Brest, traiu abertamente as instruções do Partido. Declarou que a Republica Soviética se negava a assinar a paz nas condições propostas pela Alemanha, e, ao mesmo tempo, comunicou aos alemães que os Soviets não fariam a guerra e continuariam desmobilizando o seu exército.
A coisa era monstruosa. Nem os próprios imperialistas alemães podiam esperar mais.
O governo alemão deu por terminado o armistício e passou à ofensiva. Os restos de nosso antigo exército não fizeram frente à ofensiva das tropas alemãs e começaram a dispersar-se. Os alemães avançaram rapidamente, ocupando territórios imensos e ameaçando Petrogrado. O imperialismo alemão, irrompendo no país dos Soviets, tinha como objetivo derrubar o poder soviético e converter o país numa colônia. O antigo exército czarista, que desmoronava, não podia fazer frente às legiões armadas do imperialismo alemão e recuava ante os golpes do exército inimigo.
Mas a intervenção armada dos imperialistas alemães provocou uma potente onda de ardor revolucionário dentro do país. A classe operária respondeu ao grito “A Pátria Socialista está em perigo!” lançado pelo Partido e o Governo Soviético, pondo em pé de guerra numerosas unidades do Exército Vermelho. Os jovens destacamentos do novo exército do povo revolucionário rechaçaram heroicamente a arremetida do bandoleiro imperialista alemão, armado até os dentes. Em Narva e em Pskov, os invasores alemães se chocaram com uma resposta enérgica. O seu avanço sobre Petrogrado foi contido. No dia em que as tropas do imperialismo alemão foram rechaçadas – 23 de fevereiro – nasceu o Exército Vermelho.
Já em 18 de fevereiro de 1918, o CC do Partido Bolchevique aprovara a proposta de Lênin de enviar um telegrama ao governo alemão sobre a conclusão imediata da paz. Para arrancar condições mais favoráveis, os alemães prosseguiram a ofensiva e até 22 de fevereiro o governo alemão não se mostrou disposto a assinar a paz, exigindo, além disso, condições muito mais duras que as iniciais.
Lênin, Stalin e Sverdlov tiveram de manter uma luta encarniçada no seio do Comitê Central contra Trotsky, Bukharin e demais trotskistas, até conseguir que se tomasse a resolução de negociar a paz. Lênin assinalou que Bukharin e Trotsky “ajudavam de fato aos imperialistas alemães e entravavam os avanços e o desenvolvimento da revolução na Alemanha” (Lênin, t. XXII pág. 307, ed. russa).
Em 23 de fevereiro, o CC resolveu aceitar as condições impostas pelo comando alemão e assinar o tratado de paz. A traição de Trotsky e Bukharin custou caro à República dos Soviets. Foram anexadas pela Alemanha a Letônia e a Estônia, além da Polônia; e a Ucrânia foi separada da República Soviética e convertida num Estado vassalo da Alemanha. Impôs-se, além disso, ao País Soviético a obrigação de pagar uma contribuição de guerra aos alemães.
Entretanto, os chamados “comunistas de esquerda” prosseguiram na luta contra Lênin, afundando-se cada vez mais no pântano da traição.
A sessão regional do Partido de Moscou, da qual os “comunistas de esquerda” (Bukharin, Osinski, Iakovleva, Stukov, Mantzev) conseguiram se apossar temporariamente, aprovou uma resolução divisionista de desconfiança no CC e declarou que considerava “quase inevitável a cisão do Partido em breve prazo”. E chegava até o extremo de incluir nesta resolução uma declaração anti-soviética! “No interesse da revolução internacional – diziam os “comunistas de esquerda” – consideramos conveniente aceitar a possibilidade da perda do poder soviético, que se está convertendo em um poder puramente formal”.
Lênin qualificou esta resolução de “excêntrica e monstruosa”.
Naquele momento, o Partido ainda não via claro a causa real da conduta antibolchevique de Trotsky e dos “comunistas de esquerda”. Mas o processo do bloco anti-soviético direitista–trotskista, levado a efeito recentemente (em começos de 1938), revelou que Bukharin e o grupo de “comunistas de esquerda”, dirigido por ele, se achavam já naquele tempo, juntamente com Trotsky e os social-revolucionários de “esquerda”, em relações secretas e conspirativas contra o Governo dos Soviets. Comprovou-se que Bukharin, Trotsky e seus cúmplices na conjuração tinham como objetivo romper o tratado de paz de Brest-Litovsk, prender V. I. Lênin, I. V. Stalin e I. M. Sverdlov, assassiná-los e formar um novo governo, composto de bukharinistas, trotskistas e social-revolucionários de “esquerda”.
Ao mesmo tempo em que organizavam clandestinamente este “complot” contra-revolucionário, o grupo dos “comunistas de esquerda”, apoiado por Trotsky, atacava abertamente o Partido Bolchevique, esperando cindi-lo e decompor suas fileiras. Mas, naqueles momentos difíceis, o Partido formou um bloco em torno de Lênin, Stalin e Sverdlov e apoiou o Comitê Central, tanto no problema da paz como nos demais problemas apresentados.
O grupo dos “comunistas de esquerda” ficou isolado e derrotado.
Para tomar uma decisão definitiva sobre o problema da paz, convocou-se o 7º Congresso do Partido Bolchevique.
O 7º Congresso, o primeiro que se convocava depois da tomada do poder, abriu suas sessões em 6 de março de 1918. Assistiram a ele 46 delegados com direito a palavra e voto, e 58 sem direito a votar. Estiveram representados neste Congresso 145 mil membros. Na realidade o Partido tinha já mais de 270 mil membros. Esta diferença se explica pelo caráter urgente do Congresso, o que impediu a muitas organizações enviar delegados, não tendo podido fazê-lo ainda as do território ocupado pelos alemães.
Informando sobre a paz de Brest-Litovsk, Lênin disse neste Congresso: “a dura crise que o nosso Partido atravessa, em virtude da formação dentro dele de uma oposição de esquerda, é uma das maiores crises pelas quais passou a revolução russa” (Lênin, t. XXXII, pág. 321, ed. russa).
A resolução apresentada por Lênin sobre a paz de Brest-Litovsk foi aprovada por 30 votos contra 12 a 4 abstenções.
No dia seguinte à aprovação desta resolução, Lênin escrevia em seu artigo intitulado “Uma paz desgraçada”:
“Insuportavelmente duras são as condições de paz. Mas apesar de tudo, a história se imporá… Mãos à obra a trabalhar na organização, na organização e na organização! O futuro é nosso, sejam quais forem às provas por que passarmos” (Obra citada, pág. 288).
Na resolução aprovada pelo Congresso se advertia que seria inevitável que no futuro surgissem também ataques bélicos dos Estados imperialistas contra a República dos Soviets, razão pela qual o Congresso considerava dever fundamental tomar as medidas mais enérgicas e decisivas com o objeto de aumentar a disciplina no seio do Partido e a dos operários e camponeses em geral, pôr as massas em condições de defender abnegadamente a pátria socialista, organizar o Exército Vermelho e instruir militarmente toda a população.
O Congresso, depois de ratificar a justeza da linha leninista no problema da paz de Brest-Litovsk, condenou a posição de Trotsky e de Bukharin e estigmatizou a tentativa dos “comunistas de esquerda”, derrotados, de prosseguirem seu trabalho divisionista.
A assinatura da paz de Brest-Litovsk deu ao Partido a possibilidade de ganhar tempo para consolidar o poder soviético e pôr em ordem a economia do país.
A assinatura da paz deu ao Partido a possibilidade de se aproveitar dos choques existentes dentro do campo imperialista (continuação da guerra da Áustria e da Alemanha com a Entente), de decompor as forças do adversário, organizar a economia soviética e criar o Exército Vermelho.
A paz de Brest-Litovsk permitiu ao proletariado manter do seu lado os camponeses e acumular forças para esmagar os generais brancos no período da guerra civil.
Durante o período da Revolução de Outubro, Lênin tinha ensinado ao Partido Bolchevique como se deve avançar resolutamente e sem medo, quando se dão as condições necessárias para isso. Durante o período da paz de Brest-Litovsk, ensinou-lhe como se deve retroceder, ordenadamente, quando as forças do adversário superam com toda a certeza as próprias, com o fim de preparar com a maior energia a nova ofensiva contra o inimigo.
A história confirmou plenamente a justeza da linha leninista.
No 7º Congresso se tomou a resolução de mudar o nome do Partido e de redigir um novo programa. O Partido passou a se chamar Partido Comunista da Rússia (bolchevique) – PCR(b). Lênin propôs este nome, por se ajustar exatamente ao objetivo que o Partido se propõe, que é a realização do comunismo.
Para a redação do novo programa foi escolhida uma Comissão Especial da qual fazia parte Lênin, Stalin e outros, tomando-se como base o projeto apresentado por Lênin.
O 7º Congresso realizou uma obra histórica formidável: derrotou os inimigos emboscados dentro do Partido, os “comunistas de esquerda” e os trotskistas, conseguiu tirar o país da guerra imperialista, conseguiu a paz, e com ela uma trégua que permitiu ganhar o tempo necessário para organizar o Exército Vermelho, e avançar na implantação da ordem socialista na economia nacional.
O plano de Lênin para a construção do socialismo – A sublevação dos social-revolucionários de “esquerda” – O 5º Congresso dos Soviets e a Constituição da República Federativa Soviética da Rússia
Depois de concluir a paz e obter uma trégua, o poder soviético abordou o problema de desenvolver a edificação do socialismo. Lênin chamava o período que vai desde novembro de 1917 até fevereiro de 1918 de período de “ataque da Guarda Vermelha contra o capital”. Durante o primeiro semestre do ano de 1918, o poder soviético concentrou em suas mãos os postos de direção da economia nacional (as fábricas e empresas industriais, os bancos, as estradas de ferro, o comércio exterior, a marinha mercante, etc.), demoliu o aparelho de Estado burguês e liquidou vitoriosamente as primeiras investidas da contra-revolução.
Mas tudo isto estava ainda muito longe de ser suficiente. Para poder avançar, era necessário passar da derrubada do velho para a construção do novo. Por isso, na primavera de 1918, se iniciou a passagem para a nova etapa da construção socialista, se passou da “expropriação dos expropriadores” à consolidação organizada das vitórias conseguidas, à edificação da economia nacional soviética. Lênin considerava necessário aproveitar-se até o “máximo” da trégua para abordar o problema de lançar os alicerces da economia socialista. Os bolcheviques tinham que aprender a organizar de um modo novo a produção e administrá-la. Lênin escrevia que o Partido Bolchevique tinha conseguido convencer a Rússia e tinha conseguido arrancá-la das mãos dos ricos para entregá-la ao povo; agora, dizia Lênin, é necessário que o Partido bolchevique aprenda a governar e administrar a Rússia.
Nesta etapa, Lênin reputava como tarefas fundamentais às de fazer a contabilidade do que se produzia na economia nacional e controlar o consumo de todos os artigos produzidos. Na economia russa predominavam os elementos pequeno-burgueses. Milhões de pequenos industriais e camponeses formavam o terreno que servia de base para o desenvolvimento do capitalismo. Estes pequenos empresários não reconheciam nem a disciplina do trabalho nem a disciplina geral do Estado; não se submetiam a nenhum requisito de contabilidade nem de controle. Naqueles momentos difíceis, constituía um perigo especialmente grande o elemento pequeno-burguês de especulação e mercantilismo, e as tentativas destes pequenos industriais e comerciantes de enriquecerem a custa da miséria do povo.
O Partido Bolchevique desencadeou uma luta enérgica contra a desídia na produção, contra a falta de disciplina de trabalho na indústria. As massas iam assimilando lentamente novos hábitos de trabalho. Isto fazia que a luta por uma disciplina no trabalho fosse, durante este período, a tarefa central.
Lênin assinalou a necessidade de desenvolver a emulação socialista na indústria, de implantar o salário pelo valor do trabalho, de lutar contra o igualitarismo, aplicando, lado a lado com as medidas persuasivas de educação, medidas de coação contra quantos pretendessem fraudar o Estado, contra os vagabundos e os especuladores. Achava que a nova disciplina, uma disciplina de trabalho, uma disciplina de camaradagem, uma disciplina soviética, seria forjada por milhões de trabalhadores, na prática do trabalho diário. E fazia notar que “esta obra preencherá toda uma época histórica” (Lênin, t. XXIII pág. 44 ed. russa).
Todos estes problemas da construção do socialismo, os problemas da criação de novas relações de produção de tipo socialista, foram esclarecidos por Lênin em seu notável trabalho intitulado “As Tarefas Atuais do Poder Soviético”.
Os “comunistas de esquerda”, de braço com os social-revolucionários e mencheviques, lutaram também contra Lênin, no que diz respeito a estes problemas. Bukharin, Osinski e outros se manifestaram contra a implantação de uma disciplina, contra a direção unipessoal das empresas, contra o emprego de especialistas na indústria, contra a instauração de um regime de contabilidade e controle financeiro. E caluniavam Lênin, afirmando que semelhante política representava a volta ao regime burguês. Ao mesmo tempo, os “comunistas de esquerda” pregavam a tese trotskista sobre a impossibilidade de levarem adiante na Rússia a edificação socialista e o triunfo do socialismo.
Por trás das frases “esquerdistas” dos “comunistas de esquerda” se escondia a defesa dos kulaks, dos vagabundos, dos especuladores, que eram inimigos da disciplina do trabalho e viam com hostilidade a regulamentação, pelo Estado, da vida econômica, o regime de contabilidade e de controle.
Depois de delinear os problemas da organização da nova indústria soviética, o Partido atacou os problemas do campo. No campo, estava em ebulição, naquele momento, a luta dos camponeses pobres contra os kulaks. Estes apoderavam-se das terras que tinham sido arrebatadas aos latifundiários. Os camponeses pobres necessitavam de ajuda. Os kulaks lutavam contra o Estado proletário, negando-se a vender-lhe o trigo ao preço taxado. Propunham-se obrigar o Estado Soviético, por meio da fome, a renunciar à implantação de medidas socialistas. O Partido Bolchevique traçou a si mesmo o propósito de esmagar os kulaks contra-revolucionários. Para organizar os camponeses pobres e lutar com êxito contra os kulaks, que dispunham das sobras de trigo, organizou-se uma campanha dos operários no campo.
“Camaradas operários! – escrevia Lênin – Lembrem que a revolução passa por uma situação crítica. Lembrem que são vocês, e ninguém mais que vocês, que poderão salvar a revolução. Dezenas de milhares de operários escolhidos, avançados, dedicados à causa do socialismo, incapazes de se render ao suborno ou à rapina, capazes de criar uma força férrea contra os kulaks, os especuladores, os aproveitadores, os indivíduos venais, os desorganizadores; eis aí o que nos faz falta”. (Lênin, t. XXIII pág. 25, ed. russa).
“A luta pelo pão é a luta pelo socialismo”, disse Lênin, e sob esta palavra de ordem se desenvolveu a organização dos operários para a campanha nas aldeias. Baixou-se uma série de decretos, pelos quais se instaurava uma ditadura do abastecimento e se concediam aos órgãos do Comissariado de Abastecimento poderes extraordinários para comprar trigo a preços tabelados.
Por um decreto de 11 de junho de 1918, foram criados os Comitês de Camponeses Pobres. Estes Comitês desempenharam um grande papel na luta contra os kulaks, na nova partilha das terras confiscadas e na distribuição dos instrumentos de lavoura e dos animais de tração, na aquisição aos kulaks da sobra dos produtos e no aprovisionamento dos centros operários e do Exército Vermelho. 50 milhões de hectares de terras de posse dos kulaks passaram para as mãos dos camponeses pobres e médios. E foi confiscada aos kulaks, em benefício dos camponeses pobres, uma parte considerável dos meios de produção.
A organização destes Comitês de Camponeses Pobres representou uma etapa para frente na marcha da revolução socialista no campo. Estes Comitês eram os baluartes da ditadura do proletariado na aldeia. E foram, além disso, uma considerável medida, o caminho pelo qual se recrutaram os quadros do Exército Vermelho entre a população camponesa.
A campanha dos proletários nas aldeias e a organização dos Comitês de Camponeses Pobres garantiram o poder soviético no campo e tiveram uma enorme importância política para atrair os camponeses médios. Em fins de 1918, depois de cumprir sua missão, os Comitês de Camponeses Pobres deixaram de existir, fundindo-se com os soviets rurais.
Em 4 de julho de 1918, se abriu o 5º Congresso dos Soviets. Os social-revolucionários de “esquerda” desencadearam neste Congresso uma luta furiosa contra Lênin, em defesa dos kulaks. Exigiram que se pusesse fim à campanha contra os kulaks e se renunciasse a enviar ao campo destacamentos operários encarregados do abastecimento. E quando se convenceram de que sua atitude encontrava uma resistência firme por parte da maioria do Congresso, organizaram uma sublevação em Moscou, apoderaram-se de uma rua e começaram dali a disparar contra o Kremlin. Mas ao cabo de poucas horas, esta aventura social-revolucionária de “esquerda” foi aniquilada. E se bem que suas organizações locais tenham também tentado sublevar-se em uma série de pontos do país, a aventura foi rapidamente liquidada em toda a parte.
Como o processo contra o bloco direitista-trotskista acabou de demonstrar ultimamente, a sublevação dos social-revolucionários de “esquerda” se produziu com conhecimento e de acordo com Bukharin e Trotsky, e fazia parte do plano geral de um “complot” contra-revolucionário dos bukharinistas, trotskistas e social-revolucionários de “esquerda” contra o poder soviético.
Por aqueles mesmos dias, o social-revolucionário de “esquerda” Bliumkim, que mais tarde passaria a ser agente de Trotsky, introduziu-se na embaixada alemã e, com o propósito de provocar uma guerra com a Alemanha, assassinou o embaixador alemão em Moscou, Mirbach. Mas o governo soviético conseguiu evitar a guerra e fazer fracassar a provocação dos contra-revolucionários.
No 5º Congresso dos Soviets foi aprovada a Constituição da República Socialista Federativa Soviética da Rússia, a primeira de todas as constituições soviéticas.
Começa a intervenção militar estrangeira – Primeiro período da guerra civil – O comunismo de guerra
A assinatura da paz de Brest-Litovsk e o fortalecimento do Poder Soviético, como resultado da série de medidas de tipo econômico-revolucionário adotadas por ele, nos momentos em que a guerra estava em seu apogeu nas frentes ocidentais, provocaram grande alarme entre os imperialistas da Europa Oidental e, sobretudo, entre os da Entente.
Os imperialistas do campo da Entente receavam que a paz entre a Alemanha e a Rússia aliviasse a situação militar da Alemanha, piorando assim, portanto, a situação das tropas da Entente. Receavam, ainda mais, que a assinatura da paz entre a Rússia e a Alemanha acentuasse o desejo de paz em todos os países e em todas as frentes, prejudicando deste modo a causa da guerra, a causa dos imperialistas. Receavam, finalmente, que a existência do Poder Soviético num território tão grande como o da Rússia e os êxitos conquistados por ele dentro do país, depois de ter derrubado o poder da burguesia, fosse um exemplo contagioso para os operários e soldados dos países ocidentais, nos quais fermentava um profundo descontentamento contra aquela guerra interminável e que – seguindo o exemplo dos russos – podiam chegar a voltar as baionetas contra seus amos e opressores. Por todas estas razões, os governos da Entente decidiram lançar-se à intervenção militar contra a Rússia, com o fim de derrubar o poder soviético e instaurar um poder burguês que restabelecesse o regime capitalista dentro do país, anulasse o tratado de paz com os alemães e refizesse a frente de guerra contra a Alemanha e a Áustria.
Os imperialistas da Entente embarcaram alegremente nesta aventura tenebrosa, convencidos como estavam da instabilidade do poder soviético e certos de que, por pouco que seus inimigos se esforçassem, sua queda seria inevitável e rápida.
Maior ainda era o alarme que os êxitos do poder soviético e seu fortalecimento infundiam nas fileiras das classes derrubadas – entre os latifundiários e os capitalistas, – nas fileiras dos partidos derrotados – kadetes, mencheviques, social-revolucionários, anarquistas e nacionalistas burgueses de todos os matizes – e nas fileiras dos generais brancos, da oficialidade cossaca, etc.
Desde os primeiros dias do triunfo da Revolução de Outubro, todos estes elementos gritavam a plenos pulmões que o poder soviético não podia enraizar-se na Rússia, que estava condenado a morrer, que desmoronaria forçosamente ao cabo de uma ou duas semanas, dentro de um mês, ou no máximo de dois ou três meses. E como o poder soviético, apesar dos exorcismos de seus adversários, continuava existindo e se reforçando, os seus inimigos dentro da Rússia viram-se obrigados a reconhecer que o novo poder era muito mais forte do que eles haviam pensado e que para derrubá-lo seria necessário desenvolver sérios esforços e desencadear uma luta feroz de todas as forças da contra-revolução. Em vista disto, decidiram desenvolver um amplo trabalho sedicioso e contra-revolucionário destinado a agrupar as forças da contra-revolução, recrutar quadros militares e organizar a sublevação, sobretudo, nas regiões dos cossacos e dos kulaks.
E assim, já no primeiro semestre do ano de 1918, definiram-se dois grupos de forças dispostas a lutar para derrubar o Poder Soviético: no estrangeiro, os imperialistas da Entente, e, dentro da Rússia, a contra-revolução.
Nenhuma destas duas forças contava com elementos suficientes para se lançar por si só à conquista do objetivo almejado. A contra-revolução interna dispunha de alguns quadros militares, assim como de certa quantidade de homens, recrutados principalmente entre os cossacos acomodados e os kulaks, com os quais necessitava contar para desencadear a insurreição contra o governo soviético. Porém precisava de dinheiro e armas. Em compensação, os imperialistas estrangeiros tinham dinheiro e armas, porém não podiam destinar à intervenção a quantidade necessária de tropas, não só porque necessitavam delas para fazer a guerra contra a Alemanha e a Áustria, como também porque, estas tropas podiam tornar-se pouco seguras na luta contra o poder soviético.
As condições de luta contra os Soviets impunham a unificação de ambas as forças anti-soviéticas, as do estrangeiro e as do interior. Com efeito, esta unificação se consumou, no primeiro semestre do ano de 1918.
Assim foi como se forjou a intervenção armada estrangeira, apoiada pelas sedições contra-revolucionárias dos inimigos dos Soviets dentro da Rússia.
Com isto, terminava a trégua e começava a guerra civil na Rússia, a guerra dos operários e camponeses dos povos da Rússia contra os inimigos externos e internos do poder soviético.
Os imperialistas da Inglaterra, França, Japão e Estados Unidos começaram sua intervenção militar sem prévia declaração de guerra, apesar desta intervenção não ser mais que uma guerra desencadeada contra a Rússia e uma guerra, além disso, da pior espécie. Estes bandoleiros “civilizados” estenderam as suas garras e desembarcaram suas tropas no território russo, sub-repticiamente, como ladrões.
As tropas anglo-francesas desembarcaram no Norte da Rússia, ocuparam Arkangelsk e Murmansk, apoiando a sublevação dos guardas brancos organizada nesta região, derrubaram os Soviets e criaram o chamado “governo do Norte da Rússia”, governo faccioso de guardas brancos.
As tropas japonesas desembarcaram em Vladivostok, apoderaram-se da Província Marítima e apoiaram os guardas brancos que se encarregaram depois de restaurar o regime burguês.
No Cáucaso do Norte, os generais Kornilov, Alexeiev e Denikin, apoiados pelos ingleses e os franceses, organizaram um “exército voluntário” de guardas brancos, desencadearam uma sublevação de cossacos ricos e abriram a campanha contra os Soviets.
Na região do Don, os generais Krasnov e Mamontov, apoiados secretamente pelos imperialistas alemães (o tratado de paz entre a Alemanha e a Rússia os impedia de lhes prestar um apoio franco), desencadearam a sublevação dos cossacos do Don e ocuparam a região banhada por este rio.
Na região central do Volga e na Sibéria, os anglo-franceses intrigaram para organizar a sublevação do corpo de exército tchecoslovaco. Este corpo de exército, composto por prisioneiros de guerra, havia sido autorizado pelo governo soviético a regressar ao seu país pela Sibéria e Extremo Oriente. No caminho, social-revolucionários, ingleses e franceses induziram-no a se sublevar. A sublevação deste corpo de exército foi o sinal para o levante sedicioso dos “kulaks” do Volga e da Sibéria e dos operários das fábricas de Votkinsk e Izhevsk influenciados pelos social-revolucionários. Na região do Volga foi restaurado um governo de guardas brancos e social-revolucionários, com sede em Samara. Em Omsk, estabeleceu-se o governo dos guardas brancos da Sibéria.
A Alemanha não tomou nem podia tomar parte nesta campanha de intervenção do bloco anglo-franco-japonês-norte-americano, entre outras coisas, pela simples razão de que se achava em guerra contra este bloco. Porém, apesar disto e da existência de um tratado de paz entre a Rússia e a Alemanha, nenhum bolchevique abrigava a menor dúvida de que o governo alemão do Kaiser era um inimigo tão feroz do país soviético como os intervencionistas ingleses, franceses, japoneses e norte-americanos. E, com efeito, os imperialistas alemães fizeram o possível e o impossível para isolar, enfraquecer e afundar o país dos Soviets. Separaram a Ucrânia da Rússia soviética – é certo que baseados num “tratado” com a Rada ucraniana -, introduziram suas tropas na Ucrânia, a pedido da Rada ucraniana dos guardas brancos, começaram a saquear e oprimir ferozmente o povo ucraniano, proibindo-o de manter o menor contato com a Rússia soviética. Separaram desta a Transcaucásia, introduziram no seu território, a pedido dos nacionalistas georgianos e azerbaidjanos, tropas alemãs e turcas, começaram a mandar como amos e senhores em Tiflis e Baku, e ajudaram por todos os meios, embora sorrateiramente, com armas e provisões, o general Krasnov, sublevado no Don.
A Rússia soviética via-se deste modo isolada das regiões que eram suas fontes básicas de abastecimentos, de matérias primas e de combustíveis.
A vida, durante este período foi terrivelmente dura. Escasseava o pão. Escasseava a carne. A fome mortificava os operários. Os operários de Moscou e Petrogrado recebiam uma ração de pão de um oitavo de libra a cada dois dias. Havia dias em que não se distribuía nem um pedaço de pão. As fábricas estavam paradas ou trabalhavam muito pouco tempo, pois não havia matérias primas nem combustíveis. A classe operária, porém, não se acovardava, tampouco se acovardava o Partido bolchevique. As incríveis dificuldades deste período e a luta desesperada contra elas revelaram como são inesgotáveis as energias que a classe operária armazena e como é grande e incomensurável a força da autoridade do Partido bolchevique.
O Partido proclamou o país um acampamento de guerra e reconstruiu sua vida econômica, política e cultural em consonância com isto. O governo declarou que “a pátria socialista estava em perigo” e chamou o povo à defesa revolucionária. Lênin lançou a palavra de ordem de “Tudo Para a Frente!”, e centenas de milhares de operários e camponeses se alistaram como voluntários no Exército Vermelho e seguiram para o front. Cerca da metade do total de filiados ao Partido e às Juventudes Comunistas ocuparam seus postos nas frentes de luta. O Partido pôs o povo de pé para a guerra de salvação da Pátria contra a invasão das tropas dos intervencionistas estrangeiros e contra a sublevação das classes exploradoras derrubadas pela revolução. O Conselho da Defesa Operária e Camponesa organizado por Lênin, dirigia o envio de homens, víveres, equipamentos e armas para as frentes. A mudança do sistema do voluntariado ao serviço militar obrigatório levou para as fileiras do Exército Vermelho centenas de milhares de homens de reforço, e em pouco tempo o Exército Vermelho se converteu num exército de um milhão de combatentes.
Apesar da duríssima situação do país e da pouca idade do Exército Vermelho, que ainda não havia logrado fortalecer-se, as medidas de defesa adotadas não tardaram em acarretar os primeiros êxitos. O general Krasnov foi repelido em Tsaritsin, de cuja tomada estava seguro, e rechaçado para além do Don. As aventuras do general Denikin ficaram limitadas a uma região reduzida do Cáucaso do Norte, e o general Kornilov foi morto em combate contra o Exército Vermelho. Os tchecoslovacos e os bandos de social-revolucionários e guardas brancos foram desalojados de Kazán, Simsbirsk e Samara e arrojados para os Urais. A sublevação do guarda branco Savinkov em Iaroslav, organizada pelo chefe da Missão Inglesa em Moscou, Lockhart, foi esmagada e ele detido. Os social-revolucionários, que haviam assassinado os camaradas Uristski e Volodarski e perpetrado o atentado criminoso contra a vida de Lênin, foram submetidos ao terror vermelho em resposta ao terror branco desencadeado por eles contra os bolcheviques, sendo esmagados em todos os pontos importantes da Rússia central.
Nestes combates contra os inimigos se temperou e se fez forte e vigoroso o jovem Exército Vermelho.
Os comissários comunistas que atuaram durante este período no Exército Vermelho desempenharam um papel decisivo na obra de fortalecimento do Exército, na sua educação política, no reforço de sua capacidade combativa e de sua disciplina.
Porém, o Partido bolchevique compreendia que estes êxitos do Exército Vermelho não resolviam o problema, que só eram os êxitos iniciais. Compreendia que o aguardava novos combates, ainda mais encarniçados, e que o país só poderia recobrar as regiões perdidas, que eram suas fontes de abastecimento de matérias primas e de combustível, à custa de uma longa e dura luta contra seus inimigos. Por isto, os bolcheviques começaram a se preparar intensivamente para uma guerra longa e decidiram pôr toda a retaguarda a serviço da frente. O governo soviético implantou o comunismo de guerra. O Poder dos Soviets pôs sob seu controle, além da grande indústria, a indústria pequena e média, com o fim de acumular os artigos de primeira necessidade para abastecer o exército e o campo. Implantou o monopólio do comércio do trigo, proibiu o comércio privado de cereais e introduziu o sistema de cotização de produtos agrícolas, com o objetivo de mobilizar toda a sobra dos produtos recolhidos pelos camponeses, formar um estoque de trigo e abastecer de víveres o Exército e os operários. Finalmente, implantou o trabalho obrigatório, extensivo a todas as classes da população. Esta incorporação da burguesia ao trabalho físico obrigatório permitia utilizar os operários para outros trabalhos mais importantes inclusive na frente, e com isto o Partido punha em prática, o principio de “quem não trabalha, não come”.
Todo este sistema de medidas impostas pelas condições extraordinariamente difíceis em que se devia organizar a defesa do país, tinha caráter provisório e se englobava sob o nome de comunismo de guerra.
O país se preparava para uma longa e dura guerra civil contra os inimigos externos e internos do poder soviético. Em fins do ano de 1918, houve necessidade de triplicar o contingente do exército. Isto exigia que se acumulassem os meios necessários para abastecê-lo.
Eis como se expressava Lênin, por aqueles dias: “Decidimos ter um exército de um milhão de homens para a primavera: agora necessitamos um exército de três milhões de homens. Podemos ter este exército e o teremos”.
Derrota militar da Alemanha – A revolução alemã – Fundação da 3ª Internacional – O 8º Congresso do Partido
Enquanto a Rússia se preparava para novos combates contra os intervencionistas estrangeiros, no Ocidente, na retaguarda e nas frentes dos países beligerantes, se produziam acontecimentos decisivos. A Alemanha e a Áustria iam ficando exaustas entre os tormentos da guerra e da crise de subsistência. Enquanto a Inglaterra, França e Estados Unidos mobilizavam novas reservas, a Alemanha e a Áustria esgotaram as últimas e exíguas reservas de que podiam dispor. Tal como estava a coisa, a Alemanha e a Áustria, esgotadas, seriam derrotadas em pouco tempo.
Entretanto, ia fermentando dentro desses países a indignação do povo contra aquela guerra interminável e aniquiladora e contra os governos imperialistas desses países que haviam conduzido o povo ao esgotamento e à fome. Também aqui se revelava a formidável influência revolucionária da Revolução de Outubro, de atos de confraternização entre os soldados soviéticos e os soldados austro-alemães na frente, antes mesmo da paz de Brest-Litovsk e, depois desta, a influência da própria conclusão da guerra contra a Rússia Soviética e da paz concertada com ela. O exemplo da Rússia, onde o povo pôs fim à guerra mediante a derrubada do seu próprio governo imperialista, não podia deixar de servir de referência aos operários austro-alemães. E os soldados alemães da frente oriental que haviam sido transferidos para a frente ocidental, depois da paz de Brest, tinham forçosamente que contribuir para decompor o exército alemão ali destacado, com seus relatos acerca dos atos de confraternização com os soldados soviéticos e acerca do modo como estes souberam desembaraçar-se da guerra. Quanto ao exército austríaco, começara a se decompor mesmo antes que o alemão, como resultado das mesmas causas. Todas estas circunstâncias contribuíram para aumentar nas tropas alemãs o anseio de paz, para fazer que já não dessem provas da mesma combatividade de antes e para que começassem a retroceder ante o arrojo das tropas da Entente; no interior da Alemanha, estalou, em novembro de 1918, a revolução, derrubando o Kaiser e o seu governo.
A Alemanha se viu obrigada a reconhecer sua derrota e a pedir a paz à Entente.
Deste modo, a Alemanha, potência de primeira ordem, ficava reduzida de repente, à situação de uma potência de segunda ordem.
Do ponto de vista da situação do poder soviético, este fato exerceu certa influência negativa, já que convertia os Estados da Entente, organizadores da intervenção, na força dominante da Europa e da Ásia, dando-lhes a possibilidade de intensificá-la e de organizar o bloqueio do país soviético. E isto foi, com efeito, o que ocorreu, como veremos adiante. Porém, por outra parte, tinha uma importância positiva ainda mais considerável, que vinha aliviar radicalmente a situação do país dos Soviets. Em primeiro lugar, dava ao Poder Soviético a possibilidade de anular o tratado de paz bandido de Brest-Litovsk, de pôr fim aos pagamentos que lhe foram impostos a título de indenização e de desenvolver uma luta aberta, no terreno militar e político, para libertar a Estônia, a Letônia, a Bielorússia, a Lituânia, a Ucrânia e a Transcaucásia do jugo do imperialismo alemão. Em segundo lugar – e isto era o mais importante, – a existência no centro da Europa, na Alemanha, de um regime republicano e de Soviets de deputados operários e soldados, tinha necessariamente que repercutir de um modo revolucionário, como de fato repercutiu, nos países da Europa, circunstância que tinha de fortalecer a situação do poder soviético na Rússia. É verdade que a revolução não era uma revolução socialista, senão uma revolução burguesa, e que os Soviets na Alemanha serviram de dócil instrumento ao parlamento da burguesia, já que a sua direção estava nas mãos dos social-democratas, que eram oportunistas como os mencheviques russos, circunstância que explica especialmente, a debilidade daquela revolução. Quanto era débil a revolução na Alemanha o demonstra um só fato: o de que permitisse que, pelos guardas brancos alemães fossem impunemente assassinados revolucionários de tanto prestígio como Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. Porém, apesar disso, era uma revolução; o Kaiser foi derrubado do trono; os operários romperam suas cadeias e, ainda que não se houvesse conseguido outra coisa, isto tinha necessariamente que fomentar a revolução no Ocidente, não podia deixar de provocar o auge da revolução nos países europeus.
A revolução começou a avançar na Europa. Na Áustria vinha se desenvolvendo o movimento revolucionário. Na Hungria foi proclamada a República dos Soviets. A onda revolucionária fez aparecer os Partidos Comunistas na Europa.
Isto criou uma base real para a unificação dos Partidos Comunistas na Terceira Internacional, na Internacional Comunista.
Em março de 1919, em Moscou, no primeiro Congresso dos Partidos Comunistas de vários países, por iniciativa de Lênin e dos bolcheviques, foi fundada a Internacional Comunista. E ainda que o bloqueio e as perseguições dos imperialistas impedissem a muitos delegados chegar a Moscou, tomaram parte neste primeiro Congresso representantes dos mais importantes países da Europa e da América. O Congresso foi dirigido por Lênin. No seu informe sobre a democracia burguesa e a ditadura do proletariado, Lênin salientou a significação do Poder Soviético, como a autêntica democracia para os trabalhadores. O Congresso aprovou o Manifesto dirigido ao proletariado internacional, no qual se fazia um apelo à luta pela ditadura do proletariado e pelo triunfo dos Soviets em todos os países. Neste Congresso se elegeu o Comitê Executivo do Comintern, órgão executivo da Terceira Internacional ou Internacional Comunista.
Assim foi fundada esta organização proletária revolucionária internacional de novo tipo, a Internacional Comunista, Internacional marxista-leninista.
Numa situação formada por circunstâncias contraditórias, em que se reforçava o bloco reacionário de Estados da Entente contra o Poder Soviético, de uma parte, e, de outra, se acentuava o auge revolucionário na Europa, principalmente nos países que saíram derrotados da guerra, circunstância que aliviava consideravelmente a situação do País Soviético, se reuniu, em março de 1919, o 8º Congresso do Partido Bolchevique.
Neste congresso participaram 301 delegados com direito de palavra e voto, representando 313.766 filiados. Havia, além disso, 102 delegados com palavra, porém sem direito a votar.
Lênin consagrou as primeiras palavras do seu discurso de abertura à memória de I.M. Sverdlov, um dos melhores organizadores do Partido bolchevique, morto nas vésperas da abertura do Congresso.
Neste Congresso foi aprovado o novo programa do Partido.
Define-se nele o que é o capitalismo e sua fase superior, o imperialismo. Comparam-se os dois sistemas de Estados: o sistema da democracia burguesa e o sistema soviético. Assinalam-se minuciosamente as tarefas concretas do Partido na sua luta pelo socialismo: levar até o fim a expropriação da burguesia, organizar a Economia do país segundo um plano socialista único, fazer com que os sindicatos intervenham na organização da economia nacional, implantar a disciplina socialista do trabalho, utilizar os técnicos na economia nacional, sob o controle dos órgãos soviéticos, incorporar gradual e planificadamente os camponeses médios ao trabalho da edificação socialista.
O 8º Congresso aprovou por proposta de Lênin incluir no programa não só a definição do imperialismo como etapa superior do capitalismo, como também a descrição do capitalismo industrial e do regime de produção simples de mercadorias, que figurava no velho programa, aprovado no 2º Congresso do Partido. Lênin considerava necessário que fosse levada em conta no programa a complexidade da economia russa, e se assinalasse a existência no país de diversas formações econômicas, incluindo entre elas o regime de pequena produção de mercadorias, cujo expoente era o camponês médio. Por isso, ao se discutir o programa, interveio energicamente contra as idéias antibolcheviques de Bukharin, que propunha eliminar dele os pontos em que se falava de capitalismo, da pequena produção de mercadorias e do regime econômico do camponês médio. As idéias de Bukharin representavam a negação menchevique-trotskista da importância do camponês médio para a edificação soviética. Ao mesmo tempo, Bukharin escondia o fato de que era o regime da pequena produção de mercadorias dos camponeses o que engendra e fomenta o desenvolvimento dos elementos “kulaks”.
Lênin também combateu as idéias antibolcheviques de Bukharin e Piatakov sobre o problema nacional. Estes se manifestaram contra a inclusão no programa do ponto no qual se reconhece o direito de autodeterminação das nações e se pronunciaram contra a igualdade de direitos dos povos, sob o pretexto de que esta palavra de ordem estorvava, segundo eles, o triunfo da revolução proletária e dificultava a unificação dos proletários de diversas nacionalidades. Lênin lançou por terra estas funestas concepções fechadas e chauvinistas de Bukharin e Piatakov.
Nos trabalhos do 8º Congresso do Partido, ocupou um lugar importante o problema da atitude que se devia adotar em face dos camponeses médios. Como resultado do célebre decreto sobre a terra, a aldeia se convertia cada vez mais em aldeia de camponeses médios. Agora, estes formavam a maioria dentro da população camponesa.
O estado de espírito e a conduta dos camponeses médios, vacilantes entre a burguesia e o proletariado, tinham uma importância enorme para a sorte da guerra civil e da edificação socialista. O desenlace da guerra civil dependia, em boa parte, para o qual lado se inclinasse o camponês médio, da classe que soubesse conquistá-lo, de que esta classe fosse o proletariado ou a burguesia. Se os tchecoslovacos, os guardas brancos, os kulaks, os social-revolucionários e os mencheviques lograram derrubar o poder soviético na região do Volga, no verão de 1918, foi porque contaram com o apoio de uma parte considerável dos camponeses médios. E o mesmo ocorreu nas sublevações organizadas pelos kulaks na Rússia central. A partir, porém do outono de 1918, o estado de espírito das massas de camponeses médios começou a se orientar resolutamente para o poder soviético. Os camponeses viam que o triunfo dos brancos conduzia à restauração do poder dos latifundiários, com os conseqüentes despojos de terras, saques, torturas e espancamentos de camponeses. Para esta mudança operada quanto ao modo de pensar dos camponeses contribuiu também a atuação dos Comitês de Camponeses Pobres, que esmagou os kulaks. Em relação a isto, Lênin lançou, em novembro de 1918, esta palavra de ordem:
“Saber chegar a um acordo com os camponeses médios, sem cessar nem um minuto a luta contra os kulaks e tomando como sólido ponto de apoio somente os camponeses pobres”. (Lênin, t. XXIII, pág. 294, ed. russa).
É certo que as vacilações existentes entre os camponeses médios não cessaram totalmente, porém este setor da população camponesa se aproximou mais do poder soviético e começou a lhe prestar um apoio mais firme. Para isso contribuiu, em boa parte, a política traçada no 8º Congresso do Partido, em relação ao camponês médio.
O 8º Congresso marcou uma mudança na política do Partido a respeito dos camponeses médios. No informe de Lênin e nas resoluções do Congresso, destacou-se a nova linha do Partido em face deste problema. O Congresso exigiu que as organizações do Partido e todos os comunistas estabelecessem uma rigorosa diferença e separação entre os camponeses médios e os kulaks, fazendo por atrair os primeiros para o lado da classe operária mediante uma política de atenção solícita às suas necessidades. Era preciso lutar contra o atraso dos camponeses médios com o método da persuasão, porém de modo algum com medidas de coação e de violência. Por isso, o Congresso traçou a forma de que, ao implantar medidas socialistas no campo (ao criar as comunas e os artels agrícolas), não se permitisse à coação. Sempre que fossem feridos os interesses fatais dos camponeses médios, era necessário chegar a um acordo prático com eles e lhes fazer concessões quanto à utilização dos métodos de implantação das transformações socialistas. O Congresso resolveu aplicar uma política de sólida aliança com os camponeses médios, porém mantendo dentro dela o papel dirigente do proletariado.
A nova política de relações com os camponeses médios, preconizada por Lênin no 8º Congresso, exigia que o proletariado se apoiasse nos camponeses pobres, mantivesse uma sólida aliança com os camponeses médios e lutasse contra os kulaks. Até o 8º Congresso, o Partido havia seguido, em geral, a política de neutralizar os camponeses médios. Isto é, seu objetivo era conseguir que o camponês médio não se pusesse ao lado do kulaks, ao lado da burguesia, em geral. Porém, agora, isto já não bastava. O 8º Congresso passou da política de neutralização do camponês médio à política de uma sólida aliança com ele para lutar contra a intervenção dos guardas brancos e das tropas estrangeiras, assim como para a edificação vitoriosa do socialismo.
A linha traçada pelo 8º Congresso a respeito da atitude que se devia seguir com as grandes massas camponesas, com os camponeses médios, teve uma importância decisiva quanto ao desenlace vitorioso da guerra civil contra a intervenção estrangeira e os guardas brancos que lhe serviam de auxiliares. No outono de 1919, quando tiveram que escolher entre o poder soviético e Denikin, os camponeses apoiaram os Soviets, e a ditadura proletária derrotou o seu mais perigoso inimigo.
No 8º Congresso se apresentou também, com caracteres especiais, o problema da organização do Exército Vermelho. Neste Congresso, se destacou a chamada “oposição militar”, na qual apareciam enquadrados não poucos dos antigos “comunistas de esquerda”. Porém justamente com estes representantes do “comunismo de esquerda”, já liquidado, a “oposição militar” englobava militantes do Partido que jamais haviam participado de nenhuma oposição, mas que estavam descontentes com a direção que Trotsky dava ao exército. A maioria dos delegados militares estava acentuadamente contra Trotsky, contra sua admiração pelos técnicos militares procedentes do velho exército czarista, uma parte dos quais traiu abertamente o poder soviético na guerra civil, contra a atitude arrogante e hostil de Trotsky para com os velhos quadros bolcheviques dentro do exército. No Congresso se aduziram exemplos da “forma prática” como Trotsky tentara fuzilar uma série de comunistas que ocupavam postos responsáveis na frente e que não lhe agradavam, fazendo com isso o jogo do inimigo, e como só graças à intervenção do Comitê Central e aos protestos dos militantes ativos da frente se conseguira evitar a morte desses camaradas.
Entretanto, ainda que lutando contra o desvirtuamento da política militar do Partido por Trotsky, a “oposição militar” defendia concepções falsas a respeito de uma série de problemas da organização do exército. Lênin e Stalin intervieram resolutamente contra a “oposição militar” que defendia as sobrevivências da guerrilha dentro do Exército e lutava contra a criação de um Exército Vermelho regular, contra o emprego dos técnicos militares, contra essa disciplina férrea sem a qual não pode existir um verdadeiro exército. Combatendo a “oposição militar”, o camarada Stalin exigia a criação de um exército regular, compenetrado do espírito da mais severa disciplina.
“Ou criamos – dizia o camarada Stalin – um verdadeiro exército operário-camponês, e predominantemente camponês, um exército rigorosamente disciplinado e defendemos a República, ou pereceremos”.
Ao mesmo tempo, porém, que rejeitava uma série de propostas da “oposição militar”, o Congresso assestou um golpe contra Trotsky, exigindo que se melhorasse a atuação dos organismos militares centrais e se reforçasse o papel dos comunistas dentro do Exército.
Como resultado do trabalho da comissão militar nomeada pelo Congresso, logrou-se que deste saísse uma resolução unânime sobre o problema militar.
As resoluções do 8º Congresso sobre o problema militar serviram para fortalecer o Exército Vermelho e estreitar ainda mais seus laços com o Partido.
O Congresso examinou, além disso, o problema da organização do Partido na atuação dos Soviets. Na discussão deste problema, o Congresso teve que rechaçar a posição do grupo oportunista Sapronov-Osinski, que negava o papel dirigente do Partido na atuação dos Soviets.
Finalmente, em relação à enorme afluência de novos filiados, o Congresso tomou a resolução de melhorar a composição social do Partido e rever os ingressos.
Era o passo para a primeira depuração das fileiras do Partido.
Recrudesce a intervenção – Bloqueio do país soviético – Esmagamento das campanhas de Kolchak e Denikin – Uma trégua de três meses – O 9º Congresso do Partido
Depois de derrotar a Alemanha e a Áustria, os Estados da Entente decidiram lançar grandes efetivos militares contra o país soviético. Ao se retirarem as tropas alemãs, depois da derrota, da Ucrânia e da Transcaucásia, vieram ocupar seu posto os anglo-franceses, que enviaram a esquadra ao Mar Negro e desembarcaram suas tropas em Odessa e na Transcaucásia. A conduta seguida pelos intervencionistas da Entente nos territórios ocupados por eles era tão selvagem que chegavam a suprimir pelas armas grupos inteiros de operários e camponeses. Depois de ocupar o Turquestão, a selvageria dos invasores levou-os a aprisionar e conduzir ao Transcáspio 26 dirigentes bolcheviques de Baku, os camaradas Shaumian, Filetov, Dzhaparidse, Malyguin, Asisbekov, Korganov e outros, assassinando-os bestialmente, com a ajuda dos social-revolucionários.
Algum tempo depois, os intervencionistas declararam o bloqueio da Rússia. Ficaram cortadas todas as comunicações marítimas e de outro gênero com o mundo exterior.
Com isso o país soviético se via cercado quase por todas as partes.
A Entente depositava suas principais esperanças, naquele momento, no Almirante Kolchak, posto por ela na Sibéria, em Omsk. Kolchak foi proclamado “regente supremo da Rússia”. Toda a contra-revolução russa se achava sob seu comando.
A frente oriental passou a ser, portanto, a frente principal da guerra civil.
Na primavera de 1919, Kolchak, depois de reunir um formidável exército, se aproximou quase até o Volga. Foram lançadas contra ele as melhores forças bolcheviques: os jovens comunistas e os operários foram mobilizados. Em abril de 1919, o Exército Vermelho infligiu a Kolchak uma séria derrota. As tropas de Kolchak não tardaram em começar o recuo em toda à frente.
No momento em que as operações ofensivas do Exército Vermelho na frente oriental estavam em seu apogeu, Trotsky propôs um plano suspeito: deter-se diante dos Urais, cessar a perseguição dos kolchakistas e lançar as tropas da frente Oriental para a frente sul. O CC do Partido, compreendendo perfeitamente bem que não era possível deixar Urais e a Sibéria nas mãos de Kolchak, onde, com a ajuda dos japoneses e dos ingleses, poderia refazer-se e pôr-se de novo em pé, rechaçou aquele plano e deu instruções para prosseguir a ofensiva. Trotsky não concordando com estas instruções pediu demissão do seu posto; porém o CC se negou a isto, obrigando-o, ao mesmo tempo, a não intervir na direção das operações da frente oriental. A ofensiva do Exército Vermelho contra Kolchak continuou se desenvolvendo com renovado vigor. O Exército Vermelho infligiu-lhe uma série de novas derrotas e fez a limpeza dos brancos nos Urais e na Sibéria, onde o Exército Vermelho se encontrava apoiado por um potente movimento de guerrilheiros, organizados na retaguarda dos brancos.
No verão de 1919, os imperialistas confiaram ao general Yudenich, que se achava dirigindo a contra-revolução na frente noroeste (na região do Báltico, próxima de Petrogrado), a missão de distrair o Exército Vermelho da frente Oriental por meio dum ataque a Petrogrado. A guarnição de duas das fortalezas que defendiam essa capital, atingida esta agitação contra-revolucionaria dos oficiais brancos, se rebelou contra o poder soviético, e no Estado Maior da frente foi descoberto um “complot” contra-revolucionário. O inimigo ameaçava Petrogrado. Porém, graças às medidas tomadas pelo governo com a ajuda dos operários e dos marinheiros, as fortalezas foram limpas dos brancos, as tropas de Yudenich derrotadas, e o seu caudilho lançado para a Estônia.
A derrota de Yudenich perto de Petrogrado facilitou a luta contra Kolchak. Em fins de 1919, o seu exército foi definitivamente desbaratado. Kolchak foi detido e fuzilado em cumprimento da sentença baixada pelo Comitê Revolucionário.
Kolchak foi, pois, liquidado.
Na Sibéria, corria na boca do povo esta quadra depreciativa sobre Kolchak:
“Uniforme inglês,
Ombreira francesa,
Tabaco japonês
De Omsk o amo é.
O uniforme se gastou
A ombreira encolheu
O tabaco se fumou
E o amo de Omsk se acabou”.
Em vista de Kolchak não ter correspondido às esperanças nele depositadas, os intervencionistas mudaram o plano de agressão contra a República dos Soviets. As tropas desembarcadas em Odessa tiveram de voltar de novo para bordo dos seus navios, pois o contato com as tropas da República Soviética lhes contagiava o espírito revolucionário e já começavam a se sublevar contra seus opressores imperialistas. Assim, por exemplo, em Odessa se sublevaram os marinheiros franceses sob a direção de André Marty. Tudo isto contribuiu para que, depois de esmagado Kolchak, a Entente concentrasse a atenção no general Denikin, companheiro de armas de Kornilov e organizador do “exército voluntário”. Denikin operava, naquele momento, no Sul, na região do Kuban. A Entente o municiou com grandes quantidades de armas e o fez marchar para o Norte contra o poder dos Soviets.
Portanto, à frente Sul passava a ser a frente principal da guerra civil.
Denikin começou a sua grande campanha no verão de 1919. Trotsky lançou por terra o trabalho realizado na frente sul, e as tropas soviéticas sofreram derrotas, uma atrás da outra. Em meados de outubro, os brancos eram donos de toda a Ucrânia, tomaram Orel e se aproximavam de Tula, que era o centro que abastecia o Exército Vermelho de cartuchos, fuzis e metralhadoras. Os brancos se aproximavam de Moscou. A situação da República Soviética era muito grave. O Partido deu o grito de alarme e chamou o povo para a resistência. Lênin lançou a palavra de ordem de “Todos à luta contra Denikin!” Os operários e os camponeses, respondendo ao chamado dos bolcheviques, puseram em jogo todas as suas forças para esmagar o inimigo.
Com o objetivo de organizar o esmagamento de Denikin, o Comitê Central do Partido enviou à frente Sul os camaradas Stalin, Voroshilov, Ordzhonikidse e Budieny. Trotsky foi afastado da direção das operações do Exército Vermelho no Sul. Antes da chegada do camarada Stalin, o comando da frente Sul, de acordo com Trotsky, havia preparado um plano, segundo o qual o ataque principal contra Denikin se faria desde Tsaritsin sobre Novorossisk, através das estepes do Don, onde o Exército Vermelho teria que marchar por um terreno completamente impraticável e atravessar regiões povoadas por cossacos, uma parte considerável dos quais se achava então sob a influência dos guardas brancos. O camarada Stalin submeteu este plano a uma critica demolidora e propôs ao Comitê Central outro, concebido por ele, para esmagar Denikin, em que o ataque principal seguiria a linha Kharkov-Bacia do Donetz-Rostov. Este plano assegurava uma marcha rápida das tropas do Exército Vermelho contra Denikin, pois nele se previa a passagem do Exército Vermelho por regiões operárias e camponesas, isto é, por territórios em que a população simpatizava abertamente com as tropas soviéticas. Além disso, a rica rede ferroviária com que esta região contava permitia abastecer o Exército Vermelho com regularidade, de todos os elementos necessários. Finalmente, este plano oferecia a possibilidade de libertar a Bacia do Donetz, assegurando o aprovisionamento do país em combustível.
O Comitê Central aprovou o plano do camarada Stalin. Na segunda quinzena de outubro de 1919, depois de encarniçada resistência, Denikin foi derrotado pelo Exército Vermelho nos combates decisivos que se travaram perto de Orel e de Voronezh. Denikin começou a recuar com toda a pressa, dirigindo-se, precipitadamente, para o Sul, perseguidos pelas tropas soviéticas. No começo de 1920, a Ucrânia e o Cáucaso Norte tinham sido libertados do poder dos brancos.
Enquanto se travavam aqueles combates decisivos na frente Sul, os imperialistas voltaram a lançar o corpo de exército de Yudenich contra Petrogrado, com o fim de distrair da frente Sul forças do Exército Vermelho e de aliviar a situação das tropas de Denikin. Os brancos chegaram até as portas de Petrogrado. O heróico proletariado da capital formou com seus peitos uma muralha para defender a primeira cidade da revolução. Os comunistas lutaram, como sempre, na primeira linha. Depois de furiosos combates, os brancos foram derrotados e lançados de novo para outro lado das fronteiras da Rússia, para a Estônia.
Também Denikin foi, pois liquidado.
Depois de esmagados Kolchak e Denikin, a trégua que sobreveio foi de curta duração.
Quando os imperialistas viram que as tropas dos guardas brancos eram destroçadas, que a intervenção armada fracassava, que o Poder Soviético se fortalecia em todo o país e que na Europa Ocidental aumentava a indignação dos operários em face da guerra dos intervencionistas contra a República dos Soviets, começaram a mudar de atitude para com o Estado Soviético. Em janeiro de 1920, a Inglaterra, a França e a Itália decidiram levantar o bloqueio contra a Rússia Soviética.
Era esta uma brecha importantíssima, que se abria no muro da intervenção.
Isto não queria dizer, naturalmente, que o Estado Soviético pudesse dar já por terminadas a intervenção e a guerra civil. Havia ainda o perigo de que a Polônia imperialista se lançasse a um ataque. Os intervencionistas não haviam sido expulsos ainda definitivamente do Extremo Oriente, da Transcaucásia nem da Crimeia. Não obstante, o país dos Soviets obtinha uma trégua passageira, da qual se podia aproveitar para concentrar maiores forças na obra da edificação econômica. O Partido pôde ocupar-se dos problemas relacionados com a economia nacional.
Durante a guerra civil, abandonaram a produção muitos operários qualificados, pela paralisação de fábricas e oficinas. Agora, o Partido reintegrava na produção estes operários qualificados para que trabalhassem em suas especialidades. Foram mobilizados alguns milhares de comunistas para a restauração dos transportes, cuja situação era muito difícil. Sem restaurar os transportes, não se podia pensar seriamente em restaurar os ramos fundamentais da indústria. Reforçou-se e melhorou-se também o abastecimento. Começou-se a traçar um plano de eletrificação do país. Achavam-se de armas nas mãos 5 milhões de combatentes do Exército Vermelho, que não era possível licenciar, pois subsistia o perigo de guerra. Por isso, algumas unidades do Exército Vermelho foram convertidas num Exército de Trabalho, utilizando-as no terreno da edificação econômica. O conselho da Defesa operária e camponesa se transformou no Conselho do Trabalho e da Defesa (S.T.O). Para auxiliá-lo, criou-se a Comissão do Plano de Estado (Gosplan).
Tal era a situação existente em fins de março de 1920 ao se reunir o 9º Congresso do Partido.
Tomaram parte neste Congresso 554 delegados com direito de palavra e voto, representando 611.978 filiados ao Partido. Assistiram a ele, além disso, 162 delegados com palavra, porém sem voto.
O Congresso determinou as tarefas econômicas mais urgentes do país em matéria de transportes e indústria, assinalando especialmente a necessidade de que os sindicatos tomassem parte na edificação econômica.
Este Congresso consagrou atenção especial ao problema da formação dum plano econômico de conjunto, destinado a pôr de novo em marcha, em primeiro lugar, o transporte, o combustível e a metalurgia. O eixo deste plano era o problema da eletrificação de toda a economia nacional, que Lênin destaca como “um grande programa para 10 ou 20 anos”. Sobre estas bases traçar-se-ia mais tarde o celebre plano GOELRO (plano de eletrificação do país), que hoje se acha ultrapassado.
O Congresso combateu o grupo do “centralismo democrático”, grupo contrário ao Partido, que se manifestava contra o princípio da direção e da responsabilidade individuais nas empresas industriais e defendia o sistema da direção “coletiva” ilimitada e da irresponsabilidade na indústria. Os porta-vozes deste grupo antibolchevique eram Sapronov, Osinski e V. Smirnov. No Congresso, eram secundados por Rykov e Tomski.
Agressão dos “panis” polacos – Aparecimento do general Wrangel – Fracasso do plano dos polacos – Fim da intervenção armada
Apesar do esmagamento de Kolchak e Denikin, apesar do país soviético aumentar cada vez mais seu território, libertando do poder dos brancos e dos intervencionistas a região do Norte, o Turquestão, Sibéria, o Don, Ucrânia etc., e apesar da Entente se ver obrigada a levantar o bloqueio da Rússia, os Estados da Entente não se queriam resignar à idéia de que o poder soviético fosse inexpugnável e saísse vencedor. Decidiram, então, empreender uma nova tentativa de intervenção. Desta vez, mobilizaram para a empresa, de uma parte, Pilsudski, nacionalista contra-revolucionário burguês, que era, de fato, o chefe do Estado polaco, e de outra parte o general Wrangel, que havia reunido na Crimeia os restos do exército de Denikin, ameaçando de lá a bacia do Donetz e a Ucrânia.
A Polônia dos “panis” (a nobreza latifundiária polaca) e Wrangel eram, segundo a expressão de Lênin, os dois braços do imperialismo internacional que tentavam estrangular o país soviético.
O plano dos polacos era: ocupar a parte da Ucrânia Soviética situada à direita do Dnieper, anexar o território Soviético da Bielorússia, instaurar nessas regiões o Poder dos “panis” polacos, estender as fronteiras do Estado polaco “de mar a mar”, isto é, de Dantzig a Odessa, e, em pagamento pela ajuda que lhes prestaria Wrangel, ajudar este a destruir o Exército Vermelho e restaurar na Rússia Soviética o poder dos latifundiários e capitalistas.
Este plano foi aprovado pelos Estados da Entente.
As tentativas do governo soviético de entrar em negociações com a Polônia para manter a paz e impedir a guerra não deram resultado nenhum. Pilsudski não queria falar em paz. Pilsudski queria a guerra. Especulava com a idéia de que os combatentes do Exército Vermelho, cansados das campanhas de Kolchak e Denikin, seriam esmagados pelas tropas polacas.
A breve trégua terminou.
Em abril de 1920, as tropas polacas lançaram-se sobre a fronteira da Ucrânia Soviética e ocuparam a cidade de Kiev. Ao mesmo tempo, Wrangel passou à ofensiva e começou a ameaçar a bacia de Donetz.
Como réplica ao ataque das tropas polacas, as tropas do Exército Vermelho lançaram uma contra-ofensiva em toda à frente. Depois de libertar a cidade de Kiev, e de expulsar os “panis” polacos da Ucrânia e da Bielorússia, os combatentes vermelhos da frente Sul chegaram, em impetuoso avanço, até as portas de Lemberg, na Galitzia, enquanto que as tropas da frente ocidental se aproximaram de Varsóvia. A derrota total do exército dos “panis” polacos era iminente.
Mas os manejos de Trotsky e seus adeptos do Estado Maior Central do Exército Vermelho frustraram os êxitos. A ofensiva das tropas vermelhas da frente ocidental em direção a Varsóvia se desenvolveu – por culpa de Trotsky e de Tukachevski – sem organização alguma: não se fez com que as tropas fortificassem as posições conquistadas; as unidades que marchavam na frente se afastaram demasiado do resto das forças; as reservas e as munições ficaram atrasadas na retaguarda com o que as unidades da vanguarda se viam abandonadas, sem munições e sem reservas: a linha de frente era interminavelmente longa, podendo, portanto, romper-se a frente com grande facilidade. Assim se explica que, quando um pequeno grupo de tropas polacas rompeu a frente ocidental do Exército Vermelho num de seus pontos, as tropas vermelhas, que estavam sem munições, se viram em má situação, obrigadas a se retirar. Quanto às tropas da frente Sul, que se achavam às portas de Lemberg, onde mantinham os polacos em má situação, o triste “presidente do Conselho Revolucionário de Guerra”, Trotsky, lhes proibiu que tomassem a cidade e ordenou que o exército de cavalaria, isto é, a principal força da frente Sul, se dirigisse a um ponto longe da frente Noroeste, sob pretexto de que se tratava de socorrer a frente ocidental, ainda que não fosse difícil compreender que a única e a melhor ajuda que se podia prestar a esta frente era a tomada da cidade de Lemberg. Ao contrário, retirar da frente Sul o exército de cavalaria, afastando-o de Lemberg, equivalia, de fato, a fazer extensiva à frente meridional a retirada das tropas do Exército Vermelho. Assim foi como a ordem sabotadora de Trotsky impôs às tropas do Exército Vermelho da frente Sul, com alegria dos “panis” polacos, uma retirada inconcebível e absolutamente injustificável.
Com esta manobra, se ia efetivamente, em socorro, não de nossa frente ocidental, mas dos “panis” polacos e da Entente.
Alguns dias depois, conteve-se a ofensiva das tropas polacas, e o Exército Vermelho começou a se preparar para um novo ataque. A Polônia, porém, que carecia de forças para prosseguir a guerra e que, alarmada, esperava o contra-ataque dos vermelhos, foi obrigada a renunciar às suas ambições a respeito da ocupação do território ucraniano situado à margem direita do Dnieper e da Bielorússia, propondo ao governo soviético a paz. Em 20 de Outubro de 1920, assinou-se em Riga o tratado de paz com a Polônia, em virtude do qual esta conservava o território da Galitzia e uma parte da Bielorússia.
Depois de estabelecer a paz com a Polônia, a República Soviética decidiu terminar com Wrangel. Este recebera dos ingleses e dos franceses novas remessas de armas moderníssimas: carros blindados, tanques, aviões e munições em abundância. Dispunha de unidades brancas de choque, formadas, principalmente, por oficiais.
Não logrou, porém mobilizar um contingente mais ou menos considerável de camponeses e de cossacos em torno dos desembarques efetuados por ele no Kuban e no Don. Não obstante, aproximou-se da própria bacia do Donetz, ameaçando os centros carboníferos do país. A situação do poder soviético se complicava, além disso, porque o Exército Vermelho estava já, então, bastante cansado. As tropas vermelhas foram obrigadas a avançar em condições extremamente difíceis, atacando as tropas de Wrangel e lutando, ao mesmo tempo, com os bandos dos anarquistas de Majno, que ajudavam o general branco. Porém apesar de Wrangel ter em seu favor a superioridade da técnica, apesar de carecerem as tropas soviéticas de tanques, o Exército Vermelho expulsou Wrangel para península da Criméia. Em novembro de 1920, as tropas vermelhas tomaram as posições fortificadas de Perekop, irromperam na Criméia, esmagaram as tropas de Wrangel e libertaram essa península das mãos dos guardas brancos e dos intervencionistas. A Criméia passou a formar parte do território soviético.
Com o fracasso dos planos megalômanos dos polacos e a derrota de Wrangel terminou o período da intervenção.
No fim de 1920 a Transcaucásia começou a se ver livre do jugo dos nacionalistas burgueses: musavatistas no Azerbaijão, nacional mencheviques na Geórgia e dashnakes na Armênia. O poder soviético triunfou em Azerbaijão, Armênia e Geórgia.
Com isto, porém, não terminou completamente a intervenção. A intervenção armada dos japoneses no Extremo Oriente continuou até 1922. Houve, além disso, várias tentativas destinadas a organizar outra intervenção (tais como as do ataman Seminov e do barão Ungern, no Oriente, e a intervenção branco-finlandesa na Carélia, em 1921). Porém os principais inimigos do país do soviético, as forças fundamentais da intervenção, foram destruídas em fins de 1920.
A guerra dos intervencionistas estrangeiros e dos guardas brancos russos terminou com o triunfo dos Soviets.
A República Soviética soube defender sua liberdade e sua independência como Estado.
Assim terminaram a intervenção armada estrangeira e guerra civil.
Foi este um triunfo histórico do poder soviético.
Como e porquê o país soviético venceu as forças coligadas da intervenção anglo-franco-nipo-polaca e da contra-revolução dentro da Rússia
Procurando em qualquer dos grandes jornais europeus, ou americanos da época da intervenção, comprovar-se-á facilmente que nenhum escritor militar ou civil de maior destaque, nenhum conhecedor das coisas da guerra, acreditava no triunfo soviético. Ao contrário, todos os escritores de prestígio, todos os conhecedores dos assuntos da guerra, todos os historiadores das revoluções de todos os países e povos, todos as chamados homens de ciência gritavam em coro que os dias do poder soviético estavam contados, que sua derrota era inevitável.
Inspirava-lhe esta confiança no triunfo dos intervencionistas o fato do país não contar ainda com um Exército Vermelho organizado, de ter que criá-lo em plena marcha, por assim dizer, ao passo que os intervencionistas e os guardas brancos dispunham de um exército mais ou menos preparado.
Essa confiança era também inspirada no fato de que o Exército Vermelho não contava com quadros militares habilitados, já que a maioria dos comandos se passara para o campo da contra-revolução, enquanto que os intervencionistas e os guardas brancos possuíram bons quadros militares.
Era inspirada, além disso, no fato de que o Exército Vermelho dispunha de armas e munições em pequeno número e de má qualidade, em conseqüência do atraso da indústria de guerra da Rússia e da impossibilidade de recebê-las de outros países, posto que o bloqueio a mantinha isolada, enquanto que o exército dos intervencionistas e dos guardas brancos era abundantemente abastecido e o continuaria sendo com armas, munições e equipamentos de primeira classe.
Era inspirada, finalmente, no fato de que o exército dos intervencionistas e dos guardas brancos ocupava, então, as regiões mais ricas em víveres da Rússia, enquanto que o Exército Vermelho carecia destas bases e se achava mal abastecido.
E é verdade que nas unidades do Exército Vermelho notavam-se todas estas deficiências e penúrias.
Nisso, e somente nisso, tinham absoluta razão os senhores intervencionistas.
Como, então, se pode explicar que o Exército Vermelho, sobre o qual pesavam desvantagens tão consideráveis, derrotasse o exército dos intervencionistas e dos guardas brancos, que não contavam com elas?
1) O Exército Vermelho venceu, porque a política do poder soviético, em nome da qual combatia, era uma política que correspondia aos interesses do povo; porque o povo sentia e compreendia esta política como justa como a sua política própria, e a apoiava até o fim.
Os bolcheviques sabiam que um exército, que luta em nome de uma política falsa, de uma política que não conta com o apoio do povo, não pode vencer. Era isto o que ocorria ao exército dos intervencionistas e dos guardas brancos. Este exército contava com tudo: com comandos antigos e hábeis, com armamentos de primeira classe, com munições, com equipamentos, com provisões. Só lhe faltava uma coisa: o apoio e a simpatia dos povos da Rússia que não queriam, nem podiam apoiar a política dos intervencionistas e dos guardas brancos erigidos em “governantes”, política esta contrária ao povo. Por isto, o exército dos intervencionistas e dos guardas brancos foi derrotado.
2) O Exército Vermelho venceu, porque era um exército abnegado e fiel sem reservas ao seu povo, por cuja razão este o queria e o apoiava, como um exército de seu próprio sangue. O Exército Vermelho é filho do povo, e um exército como este, fiel ao seu povo como o filho fiel o é a sua mãe, conta sempre com o apoio do povo e tem necessariamente que vencer. Pelo contrário, o exército que vai contra o povo, forçosamente tem que sair derrotado.
3) O Exército Vermelho venceu, porque o poder soviético soube por em pé toda a retaguarda todo o país ao serviço dos interesses da frente. Um exército sem uma retaguarda forte, que apóie por todos os meios a frente, está condenado à derrota. Os bolcheviques sabiam disto; portanto, converteram todo o país em um acampamento de guerra, que abastecia a frente de armas, munições, equipamentos, provisões e reservas.
4) O Exército Vermelho venceu: a) porque os seus combatentes compreendiam os fins e as tarefas da guerra e tinham consciência da sua justeza; b) porque esta consciência da justeza dos fins e das tarefas da guerra fortalecia neles o espírito de disciplina e combatividade; c) porque isto fazia com que as massas de combatentes do Exército Vermelho dessem a cada passo, na luta contra o inimigo, provas de abnegação maravilhosa e de heroísmo de massas nunca visto.
5) O Exército Vermelho venceu, porque o núcleo dirigente da frente e da retaguarda do Exército Vermelho era o Partido Bolchevique, unido por sua coesão e sua disciplina, forte por seu espírito revolucionário e por sua decisão de afrontar qualquer sacrifício, contanto que triunfasse a causa comum, não superado por ninguém quanto à capacidade para organizar as massas de milhões de homens e dirigi-las acertadamente nas situações mais complicadas.
“Graças a que o Partido – disse Lênin – estava alerta, graças a que o Partido tinha uma disciplina severa, e a que a autoridade do Partido servia de traço de união entre todos os departamentos e organismos, e as palavras de ordem que o CC dava eram seguidas como por um só homem por dezenas, centenas, milhares, e em última instância, por milhões; graças a que se afrontavam os sacrifícios mais inauditos: só graças a tudo isto, pôde realizar-se o milagre que se realizou. Só graças a isto, apesar da dupla, da tríplice, da quádrupla campanha dos imperialistas da Entente e dos imperialistas do mundo inteiro, pudemos sair vencedores” (Lênin, t. XXV pág. 96, ed. russa).
6) O Exército Vermelho venceu: a) porque soube forjar nas suas fileiras chefes militares de novo tipo como Frunze, Voroshilov, Budiony e outros; b) porque nas suas fileiras lutavam heróis natos como Kotovski, Chapaiev, Lasó, Schors, Parkhomenko e tantos outros; c) porque a educação política do Exército Vermelho estava a cargo de militantes como Lênin, Stalin, Molotov, Kalinin, Sverdlov, Kaganovich, Ordzhonikidse, Kirov, Kuibyshev, Mikoian, Zhdanov, Andreev, Petrovski, Iaroslavski, Ezhov, Dzerzhinski, Schadienko, Meilis, Iruschev, Shvernik, Shkiriatov e outros; d) porque o Exército Vermelho tinha no seu seio, organizadores e agitadores tão destacados como os comissários de guerra, que com a sua atuação souberam cimentar as fileiras dos combatentes vermelhos, inculcaram-lhes o espírito de disciplina e de intrepidez guerreira, cortavam energicamente – de modo rápido e implacável – os atos de traição de alguns comandos, e pelo contrário, fortaleciam audaz e resolutamente a autoridade e o prestígio daqueles comandos que pertencessem ou não ao Partido, demonstravam a sua lealdade abnegada ao Poder Soviético e revelavam sua capacidade para dirigir com mão firme as unidades do Exército Vermelho.
“Sem os comissários de guerra, não teríamos Exército Vermelho”, dizia Lênin.
7) O Exército Vermelho venceu, porque na retaguarda dos exércitos dos guardas brancos, na retaguarda de Kolchak, Denikin, Krasnov e Wrangel, trabalhavam na clandestinidade uma série de excelentes bolcheviques, com e sem caderneta, que punham em pé os operários e camponeses e os sublevavam contra os intervencionistas e os guardas brancos, que solapavam a retaguarda dos inimigos do Poder Soviético, facilitando com isso os avanços do Exército Vermelho. É sabido por todos como os guerrilheiros da Ucrânia, da Sibéria, do Extremo Oriente, do Ural, da Bielorússia e da região do Volga minavam a retaguarda dos guardas brancos e dos intervencionistas, prestando assim ao Exército Vermelho uma ajuda inestimável.
8) O Exército Vermelho venceu, porque o país soviético não estava só na luta contra a contra-revolução dos guardas brancos e a intervenção estrangeira, porque a luta do poder soviético e os seus êxitos despertaram a simpatia e atraíram a ajuda dos proletários do mundo inteiro. Enquanto que os imperialistas tentavam estrangular a República Soviética com a intervenção e o bloqueio, os operários destes mesmos países imperialistas estavam ao lado dos Soviets e os ajudavam. Sua luta contra os capitalistas dos países inimigos da República Soviética contribuiu para que os imperialistas fossem obrigados a desistir da intervenção. Os operários da Inglaterra, da França e de outros países intervencionistas organizaram greves, negavam-se a embarcar armas e munições para os intervencionistas e os generais brancos e criavam “Comitês de ação” sob a palavra de ordem de “Fora às mãos da Rússia”.
“Tão rápido como a burguesia internacional – dizia Lênin – levanta a mão contra nós, os seus próprios operários lhe seguram o braço”. (Obra citada, pág. 405).
O País Soviético depois da liquidação da intervenção armada e da guerra civil – As dificuldades do período de restauração da economia
Depois de pôr fim à guerra, o país começou a encaminhar a obra de edificação pacífica da economia nacional. Era necessário restaurar a economia destruída, pôr em ordem a indústria, o transporte e a agricultura.
Esta obra de edificação pacífica se empreendeu em condições extraordinariamente difíceis. O triunfo na guerra civil não foi arrancado facilmente. O país estava arruinado pelos quatro anos de guerra imperialista e os três anos de luta contra a intervenção armada.
Em 1920, a produção global da agricultura, comparada com a de antes da guerra, era somente a metade. E tenha-se em conta que o nível da produção agrícola de antes da guerra era o mísero nível próprio da aldeia russa dos tempos do czarismo. O ano de 1920 foi, além disso, em muitas províncias, um ano de má colheita. A economia camponesa atravessava uma situação difícil.
Mais desastrosa ainda era a situação da indústria. A produção da grande indústria, em 1920, era quase sete vezes menor que a de antes da guerra. A maioria das fábricas estava parada e os poços mineiros destruídos e inundados. A metalurgia se encontrava em situação especialmente difícil. Durante todo ano de 1921, a fundição de ferro não passou de 116.300 toneladas, o que representava aproximadamente, 3% da produção de ferro fundido de antes da guerra. Havia grande escassez de combustível. O transporte estava desfeito. As reservas de metal e de artigos manufaturados, com que contava o país, estavam quase totalmente esgotadas. Escasseavam de modo alarmante os artigos de primeira necessidade: o pão, as gorduras, a carne, o calçado, as peças de roupa, os fósforos, o sal, o petróleo, o sabão.
Enquanto durou a guerra, o povo se resignava a suportar esta escassez, e às vezes, nem se quer se apercebia dela. Ao cessar a guerra, porém, começou a sentir que esta situação era insuportável e a exigir que fosse remediada imediatamente.
Os camponeses davam mostras de descontentamento. Sob o fogo da guerra civil, se formara e se consolidara a aliança político-militar entre os camponeses e a classe operária. Esta aliança se apoiava numa base concreta: o poder soviético dera aos camponeses a terra e os defendia contra os latifundiários e os kulaks; os camponeses forneciam aos operários os artigos alimentícios segundo o sistema de requisições.
Agora, porém, esta base era já insuficiente.
O Estado Soviético se via obrigado a apoderar-se com o regime de requisições de toda a sobra da produção dos camponeses, por exigirem assim as necessidades da defesa do país. Sem o regime das requisições, sem a política do comunismo de guerra, não teria sido possível triunfar na guerra civil. A política do comunismo de guerra foi imposta pela própria guerra, pela intervenção armada. Enquanto durou a guerra, os camponeses se submeteram às requisições e não se apercebiam da escassez de mercadorias, porém ao terminar a guerra e desaparecer a ameaça da volta dos latifundiários, começaram a manifestar seu descontentamento pela requisição das sobras dos produtos, do sistema da quotização, e a exigir que lhes fornecessem mercadorias em quantidade suficiente.
Todo o sistema do comunismo de guerra chocou-se, como dizia Lênin, com os interesses dos camponeses.
O descontentamento começava a repercutir também na classe operária. O proletariado suportou o peso principal da guerra civil, lutando heróica e abnegadamente contra as regiões dos guardas brancos e dos intervencionistas, contra o desastre econômico e a fome. Os melhores operários, os mais conscientes, os mais abnegados e disciplinados, eram os mais entusiasmados na luta pelo socialismo. Porém a desastrosa situação de desmoronamento da economia repercutia também sobre a classe operária. As poucas fábricas e empresas industriais que ainda trabalhavam diminuíram consideravelmente o seu ritmo de trabalho. Os operários foram obrigados a fazer toda a classe de ofícios, fabricar isqueiros, e, com um saco no ombro, ir procurar comida nas aldeias. Começava a vacilar o fundamento de classe da ditadura do proletariado; a classe operária ia se rarefazendo, parte dos operários emigrava para a aldeia, deixavam de ser operários, perdiam sua condição de classe. A fome e o cansaço engendravam o descontentamento de uma parte dos operários.
Ante o Partido, apresentava-se a tarefa de traçar uma nova orientação a respeito de todos os problemas da vida econômica do país, em consonância com a nova situação.
O Partido enfrentou a tarefa de traçar esta nova orientação a respeito dos problemas da edificação econômica do país.
O inimigo de classe não dormia, porém. Procurava aproveitar-se da difícil situação que atravessava a economia, procurava aproveitar-se do descontentamento dos camponeses. Estalaram sublevações de kulaks, organizadas pelos guardas brancos e os social-revolucionários, na Sibéria, na Ucrânia, na província de Tambov (a rebelião de Antonov). Começaram a se mover os elementos contra-revolucionários, de todos os matizes: mencheviques, social-revolucionários, anarquistas, guardas brancos e nacionalistas burgueses. O inimigo mudou os métodos táticos de luta.. Começou a se disfarçar com as cores soviéticas e sua palavra de ordem já não era o velho grito fracassado de “Abaixo os Soviets!”, e sim o novo grito de “Pelos Soviets, porém sem os comunistas!”.
Uma manifestação flagrante da nova tática do inimigo de classe foi à sublevação contra-revolucionária de Kronstadt, que estalou em Março de 1921, uma semana antes de começar o 10º Congresso do Partido. Esta sublevação foi dirigida pelos guardas brancos, em contato com os social-revolucionários, os mencheviques e representantes de Estados estrangeiros. Nos primeiros momentos, os sublevados se esforçaram em encobrir com a cortina “soviética” sua aspiração de restaurar o poder e a propriedade dos capitalistas e dos latifundiários. A sua palavra de ordem era: “Soviets sem comunistas!”.
A contra-revolução pretendia aproveitar-se do descontentamento das massas pequeno-burguesas para derrubar o Poder dos Soviets, sob uma palavra de ordem aparentemente soviética.
Duas circunstâncias contribuíram para facilitar a sublevação produzida em Kronstadt: o fato de haver piorado a contextura de classe dos marinheiros das guarnições dos navios de guerra e a débil organização bolchevique existente naquela base naval. Os velhos marinheiros que haviam tomado parte na Revolução de Outubro marcharam quase em bloco para a frente, onde se bateram heroicamente nas fileiras do Exército Vermelho. Entraram a servir na esquadra novas classes de marinheiros, não temperados na revolução. Estas novas classes se compunham de camponeses típicos que vinham diretamente da aldeia e nos quais se refletia o descontentamento da população do campo com o sistema da quotização. Além disso, a organização bolchevique de Kronstadt se encontrava então, muito enfraquecida por toda uma série de mobilizações para a frente. Estas circunstâncias permitiram aos social-revolucionários, aos mencheviques e aos guardas brancos penetrar sub-repticiamente em Kronstadt e ganhar esta base.
Os sublevados fizeram-se donos da magnífica fortaleza, da frota e de uma enorme quantidade de armas e munições. A contra-revolução internacional cantava vitória. Era prematuro, porém, o júbilo dos inimigos do poder soviético. As tropas soviéticas dominaram rapidamente os sediciosos. O Partido enviou contra os sublevados de Kronstadt os seus melhores filhos, os delegados do 10º Congresso, com o camarada Voroshilov à frente. Os combatentes do Exército Vermelho marcharam contra Kronstadt, pisando sobre uma delgada camada de gelo. O gelo se rompeu e muitos deles pereceram afogados. Foi necessário lançar-se ao assalto contra as fortalezas quase inexpugnáveis de Kronstadt. Mas a bravura e a abnegação revolucionária, o entusiasmo daqueles homens dispostos a dar sua vida pelo poder soviético, venceram. As tropas vermelhas tomaram de assalto a fortaleza de Kronstadt e a sublevação foi liquidada.
Discussão no Partido acerca dos Sindicatos – O 10º Congresso do Partido – A derrota da oposição – A Nova Política Econômica (NEP)
Para o Comitê Central do Partido, para a sua maioria leninista, era evidente que, depois de se terminar a guerra e de entrar no período de edificação pacífica da economia, não havia já razão para manter em pé o severo regime do comunismo de guerra, imposto pelas circunstâncias da guerra e do bloqueio.
O CC compreendia que desaparecera a necessidade da quotização, que era necessário substituir este sistema pelo imposto em espécie, para dar ao camponês a possibilidade de empregar como bem entendesse uma grande parte da sobra da sua produção. Compreendia que esta medida permitiria levantar a agricultura, incrementar a produção de cereais e os cultivos técnicos necessários para o desenvolvimento da indústria, ativar a circulação de mercadorias dentro do país, melhorar o abastecimento das cidades e assentar uma nova base econômica para a aliança entre os operários e camponeses.
O CC notava também que a reanimação da indústria constituía uma tarefa de primeiríssima ordem, porém entendia que não era possível conseguir isto sem interessar a classe operária e os seus sindicatos, que para ganhar os operários para esta causa era necessário convencê-los de que o desastre econômico era um inimigo tão perigoso para o povo como a intervenção armada e o bloqueio, e que o Partido e os sindicatos conseguiriam, indubitavelmente, sair vitoriosos desta tarefa, sempre e quando não atuassem sobre a classe operária por meio de ordens militares, seguindo os métodos aplicados na frente, onde era realmente necessário proceder deste modo, mas por meio da persuasão, por meio do convencimento.
Não pensavam, porém, todos os membros do Partido como o CC. Grupos da oposição – os trotskistas, a “oposição operária”, os “comunistas de esquerda”, os “centralistas democráticos”, etc. – achavam-se em um estado de confusão e de vacilação diante da passagem para a senda da edificação pacífica da economia. No Partido havia não poucos antigos mencheviques, social-revolucionários, bundistas, “borotbistas” e toda a sorte de seminacionalistas da periferia da Rússia. Em grande parte estes elementos aderiram a uns ou a outros grupos da oposição. Como não eram verdadeiros marxistas, nem conheciam as leis que regem o desenvolvimento econômico, nem tinham a têmpera dos militantes leninistas do Partido, esta gente não fazia mais que acentuar a dispersão e as vacilações dos grupos da oposição. Alguns deles entendiam que não era necessário afrouxar o severo regime do comunismo de guerra, mas pelo contrário, o que faltava era “continuar apertando os parafusos”. Outros opinavam que o Partido e o Estado deviam desinteressar-se do problema da restauração da economia nacional, deixando-o totalmente nas mãos dos sindicatos.
Era evidente que ante esta confusão apareceriam, em certos setores do Partido, pessoas dadas a discutir, diversos “lideres” da oposição, que pugnariam para arrastar o Partido a um debate.
E, com efeito, assim ocorreu.
A discussão começou pelo problema do papel dos sindicatos, apesar de não ser este, então, o problema mais importante na política do Partido.
O paladino da discussão e da luta contra Lênin e contra a maioria leninista do CC era Trotsky. Com o objetivo de agravar a situação, interveio na reunião dos delegados comunistas à 5ª Conferência dos Sindicatos de toda a Rússia, celebrada em começos de novembro de 1920, sustentando a duvidosa palavra de ordem de “apertar os parafusos” e “sacudir os sindicatos”. Exigia, além disso, que se procedesse à imediata “estatização dos sindicatos”. Trotsky era contrário ao método da persuasão das massas operárias e advogava transplantar aos sindicatos os métodos militares. Era contrário ao desenvolvimento da democracia dentro dos sindicatos e a provisão dos cargos sindicais por eleições.
Em vez do método da persuasão, sem o que seria inconcebível a atuação das organizações operárias, os trotskistas preconizavam o método da coação pura e simples, de mandar, sem admitir ponderações. Onde se apoderavam da direção sindical, os trotskistas, com sua política, não faziam mais que provocar nos sindicatos conflitos, divisões e discórdias. Com a sua política, os trotskistas faziam com que a massa sem partido se colocasse contra este e semeavam a desunião da classe operária.
A discussão acerca dos sindicatos tinha, na realidade, uma importância que transcendia em muito os limites do problema sindical. Como mais tarde assinalou a resolução do pleno do CC do Partido Comunista (b) da Rússia (17 de janeiro de 1925), de fato a polêmica girava em torno da atitude que se devia tomar com os camponeses que se rebelavam contra o comunismo de guerra, em torno da atitude que se devia tomar com a massa de operários sem partido, e em geral, em torno do método de como o Partido devia abordar as massas, num período em que a guerra civil já havia terminado (Resoluções do PC (b) da URSS, parte I, pág. 651).
Depois de Trotsky, intervieram também outros grupos contrários ao Partido: a “oposição operária” (Shliapnikov, Medvediev, Kolontai e outros), os “centralistas democráticos” (Sapronov, Drobin, Boguslavski, Osinski, V. Smirnov, etc.), e os “comunistas de esquerda” (Bukharin e Preobrazhenski).
A “oposição operária” formulava a palavra de ordem de entregar a direção de toda a economia nacional ao “Congresso de produtores de toda a Rússia”. Reduzia a zero o papel do Partido e tirava toda a significação à ditadura do proletariado no terreno da edificação econômica. Contrapunha os sindicatos ao Estado Soviético e ao Partido Comunista. Segundo ela, a forma mais alta de organização da classe operária não era o Partido, e sim os sindicatos. No fundo, a “oposição operária” era um grupo de tipo anarco-sindicalista, contrário ao Partido.
O grupo do “centralismo democrático” (os deístas) reivindicava a liberdade mais completa para a formação de frações e grupos dentro do Partido. Como os trotskistas, os “centralistas democráticos” se esforçavam em solapar o papel dirigente do Partido dentro dos Soviets e dos Sindicatos. Lênin dizia deles que eram a fração “dos que gritavam mais forte”, e que a sua plataforma era social-revolucionária-menchevique.
Na luta contra Lênin e o Partido, Trotsky foi ajudado por Bukharin. Foi este quem, em união com Preobrazhenski, Serebriakov, e Sokolnikov, criou um grupo “pára-choque”. Este grupo defendia e encobria os divisionistas mais perniciosos: os trotskistas. Lênin qualificou a conduta de Bukharin como “o cúmulo da decomposição ideológica”. Pouco depois os bukharinistas se uniram abertamente aos trotskistas contra Lênin.
Lênin e os leninistas dirigiam, principalmente, os seus tiros contra os trotskistas, nos quais viam a força principal dos grupos antibolcheviques. Acusavam os trotskistas de confundir os sindicatos com organizações de tipo militar, fazendo-lhes ver que não era possível transplantar aos sindicatos os métodos próprios daquelas organizações. Em face da plataforma dos grupos de oposição, Lênin e os leninistas formularam a sua própria. Nesta se sustentava que os sindicatos eram uma escola de governo, uma escola de administração econômica e uma escola de comunismo. Os sindicatos deviam organizar todo o trabalho na base do método da persuasão. Só assim poderiam levantar todos os operários para a luta contra o desastre econômico e conseguiriam interessa-los pela obra da edificação socialista da economia nacional.
Na luta contra os grupos da oposição, as organizações do Partido cerraram as suas fileiras em torno de Lênin. A luta adquiriu um caráter especialmente agudo em Moscou. Era aí onde a oposição concentrava suas principais forças, ambicionando apoderar-se da organização do Partido nessa capital. Porém os bolcheviques de Moscou combateram devidamente as manobras dos divisionistas. A luta nas organizações do Partido na Ucrânia também se revestiu de caracteres agudos. Sob a direção do camarada Molotov que era então secretário do CC do Partido Comunista (b) da Ucrânia, os bolcheviques ucranianos esmagaram os sequazes de Trotsky e Shliapnikov. O Partido Comunista da Ucrânia continuou sendo um baluarte fiel do Partido Leninista. Em Baku, o esmagamento da oposição se organizou sob a direção do camarada Ordzhonikidse. Na Ásia Central, foi o camarada Lázaro Kaganovich quem dirigiu a luta contra os grupos contrários ao Partido.
Todas as organizações fundamentais de base do Partido aderiram à plataforma leninista.
Em 8 de março de 1921, o 10º Congresso do Partido inaugurou suas tarefas. Assistiram a ele 694 delegados com direito de palavra e voto, representando 732.521 filiados, e 296 delegados com palavra, porém sem voto.
O Congresso fez o balanço da discussão sobre os sindicatos e aprovou por uma maioria esmagadora a plataforma leninista.
No seu discurso de abertura do Congresso, Lênin declarou que esta discussão representava um luxo intolerável. Assinalou que o inimigo fazia seu jogo com a luta intestina e a discórdia dentro do Partido Comunista.
Notando o enorme perigo que representava para o Partido bolchevique e para a ditadura do proletariado a existência de grupos divisionistas, o 10º Congresso consagrou atenção especial ao problema da unidade do Partido. Acerca deste ponto Lênin deu o informe. O Congresso condenou todos os grupos da oposição e destacou que estes grupos “de fato, ajudam os inimigos de classe da revolução proletária”.
O Congresso ordenou a imediata dissolução de todos os grupos divisionistas e encarregou todas as organizações para que velassem rigorosamente pela execução desta resolução; bem entendido que o não cumprimento das decisões do Congresso acarretaria a expulsão indiscutível e imediata do Partido. O Congresso deu plenos poderes ao Comitê Central para que este, em caso de infração da disciplina por parte de qualquer dos seus membros e em caso de que ressuscitasse ou se permitisse qualquer fração, aplicasse quantas sanções de Partido fossem necessárias, chegando inclusive a expulsar do Comitê Central e do Partido quem infringisse suas resoluções.
Todas estas decisões figuravam em uma resolução especial “Sobre a unidade do Partido”, redigida por Lênin e aprovada pelo Congresso.
Nesta resolução, o Congresso chamava a atenção de todos os filiados ao Partido para o fato de que a unidade e a coesão dentro das suas fileiras, a unidade de vontade da vanguarda do proletariado era especialmente necessária num momento como aquele em que se celebrava o 10º Congresso do Partido, em que uma série de circunstâncias contribuíram para acentuar as vacilações existentes entre a população pequeno-burguesa.
“Entretanto – dizia-se na resolução do Congresso, – no Partido se tinham revelado, já antes da discussão entabulada em todas as suas organizações acerca dos sindicatos, alguns sintomas de divisionismo, isto é, de formação de grupos com uma plataforma especial e com a tendência a constituir até certo ponto grupos à parte com sua disciplina própria. É necessário que todo operário consciente compreenda claramente o caráter pernicioso e inadmissível de todo divisionismo, o qual conduz inevitavelmente, na prática, ao esfacelamento do trabalho fraternal e às tentativas acentuadas e repetidas dos inimigos, que se infiltram sempre nas fileiras de um Partido governamental, com o objetivo de aprofundar as dissensões dentro deste e servir-se delas para os fins da contra-revolução”. Em outro lugar desta mesma resolução, dizia o Congresso:
“De que forma os inimigos do proletariado se aproveitam de todos os desvios da linha comunista, rigorosamente traçada, revelou-o de modo bem claro o exemplo da sublevação de Kronstadt, na qual a contra-revolução burguesa e os guardas brancos de todos os países do mundo se mostraram imediatamente dispostos a acatar inclusive a palavra de ordem do regime soviético, na medida em que pudessem derrubar a ditadura do proletariado na Rússia, no que os social-revolucionários e a contra-revolução burguesa, em geral, deram acolhidas, em Kronstadt, à palavra de ordem da insurreição simulando fazê-lo em nome do Poder Soviético contra o Governo Soviético da Rússia. Estes fatos demonstram plenamente que os guardas brancos aspiram a disfarçar-se e sabem disfarçar-se de comunistas e até de gente ainda “mais esquerdista” que eles, com o fim de enfraquecer e derrubar o baluarte da revolução proletária na Rússia.
Os folhetos mencheviques que circularam em Petrogrado nas vésperas da sublevação de Kronstadt revelam ao mesmo tempo como os mencheviques se aproveitavam das discrepâncias existentes dentro do Partido Comunista da Rússia, para estimular e apoiar de fato os sediciosos de Kronstadt, os social-revolucionários e guardas brancos, embora de palavra se fizessem passar por adversários dos sediciosos e partidários do poder soviético, do qual segundo eles, só os separavam algumas diferenças de pouca monta”.
A resolução indicava que a propaganda do Partido devia explicar minuciosamente quão pernicioso era o divisionismo do ponto de vista da unidade do Partido e da consecução da unidade de vontade da vanguarda do proletariado, como condição fundamental para o triunfo da ditadura proletária.
De outra parte, a propaganda do Partido – dizia a citada resolução do Congresso – devia explicar a peculiaridade dos novíssimos métodos táticos postos em prática pelos inimigos do poder soviético.
“Estes inimigos – destacava a resolução, – convencidos do fracasso irremediável da contra-revolução sob a bandeira descarada dos guardas brancos, encaminham agora todos os seus esforços, aproveitando-se das dissensões existentes dentro do Partido Comunista da Rússia, para passar de contrabando a contra-revolução por meio da entrega do poder aos grupos políticos mais dispostos, em aparência, ao reconhecimento do Poder Soviético”. (Resoluções do PC (b) da URSS”, parte I, págs. 373-374).
Esta resolução indicava, ao mesmo tempo, que a propaganda do Partido “devia explicar também a experiência das anteriores revoluções, em que a contra-revolução apoiava os grupos pequeno-burgueses mais próximos do partido revolucionário mais avançado, para fazer vacilar e derrubar a ditadura revolucionária, abrindo assim o caminho para dar, a seguir, o triunfo completo à contra-revolução, aos capitalistas e aos latifundiários”.
Intimamente unida à resolução “Sobre a unidade do Partido” se achava outra resolução “Sobre o desvio sindicalista e anarquista dentro do nosso Partido”, também igualmente aprovada pelo Congresso por proposta de Lênin. Nesta resolução, o 10º Congresso condenava a chamada “oposição operária”. O Congresso considerou que a propaganda das idéias do desvio anarco-sindicalista era incompatível com o fato de militar no Partido Comunista e exortava o Partido a lutar resolutamente contra este desvio.
O 10º Congresso tomou a importantíssima resolução de passar do sistema da quotização ao do imposto em espécie, de passar à nova política econômica (“NEP”).
Esta mudança do comunismo de guerra para a “nova política econômica” revela toda a sabedoria e a profundidade de visão da política leninista.
Na resolução do Congresso, tratava-se da substituição do regime das quotas pelo do imposto em espécie. Este imposto era menor que o da quotização. O valor de imposto se devia tornar público antes da semeadura da primavera, os prazos de entrega do imposto se assinalavam com toda a precisão. Tudo que excedesse do imposto se deixava à livre e plena disposição do camponês, a quem se concedia liberdade de vender esses produtos. A principio, a liberdade de venda se traduzia – dizia Lênin no seu informe – em uma certa reanimação do capitalismo dentro do país. Será necessário consentir o comércio privado e autorizar aos particulares dedicados à indústria a abertura de pequenas empresas. Não havia, porém motivo para ter medo disso. Lênin entendia que uma certa liberdade de circulação de mercadorias estimularia o interesse econômico do camponês, incrementaria a produtividade do seu trabalho e elevaria rapidamente o rendimento da agricultura; que sobre esta base se restauraria a indústria do Estado e se desalojaria o capital privado; que depois de acumular forças e recursos, se poderia criar uma potente indústria, base econômica para o socialismo, e logo depois passar decididamente à ofensiva, para destruir os restos do capitalismo dentro do país.
O comunismo de guerra foi a tentativa de tomar de assalto, atacando de frente a fortaleza dos elementos capitalistas da cidade e do campo. Neste ataque, o Partido avançou demasiado, expondo-se ao perigo de perder o contato com sua base. Agora, Lênin propunha efetuar um pequeno recuo, retroceder provisoriamente para se aproximar da retaguarda, passar da luta por assalto ao método mais lento de cercar a fortaleza, para acumular forças, e logo depois se lançar de novo ao ataque.
Os trotskistas e outros elementos da oposição entendiam que a NEP era, exclusivamente, uma retirada. Esta interpretação favorecia os seus interesses, já que a linha que eles seguiam era a de restaurar o capitalismo. Esta, porém era uma interpretação da NEP, profundamente perniciosa e antileninista. Com efeito, um ano depois de se implantar a NEP, no 11º Congresso do Partido, Lênin declarava que o recuo havia terminado e lançou a seguinte palavra de ordem: “Preparação da ofensiva contra o capital privado” (Lênin t. XXVII pág. 213, ed. russa).
Os elementos da oposição, que eram maus marxistas e supinamente ignorantes em matéria de política bolchevique, não compreendiam nem a essência da NEP, nem o caráter do recuo empreendido ao se iniciar esta. Da essência da NEP já falamos. Com relação ao caráter do recuo, diremos que há várias classes de recuo. Há momentos em que os partidos ou os exércitos se vêm obrigados a recuar por terem sofrido uma derrota, e nestes casos o exército ou o partido recua para se salvar e salvar seus quadros com vistas a novos combates. Não era esta a classe de recuo que Lênin propusera ao se implantar a NEP, já que o Partido, não só não havia sofrido uma derrota, nem estava vencido, senão que, pelo contrário, era ele quem havia derrotado os intervencionistas e os guardas brancos na guerra civil. Mas há também momentos, em que um partido ou um exército vitorioso, em seu ataque, avança demasiado, sem deixar assegurada uma base na retaguarda. E isto constitui um perigo grave. Em tais casos, um partido ou um exército experimentado sente em geral, para não perder o contato com sua base, a necessidade de retroceder um pouco, aproximando-se da retaguarda, para estabelecer um contato mais forte com sua base nela, assegurando-se de tudo aquilo que necessita, e poder logo depois lançar-se de novo ao ataque, com maior segurança e garantia de êxito. Esta classe de recuo temporário era precisamente a que Lênin aplicara com a NEP. Informando perante o 4º Congresso da Internacional Comunista acerca das causas que obedecera a implantação da NEP, Lênin declarou publicamente que “com a nossa ofensiva econômica tínhamos avançado demasiado e não tínhamos assegurado uma base suficiente”, razão por que foi necessário efetuar um recuo passageiro para a retaguarda consolidada.
A desgraça da oposição estava em que não compreendia, na sua ignorância, nem compreendeu até o fim dos seus dias, esta característica peculiar que o recuo da NEP representava.
A resolução do 10º Congresso acerca da NEP assegurava uma sólida aliança econômica entre a classe operária e os camponeses para a edificação do socialismo.
Outra das resoluções do Congresso, que perseguia também esta finalidade fundamental, era a referente ao problema nacional.
O informe acerca deste ponto ficou a cargo do camarada Stalin. Acabamos – disse o camarada Stalin – com a opressão nacional, porém isto não basta. O problema consiste em acabar com a onerosa herança do passado, com o atraso econômico, político e cultural dos antigos povos oprimidos. É necessário ajudá-los a se colocar, a este respeito, no nível da Rússia Central.
O camarada Stalin destacava, além disso, dois desvios contrários ao Partido no tocante ao problema nacional: o chauvinismo grão russo, e o do nacionalismo localista. O Congresso condenou ambos os desvios como perniciosos e perigosos para o comunismo e o internacionalismo proletário. Ao mesmo tempo, porém, dirigiu seus ataques, principalmente, já que representava o perigo fundamental, contra o chauvinismo grão-russo, isto é, contra os vestígios e as sobrevivências da atitude que os chauvinistas grão-russos adotavam ante as nacionalidades não russas, sob o czarismo.
Primeiros resultados da “NEP” – O 11º Congresso do Partido – Fundação da URSS – Enfermidade de Lênin – O Plano Cooperativo de Lênin – O 12º Congresso do Partido
A implantação da NEP chocou-se com a resistência dos elementos instáveis do Partido. Esta resistência vinha de dois lados. De uma parte, atuavam os tagarelas de “esquerda”, abortos políticos no estilo de Lominadse, Shatskin e outros, os quais “demonstravam” que a NEP era a renúncia às conquistas da Revolução de Outubro, a volta ao capitalismo, o afastamento do Poder Soviético. Sua ignorância em matéria de política e seu desconhecimento das leis do desenvolvimento econômico incapacitavam estes indivíduos para compreender a política do Partido e faziam-nos cair no pânico e fomentar em torno de si um ambiente de desmoralização, de decadência. De outra parte, atuavam os capituladores declarados, da estirpe de Trotsky, Radek, Zinoviev, Sokolnikov, Kamenev, Shliapnikov, Bukharin, Rykov e outros que não tinham fé na possibilidade de desenvolvimento socialista do país soviético, prosternavam-se ante a “potência” do capitalismo e, aspirando a fortalecer as posições dele no país dos Soviets, exigiam que se fizessem grandes concessões ao capital privado, tanto dentro do país como fora dele, e que se lhe desse uma série de postos importantes na economia nacional, à base de concessões ou de sociedades por ações mistas com participação do capital privado.
Nem uns nem outros tinham nada a ver com o marxismo, com o leninismo. O Partido desmascarou e isolou uns e outros elementos, dando uma réplica contundente aos semeadores de pânico e aos capituladores.
Esta resistência que se opunha à política do Partido mostrava uma vez mais a necessidade de depurar este dos elementos pouco firmes. Com relação a isso, o CC desenvolveu um grande trabalho de fortalecimento do Partido, organizando em 1921 a depuração de suas fileiras. A depuração foi feita nas assembléias públicas, com intervenção dos sem partido. Lênin aconselhava que se depurasse conscienciosamente o Partido “dos malandros, dos elementos burocratizados, dos indivíduos pouco honrados, dos comunistas vacilantes e dos mencheviques que, embora tivessem rebocado sua ‘fachada’, em espírito continuavam sendo mencheviques” (Lênin, t. XXVII, pág. 13 ed. russa).
Como conseqüência desta depuração, foram expulsas do Partido, em conjunto, 170.000 pessoas, ou seja, cerca de 25% do total de filiados.
Esta depuração fortaleceu consideravelmente o Partido, melhorou a sua contextura social, reforçou a confiança das massas no Partido e fez com que aumentasse a sua autoridade. A coesão e o grau de disciplina do Partido cresceram.
O primeiro ano de aplicação da nova política econômica evidenciou a justeza desta política. A mudança para a NEP fortaleceu consideravelmente a aliança entre os operários e os camponeses, sobre uma nova base. Aumentaram a potência e a fortaleza da ditadura do proletariado. Liquidou-se quase totalmente o banditismo dos kulaks. Depois da abolição do sistema de quotas, os camponeses médios ajudaram o poder soviético a lutar contra aqueles bandos. O poder soviético conservava nas suas mãos todas as posições de direção da economia nacional: a grande indústria, os transportes, os bancos, a terra, o comércio interno e externo. O Partido conseguiu mudar decisivamente a frente econômica. Manifestaram-se os primeiros êxitos no campo da indústria e dos transportes. Iniciou-se um avanço, lento no começo, é verdade, porém indubitável, no terreno da economia. Os operários e os camponeses sentiam e viam que o Partido estava em bom caminho.
Em março de 1922, se reuniu o 11º Congresso do Partido. Assistiram a ele 522 delegados com direito de palavra e voto, representando 532.000 filiados; isto é, menos que no Congresso anterior. Os delegados com palavra, porém sem voto, eram 165. A diminuição da cifra dos filiados se explica pela depuração das fileiras do Partido, que já tinha começado.
Neste Congresso, foi feito o balanço do primeiro ano da nova política econômica. Os resultados obtidos permitiram a Lênin declarar perante o Congresso:
“Durante um ano, retrocedemos. Agora, devemos declarar em nome do Partido: Basta! O objetivo que perseguíamos com o nosso recuo foi alcançado. Este período chega ao seu fim ou já finalizou. Agora, passa ao primeiro plano outro objetivo: reagrupar as forças.” (Lênin, t. XXVIII, pág. 238, ed. russa).
Lênin destacou que a NEP era uma luta desesperada, uma luta de vida ou de morte, entre o capitalismo e o socialismo. “Quem vencerá a quem?”, assim estava proposto o problema. Para vencer, era necessário assegurar os laços entre a classe operária e os camponeses, entre a indústria socialista e a economia camponesa, desenvolvendo por todos os meios o intercâmbio de mercadorias entre a cidade e o campo. Para isto era preciso aprender a administrar, era preciso aprender a comercializar de um modo inteligente.
Neste período, o elo fundamental da cadeia de tarefas que se apresentavam ao Partido era o comércio. Sem resolver este problema, era impossível desenvolver o intercâmbio de mercadorias entre a cidade e o campo, era impossível fortalecer a aliança econômica entre os operários e os camponeses, era impossível levantar a economia rural e tirar do marasmo a indústria.
Naquele momento, o comércio soviético era ainda muito débil. O aparelho comercial era muito fraco, os comunistas não tinham hábitos comerciais, ainda não conheciam a fundo o inimigo – “nepman” – nem tinham aprendido a lutar contra ele. Os comerciantes privados, os nepman, aproveitando-se da debilidade do comércio soviético, se apoderaram do comércio dos artigos manufaturados e de outras mercadorias de fácil colocação. O problema da organização de um comércio de Estado e de um comércio cooperativo adquiria uma imensa importância.
Depois do 11º Congresso, tomou novas forças o trabalho de tipo econômico. Foram liquidadas com êxito as conseqüências acarretadas pela má colheita. A economia camponesa ia-se refazendo rapidamente. O funcionamento das estradas de ferro se aperfeiçoava. Aumentava sem cessar o número de fábricas e empresas industriais que trabalhavam.
Em outubro de 1922, a República Soviética festejou um grande triunfo: O Exército Vermelho e os guerrilheiros do extremo-oriente limparam a cidade de Vladivostok dos intervencionistas japoneses, que era o único setor do território soviético ocupado ainda pelos invasores. Agora que todo o território soviético estava limpo de intervencionistas, que as tarefas da edificação do socialismo e da defesa do país exigiam que se fortalecesse ainda mais a união dos povos soviéticos, pôs-se na ordem do dia o problema de aglutinar mais estreitamente ainda as Repúblicas Soviéticas dentro de uma União de Estados. Era necessário unificar todas as forças populares para a construção do socialismo. Era necessário organizar energicamente a defesa do país. Era necessário assegurar o pleno desenvolvimento de todas as nacionalidades da Pátria socialista. Para conseguir isto, compunha-se a necessidade de agrupar mais estreitamente ainda todos os povos do país soviético.
Em dezembro de 1922, celebrou-se o primeiro Congresso dos Soviets de toda a União. Neste Congresso fundou-se por proposta de Lênin e Stalin a união voluntária e livre formada pelos Estados dos povos soviéticos: a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Faziam parte da URSS, no inicio, a República Socialista Federativa Soviética da Rússia (RSFSR), a República Socialista Federativa Soviética da Transcaucásia (RSFST), a República Socialista Soviética da Ucrânia, (USSU) e a República Socialista Soviética da Bielorússia (RSSB). Pouco tempo depois, se constituíram na Ásia Central três Repúblicas Soviéticas independentes dentro da União: as Repúblicas do Uzbequistão, Turcomenistão e Tadzikistão. Todas estas Repúblicas se agruparam na União dos Estados Soviéticos, a URSS, sobre a base de sua livre vontade, com direitos iguais, e conservando cada uma delas a faculdade de abandonar livremente a União Soviética.
A fundação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas representava o fortalecimento do Poder Soviético e um grande triunfo da política leninista-stalinista do Partido Bolchevique a respeito do problema nacional.
Em novembro de 1922, Lênin interveio na sessão plenária do Soviet de Moscou. Fazendo o balanço dos cinco anos de existência do poder soviético, expressou a sua firme convicção de que “da Rússia da NEP sairia a Rússia socialista”. Foi o último discurso que pronunciou ante o país. No outono de 1922, o Partido experimentou uma grande desgraça: Lênin caiu gravemente enfermo. Todo o Partido, todos os trabalhadores, seguiam profundamente penalizados, a enfermidade de Lênin. Todo o país estava dependente, com angústia, daquela vida tão preciosa. Lênin, porém não interrompeu seu trabalho, apesar da enfermidade. Estando já gravemente doente, ainda escreveu uma série de artigos importantíssimos. Nestes artigos que foram os últimos, fazia o balanço do trabalho realizado e traçava o plano da construção do socialismo no país soviético, mediante a incorporação dos camponeses à obra da edificação socialista. Neste projeto, Lênin destacava o seu plano cooperativo, destinado a trazer os camponeses á causa da edificação do socialismo.
Lênin via na cooperação em geral, e na cooperação agrária em particular, o caminho exeqüível e lógico para milhões de camponeses, pelo qual se podia passar da pequena exploração individual para as grandes agrupações cooperativas da produção: kolkhoses. Destacava que o caminho pelo qual devia seguir o desenvolvimento da economia agrícola era de incorporar os camponeses à edificação socialista por meio da cooperação, ir infundindo gradualmente na agricultura os princípios do coletivismo, começando pela esfera da venda, para passar depois para a esfera da produção agrícola. Salienta que o regime da ditadura do proletariado e da aliança da classe operária com os camponeses, assegurada a direção dos camponeses pelo proletariado e com a existência de uma indústria socialista, a cooperação para a produção, da cooperação bem organizada que abarcasse milhões de camponeses, era o caminho pelo qual se poderia construir no país Soviético uma sociedade socialista completa.
Em abril de 1923, celebrou-se o 12º Congresso do Partido. Era o primeiro Congresso que se reunia, depois da tomada do poder pelos bolcheviques, sem a presença pessoal de Lênin. Tomaram parte nele 408 delegados com direito de palavra e voto, representando 386.000 filiados, isto é menos que no Congresso anterior. Era o resultado da persistente depuração das fileiras do Partido, em conseqüência da qual tinham sido expulsos dele uma percentagem considerável de filiados. A este Congresso, assistiram, além disso, 417 delegados com palavra, porém sem voto.
Nas resoluções tomadas pelo 12º Congresso foram levadas na devida conta todas as indicações feitas por Lênin nos seus últimos artigos e cartas.
O Congresso combateu energicamente todos os que interpretavam a NEP como um abandono das posições socialistas, como uma rendição destas posições ao capitalismo, todos os que se propunham entregar às garras deste. Foi isto o que preconizaram no Congresso os adeptos de Trotsky, Radek e Krasin. Estes se propunham entregar à mercê dos capitalistas estrangeiros, pôr nas suas mãos, a título de concessões, os ramos industriais de interesse vital para o Estado Soviético. Propunham pagar as dívidas do governo czarista, anuladas pela Revolução de Outubro. O Partido estigmatizou como traidoras estas propostas de capitulação. Não renunciava a empregar a política de concessões, porém só naqueles ramos e dentro daqueles limites que se tornassem vantajosos para o Estado Soviético.
Antes do Congresso, Bukharin e Sokolnikov tinham proposto pôr fim ao monopólio do comércio exterior. Esta proposta era também o resultado da interpretação da NEP como a entrega das posições soviéticas ao capitalismo. Lênin estigmatizou então Bukharin como defensor dos especuladores, dos nepman e dos kulaks. O 12º Congresso rechaçou decididamente o atentado que se queria perpetrar contra a firmeza do monopólio do comércio exterior.
O Congresso combateu também a tentativa de Trotsky de impor ao Partido uma política funesta em relação aos camponeses. Destacou que não era lícito perder de vista o fato do predomínio que a pequena economia camponesa tinha dentro do país. Salientou que o desenvolvimento da indústria, incluindo a indústria pesada, não se devia chocar com os interesses das massas camponesas, porém se harmonizar com eles no interesse de toda a população trabalhadora. Estas resoluções eram dirigidas contra Trotsky, que preconizava a edificação da indústria por meio da exploração dos camponeses e que não reconhecia, de fato, a política da aliança entre o proletariado e os camponeses.
Trotsky propunha também o fechamento de grandes fábricas como as de “Putilov”, “Briansk” e outras, que interessavam à defesa do país, porém que, segundo ele, não eram rendosas. O Congresso rechaçou indignado, a proposta de Trotsky.
Por proposta de Lênin, formulada por meio de uma carta, o 12º Congresso criou um órgão de fusão da Comissão Central de Controle e da Inspeção Operária e Camponesa. A este órgão deu-se uma missão de responsabilidade: velar pela unidade do Partido, fortalecer a disciplina do Partido e do Estado e aperfeiçoar por todos os meios o aparelho do Estado Soviético.
O Congresso consagrou atenção especial ao problema nacional. Informou acerca deste ponto o camarada Stalin, que salientou a significação internacional da política soviética sobre o problema nacional.
Os povos oprimidos do Ocidente e do Oriente vêem na União Soviética o exemplo de como se deve resolver o problema nacional e de como se deve acabar com a opressão nacional. Destacou a necessidade de trabalhar energicamente para liquidar a desigualdade econômica e cultural entre os povos da União Soviética. E incitou todo o Partido para lutar decididamente contra os desvios referentes ao problema nacional: contra o chauvinismo grão-russo e contra o nacionalismo regionalista burguês.
No Congresso foram desmascarados os porta-vozes do desvio nacionalista e a sua política absorcionista a respeito das minorias nacionais. Atuavam, naquele momento, contra o Partido os porta-vozes do desvio nacionalista georgiano: Mdivani e outros. Estes elementos eram contrários à criação da federação transcaucásica e ao fortalecimento da amizade entre os povos da Transcaucásia. A sua atitude frente às outras nacionalidades da Geórgia era a de autênticos chauvinistas. Expulsavam de Tiflis a todos os não georgianos, principalmente os armênios, e decretaram uma lei, segundo a qual toda georgiana que contraísse matrimônio com um homem de outra nacionalidade perderia a sua cidadania georgiana. Contavam com o apoio de Trotsky, Radek, Bukharin, Serypnik e Rakovski.
Imediatamente depois do congresso, foi convocada uma conferência especial dos militantes das Repúblicas nacionais para tratar do problema nacional. Nela, foram desmascarados o grupo dos nacionalistas burgueses tártaros, Sultão-Galiev e outros, e o grupo dos porta-vozes do desvio nacionalista no Uzbequistão, constituído por Faisula Iodzhaiev e outros.
O 12º Congresso fez o balanço dos resultados obtidos nos dois anos da nova política econômica. Estes resultados infundiam ao espírito vigor e segurança no triunfo final.
“Nosso Partido continua sendo um Partido coerente, monolítico, resistente às maiores viradas e que marcha para a frente com as bandeiras desfraldadas”, – declarou no congresso o camarada Stalin.
A luta contra as dificuldades da restauração da economia nacional – Recrudesce a atividade dos trotskistas – Nova discussão dentro do Partido – Morte de Lênin – O 13º Congresso do Partido
Os primeiros anos de luta pela restauração da Economia nacional se traduziram em êxitos consideráveis. Em 1924, se percebia o progresso em todos os ramos da economia. A superfície semeada aumentou consideravelmente a partir de 1921; a economia camponesa se fortalecia cada vez mais. A indústria socialista crescia e se desenvolvia. Registrava-se um aumento numérico considerável da classe operária. Os salários se elevavam. Os operários e os camponeses começavam a viver melhor e com mais comodidade que em 1920 e 1921.
Apesar de tudo, porém, notavam-se os resultados de uma situação de desastre econômico ainda não liquidada. A indústria não tinha ainda atingido o nível de antes da guerra e o seu desenvolvimento se achava consideravelmente atrasado, em comparação com o aumento das necessidades do país. Em fins de 1923, registrava-se cerca de um milhão de operários sem trabalho; o lento desenvolvimento da economia nacional não permitia absorver e liquidar o desemprego. O comércio se desenvolvia com intermitências, em razão dos preços extraordinariamente elevados dos artigos industriais, preços que os especuladores e os nepman emboscados nas organizações comerciais soviéticas, impunham ao país.
Em relação com isto, o rublo soviético começou a experimentar fortes oscilações e a baixar de valor. Tudo isto contribuía para dificultar a melhora da situação dos operários e dos camponeses.
No outono de 1923, aumentaram as dificuldades econômicas, em conseqüência das infrações cometidas contra a política soviética de preços pelos organismos industriais e comerciais. Entre os preços das mercadorias industriais e dos produtos agrícolas existia grande desarmonia. Enquanto que o preço do trigo era baixo, os preços das mercadorias industriais eram desproporcionalmente elevados. Sobre a indústria pesavam, então, muitos gastos improdutivos e isto encarecia as mercadorias. O dinheiro que os camponeses obtinham pela venda do trigo se depreciava rapidamente. Achando que isto era pouco, o trotskista Piatakov, que ocupava então um posto no Conselho Supremo da Economia Nacional traçou aos militantes das organizações econômicas a norma criminosa de extrair maiores lucros da venda dos artigos industriais, elevando desregradamente os preços, com o pretexto de fomentar a indústria. Na realidade, esta palavra de ordem própria de um nepman, só podia conduzir a um resultado: reduzir a base da produção industrial e solapar a indústria. Nestas condições, os camponeses não podiam pensar em adquirir artigos industriais e deixavam de comprá-los. Deste modo, se iniciou uma crise do mercado, que repercutiu sobre a indústria. Surgiram dificuldades, para o pagamento dos salários, o que provocou o descontentamento dos operários. Em algumas fábricas, os operários menos conscientes abandonaram o trabalho.
O Comitê Central do Partido mostrou o caminho para superar todas estas dificuldades e deficiências. Foram tomadas medidas para acabar com a crise do mercado. Foram barateados os preços dos artigos, de consumo popular. Foi implantada uma reforma monetária adotando-se um padrão firme e estável: o chervonetz. Foi normalizado o pagamento dos salários. Esboçaram-se as medidas convenientes para desenvolver o comércio por intermédio dos organismos soviéticos e cooperativos, expulsando deles toda a classe de mercadores e especuladores.
Era preciso pôr mãos à obra com denodo, e todos unidos.
Assim era como pensavam e atuavam os homens fiéis ao Partido. Os trotskistas, porém, procediam de outro modo. Aproveitando-se da ausência de Lênin, que estava afastado da frente de batalha, devido à sua grave enfermidade, iniciaram uma nova agressão contra o Partido e contra sua direção. Decidiram que o momento indicado havia chegado para derrotar o Partido e derrubar sua direção. Na luta contra o Partido, se aproveitavam de tudo; da derrota sofrida pela revolução na Alemanha e na Bulgária no outono de 1923, das dificuldades econômicas existentes dentro do país, e da enfermidade de Lênin. Foi justamente neste momento difícil para o Estado Soviético, em que o chefe do Partido estava de cama, que Trotsky desencadeou o seu ataque contra o Partido bolchevique. Agrupando em torno de si todos os elementos antileninistas do Partido, arranjou uma plataforma oposicionista, plataforma que era dirigida contra o Partido, contra a sua direção e contra sua política. A esta plataforma se deu o nome de “declaração dos 46 oposicionistas”. Na luta contra o Partido leninista, se uniram todos os grupos da oposição: os trotskistas, os “centralistas democráticos”, os restos dos “comunistas de esquerda” e da “oposição operária”. Na sua declaração, estes elementos profetizavam uma terrível crise econômica e o afundamento do Poder Soviético e exigiam, como única solução, a liberdade para a existência de frações e grupos.
Era uma luta destinada a restabelecer as frações, que foram proibidas pelo 10º Congresso do Partido, por proposta de Lênin.
Os trotskistas não apresentavam nenhum problema concreto sobre o desenvolvimento da indústria ou da agricultura, sobre o aperfeiçoamento do regime de circulação das mercadorias dentro do país ou o melhoramento da situação dos trabalhadores. Além do mais, isso não lhes interessava. A única coisa que lhes interessava era aproveitarem-se da ausência de Lênin para restabelecer as frações dentro do Partido e solapar deste modo seus alicerces, minar seu Comitê Central.
Imediatamente depois da plataforma dos 46, foi publicada uma carta de Trotsky, na qual cobria de lama os quadros do Partido e dirigia uma série de novas calúnias contra este. Nesta carta Trotsky repetia as velhas cantilenas mencheviques, que o Partido estava cansado de ouvir dele.
Os trotskistas dirigiam sua agressão, principalmente, contra o aparelho do Partido, pois sabiam que o Partido não pode viver nem atuar sem um aparelho forte. A oposição se esforçava em solapar, em derrubar este aparelho, em enfrentar os filiados do Partido com o aparelho deste, e a juventude com os velhos quadros do Partido. Na carta, Trotsky especulava com a juventude estudantil, com os jovens filiados ao Partido, que ignoravam a história da luta deste contra o trotskismo. Para conquistar esta juventude estudantil, Trotsky a adulava, dizendo que ela era “o barômetro mais fiel do Partido”, ao mesmo tempo em que falava da degeneração da velha guarda leninista. Apontando os chefes degenerados da Segunda Internacional, sugeria, ignominiosamente, que a velha guarda bolchevique seguia pelo mesmo caminho. Com seus gritos sobre a degeneração do Partido, Trotsky tentava encobrir sua própria degeneração e os seus desígnios antibolcheviques.
Os dois documentos da oposição, a plataforma dos 46 e a carta de Trotsky foram distribuídos pelos trotskistas nos setores e nas células e postos para discussão entre os filiados ao Partido.
O Partido foi desafiado pelos trotskistas a uma contenda.
Repetia-se, pois, o que ocorrera antes do 10º Congresso do Partido, em virtude da discussão sobre a questão sindical: o Partido via-se arrastado pelos trotskistas a uma discussão, extensiva a todos os filiados.
Apesar de se achar ocupado em problemas de caráter econômico mais importantes, o Partido aceitou o repto e abriu a discussão.
A discussão foi extensiva a todo o Partido. Era uma luta inflamada. A contenda adquiriu caracteres especialmente agudos em Moscou. Os trotskistas aspiravam, de preferência, a se apoderar da organização da capital. A discussão, porém de nada serviu aos trotskistas, a não ser para evidenciar sua infâmia. Foram derrotados em toda a União Soviética. Só votou por eles um número reduzido de células pertencentes às Escolas Superiores e a organismos administrativos.
Em janeiro de 1924, se reuniu a 13ª Conferência do Partido. Nela o camarada Stalin pronunciou um informe, fazendo o balanço da discussão sustentada no Partido. A Conferência condenou a oposição trotskista, declarando que se tratava de um desvio pequeno burguês do marxismo. As resoluções desta Conferência foram referendadas posteriormente pelo 13ª Congresso do Partido e pelo 5º Congresso da Internacional Comunista. O proletariado comunista internacional apoiava o Partido bolchevique na sua luta contra o trotskismo.
Os trotskistas não cessaram, porém, seu trabalho de sapa. No outono de 1924, Trotsky publicou um artigo intitulado “Os ensinamentos de Outubro”, no qual tentava substituir o leninismo pelo trotskismo. Todo este artigo era uma calúnia contra o Partido Bolchevique e seu chefe, Lênin. Todos os inimigos do comunismo e do país soviético se aferravam a este livreco calunioso.
O Partido rechaçou com indignação estas calúnias de Trotsky contra a história heróica do bolchevismo. O camarada Stalin desmascarou a tentativa de Trotsky de substituir o leninismo pelo trotskismo, destacando, em suas intervenções, que “a missão do Partido consiste em enterrar o trotskismo, como corrente ideológica”.
Na obra de esmagamento ideológico do trotskismo e de defesa do leninismo, teve uma importância extraordinária o trabalho teórico do camarada Stalin intitulado: “Sobre os fundamentos do leninismo”, que veio à luz em 1924. Esta obra é uma exposição magistral e um sério fundamento teórico do leninismo, que então armou e continua armando hoje os bolcheviques do mundo inteiro com a arma afiada da teoria marxista-leninista.
Na luta contra o trotskismo, o camarada Stalin cerrou as fileiras do Partido em torno do seu Comitê Central e o mobilizou para continuar combatendo pelo triunfo do socialismo no país soviético. O camarada Stalin soube demonstrar que o esmagamento ideológico do trotskismo era condição imprescindível para assegurar o prosseguimento da marcha vitoriosa para o socialismo.
Fazendo o balanço deste período de luta contra o trotskismo, dizia o camarada Stalin:
“Sem esmagar o trotskismo não é possível triunfar dentro das condições da NEP, nem é possível conseguir a transformação da Rússia atual em uma Rússia Socialista”.
Porém, os êxitos da política leninista do Partido foram cobertos de tristeza pela enorme desgraça que o próprio Partido e a classe operária experimentaram. Em 21 de janeiro de 1924, morreu em Gorki, perto de Moscou, o nosso chefe e mestre, o fundador do Partido Bolchevique, Lênin. A notícia da morte de Lênin afetou a classe operária do mundo inteiro com a perda mais cruel. No dia do enterro de Lênin, o proletariado internacional suspendeu o trabalho durante cinco minutos. Pararam os trens, interromperam-se os trabalhos nas fábricas e oficinas. Os trabalhadores de todo o mundo acompanharam ao túmulo, com a mais profunda dor, seu pai e mestre seu melhor amigo e defensor, Lênin.
A classe operária da União Soviética respondeu à morte de Lênin cerrando ainda mais suas fileiras em torno do Partido leninista. Naqueles dias lutuosos, todo operário consciente meditou acerca da sua atitude ante o Partido Comunista, o Partido que punha em prática os mandamentos de Lênin. Ao Comitê Central do Partido chegaram milhares e milhares de declarações de operários sem partido, pedindo ingresso no Partido bolchevique. O Comitê Central, fazendo-se eco deste movimento dos operários de vanguarda, admitiu o ingresso em massa no Partido e abriu as portas deste à promoção leninista. Ingressaram no Partido novas dezenas de milhares de operários. Ingressaram nele os que estavam dispostos a dar a vida pela causa do Partido, pela causa de Lênin. Em pouco tempo, engrossaram as fileiras do Partido mais de 240.000 operários. Aderiu ao Partido a parte mais avançada da classe operária, a mais consciente e revolucionária, a mais audaciosa e disciplinada. Esta foi à promoção leninista de novos filiados ao Partido.
A morte de Lênin mostrou quanto as massas operárias estavam unidas ao Partido bolchevique e quanto o queriam como filho de suas entranhas.
No 2º Congresso dos Soviets da URSS, celebrado nos dias de luto pela morte de Lênin, o camarada Stalin pronunciou, em nome do Partido, um solene juramento, no qual disse:
“Nós, os comunistas, somos homens de uma têmpera especial. Somos feitos de fibra especial. Somos os que formamos o exército do grande estrategista proletário, o exército do camarada Lênin. Não há nada mais alto que a honra de pertencer a este exército. Não há nada superior ao título de membro do Partido cujo fundador e chefe é o camarada Lênin.
Ao nos deixar, o camarada Lênin nos legou o dever de manter bem alto e conservar em toda a sua pureza o grande título de membro do Partido. Nós te juramos, camarada Lênin, que executaremos com honra este mandato!…
Ao nos deixar, o camarada Lênin nos legou o dever de conservar e fortalecer a ditadura do proletariado. Nós te juramos, camarada Lênin, que não pouparemos esforço para executar com honra também este mandato!
Ao nos deixar, o camarada Lênin nos legou o dever de assegurar com todas as nossas forças, a aliança dos operários e camponeses. Nós te juramos, camarada Lênin, que executaremos com honra igualmente este mandato!
O camarada Lênin nos falava insistentemente da necessidade de uma aliança voluntária e livre entre os povos do nosso país, da necessidade da sua colaboração fraternal dentro dos limites da União Soviética da necessidade da sua colaboração fraternal dentro dos limites da União Soviética. Aos nos deixar, o camarada Lênin, nos legou o dever de reforçar e estender a União das Repúblicas. Nós te juramos, camarada Lênin, que executaremos com honra também este mandato!…
Lênin nos indicou repetidas vezes que o fortalecimento do Exército Vermelho e o seu aperfeiçoamento constituem uma das mais importantes tarefas do nosso Partido. Juremos, pois, camaradas, que não pouparemos esforço para fortalecer o nosso Exército Vermelho e a nossa Frota Vermelha!
Ao nos deixar, o camarada Lênin nos legou o dever de permanecermos fiéis aos princípios da Internacional Comunista. Nós te juramos, camarada Lênin, que não regatearemos nossa vida para fortalecer e estender a união dos trabalhadores de todo o mundo, a Internacional Comunista!“.
Tal foi o juramento do Partido bolchevique a seu chefe, Lênin, cuja obra perdurará através dos séculos.
Em maio de 1924, celebrou-se o 13º Congresso do Partido. Assistiram a ele 748 delegados com direito de palavra e voto, representando 735.881 filiados. O enorme aumento do número de filiados ao Partido, em comparação com o do Congresso anterior, tem sua explicação nos 250.000 ingressantes, aproximadamente, da promoção leninista. Os delegados com palavra, porém sem voto, eram 416.
O Congresso condenou unanimemente a plataforma da oposição trotskista, definindo-a como um desvio pequeno-burguês do marxismo, como uma revisão do leninismo e ratificou as resoluções votadas pela 13ª Conferência do Partido “Sobre a obra do desenvolvimento do Partido” e “Sobre os resultados da discussão”.
Partindo da tarefa de reforçar a coesão entre a cidade e o campo, o Congresso indicou a necessidade de continuar desenvolvendo a indústria, e em primeiro lugar, a industria leve, salientando, ao mesmo tempo, a necessidade de imprimir um rápido desenvolvimento à indústria metalúrgica.
O Congresso ratificou a criação do Comissariado do povo para o Comércio Interior e propôs a todos os organismos comerciais a tarefa de dominar o mercado e desalojar da órbita comercial o capital privado.
O Congresso propôs a tarefa de desenvolver o crédito do Estado a favor dos camponeses com juros baixos, desalojando da aldeia o agiota.
Como tarefa fundamental para a atuação no campo, o Congresso destacou a palavra de ordem de desenvolver por todos os meios a cooperação entre as massas camponesas.
Finalmente, o Congresso assinalou a enorme importância da promoção leninista e chamou a atenção do Partido para a necessidade de reforçar o trabalho de educação dos novos filiados ao Partido, e, sobretudo da promoção leninista, instruindo-os nos fundamentos do leninismo.
A URSS no final do período de restauração da economia nacional – O problema da edificação e do triunfo do socialismo no país soviético – A “nova oposição” de Zinoviev-Kamenev – O 14º Congresso do Partido
O Partido Bolchevique e a classe operária estavam já com quatro anos de luta tenaz pela rota da nova política econômica. O heróico trabalho de restauração da economia nacional chegava a seu fim. A potência econômica e política da União Soviética crescia sem cessar.
A situação internacional, naquele momento, havia mudado. O capitalismo fez frente ao primeiro assalto revolucionário das massas depois da guerra imperialista. Foi sufocado o movimento revolucionário na Alemanha, na Itália, na Bulgária, Polônia e noutra série de países. Os chefes dos partidos social-democratas oportunistas ajudaram a burguesia a conseguir isto. Iniciou-se um refluxo passageiro da revolução. Iniciou-se uma estabilização parcial e passageira do capitalismo na Europa Ocidental, de um fortalecimento temporário das suas posições. Porém a estabilização do capitalismo não suprimiu as contradições fundamentais que desagregam a sociedade capitalista. Pelo contrário: a estabilização parcial do capitalismo vinha acentuar as contradições entre os operários e os capitalistas, entre o imperialismo e os países coloniais, entre os grupos imperialistas dos diversos países. A estabilização do capitalismo preparava a nova explosão dessas contradições, gerava novas crises nos países capitalistas.
Paralelamente à estabilização do capitalismo, devolvia-se a estabilização da União Soviética. Entretanto, entre estes dois processos de estabilização mediava uma diferença radical. A estabilização capitalista pressagiava a nova crise do capitalismo. A estabilização da União Soviética representava um novo desenvolvimento da potência econômica e política do país do socialismo.
Apesar da derrota sofrida pela revolução nos países ocidentais, a situação internacional da União Soviética continuava se fortalecendo, embora com ritmo mais lento.
Em 1922, a União Soviética foi convidada para a Conferência Econômica Internacional que se celebrou na cidade italiana de Gênova. Na Conferência de Gênova, os governos imperialistas, animados pela derrota da revolução nos países do capitalismo, tentaram fazer uma nova pressão sobre a República dos Soviets, agora, sob uma forma diplomática. Os imperialistas formularam ao país dos Soviets reivindicações insolentes. Exigiam que fossem devolvidas aos capitalistas estrangeiros as fábricas e as empresas industriais nacionalizadas pela Revolução de Outubro e que se pagassem todas as dívidas contraídas pelo governo czarista. Em compensação, os estados imperialistas prometiam fazer ao Estado soviético alguns empréstimos.
A União Soviética rechaçou estas exigências.
A Conferência de Gênova foi infrutífera.
Também obteve a réplica adequada a ameaça de uma nova intervenção que o ultimato formulado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros da Inglaterra, Curzon, em 1923, representava.
Tendo sondado bem a firmeza do poder soviético, os Estados capitalistas, convencidos da própria debilidade, foram reatando um a um, as relações diplomáticas com o país dos Soviets. No transcurso do ano de 1924, se restabeleceram as relações diplomáticas com a Inglaterra, a França, o Japão e a Itália.
Era evidente que o poder soviético soube conquistar um período de trégua pacífica.
Tinha mudado também a situação dentro do país. O trabalho abnegado dos operários e dos camponeses dava seus frutos. A economia se desenvolvia rapidamente. No ano econômico de 1924-1925, a produção agrícola se aproximava já do nível de antes da guerra, pois tinha alcançado 87% deste nível. A grande indústria da URSS produzia, já em 1925, cerca de três quartas partes da produção industrial de antes da guerra. Em 1924-1925, o país soviético já pôde investir, em obras básicas, 385 milhões de rublos. O plano de eletrificação do país se realizava com êxito. As posições chaves do socialismo, na economia nacional, se firmavam. Foram obtidos importantes êxitos na luta contra o capital privado na indústria e no comércio.
O auge econômico se traduzia em um novo melhoramento da situação dos operários e dos camponeses. A classe operária crescia com ritmo acelerado. Os salários aumentavam. Aumentava também a produtividade do trabalho. A situação material dos camponeses melhorava consideravelmente. Em 1924-1925, o Estado operário e camponês pôde consignar 290 milhões de rublos para ajudar os camponeses pobres. O melhoramento da situação dos operários e camponeses contribuiu para incrementar em proporções consideráveis a atividade política das massas. A ditadura do proletariado se fortalecia: A autoridade e a influência do Partido estavam aumentando.
A restauração da economia nacional chegava a seu fim. Porém o país dos Soviets não podia dar-se por satisfeito com a restauração pura e simples da economia, com alcançar simplesmente o nível de antes da guerra. Este nível era o de um país atrasado. Era preciso continuar avançando. A longa trégua conquistada pelo Estado Soviético garantia a possibilidade de prosseguir a obra de edificação.
Ao chegar aqui, porém, surgia em toda a sua envergadura o problema das perspectivas, do caráter do nosso desenvolvimento e da nossa edificação, o problema da sorte do socialismo na União Soviética. Em que direção se devia orientar a edificação econômica da União Soviética, em direção do socialismo ou numa outra direção? Devia e podia o país soviético construir uma economia socialista, ou estava condenado a preparar o terreno para outra classe de economia, para uma economia capitalista? Era possível, em linhas gerais, construir uma economia socialista da URSS, e caso assim fosse, era possível construí-la ante a demora da revolução nos países capitalistas e a estabilização do capitalismo? Era possível construir uma economia socialista pela senda da nova política econômica, que ao mesmo tempo em que fortalecia e desenvolvia por todos os meios as forças do socialismo dentro do país, dava também, no momento, um certo incremento ao capitalismo? Como construir uma economia nacional de tipo socialista? Por onde começar esta obra de edificação?
Todas estas perguntas se levantavam ante o Partido, ao terminar o período de restauração da economia nacional, não já como problemas teóricos, e sim como problemas práticos, como problemas que afetavam o trabalho quotidiano da edificação econômica.
Eram todas estas perguntas que exigiam respostas claras e simples, para que os militantes do Partido e os dirigentes das organizações econômicas, os que constituíam a indústria e a agricultura, e todo o povo, soubessem para onde se deviam orientar, se para o socialismo ou para o capitalismo.
Sem responder claramente a estas perguntas, toda a atuação prática do Partido no terreno construtivo seria trabalho com falta de perspectivas, trabalho às cegas, estéril.
E, com efeito, o Partido deu a todas estas perguntas uma resposta clara e definida.
Sim – respondia o Partido – o país soviético pode e deve edificar uma economia socialista, pois existem nele todos os elementos necessários para isto, para construir uma economia socialista e para edificar uma sociedade socialista completa. Em outubro de 1917 a classe operária venceu o capitalismo no terreno político, instaurando sua ditadura política. De então para cá, o poder soviético tomou todas as medidas necessárias para destruir a potência econômica do capitalismo e criar as condições indispensáveis para edificar uma economia nacional de tipo socialista. A expropriação dos capitalistas e latifundiários, a conversão das terras, fábricas e empresas industriais, bancos e vias de comunicação, em propriedade de todo o povo; a implantação da nova política econômica; a organização de uma indústria socialista do Estado; a aplicação do plano cooperativo de Lênin: eis aí as medidas adotadas pelo poder soviético. A tarefa fundamental, agora, consiste em desenvolver por todo o país a obra de edificação de uma nova economia, da economia socialista, dando também assim o tiro de misericórdia no capitalismo no terreno econômico. Todo o trabalho prático, toda a atuação do Partido Bolchevique devem subordinar-se ao cumprimento desta tarefa fundamental. A classe operária pode fazer isto e o fará. A execução desta tarefa grandiosa deve começar pela industrialização do país. A industrialização socialista do país é o elo fundamental pelo qual há de começar a magna obra da edificação de uma economia nacional de tipo socialista. Nem a demora da revolução na Europa Ocidental, nem a estabilização parcial do capitalismo nos países não soviéticos, poderão conter a marcha vitoriosa da URSS para o socialismo. A nova política econômica só pode facilitar esta obra, pois foi implantada pelo Partido precisamente para isto, para facilitar a edificação dos alicerces socialistas da economia nacional do país.
Esta era a resposta que dava o Partido à pergunta acerca do triunfo da edificação socialista na União Soviética.
O Partido sabia, porém, que o problema do triunfo do socialismo em um só país não se reduzia a isto. A construção do socialismo na URSS representava uma grandiosa mudança na história da Humanidade e um triunfo de alcance histórico universal para a classe operária e os camponeses da URSS. Mas é, porém, apesar de tudo, uma incumbência interior da URSS e representa somente uma parte do problema do triunfo do socialismo. A outra parte do problema constitui seu aspecto internacional. Fundamentando as teses do triunfo do socialismo em um só país, o camarada Stalin assinalou mais de uma vez que é necessário distinguir entre os dois aspectos deste problema: O aspecto interior e o aspecto internacional. Pelo que se refere ao aspecto interior do problema, ou seja, a correlação de classes dentro do país, a classe operária e os camponeses da URSS poderão vencer plenamente no terreno econômico a sua própria burguesia e construir uma sociedade socialista completa. Fica, porém, o aspecto internacional do assunto, isto é, a órbita das relações exteriores, a órbita das relações entre o país soviético e os países capitalistas, entre o povo soviético e a burguesia internacional, que odeia o regime soviético e procurará a ocasião para desencadear uma nova intervenção armada contra o país dos Soviets, fazendo novas tentativas destinadas a restaurar o capitalismo na URSS. E como este é, no momento, o único país do socialismo e os demais países continuam sendo capitalistas, continuará existindo em torno da URSS um cerco capitalista, fonte de perigo de uma nova intervenção armada do capitalismo. Claro está que enquanto existir o cerco capitalista continuará também existindo o perigo de uma intervenção capitalista. Pode o povo soviético só com suas forças, destruir este perigo exterior, o perigo de uma intervenção armada do capitalismo contra a URSS? Não, não pode. E não pode, porque para acabar com o perigo de uma intervenção do capitalismo é necessário acabar com o cerco capitalista, e isto só é possível conseguir como resultado de uma revolução proletária vitoriosa, pelo menos, em alguns países. De onde se deduz que o triunfo do socialismo na URSS, triunfo que se revela na liquidação do sistema da economia capitalista e na construção do sistema da economia socialista, não pode, apesar de tudo, considerar-se como um triunfo definitivo, enquanto não desaparecer o perigo de uma intervenção armada estrangeira e das tentativas de restauração do capitalismo, enquanto o país do socialismo não estiver garantido contra este perigo. Para acabar com o perigo de uma intervenção armada estrangeira, é necessário acabar com o cerco capitalista.
É verdade que o povo soviético e o seu Exército Vermelho, mediante a política acertada do poder soviético, saberão dar uma resposta mais adequada a uma nova intervenção capitalista estrangeira, tal como deram à primeira intervenção capitalista dos anos de 1918 e 1920. Mas isto, por si só, não quer dizer que vai desaparecer o perigo de novas intervenções capitalistas. A derrota sofrida pela primeira intervenção não acabou com o perigo de uma outra nova, como o demonstra o fato de que a fonte da qual emana o perigo de novas intervenções – o cerco capitalista – continua existindo. O fracasso de uma intervenção também não fará desaparecer o perigo de que se produzam outras, enquanto estiver de pé o cerco capitalista.
Conclui-se daí que o triunfo da revolução proletária nos países capitalistas é de interesse vital para os trabalhadores da URSS. Era essa a posição do Partido ante o problema do triunfo do socialismo no país soviético.
O Comitê Central exigiu que esta posição fosse submetida à consideração da 14º Conferência do Partido, prestes a se celebrar, para que fosse aprovada e sancionada como posição do Partido, como resolução do Partido, obrigatória para todos os membros.
Esta posição produziu um efeito desconcertante nos elementos da oposição. Desconcertou-os, sobretudo, o fato de que o Partido desse a essa posição um caráter prático concreto, a ligasse ao plano prático da industrialização socialista do país e exigisse que tivesse a forma de uma resolução da 14ª Conferência do Partido, obrigatória para todos os filiados.
Os trotskistas se levantaram contra esta posição do Partido, opondo-lhe a “teoria da revolução permanente”, teoria menchevique, que, só para escarnecer do marxismo, se podia apresentar como uma teoria marxista, e que negava a possibilidade do triunfo do socialismo na URSS.
Os bukharinistas não se decidiram a enfrentar abertamente a posição do Partido. Sorrateiramente, porém, começaram a lhe opor a sua própria “teoria” da evolução pacífica da burguesia para o socialismo, completando-a com a “nova” palavra de ordem “enriquecei-vos!”. Isto é, segundo os bukharinistas, o triunfo do socialismo não representava a liquidação da burguesia, mas, pelo contrário, vinha para fomentá-la e enriquece-la.
Zinoviev e Kamenev se precipitaram, mantendo durante algum tempo, a afirmação de que na URSS era impossível que triunfasse o socialismo, devido ao atraso técnico-econômico deste país: porém viram-se obrigados mais tarde a bater em retirada.
A 14ª Conferência do Partido (celebrada em abril de 1925) condenou todas estas “teorias” capituladoras dos sequazes assumidos e encobertos da oposição e afirmou a posição do Partido sobre o triunfo do socialismo na URSS, votando uma resolução conseqüente com isto.
Zinoviev e Kamenev, vendo-se acossados, optaram por votar a favor desta resolução. Mas não se podia ocultar ao Partido que isto não era mais que um ardil para retardar sua luta contra ele e para “dar combate ao Partido” no seu 14º Congresso. Logo reuniram os adeptos que contavam em Leningrado e formaram a chamada “nova oposição”.
Em dezembro de 1925, celebrou-se o 14º Congresso.
Este Congresso decorreu numa atmosfera de grande tensão dentro do Partido. Em todo o tempo que este tinha de existência não se havia dado ainda o caso de que a delegação de um centro importantíssimo do Partido como Leningrado confabulasse para atuar toda ela contra o Comitê Central.
Participaram deste Congresso 665 delegados com direito de palavra e voto e 641 sem direito a voto, representando 643.000 filiados e 445.000 aspirantes, isto é, um número algo menor que no Congresso anterior. Este declínio era o resultado da depuração parcial levada a cabo nas células das escolas superiores e dos organismos administrativos que se revelaram infestados de elementos inimigos do Partido.
O informe político do Comitê Central coube ao camarada Stalin. Este traçou um quadro nítido do desenvolvimento da potência política e econômica da União Soviética. Graças à superioridade do sistema da economia soviética, tanto a indústria como a agricultura foram restauradas em um prazo relativamente curto e se aproximavam de novo do nível de antes da guerra. Apesar destes êxitos, porém, o camarada Stalin preconizava a necessidade de não se contentar com o conseguido, já que os êxitos obtidos não podiam destruir o fato de que o país soviético continuava sendo um país agrário. As duas terças partes da produção eram agrícolas e só uma terça parte procedia da indústria. Ante o Partido se apresentava em toda a sua plenitude – dizia o camarada Stalin – o problema de transformar o país soviético num país industrial, economicamente independente dos países capitalistas. E isto se podia e se devia fazer. A tarefa central do Partido era lutar pela industrialização socialista do país, lutar pelo triunfo do socialismo.
“Transformar o nosso país de um país agrário em um país industrial, capaz de produzir com seus próprios meios as máquinas e as ferramentas necessárias: nisto consiste a essência, o fundamento da nossa linha geral”, – dizia o camarada Stalin.
A industrialização do país garantiria sua independência econômica, reforçaria sua capacidade defensiva e criaria as condições necessárias para o triunfo do socialismo na URSS.
Contra a linha geral do Partido se levantaram os zinovievistas. O zinovievista Sokolnikov opôs ao plano de industrialização socialista de Stalin o plano burguês que tinha aceitação entre os tubarões do capitalismo. Este plano consistia em que a URSS continuasse sendo um país agrário que produzisse, fundamentalmente, matérias primas e artigos alimentícios, exportando estes artigos e importando a maquinaria que não produzia nem devia, segundo eles, produzir. Dentro das condições existentes em 1925, este plano tinha todo o caráter de um plano de escravização econômica da URSS pelos países estrangeiros industrialmente desenvolvidos, de um plano destinado a manter o atraso industrial da URSS em proveito dos tubarões imperialistas dos países do capitalismo.
Aceitar este plano equivalia a converter o país soviético em um país agrário impotente, em um apêndice agrícola do mundo capitalista, entregá-lo como um país débil e enorme à mercê do cerco capitalista e, em última instância, sepultar a causa do socialismo na URSS
O Congresso estigmatizou o “plano” econômico dos zinovievistas, como um plano de escravidão da URSS.
De nada serviram à “nova oposição” saídas como a de afirmar (deturpando Lênin) que a indústria do Estado Soviético não era, segundo ela, uma indústria socialista, nem declarar (deturpando também Lênin) que o camponês não podia, segundo ela, ser aliado da classe operária na edificação do socialismo.
O Congresso estigmatizou, como antileninistas, estas saídas da “nova oposição”.
O camarada Stalin desmascarou o fundo trotskista-menchevique da “nova oposição”. Mostrou que Zinoviev e Kamenev não faziam mais que repetir as cantilenas dos inimigos do Partido, contra os quais Lênin em seu tempo tinha lutado implacavelmente.
Não havia a menor dúvida que os zinovievistas não eram mais que trotskistas mal disfarçados.
O camarada Stalin destacou que a tarefa mais importante do Partido consistia em estabelecer uma aliança sólida entre a classe operária e os camponeses médios para a obra da edificação do socialismo. E assinalou dois desvios que existiam então, no Partido, a respeito do problema camponês e que representavam um perigo para esta aliança. O primeiro desvio consistia em menosprezar e diminuir a importância do perigo dos kulaks; o segundo era o pânico, o terror aos kulaks, e o menosprezo da importância dos camponeses médios. Respondendo à pergunta de qual dos dois desvios era o pior, o camarada Stalin dizia: “Ambos, o primeiro e o segundo desvios, são piores. E si estes desvios ganhassem terreno, seriam capazes de desorganizar e jogar no monturo o nosso Partido. Dentro do nosso Partido há, felizmente, forças suficientes para cortar pela raiz o primeiro e o segundo desvios”.
Com efeito, o Partido esmagou e cortou pela raiz o desvio de esquerda e o de direita.
Fazendo o balanço dos debates mantidos em torno da edificação econômica, o 14º Congresso do Partido rechaçou unanimemente os planos capituladores dos elementos da oposição e estampou na sua memorável resolução estas palavras:
“No terreno da edificação econômica, o Congresso parte do critério de que o nosso país, o país da ditadura do proletariado, conta “com todos os elementos necessários para construir uma sociedade socialista completa” (Lênin). O Congresso entende que a luta pelo triunfo da edificação do socialismo na URSS, é missão fundamental do nosso Partido”.
O 14º Congresso aprovou os novos estatutos do Partido.
A partir do 14º Congresso, o Partido bolchevique começou a se chamar Partido Comunista (bolchevique) da URSS – PC (b) da URSS.
Os zinovievistas, derrotados no Congresso, não se submeteram à disciplina do Partido. Começaram a lutar contra as resoluções do 14º Congresso. Zinoviev organizou uma assembléia do Comitê provincial das Juventudes Comunistas de Leningrado, em cujos dirigentes ele, Salutski, Bakaiev, Evdokimov, Kuklin, Safarov e outros salafrários, tinham inculcado o ódio contra o Comitê Central Leninista do Partido.
Nesta assembléia, o Comitê provincial das Juventudes Comunistas de Leningrado tomou a resolução, inaudita na história das Juventudes Comunistas Leninistas da URSS, de se rebelar contra as resoluções do 14º Congresso do Partido.
Os dirigentes zinovievistas das Juventudes Comunistas de Leningrado não refletiam, porém, de nenhum modo, o estado de espírito das massas de jovens comunistas dessa capital. Não deu, pois, grande trabalho esmagá-los, e rapidamente a organização juvenil de Leningrado voltou a ocupar o lugar que lhe correspondia dentro das Juventudes Comunistas.
Ao terminar o 14º Congresso, saíram para Leningrado um grupo de delegados, composto pelos camaradas Molotov, Kirov, Voroshilov, Kalinin, Andreev e outros. Era necessário explicar aos membros da organização do Partido naquela capital o caráter criminoso, anti-bolchevique da oposição mantida no Congresso pela delegação de Leningrado, que tinha obtido as suas atas por meio de fraude. As assembléias em que se informou sobre o Congresso foram bastante agitadas. Convocou-se urgentemente uma nova Conferência da organização do Partido de Leningrado. A esmagadora maioria dos filiados ao Partido em Leningrado (mais de 97 por cento) referendou plenamente as resoluções do XIV Congresso do Partido e condenou a “nova oposição” zinovievista antibolchevique. A “nova oposição” era já um grupo de generais sem exército.
Os bolcheviques de Leningrado continuaram militando nas primeiras fileiras do Partido de Lênin e Stalin.
Resumindo os resultados do trabalho do 14º Congresso do Partido, o camarada Stalin escrevia:
“A significação histórica do 14º Congresso do PC (b) da URSS consiste em que soube pôr a descoberto até em sua raiz os erros da “nova oposição”, em que lançou por terra sua falta de fé e suas lamentações, em que traçou clara e nitidamente o caminho para continuar lutando pelo socialismo, deu ao Partido uma perspectiva de triunfo e com isso infundiu no proletariado a fé inquebrantável no triunfo da edificação socialista” (Stalin, “Questões do Leninismo”, ed.russa, pág. 150).