A viagem de Jair Bolsonaro à reunião do G20 (grupo dos vinte países mais ricos do mundo) ficou marcada pela carga de 39 quilos de cocaína levada a bordo por um integrante de sua escolta oficial. O mundo inteiro assistiu à prisão, em Sevilha, na Espanha, do sargento Manoel Silva Rodrigues, com uma bagagem de mão contendo 37 pacotes de pouco mais de um quilo de pó cada um.
Mais surpreendente ainda foi a reação do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, Augusto Heleno, que acompanhava Bolsonaro ao Japão. “Podia não ter acontecido, né? Falta de sorte ter acontecido justamente na hora de um evento mundial. Acaba tendo uma repercussão mundial que poderia não ter tido. Foi um fato muito desagradável”, disse Heleno, na frente do hotel onde está hospedado, em Osaka.
Ele manifestou o incômodo com a “falta de sorte” porque a operação que resultou na prisão do traficante do voo presidencial acabou dando chabu em seu “plano” de tentar “mudar a imagem de Bolsonaro”. Segundo Heleno, o objetivo era mudar a imagem de “fascista” que, na visão do auxiliar do Planalto, “foi atribuída ao presidente brasileiro por parte da imprensa”.
Se já haviam suspeitas das ligações familiares com as milícias, o episódio da Sevilha adicionou ainda mais pó aos ingredientes bolsonarianos.
A “sorte”, para Augusto Heleno, seria, então, se o traficante preso consumasse a entrega da droga transportada dentro do avião oficial. Aí tudo estaria bem. Melhor seria que tudo ficasse encoberto. Mas, houve muita “falta de sorte” e a “mula qualificada”, “infelizmente” foi pega em flagrante.
Além de reclamar pelo triste fato do “tráfico presidencial” ter se tornado público, Augusto Heleno tentou, sem sucesso, minimizar a dimensão do escândalo.
“Se mudar a imagem do Brasil por causa disso, só se a gente não estivesse sabendo da quantidade de tráfico de droga que tem no mundo. É mais um”, disse ele. Ou seja, para o conselheiro de Bolsonaro, se o mundo tem tráfico, por que nós não podemos ter o nosso? Só 39 quilos?
Depois de reclamar da “falta de sorte”, o chefe da área que cuida da segurança pessoal do presidente da República, buscou tirar o corpo fora, tentando jogar a culpa na FAB. Disse que seu setor não tem responsabilidade pelo transporte de drogas no avião da FAB que apoia as comitivas do presidente.
“Cada um tem seu cada qual. A revista de passageiros e de malas para aviões da FAB fica a cargo da FAB, que não é subordinada a mim. Então não tem nada a ver com o GSI”, disse. “O GSI não prova a comida do presidente. Cada um tem sua missão”, prosseguiu.
Se o plano era tentar “mudar a imagem” de fascista de Bolsonaro mundo à fora, deu tudo errado. A repercussão do episódio caiu como uma bomba nos “planos” de marketagem de Augusto Heleno. Bolsonaro e sua “carga” viraram a grande piada da semana.
“Pó branco, rostos vermelhos: carregamento de cocaína no avião presidencial do Brasil”, disse o New York Times.
O Le Monde aproveitou para fazer referência às ligações da família Bolsonaro com as milícias. “Um falso anúncio da ‘Milícia Airlines’, numa referência às controversas amizades do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, com membros das milícias do Rio e mostra o avião presidencial: ‘Boa viagem com a Milícia Airlines, limite de bagagem: 39 quilos'”.
O “Clarín”, da Argentina destacou o desgaste na reunião do G20 e deu o título “Prisão de militar brasileiro com 39 quilos de cocaína respinga na viagem de Jair Bolsonaro ao G20”. O jornal argentino descreve a história e também publica que a rota de voo do mandatário foi alterada – em vez de passar por Sevilha, parou em Lisboa.
“Para se livrar desse assunto, o presidente também publicou em uma rede social um vídeo que o mostra fazendo uma escala em Portugal (e não em Sevilha) em sua viagem ao Japão”, disse o jornal portenho.
A partir deste episódio, o “marqueteiro” Augusto Heleno vai ter muito mais trabalho pela frente.
SÉRGIO CRUZ