Em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, representantes da indústria manifestaram forte reação à Portaria 309 do Ministério da Economia, editada no dia 24 de junho, que reduz a zero o imposto de importação de bens de capital – máquinas e equipamentos usados na produção de outros bens -, além de produtos de informática e telecomunicações, “sem produção nacional equivalente“.
De acordo com o governo, se o produto fabricado no Brasil for 5% mais caro que o importado, não será considerado “similar nacional”.
Segundo os empresários, a portaria, além de prejudicar a produção nacional, vai atingir milhares de empregos.
As tarifas de importação variam entre 14% (bens de capital) e 16% (informática e telecomunicações). No entanto, através do Regime de Ex-Tarifário, que permite a tarifa zero por um tempo determinado, inúmeros produtos entram no país com benefício fiscal.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso Dias Cardoso, a portaria “equivale a dizer que a indústria será destruída”.
“O regime Ex-Tarifário”, enfatizou o empresário, “é um instrumento de política industrial que deveria ser usado para melhorar a produtividade e não somente para baratear a compra de um bem qualquer”. Segundo ele, deve ser usado para trazer melhorias na produtividade, com o uso de tecnologias avançadas ainda não disponíveis no Brasil.
De acordo com Velloso, “hoje existem mais de 6 mil ex-tarifários vigentes. Em 2012, eram pouco mais de 3 mil. O Imposto de Importação é um colchão que visa a regular a competitividade de produtos nacionais frente a seus concorrentes, pois existe a clara percepção que não é possível simplesmente comparar preços internacionais devido ao Custo Brasil”.
“Vamos lembrar que os automóveis, mesmo depois da abertura comercial, têm até hoje imposto de importação de 35%. Mas a Portaria 309 cria critérios de comparação de preço, prazo de entrega e fornecimentos anteriores que são irreais e criam uma imensa subjetividade”, acrescentou o presidente da Abimaq.
Para o presidente da Abinee, Humberto Barbato, “o Ex-Tarifário é uma concessão temporária de redução do Imposto de Importação a zero em função de alguns aspectos. Por exemplo, só pode ser concedido a equipamentos novos. O que acontece com essa Portaria 309 é que [a alíquota zero] está sendo concedida para quaisquer bens, inclusive usados [remanufaturados]”.
“O governo estabelece uma concorrência desleal, porque no Brasil só se fabricam produtos novos, não tem remanufaturados. A prática é de que quando se pede o Ex-Tarifário, já foi feita a compra do produto importado”, disse Barbato. “Só aí há consulta a fornecedor brasileiro. Com isso, evidentemente se estabelecem dois pesos e duas medidas em que o estrangeiro vai sempre ter uma vantagem”, completou.
Barbato defendeu também a concessão do Ex-Tarifário somente mediante consulta preliminar à Receita Federal, para que “a porteira não seja aberta com toda a facilidade”.
O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), José Jorge do Nascimento Júnior, acredita que por trás da iniciativa está a defesa da abertura comercial feita pela governo. Ele alertou que essa abertura, dependendo do modo que for feita, pode gerar uma desindustrialização que acarretará grande índice de desemprego.
“Não é justo que alguém produza no Brasil algo em condições distintas de quem produz fora. E quem produz fora ainda chega aqui com produto mais barato porque tem beneficio tributário. Isso não é razoável”, disse o dirigente da Eletros. “Não podemos desempregar gente nem fazer as indústrias saírem do país. Não podemos fazer com que o risco de se produzir no Brasil aumente”.
FIASCO
O diretor de Relações Governamentais da Positivo, José Goutier Rodrigues, criticou a falta de planejamento do governo nessas decisões regulatórias. E disse que isso pode ter consequências desastrosas, como ocorreu na Argentina.
“Em 2017, o governo argentino reduziu de 12% para 0% o Imposto de Importação sobre bens de informática. Houve de imediato perda de 5 mil postos de trabalho. O preço médio de um computador caiu de US$ 400 para US$ 355. Todos acharam louvável. E hoje, como está o preço sem esses empregos? Atualmente, os computadores vêm da China e são vendidos mais caros do que antes, pois o próprio varejo cuidou de realocar os valores. Nestes tipos de produtos, o preço depende não só da carga tributária, mas da oferta e da procura. Nesta semana, a Argentina foi obrigada a aumentar o Imposto de Importação novamente porque não tem mais indústria local, não tem recolhimento de tributos. É um exemplo portenho. Foi um fiasco o que aconteceu lá”, constatou.
MEDIDA ENTREGUISTA
Entre senadores, a portaria também gerou duras críticas. O senador José Serra (PSDB-SP) afirmou: “nunca vi medida tão entreguista e tão mal feita como essa portaria. E voltada tão fortemente contra a indústria instalada no Brasil. Não temos outro caminho a não ser a derrubada pelo caminho do Decreto Legislativo (PDL)”, que ele mesmo propôs.
Até o governista senador Major Olímpio (PSL/SP), líder do partido do governo na casa, criticou a medida de Guedes. “Esta é uma plena comunhão do inútil com o desagradável. Estamos zerando alíquotas de importados em um momento em que precisamos é gerar empregos”.
O senador do Amazonas Eduardo Braga (MDB) pediu o cancelamento da portaria, na sua avaliação se ela continuar a vigorar pode comprometer a sobrevivência da indústria nacional e a manutenção de 5 milhões de empregos diretos e indiretos.
“Essa matéria é inimaginável, absurda e tão ruim, a ponto de assustar aqueles que estão no Paraná, no Rio Grande do Sul, em São Paulo, em Minas Gerais e na Zona Franca de Manaus”, afirmou Braga.
No dia seguinte à audiência no Senado Federal, o governo decidiu na quarta-feira (10) suspender até 30 de agosto os efeitos da Portaria 309/2019. Até lá, o Ministério da Economia não dará autorizações para a compra destes produtos com a alíquota reduzida.
Na Câmara, o deputado Sidney Leite (PSD), apresentou projeto de Decreto Legislativo para derrubar a portaria 309.
Além dos dirigentes da Abimaq, Abinee, Eletros e do Positivo, também participaram da reunião da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, representantes da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e da empresa WEG e Positivo, que manifestaram de forma inequívoca a repulsa à portaria em questão.
J.AMARO