Num episódio inédito, Bolsonaro barrou, através da Petrobrás, o abastecimento de navios do Irã que trouxeram ureia ao Brasil e iam retornar ao seu país levando milho brasileiro.
Além dos navios Bavand e Termeh, fundeados em Paranaguá (PR), outros dois navios de bandeira iraniana (Ganj e The Finder) estão em Imbituba (SC) na mesma situação.
Revelando sua total submissão a Trump e suas criminosas sanções contra o Irã, Bolsonaro declarou a jornalistas que avisou às empresas sobre as sanções.
“Eu particularmente estou me aproximando cada vez mais do Trump, fui recebido duas vezes por ele. Ele é a primeira economia do mundo, segundo o mercado econômico. E hoje abri, inclusive aos jornalistas estrangeiros, uns 20 presentes, que o Brasil está de braços abertos para fazermos acordos, parcerias. O Brasil é um país que não tem conflito em nenhum lugar do mundo, graças a Deus, pretendemos manter nessa linha, mas entendemos que outros países têm problemas e nós aqui temos que cuidar dos nossos em primeiro lugar”, declarou Bolsonaro.
A Petrobrás se negou a fornecer combustível aos navios sob a alegação de que os navios estão na “lista negra” da OFAC ( Agência de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA), órgão ligado ao departamento de tesouro do governo norte-americano.
“Caso a Petrobrás venha a abastecer esses navios, ficará sujeita ao risco de ser incluída na mesma lista, sofrendo graves prejuízos decorrentes dessa sanção”, disse a estatal em nota, na sexta-feira (19).
Os navios estão atracados no Porto de Paranaguá (PR) desde início de junho. O navio MV Bavand já está carregado com 48,4 mil toneladas de milho, avaliadas em R$ 45,5 milhões, e deveria ter partido para o Irã no dia 8 de junho. O MV Termeh aguarda, desde o dia 9 de junho, o combustível para seguir rumo ao Porto de Imbituba (SC), onde receberá aproximadamente 60 mil toneladas de milho a granel, no valor aproximado de R$ 60 milhões.
A medida surpreendeu a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), que tem no Irã o maior importador de milho do Brasil e está entre os principais compradores de soja e carne bovina. Só este ano, até junho, o país asiático importou cerca de 2,5 milhões de toneladas de milho do Brasil.
“Completa surpresa, os navios das nossas exportadoras continuam exportando normalmente, qualquer sanção em comida está fora. Diria que não espero impacto (na exportação de milho e soja do Brasil), comida está fora dessa história, alimento está fora de qualquer processo de sanção”, afirmou o diretor-geral da Anec, Sérgio Mendes, à Reuters. “Tanto que os navios dos nossos associados estão carregando normalmente”, enfatizou.
De acordo com informações de agentes do setor portuário, navios afretados por outras companhias de outras países, que carregavam milho brasileiro, deixaram o Brasil recentemente sem qualquer problema.
Segundo o site Portos e Navios, uma liminar do desembargador na 2ª vara cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), concedida em 4 de julho, obrigou a Transpetro a fornecer em caráter de urgência o combustível IFO 380 em quantidade suficiente para que os dois primeiros navios nessa situação pudessem retornar ao Irã, concluindo a exportação de aproximadamente 100 mil toneladas milho a granel, cujo valor de mercado é da ordem de R$ 100 milhões.
Porém, a liminar foi cassada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, após recurso impetrado pela Petrobrás. Como a decisão é preliminar, será analisada pelo colegiado do Supremo. O processo tramita em segredo de Justiça a pedido da estatal brasileira.
EXCEÇÃO HUMANITÁRIA
Segundo a empresa exportadora, o não fornecimento de combustível pode fazer com que as embarcações fiquem à deriva, “colocando em risco os tripulantes , o navio, a carga, o meio ambiente e as demais embarcações que estiverem fundeadas em Paranaguá”.
A exportadora afirma que as sanções americanas não poderiam impedir a Petrobrás de abastecer essas embarcações. Isso porque elas transportam milho, o que as colocaria em “exceção humanitária”.
“Ainda que a norma do Tesouro Americano fosse aplicada à Petrobras, o transporte de alimentos é uma das exceções previstas no que a lei americana chama de ‘Humanitarian Exception’, ou exceção humanitária, que é uma licença geral para o transporte de commodities agrícolas, comida, medicamentos e equipamentos médicos”, afirma o escritório de advocacia que defende a exportadora que afretou os navios.
Íntegra da nota da exportadora
“Sobre o caso dos navios iranianos que aguardam decisão judicial para deixar porto de Paranaguá, esclarecemos que:
- O impasse é restrito à Petrobras e a empresa brasileira que afretou as embarcações para exportar milho. Não há qualquer impasse com o Departamento de Tesouro dos EUA ou com as autoridades portuárias. Toda a documentação de liberação dos navios já foi fornecida pelas autoridades brasileiras.
- As restrições de contratação com entidades listadas pelo OFAC [departamento do Tesouro americano que trata de sanções econômicas] são aplicáveis a cidadãos e entidades norte-americanos, não à Petrobras.
- O combustível será usado para possibilitar a exportação de milho. Ainda que a norma do Tesouro Americano fosse aplicada à Petrobras, o transporte de alimentos é uma das exceções previstas no que a lei americana chama de “Humanitarian Exception”, ou exceção humanitária, que é uma licença geral para o transporte de commodities agrícolas, comida, medicamentos e equipamentos médicos.
- O que a empresa brasileira pretende é que lhe seja fornecido combustível. A empresa brasileira NÃO está listada pelo Departamento de Tesouro norte-americano, diferentemente do que foi informado na reportagem. A empresa iraniana é somente a dona da embarcação e não possui qualquer relação com a Petrobras.
- O fornecimento de combustível não tem qualquer relação com a importação de ureia (um fertilizante comum, que a própria Petrobras também comercializa) para o Brasil, uma vez que essa importação já foi finalizada. Seja como for, a ureia é uma commodity agrícola e, portanto, produto de livre circulação conforme as normas norte-americanas invocadas pela Petrobras para recusar o abastecimento.
- Não há outras alternativas viáveis e seguras para o abastecimento das embarcações, que dependem de um tipo específico de combustível cujo fornecimento é monopólio da Petrobras.
- O não fornecimento do combustível fará com que as embarcações fiquem à deriva a qualquer momento, colocando em risco os tripulantes, o navio, a carga, o meio ambiente e as demais embarcações que estiverem fundeadas em Paranaguá.
- O Irã é um parceiro comercial importante para o Brasil, sendo o maior importador de milho brasileiro de acordo com informações públicas do MDIC – Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços .
- A liminar do Tribunal de Justiça do Paraná, a favor da empresa brasileira, foi suspensa, aguardando nova decisão do STF nos próximos dias. Ou seja, a liminar não foi definitivamente reformada.”
ELIANA REIS