A ex-corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, afirmou que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, agiu como “senhor todo-poderoso” ao suspender investigações penais com base em dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sem autorização judicial prévia.
“Ele dá uma liminar em pleno recesso, não respeita a opinião colegiada e decide que só em novembro o caso vai ser julgado. Isso é muito grave”, disse.
A decisão de Toffoli atendeu a um pedido de Flávio Bolsonaro. A medida beneficiou o filho de Bolsonaro e seu ex-funcionário Fabrício Queiroz, acusados de peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, quando Flávio ainda era deputado estadual no Rio de Janeiro.
O Coaf detectou movimentações financeiras suspeitas de Queiroz e Flávio Bolsonaro que chegaram a R$ 7 milhões entre 2014 e 2017. Só na conta de Flávio Bolsonaro, foram feitos 48 depósitos em dinheiro, no total de R$ 96 mil. Todos os depósitos eram iguais: R$ 2 mil.
Eliana Calmon, que foi primeira ministra mulher a compor o Superior Tribunal de Justiça (STJ), lembrou que em 19 de dezembro de 2011, o ministro do STF, Ricardo Lewandowski, já havia também concedido liminar para interromper as inspeções iniciadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que ela dirigiu de 2010 a 2012, a partir de informações do Coaf.
Questionada sobre a decisão de Toffoli, Eliana Calmon declarou que “é realmente um retrocesso internacional, inutilizando investigações importantíssimas”. “Até a Suíça abriu os seus cofres para mostrar o esconderijo, porque o Brasil era uma grande lavanderia. Hoje, o mundo civilizado está muito preocupado com a lavagem de dinheiro”, assinalou a ex-ministra.
Eliana Calmon ironizou o presidente do STF: “Toffoli diz que a medida é uma defesa do cidadão, pois, sem controle do Judiciário, qualquer um fica sujeito a vasculhamento na sua intimidade. Agir em prol do cidadão é você apurar quem está lavando dinheiro. A lei de lavagem já está em vigor há mais de 20 anos”.
Ela avaliou o Coaf como um órgão importantíssimo. “O Coaf diz onde estão sedo feitas operações atípicas. Informa aos órgãos de controle do Estado, como o Ministério Público, os tribunais de contas, a polícia. A partir daí, começam as investigações”, comentou, em entrevista para o jornal Folha de S. Paulo.
Eliana Calmon também foi ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2008 a 2010.
A ex-ministra do STJ destacou que a decisão de Toffoli e a interrupção de investigação no CNJ em 2011 “foram decisões monocráticas, em período de recesso. Lá atrás, já se começava a não aplicar a lei. Havia uma agitação muito grande. Alguns ministros e conselheiros do CNJ nem sabiam o que era o Coaf”.
Dias Toffoli foi por muito tempo advogado da CUT e do PT e foi indicado no governo Lula (2009) para o STF. Antes (2007) foi nomeado por Lula para advogado-geral da União. Ricardo Lewandowski também foi indicado por Lula para integrar o STF em 2006.
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