“É uma mentira dizer que ela está acuada no mercado porque a Airbus assumiu a divisão de jatos regionais da Bombardier, muito pelo contrário, a Airbus é que estava acuada, sem condições de concorrer com a Embraer”
O presidente da Associação Brasileira de Investimentos (Abradin), o economista Aurélio Valporto, afirmou na quinta-feira (08), em entrevista ao HP, que considera a aquisição da Embraer pela norte-americana Boeing uma operação “ilegal e criminosa, que trará prejuízos incalculáveis ao Brasil, à engenharia brasileira, aos acionistas da Embraer e à economia nacional”. “Esta venda visa beneficiar exclusivamente a Boeing e atende a interesses incofessáveis”, alerta o representante dos acionistas minoritários.
Para o economista, “a sociedade brasileira ainda não conseguiu dimensionar adequadamente o que poderá acarretar ao país, em termos de prejuízos, se essa transação for efetivada”. “São muitas informações que são deformadas e acobertadas”, acrescentou Valporto.
ENGENHARIA
“A transferência do setor de engenharia, incluída no negócio, vai inviabilizar a criação, pela Embraer, de qualquer novo tipo de aeronave, seja civil, comercial e executiva ou militar. O centro de engenharia é único e serve tanto à área comercial, como à executiva e militar. Com a sua transferência para a Boeing, o que restará será insuficiente para a continuidade da empresa. A Embraer não conseguirá sobreviver”, disse Valporto.
“A expertise construída pela Embraer em projetos, planejamento e desenvolvimento de aeronaves é única no mundo”, explicou. “Não é todo mundo que consegue reunir por tantos anos uma equipe tão capaz e habilitada para fazer o que a Embraer fez”.
“São muitos anos de experiência”, prosseguiu o dirigente da Abradin. Ele explicou que no setor de aviação são pouquíssimas as equipes no mundo que se capacitam, com o saber e a vivência necessárias, para construir aeronaves, como a Embraer conseguiu.
CRISE NA BOEING
“A Boeing está vivendo uma crise exatamente nesse setor de engenharia. Não é à toa que estamos assistindo essas quedas frequentes de aeronaves da empresa”, observou.
“O setor de construção de trens de pouso, por exemplo, desenvolvido pela Embraer, é um dos mais avançados internacionalmente. Ele é o resultado de muito investimento, de muita capacitação e criatividade. Este setor construído pela empresa brasileira é quase único no mundo”, prosseguiu Valporto.
A trajetória da Eleb Equipamentos, fabricante de trem de pouso controlada pela Embraer, é um dos exemplos bem sucedidos da estratégia da fabricante brasileira. Com tecnologia de ponta ela garante o diferencial competitivo necessário para continuar sendo uma das três mais importantes empresas do mundo na construção de aeronaves.
A partir do desenvolvimento dos trens de pouso do jato de transporte militar KC-390, a Eleb passou a dominar todo o processo de desenvolvimento dos trens de pouso de um avião.
“A Boeing é uma empresa sabidamente em dificuldades, enquanto a brasileira Embraer, em seus cinquenta anos de existência, tornou-se uma das maiores e mais bem sucedidas empresas do mundo”, destacou o presidente da Abradin.
“A capacidade tecnológica e gerencial da companhia de São José dos Campos é excepcional e, por isso, ela passou a incomodar as grandes do setor”, avalia.
“A Embraer foi capaz de concorrer e vencer empresas tradicionais no ramo aeronáutico, como a própria Boeing, a canadense Bombardier e a europeia Airbus. Ela simplesmente tirou a Bombardier do mercado”, lembrou o economista.
“A empresa aeronáutica brasileira vinha conquistando o mercado mundial num ritmo muito forte. A Boeing passou a ter um grande interesse em tirar a Embraer de seu caminho. Não tenho informações mais detalhadas, mas, parece que o governo norte-americano não tinha interesse em ter uma empresa com a capacidade tecnológica da Embraer num país como o Brasil a concorrer com a Boeing”, avaliou Aurélio.
“Nós chegamos a alertar as autoridades brasileiras que essa operação vai destruir nossa capacidade, conquistada a duras penas, de construir aviões”, disse Valporto.
PREÇO DE BANANA
“O que teria levado alguns de seus administradores a desrespeitarem a legislação, a rasgarem o estatuto da empresa, a atropelarem os acionistas e a enganarem os militares, entregando a Embraer e todos os seus projetos vitoriosos, inclusive os militares, para a Boeing a preço de banana?”, indagou Valporto.
Segundo o representante dos acionistas minoritários, “o valor oferecido pela Boeing para a aquisição da Embraer é irrisório. E, mesmo esse valor anunciado, de US$ 4,2 bilhões, não é verdadeiro”.
“Ele também é uma fraude. Há cláusulas que exigem que a nova empresa, controlada pela Boeing, tenha que receber US$ 1,5 bilhão em caixa. Já há uma redução; do total ainda será descontado cerca de US$ 1 bilhão de impostos. Cerca de US$ 1,6 bilhão será dividido entre os acionistas, e o que sobrar vai compor um caixa que ficará na Embraer. Cerca de US$ 100 milhões. A Embraer S.A. que vai permanecer depois da venda não vai conseguir se manter’, denuncia.
AÇÃO NA JUSTIÇA
O economista foi o responsável por uma ação na Justiça e uma representação junto ao Ministério Público Federal com o objetivo de barrar a operação fraudulenta de venda da Embraer à Boeing e impedir a sua concretização.
Segundo ele, entre outros crimes, “os responsáveis fraudaram a Lei das S.A”.
“Fizeram uma manobra, vendendo uma empresa de capital aberto, como é a Embraer, para uma empresa de prateleira, chamada Yaborã Indústria Aeronáutica”.
É com esta última que a Boeing está fechando o negócio final para criar a New Co, com 80% da Boeing e 20% da Embraer.
“Desta forma os administradores conseguiram fraudar a Lei das S. A. para vender a empresa sem que houvesse a possibilidade de interferência dos acionistas e nem do governo”, denunciou.
A avaliação de Aurélio é que “essa transação é altamente lesiva aos interesses, tanto do país, quanto dos acionistas”.
“Literalmente a Embraer está sendo vendida a preço de banana”, avalia. Segundo ele, “só uma administração irresponsável e a falta de um acionista controlador permite que um negócio tão desfavorável como este seja feito”.
Desde a reestruturação societária ocorrida em 2006, o capital social da Embraer é composto exclusivamente por ações ordinárias, além de uma ação de classe especial de titularidade da União, inexistindo um grupo de controle ou acionista controlador.
PROXIMIDADE DE EXECUTIVOS DA EMBRAER COM GUEDES
O BNDES e a Previ, que, juntas, detêm cerca de 11% das ações, poderiam ter impedido que essa venda se consumasse. Inclusive, esses órgãos poderão, segundo Valporto, ser responsabilizados por permitirem uma operação causadora de grande prejuízo aos seus investidores. A participação direta do ministro Paulo Guedes na imposição da venda é em parte explicada pelas estreitas relações entre ele e Sérgio Eraldo Salles Pinto, vice-presidente do conselho de administração da fabricante de jatos brasileira.
Salles Pinto trabalhou em diversas empresas do grupo Bozano desde 1988, chegando a ocupar os cargos de diretor-presidente e diretor-executivo, conforme o site da Embraer. A companhia de investimento teve como um dos sócios fundadores Paulo Guedes, que saiu do negócio para assumir o cargo de ministro no governo Jair Bolsonaro. A Abradin já entrou com ação civil pública contra a venda da divisão comercial da Embraer à Boeing, questionando a relação entre o ministro da Economia Paulo Guedes e Sérgio Eraldo de Salles Pinto.
O questionamento sobre a relação entre Salles Pinto e o Bozano Investimentos não foi diretamente abordado pela Abradin na ação civil pública, encaminhada à 24ª Vara Cível Federal de São Paulo do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Mas a petição sugere que a empresa teria postergado a apresentação da operação ao governo, que poderia barrá-la por meio de sua golden share, ação que lhe dá o direito de veto. Há fortes suspeitas que Guedes tenha conseguido isso para que a decisão ficasse em suas mãos já no governo Bolsonaro.
Na ação civil pública, a Abradin diz que o negócio foi precificado sem um estudo da avaliação dos acionistas minoritários e sem estudos de impacto econômico na região e no país, além de deixar de cumprir a obrigatoriedade de realização anterior de uma oferta pública de aquisição aos acionistas.
Na avaliação de Aurélio Valporto “ainda há chance de que essa transação seja revertida. A última etapa da operação, segundo ele, depende da aprovação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Esta apreciação ainda não foi feita pelo órgão”.
SÉRGIO CRUZ
Publicamos abaixo alguns trechos do artigo do nosso entrevistado, Aurélio Valporto, com o título “A venda da Embraer atende a Interesses inconfessáveis”, publicado no site da Abradin, e que nos dá uma visão geral ampla sobre os argumentos do economista relativos aos prejuízos que a venda da Embraer trará para o Brasil.
A VENDA DA EMBRAER ATENDE A INTERESSES INCONFESSÁVEIS
AURÉLIO VALPORTO
(…) “A tecnologia desenvolvida na Embraer, aliada à sua necessidade de fornecedores nacionais, se espraia para outras indústrias, sendo, assim, um importantíssimo polo gerador de tecnologia e produtos de alto valor agregado para toda a economia nacional.
Por ser o mais eficiente fabricante mundial de aeronaves da sua categoria, produzindo produtos superiores a um preço, na maioria das vezes, mais de 20% inferior aos concorrentes, a Embraer tem, de longe, a maior carteira de pedidos firmes da indústria de jatos regionais.
Apenas na feira de Farnborough, em julho de 2018, foram recebidas encomendas para 300 aeronaves, hoje a carteira de encomenda de jatos regionais da empresa de aviação brasileira, incluindo as opções, equivale a cerca de 40% de todos os E-jets que ela já vendeu em toda a sua história.
É uma mentira dizer que ela está acuada no mercado porque a Airbus assumiu a divisão de jatos regionais da Bombardier, muito pelo contrário, a Airbus é que estava acuada, sem condições de concorrer com a Embraer.
Anteriormente a Embraer tinha expulsado do mercado o Boeing 717 e o 737-600, uma versão reduzida do famoso 737 voltada para a aviação regional. Com a conclusão do projeto da aeronave militar KC-390, de fuselagem larga, a empresa está pronta para entrar no maior e mais cobiçado segmento da aviação comercial mundial: o de 150 a 220 passageiros, disputado por Boeing 737 e Airbus A-320.
A Boeing está com sérios problemas de projeto no seu principal produto: o 737-MAX. Esses problemas de projeto resultaram em graves acidentes com a morte de todos os ocupantes. A verdade é que o departamento de projetos da Boeing está velho e ultrapassado, seus projetos não têm condições tecnológicas de concorrer com as novas versões do A320.
Por outro lado, a Embraer tem um corpo de projetistas extremamente capacitado, bem como projeta e fabrica trens de pouso, através da sua subsidiária ELEB, uma das cobiças da Boeing para resolver suas deficiências em trens de pouso.
No entendimento de muitos engenheiros da própria Embraer, ela é a única empresa capacitada a concorrer com a Airbus no segmento de 150 a 220 passageiros no futuro próximo, uma vez que, com o fracasso de projeto do 737 MAX, a Boeing não tem mais esta capacidade.
Por isso, comprar a Embraer é uma prioridade para Boeing, e não só a divisão de jatos comerciais, mas todo o corpo de projetistas, que são os mesmos que projetam aeronaves militares e executivas.
Aqui cabe informar que não existe diferença entre corpo de projetistas de aeronaves militares e civis, há, isto sim, projetistas de asas, projetistas de fuselagem central etc., que são os mesmos que projetam asas e fuselagens para aviões civis e militares, portanto dizer que a Embraer ficará com os segmentos executivo e militar é uma falácia. Com a perda do setor de projetos, ela perderá a capacidade de projetar e desenvolver qualquer tipo de aeronave.
Como está também no pacote, a ELEB, subsidiária da Embraer que fabrica trens de pouso, com ela a Boeing ganhará capacidade de projetar e desenvolver trens de pouso, um dos “calcanhares de Aquiles” de seus aviões.
Como se não bastasse, o acordo prevê ainda a transferência, também, da linha de produção do novo jato de transporte militar da Embraer, o KC-390, para os Estados Unidos. É interessante notar que a Boeing não garantiu a venda de um único avião KC-390, não apresentou uma única encomenda, mas vai transferir a linha, de propriedade do governo brasileiro, da FAB, para os EUA bem como se apossará das licenças de propriedade da FAB.
Todo este negócio está sendo feito sem apresentar um único projeto ao governo ou aos acionistas, ninguém sabe de onde se tirou o valor de US$ 4,2 bilhões, apenas como comparação, recentemente a rede de drogarias São Paulo recebeu uma oferta superior a US$ 6,5 bilhões para a venda de seu controle, e não aceitou! A direção da Embraer está entregando a empresa por menos que um conjunto de balcões de farmácia!
O negócio não é bom para ninguém na Embraer, somente para a Boeing.
Mais uma vez os acionistas minoritários estão sendo lesados, desde que o negócio foi anunciado, em julho de 2018, as ações caíram mais de 30%, isso porque a Embraer anunciou aos acionistas a distribuição de uma parcela de US$ 1,6 bilhão, equivalente a mais de 40% do valor das ações hoje, mas o negócio é tão ruim para o futuro da empresa que continuaram despencando, mesmo após o anúncio.
Está claro que qualquer um que conheça as “entranhas” desta verdadeira negociata e ainda assim defenda a concretização das negociações está, na verdade, defendendo interesses inconfessáveis.
Aqui cabe lembrar que o diretor financeiro e de RI da Embraer, Nelson Salgado é acusado pela CVM de enganar investidores (que nesse caso inclui o Governo Federal e o BNDES) e este mesmo sujeito, bem como todo o conselho de administração da Embraer (incluindo o brigadeiro Araújo), foram denunciados em notícia-crime pela prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, contra a fé pública e indução de investidor ao erro.
Depois do exposto, me indago: Se o negócio é tão nocivo para a economia nacional, se é tão ruim para o futuro da empresa e péssimo para seus acionistas, por que os administradores da Embraer estão insistindo na sua venda e, para isso, “rasgando” a lei 6.404, que disciplina esse tipo de negócio no Brasil?
A que interesses estão atendendo? E o governo que pode vetar o negócio com sua “golden share” ou mesmo através do BNDES em assembleia de acionistas, por que está concordando com algo tão nocivo sem sequer ter sido apresentado um projeto para a Embraer e mesmo sequer um estudo de impacto econômico regional e nacional de curto, médio e longo prazos?”
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Isso tudo e COMPLEXO DE VIRA LATA, levando a fazer ato tão impatriotico. Aí o país continua a exportar minérios a US$ 100/tb e comprar aviões a US$ 3,000 o quilo. Significa tb retrocesso aos anos 50. Não entendo uma corporação com 17.000 colaboradores, sendo 7000 ENGENHEIROS aceitarem tudo assim tão passivamente. Enfim o pessoal da ENGENHARIA BRASILEIDA e da Aeronáutica não fazerem nada!
É falta de olhar estratégico de longo prazo!
Todo chefe de Estado fica 4 anos e não está nem aí para o que acontece depois!
Só pensam em seus projetos mesquinhos de poder!
A China, EUA e Russia têm demostrado pensar e planejar em longo prazo!
A China tem perspectivas do Brasil para daqui a 40 anos, mas e o estado Brasileiro… têm?
Sequer sabemos quem será o próximo chefe de Estado, a República nos dá uma estabilidade de biruta de aeroporto.
Não entendemos, leitor. A solução seria… restaurar a monarquia?
Apoio Ciro Gomes nesta luta, não votei nele mas agora admiro como um brasileiro patriota.Temos que lutar pelo que é nosso.