Manifestantes protestam contra Witzel após a morte de seis jovens e um bebê em cinco dias
Um evento com a presença do governador Wilson Witzel (PSC) foi interrompido na noite de quarta-feira (15). Manifestantes entraram em protesto nos jardins do Palácio Solar do Jambeiro, no Ingá, em Niterói.
“Tem que parar de matar aluno, governador!”, exigiram os manifestantes após a morte de seis jovens, sem ligação alguma com o crime organizado, em um período de cinco dias.
Gabriel Pereira Alves, 18 anos; Lucas Monteiro dos Santos Costa, 21 anos; Tiago Freitas, 21 anos; Dyogo Costa Xavier de Brito, 16 anos; Henrico de Jesus Viegas de Menezes Júnior, 19 anos; Margareth Teixeira, de 17 anos. Todos vítimas de uma política de “abate” de pessoas nas comunidades do Rio de Janeiro, levada a cabo por Witizel, no que os integrantes da segurança-pública do estado chamam de efeito colateral da guerra contra o tráfico de drogas.
A última vítima, Margareth Teixeira, foi baleada e morta durante uma operação da Polícia Militar na comunidade 48, em Bangu, na Zona Oeste do Rio, na noite de terça-feira, por volta das 19h30. Ela estava indo para a igreja com o filho, de apenas um ano e dez meses, no colo quando os dois foram atingidos. De acordo com um parente de Margareth, que não quis se identificar, moradores contaram que as duas vítimas teriam ficado no meio do fogo cruzado. A PM informou, em nota, que durante a ação dois suspeitos, ainda não identificados, também foram mortos. Já o bebê, baleado de raspão no pé esquerdo, de acordo com a Secretaria municipal de Saúde do Rio, apresenta quadro de saúde estável.
SONHO
Dyogo Costa Xavier de Brito, de apenas 16 anos, foi morto durante uma operação da Polícia Militar. Atleta do América, sonhava em ser jogador de futebol profissional.
Familiares de Dyogo estão desolados com o assassinato. Parentes de Dondom, como era conhecido entre os amigos, acusam policiais militares de terem atirado nele pelas costas durante a operação.
“Não sei se ele foi confundido, porque não tem como confundir um menino tão saudável com uma chuteira na mão”, critica uma tia de Dyogo. “Ele ia jogar bola diversas vezes por semana no Rio. Estava passando tranquilamente para pegar o ônibus na Estrada da Cachoeira quando foi pego de forma absurda, sem profissionalismo (por parte dos policiais)”. Familiares dizem que o jogador foi morto à queima-roupa.
No Instituto Médico Legal (IML) de Niterói, ainda com a camisa marcada pelo sangue do neto, o avô de Dyogo lembrou do trauma e comentou como foi o encontro com o policial na hora em que o garoto foi baleado. “Quando eu cheguei perto do corpo o policial falou ‘Para, para para’, e eu respondi ‘Para o quê, rapaz? Eu tinha reconhecido meu neto. Ele estava com a barriga para baixo. Eu falei ‘você matou meu neto. Ele ia para o Rio treinar’. Ele falou ‘seu neto é traficante’. O que ele tinha dentro da mochila era uma chuteira, R$ 85, que eu dei a ele para treinar e uma sandália de dedo”, comentou Cristóvão Brito. “Uma criança que eu peguei no colo quando nasceu e fui eu quem pegou no colo quando morreu, no chão, baleado”, disse à reportagem da Rede Globo.
O corpo do garoto foi enterrado na terça-feira (13), sob protesto nas proximidades do Cemitério São Francisco Xavier – no dia da morte, um ônibus foi incendiado.
Depois do enterro, centenas de pessoas acompanharam os familiares de Dyogo em um protesto pelas ruas do Bairro São Francisco, onde está localizado o cemitério. Muitas delas estavam com as camisas manchadas de tinta vermelha. Pacificamente, os manifestantes gritavam pedindo justiça e falando o nome do jovem, entre aplausos. “Que cada pessoa que está aqui não perca ninguém desse jeito. Quando alguém estiver assim, bem triste, pega suas mãos e põe lá no coração dele. Sejam do bem, não sejam do mau”, pediu a pequena Sofia, de 7 anos, irmã do adolescente.
80 HORAS
Outras quatro famílias choraram a perda de jovens para a violência na Região Metropolitana do Rio.
Gabriel Pereira Alves, de 18 anos, foi atingido no peito por uma bala às 7h de sexta-feira, enquanto aguardava em um ponto de ônibus na Tijuca, Zona Norte do Rio. Já na noite de sexta, em uma festa no Encantado, na mesma região da cidade, o soldado e paraquedista do exército Lucas Monteiro dos Santos Costa, de 21, foi morto enquanto bandidos invadiram o local atirando. Um amigo de Lucas, Tiago Freitas, 21, foi baleado na cabeça. Na segunda-feira, Henrico de Jesus Viegas de Menezes Júnior, de 19 anos, também foi atingido na cabeça durante um tiroteio na Comunidade Terra Nova. Ele ia recolher uma moto deixada para conserto numa oficina.
COMEMORAÇÃO
No evento, Witzel respondeu com elogios à PM e à política de Segurança do seu governo. Os policiais expulsaram os manifestantes do local e fecharam o portão do Solar do Jambeiro.
O governador disse que não irá rever a política de segurança de seu governo. “Não retrocederei. Se retrocedermos, teremos mais gente sendo morta. O roubo de cargas e carros e homicídios e roubo de rua sendo reduzido. Não aceitaremos que bandos de assaltantes estivessem na rua assaltando a população”, declarou.
Witzel também disse que está “no caminho certo”. Ele reafirmou o discurso de Segurança que defende desde a campanha. “É bom ele se render porque senão a gente vai continuar abatendo quem está de fuzil na mão”, ameaçou.
Governo diz lamentar “mortes futuras”
O secretário de governo do estado, Cleiton Rodrigues, defendeu a política de segurança do estado após seis inocentes morrerem em cinco dias de operações policiais no Grande Rio. Rodrigues lamentou ainda a possibilidade de futuras mortes e disse que não há enfrentamento “como está sendo colocado”.
“O governador e o governo do estado lamentam profundamente todas essas mortes. Essas e todas as outras que possam acontecer. Nós estamos todos os dias trabalhando para que elas não aconteçam”, disse o secretário.
“Mortes são inadmissíveis”, diz OAB
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio de Janeiro afirmou nesta quarta-feira (14) que tem profunda preocupação com a política de segurança pública do estado. De acordo com o órgão, a morte recente de seis jovens é algo “inadmissível e não podem ser tratadas como efeito colateral aceitável”.
O órgão classificou a política adotada como “sem inteligência e respeito a direitos e garantias da população.” O posicionamento segue e diz que “nenhum indicador de violência ou “propósito pacificador” justifica incursões policiais que desprezem a vida humana, com corte de raça e classe tão eloquente”.
A OAB disse ainda que estuda medidas contra esse “estado de coisas” e que irá prestar apoio jurídico às famílias dos jovens assassinados.