Margareth Teixeira, de 17 anos, estava, com o filho no colo, indo à igreja, quando foi morta por dez disparos “de arma com alta capacidade de destruição”
Nesta sexta-feira (16), a Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB-RJ emitiram uma nota de repúdio à declaração proferida, no dia 16 de agosto, pelo governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), que afirmou estar “no colo” dos defensores de direitos humanos os cadáveres dos seis jovens assassinados nos últimos dias durante operações policiais.
“Quando eu digo que quem está de fuzil tem que ser abatido, levantam-se vários defensores de direitos humanos; aí quando eles [bandidos] matam inocente, levantam a foto do inocente, dizendo que foi a polícia que matou”, disse o governador.
“Pessoas que se dizem defensoras de direitos humanos, ‘pseudodefensoras’ de direitos humanos, não querem que a polícia mate quem está de fuzil. Porque se não mata quem está de fuzil, quem morre são os inocentes. Então, está na sua conta, defensor dos direitos humanos. Esses cadáveres desses jovens não estão no meu colo. Estão no colo de vocês, que não deixam que as polícias façam o trabalho que tem que ser feito”, emendou Witzel.
Segundo as comissões, o governador afrontou o artigo 144 da Constituição Federal ao não reconhecer o papel da Polícia Militar de preservação da ordem pública. Não há legislação no Brasil que permita à polícia matar indiscriminadamente.
“Com esse tipo de afirmação, na verdade, o governador foge de sua atribuição de chefe das forças de segurança, ao tentar transferir para defensores de direitos humanos a responsabilidade de mortes ocorridas a partir de ações do Estado. A política de segurança defendida pelo governador tem, como método, violência e morte, enquanto a que os defensores de direitos humanos defendem é a política da vida para todos”, diz um trecho da nota.
Somente em 2019, a atual gestão do governo estadual alcançou o recorde de maior número de mortes por intervenção policial nos últimos 20 anos.
Nos 12 meses de 2018, foram mortas 1.534 pessoas pela Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Em 2019, já são 881 mortos.
Essa política de morte, defendida pelo governo, também vitima a própria polícia. No ano de 2018, 92 policiais militares morreram no Rio de Janeiro, sendo 24 em serviço, 13 eram policiais reformados e 55 estavam de folga no momento do crime.
Porém, somente em 2019, houve 119 pessoas atingidas por “balas perdidas” – 33 das quais morreram, sem que tivessem nenhum envolvimento com o crime (cf. Plataforma Fogo Cruzado).
A OAB-RJ havia afirmado, na quarta-feira (14), que tem profunda preocupação com a política de segurança pública do estado. De acordo com o órgão, a morte recente de seis jovens é algo “inadmissível e não podem ser tratadas como efeito colateral aceitável”.
O órgão classificou a política adotada como “sem inteligência e respeito a direitos e garantias da população.” O posicionamento segue e diz que “nenhum indicador de violência ou ‘propósito pacificador’ justifica incursões policiais que desprezem a vida humana, com corte de raça e classe tão eloquente”.
A OAB disse ainda que estuda medidas contra esse “estado de coisas” e que irá prestar apoio jurídico às famílias dos jovens assassinados.
JOVENS
Durante as últimas ações da Polícia nos morros cariocas, ao menos, seis jovens foram mortos, sem ligação alguma com o crime, em um período de cinco dias.
Gabriel Pereira Alves, 18 anos;
Lucas Monteiro dos Santos Costa, 21 anos;
Tiago Freitas, 21 anos;
Dyogo Costa Xavier de Brito, 16 anos;
Henrico de Jesus Viegas de Menezes Júnior, 19 anos;
Margareth Teixeira, de 17 anos.
Todos vítimas de uma política de “abate” de pessoas nas comunidades do Rio de Janeiro, levada a cabo por Witzel, no que ele e seus assessores chamam de “efeito colateral” da guerra contra o tráfico de drogas.
Gabriel Pereira Alves, de 18 anos, foi atingido no peito por uma bala às 7h de sexta-feira, enquanto aguardava em um ponto de ônibus na Tijuca, Zona Norte do Rio.
Já na noite de sexta, em uma festa no Encantado, o soldado e paraquedista do exército Lucas Monteiro dos Santos Costa, de 21, foi morto.
Um amigo de Lucas, Tiago Freitas, 21, foi baleado na cabeça.
Na segunda-feira, Henrico de Jesus Viegas de Menezes Júnior, de 19 anos, também foi atingido na cabeça durante um tiroteio na Comunidade Terra Nova. Ele ia recolher uma moto deixada para conserto numa oficina.
Dyogo Costa Xavier de Brito, de apenas 16 anos, foi morto durante uma operação da Polícia Militar. Atleta do América, sonhava em ser jogador de futebol profissional.
A última vítima, Margareth Teixeira, foi baleada e morta durante uma operação da Polícia Militar na Comunidade 48, em Bangu, na Zona Oeste do Rio, na noite de terça-feira, por volta das 19h30.
Margareth ia para a igreja com o filho, de apenas um ano e dez meses, no colo, quando os dois foram atingidos. Dez balas perfuraram o corpo de Margareth, disparadas por “arma de alta capacidade de destruição”, segundo o Instituto Médico Legal. O menino foi atingido de raspão no pé.
Sua irmã, Mariana, ao deixar o Instituto Médico Legal, declarou: “Margareth era uma pessoa doce, que queria entrar na Polícia Militar. Ela não morreu de ‘bala perdida’. Foi bala achada mesmo. Ela tomou 10 tiros. Não foi bala perdida”.
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