Dezenas de milhares de argentinos marcharam até a Casa Rosada, sede do governo, para exigir empregos, melhores salários e aumento dos subsídios à pobreza, em meio ao estouro de uma crise financeira que deixa o presidente Mauricio Macri isolado até das forças que o apoiaram desde sua eleição.
“A dívida é com o povo, não com o FMI (Fundo Monetário Internacional)”, dizia uma das bandeiras na manifestação, em referencia ao acordo pelo qual, em troca de 57 bilhões de dólares, Macri submeteu o país ao controle – que chama de supervisão – da política econômica do governo.
A chapa de oposição composta pelos peronistas Alberto Fernández e Cristina Kirchner obteve uma vitória arrasadora sobre o arrocho e desemprego de Macri nas eleições Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias (PASO) realizadas no domingo, 11, com uma percentagem de 49,2% contra 33,1% (16 pontos de diferença). A reação destemperada do presidente provocou a derrubada do mercado financeiro.
O Instituto Nacional de Estatística e Censos da Argentina, Indec, recentemente divulgou pesquisa mostrando que no primeiro trimestre de 2019 a pobreza no país atingiu 34,1% e a indigência chegou a 7,1% da população. No primeiro trimestre do ano passado, o índice indicava 25,5% dos argentinos em situação de pobreza.
Sindicatos, organizações de desempregados e de partidos de oposição, com faixas, bandeiras e cartazes enfeitaram a enorme manifestação que se concentrou na Praça de Maio, no dia 16, à qual se somaram milhares de manifestantes espontâneos.
As primárias tiveram um valor simbólico porque os partidos já tinham escolhido previamente seus candidatos à presidência, mas tornaram-se uma pesquisa precisa do que deve ocorrer nas eleições presidenciais de outubro. Daí a reação de Macri.
Um dia depois do resultado eleitoral, com o câmbio desfavorável ao peso disparando e a moeda argentina perdendo 15% em relação ao dólar, o presidente tentou chantagear: “Isso é só uma amostra do que pode acontecer” com a previsível vitória da oposição.
Imediatamente, milhares de cientistas e personalidades ligadas à produção cultural na Argentina divulgaram uma declaração pública onde expressaram sua preocupação com a fala irresponsável de Macri, assim como com a real situação econômica do país e exigiram ao governo que “assuma sua responsabilidade na crise a que nos conduziu”.
Até a grande mídia internacional buscou se distanciar das origens da crise econômica que atravessa a Argentina. Um artigo de opinião do jornal New York Times, na segunda-feira, 19, desmentiu que os resultados eleitorais das PASO tenham sido o detonador dos aumentos da semana passada.
“Quem tem a culpa da crise econômica na Argentina?” se intitula o artigo escrito na versão em espanhol do jornal estadunidense. Discordando dos argumentos de Macri que responsabilizou os votantes pela crise, o articulista Mark Weisbrot cita o desastre dos indicadores econômicos que são de responsabilidade direta do atual governo. “A pobreza se incrementou de maneira significativa, a renda por pessoa caiu e o desemprego aumentou. As taxas de juros dispararam de 32 para 75% atualmente; a inflação cresceu de 18 para 56%. A dívida pública cresceu de 53% a mais de 86% do PIB”, detalha o jornalista, assinalando que “tanto da perspectiva de um economista, como de um cientista social, não está claro o motivo pelo qual deveríamos temer ao kirchnerismo”.