Macri levou a Argentina a um quadro de falência econômica.
O dia 29 de agosto ficará conhecido como o dia em que Macri assumiu – ainda que pelas medidas e não por declarações acerca do verdadeiro quadro da economia argentina – o resultado de uma das aplicações mais submissas já vistas do receituário do FMI (juros mais elevados do mundo, tarifaços a torto e a direito, corte nos investimentos e nos serviços públicos, demissões em massa e endividamento desenfreado do país): a quebra da economia do país sob seu comando.
Foi com as medidas que ele e seus assessores, empenhados na destruição do poder aquisitivo do povo, chamam de “ajuste”, o que seria mais apropriadamente denominado de torniquete fiscal, a buscarem cumprir conforme lhes foi ordenado, as metas do FMI de reduzir o déficit fiscal (que serve para garantir pagamento aos bancos) a 2,7% do PIB em 2018 e 1,3% em 2019.
Sob o arrocho imposto ao país, o déficit fiscal passou de 6%, no fim de 2015, para 3,9% em 2017. No afã de ser mais realista do que o rei, Macri aplicou um arrocho tão estúpido que o déficit acabaria ficando mais baixo até do que exigido pelo próprio FMI: 2,4% em 2018.
A retração da economia, claro, veio junto.
É o que observou o economista Alfredo Zaiat, na matéria intitulada “A desindustrialização macrista” publicada pelo portal Página 12, em novembro de 2018, e traduzida e publicada no HP:
Nela, Zaiat ressalta que “a megadesvalorização, taxas de juros elevadíssimas em termos reais, abertura importadora, descenso do salário real, tarifaços e debilitamento do mercado interno é uma combinação demolidora para a indústria nacional”.
A matéria trata de um momento em que, sob o acúmulo de obstáculos macristas ao crescimento, a indústria argentina apresentou a maior queda em 16 anos, um decréscimo de 11,5% em setembro de 2018 em relação a mesmo mês do ano anterior: https://horadopovo.com.br/a-desindustrializacao-macrista/
“A derrapagem industrial de 11,5% foi o maior descenso em 16 anos, quando no mês de julho de 2002 se configurou uma queda de 12,2%. Jogou a indústria ao nível de 2009, ano que foi interrompido o ciclo ascendente que havia começado em 2002 e se estendera até 2012, com a pausa ocasionada pelo impacto negativo derivado da crise internacional. Especialistas dedicados ao estudo e acompanhamento da política exterior argentina reunidos no OCIPEx (Observatorio de Coyuntura Internacional y Política Exterior) identificaram que em setembro passado a indústria argentina foi a segunda que mais retrocedeu no ranking mundial, liderado por Burundi, onde houve um rebaixamento de 15,4%. Logo atrás da Argentina ficou Togo, com uma queda de 11,3%, Benin e Jordânia, com derrubadas de 9,6% e 8,8%, respectivamente”.
ACONTECE O CONTRÁRIO DO QUE MACRI AFIRMOU
Agora, trinta dias depois de afirmar – às vésperas das eleições preliminares onde seria fragorosamente derrotado – que os pagamentos a vencer da dívida estariam todos garantidos, Macri vem a público dizer que quer estender os prazos de pagamento nada mais nada menos do que às Letras do Tesouro Nacional argentino.
Diante do quadro adverso, como observa o analista financeiro Christian Buteler, “a perda de confiança dos investidores é absoluta”. Ou seja, o tal “mercado” (panaceia para todos os males da economia exaltada por Macri e seu séquito), não lhe oferece nenhuma salvação, ao contrário, em menos de quatro anos, de governar ao sabor das variações e a favor dos especuladores a que chamam de “investidores”, o tal caminho para a “estabilização via ajustes e austeridade” se demonstra um beco sem saída; o momento de fuga dos papéis argentinos já toma corpo e se expressa principalmente na alta incontida do dólar frente ao peso.
No desespero de tentar esconder a sua responsabilidade pelo descalabro, Macri tem tentado, no auge da crise, culpar os opositores que venceram por 49% a 32% (nas primárias) pela sua calamitosa política econômica, assim como aos que, sabiamente, optaram por votar na chapa opositora, Fernández/Cristina. Tratando aquela votação contrária ao governo como geradora da crise chamou os argentinos a “entenderem nestes dias que antecedem as eleições o papel de liderança”. Ou seja, dele, para vencer a crise, como se não fosse ele próprio e seu conjunto de medidas arrasa-quarteirão seus efetivos causadores.
Antes de examinar mais alguns números que demonstram de onde partiu o desenrolar da crise, vale destacar que, diante dela, ou melhor, de sua exacerbação, Macri toma novas medidas que só levarão a mais afundamento no atoleiro, além do fartamente noticiado alongamento dos pagamentos dos papeis de três para seis meses, mantidos os mesmos juros que já os tornaram impagáveis.
A primeira delas foi a de, a pretexto de conter a fuga dos que detêm títulos argentinos ou dólares, fazer o Banco Central elevar os juros básicos a 74,9% com uma inflação projetada de 54% para os próximos 12 meses; um juro em torno de estratosféricos 25% em termos reais. Isso só exacerba uma condição em que os juros argentinos, sob Macri, são, de forma disparada, os mais elevados em todo o mundo.
Quer dizer, ele promete pagar mais pelos títulos no futuro, quando declara que não consegue pagá-los nas atuais datas de vencimento. Sinceramente, é possível escancarar maior irresponsabilidade?
A segunda medida foi a queima acelerada de reservas, na vã tentativa de conter a depreciação da moeda, comprando dólares no mercado a um ritmo de 300 milhões de dólares ao dia, disparada de compras que, se continuada tende a esgotar o total das reservas do país em menos de três meses. Ainda assim, o dólar, nos últimos dias ultrapassou o valor de 60 pesos (550% acima do valor que Macri encontrou ao tomar posse).
A terceira medida é, mediante o que chama de “reperfilamento” dos papéis, apresentar ao FMI uma suposta responsabilidade com a solvência na qual somente os interessados em afundar o barco acreditariam e, assim, receber mais um desencaixe, por parte daquele fundo, de mais 6 bilhões e quatrocentos milhões de dólares até o dia das eleições. Assim, eleva a espiral de endividamento irresponsável e impagável junto aos credores internacionais, piorando mais ainda as condições para que o governo que provavelmente lhe seguirá, sob direção de Alberto Fernández, trabalhará para superar as dificuldades que impostas pelo desgoverno macrista.
O DESCONTROLE MONETÁRIO
A trajetória da desvalorização do dólar nos dá uma clara radiografia do descontrole a que Macri submeteu a economia argentina.
Quando seu governo assumiu, em 2015, o dólar era negociado a 8 pesos argentinos. As medidas que já citamos, em especial os tarifaços (multiplicando os custos com energia, água e gás para a população), foram rebaixando progressivamente o valor do peso até que, houve uma disparada e, em 24 de abril de 2018, o dólar bateu os 25 pesos. Na maior compra de dólares da história argentina, em um dia apenas, o Banco Central do país desgovernado por Macri dispendeu o equivalente a US$ 1.5 bilhões de suas reservas.
Nada conseguia estancar a desvalorização do peso e, em 28 de agosto, com o dólar chegando a mais de 32 pesos, uma perda de 41,6% até àquela altura do ano, Macri anuncia que pediu adiantamento ao FMI e que o montante a ser entregue pelo fundo ficaria em US$ 57 bilhões.
Com o povo argentino, que já sentiu na pele a desgraça causada por idas anteriores ao FMI, ocupando as ruas, dizendo não ao empréstimo, que na prática significava a abdicação do comando da economia do país, Macri declara: “Garantir o financiamento para 2019 vai nos permitir fortalecer a confiança e retomar o caminho do crescimento o mais rápido possível”.
Ao contrário do prometido por Macri, o que veio rápido, em exatamente um ano, foi a falência assumida na prática pelo próprio governo e a aceleração rumo ao despenhadeiro do qual só uma mudança de rumos, sob nova administração, que se entregue à árdua tarefa de reverter o tenebroso quadro, pode salvar o país, retomar o controle da economia e reconduzi-la ao crescimento.
NATHANIEL BRAIA