RJ: Ágatha foi a 16ª criança que polícia baleou
Governador, que se gaba por matar, levou três dias para falar do assassinato
Ágatha foi a quinta criança assassinada pela política de “abate” promovida pelo governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).
Ágatha tinha oito anos.
Na sexta-feira (20), ela foi baleada pelas costas por um tiro de fuzil, na comunidade da Fazendinha, Complexo do Alemão, quando voltava para a casa de sua mãe.
Witzel ficou três dias em silêncio. Na segunda-feira (23), disse, em coletiva de imprensa, que lamentava o ocorrido, mas que a política de segurança “está no caminho certo” e afirmou ser “indecente usar um caixão como palanque”.
“É indecente usar um caixão como palanque. Não podemos permitir que partidos de oposição venham a utilizar mortes de inocentes para palanque. O pacote anticrime é essencial”, defendeu Witzel, que celebrou a redução dos números de homicídios no estado a “patamares civilizatórios”. “A oposição está fazendo palanque. Preferi, então, reunir o nosso governo e dar uma explicação de Estado”.
Certamente, a população deveria aplaudir o assassinato de uma menina de oito anos por aqueles que deveriam defender a população.
No caso, o único que subiu ao palanque foi Witzel. A morte de Ágatha é demasiado eloquente, demasiado trágica – e demasiado criminosa – para precisar, ainda, de alguma agitação.
Assim, Witzel apenas acusava outros daquilo que estava fazendo.
Mas é inútil. Ágatha é a 16ª criança baleada pelo abate de Witzel – e a quinta a morrer. O que é necessário mais para julgar, não apenas essa política, mas o que é Witzel, Bolsonaro e outros fascistas?
Daí, toda a conversa estúpida sobre “utilizar mortes de inocentes para palanque”. A questão é que é ele que está matando os inocentes.
Os inocentes não estão morrendo por um capricho da natureza, muito menos estão se suicidando para desgastar o governo de Witzel.
Acontece que matar inocentes é a política de Witzel. Ou alguém acha que essa barbaridade é combate ao crime?
Witzel é uma cria de Bolsonaro – apesar de seu rompimento, suposto ou verdadeiro, quem sabia, no Rio de Janeiro, quem era Witzel, antes que Bolsonaro, sobretudo através de seu filho, Flávio (aquele do caso Queiroz), o apoiasse na campanha eleitoral?
A política (se é que se pode usar esse nome) dos dois é a mesma: bala no povo, que tem de ficar quieto enquanto eles devastam o Rio de Janeiro e o Brasil.
A morte de Ágatha expõe, como um nervo furado por uma agulha, esse crime travestido de política.
Daí toda a demagogia – e, nesse caso, demagogia nazista, sanguinária – de Witzel sobre o cadáver de uma criança.
É verdade, não são apenas as crianças que estão sendo assassinadas no Rio. Mas a dor de ver uma criança assassinada mostra, de modo mais pungente, mais agudo, o crime – e os criminosos.
Ágatha foi atingida quando estava com o avô em uma Kombi, na favela Fazendinha, no Complexo do Alemão, onde a família mora. Segundo testemunhas, ela estava sentada no veículo quando policiais militares atiraram em uma moto e atingiram o veículo, baleando a criança. Ela chegou a ser levada para a UPA do Alemão e transferida para o hospital Getúlio Vargas, mas não resistiu aos ferimentos.
Segundo a família de Ágatha não havia troca de tiros no momento.
Além de Ágatha… antes de Ágatha, foram assassinados:
– Kauan Peixoto, de 12 anos;
– Kauan Rosário, de 11 anos;
– Kauê Ribeiro, de 12 anos;
– Victor Almeida, de 7 anos;
– e Jenifer Cilene, de 11 anos.
Segundo a plataforma “Fogo Cruzado”, ao menos 16 crianças de até 12 anos foram baleadas no Rio de Janeiro neste ano.
“A gente não pode, de maneira nenhuma, ligar a morte da menina Ágatha à política de segurança do Rio de Janeiro”, disse Marcus Vinícius Braga, secretário de Polícia Civil. Na opinião do secretário, a morte da menina não põe em xeque a política adotada pelo governo Witzel. Provavelmente, deve ser uma prova de que essa política está certa.
DEMORA
O governador tentou justificar sua demora em se manifestar sobre o episódio. “Eu aguardei, fiz varias ligações até que eu pudesse fazer o juízo”, afirmou. E esclareceu: “Eu não sou desalmado, tenho sentimentos”.
Witzel afirmou também que tem uma reunião marcada com o ministro da justiça Sergio Moro na próxima quarta-feira para debater a questão da segurança no estado. O encontro já estava marcado antes da morte da menina Ágatha acontecer.
No Twitter, Witzel se eximiu de sua responsabilidade, no caso, enquanto chefe de Estado e culpou as pessoas que fazem uso “recreativo de drogas. Vocês são responsáveis pela morte da menina Ágatha: vocês que usam maconha e cocaína e dão dinheiro para genocidas”.
O problema é que, se existe algo que o assassinato de Ágatha demonstra, é que o genocida é ele.
OAB
A Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ) divulgou uma nota lamentando a morte da menina Agatha.
No texto assinado pelo presidente da seccional Luciano Bandeira, a instituição lamenta profundamente o ocorrido e lembra que “a morte de Ágatha vem se somar à estatística de 1.249 pessoas mortas pela polícia nos oito primeiros meses do ano. Um recorde macabro que este governo do Estado aparenta ostentar com orgulho”, afirmou a OAB-RJ
A OAB ainda “lamenta profundamente que a média de cinco mortos por dia pela polícia seja encarada com normalidade pelo Executivo estadual e por parte da população. A normalização da barbárie é sintoma de uma sociedade doente”.
O texto também critica a postura do governador Wilson Witzel que, horas antes do ocorrido, declarou que promoveria que um “combate e caça nas comunidades”.
“As mortes de inocentes, moradores de comunidades, não podem continuar a ser tratadas pelo governo do Estado como danos colaterais aceitáveis. A morte de Ágatha evidencia mais uma vez que as principais vítimas dessa política de segurança pública, sem inteligência e baseada no confronto, são pessoas negras, pobres e mais desassistidas pelo Poder Público”.
Até mesmo o prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (PRB) criticou a atuação das forças de segurança do Estado que sobem “o morro dando tiro para todo lado” e disse que “violência nunca gerou paz”. Durante a tarde, no Palácio da Cidade, Crivella pediu que o governador reveja a estratégia adotada para combater o crime nas comunidades e fez um apelo às polícias.
O prefeito do Rio ainda destacou que “se as ações ocorrem depois do início do horário escolas, as crianças estão dentro das escolas, ficam apavoradas. Temos os protocolos de segurança que foram estabelecidos e ensaiados, mas é algo muito traumático. Se formos analisar desde o início do ano, por mais de 700 vezes as escolas fecharam por causa de ações policiais nas comunidades. Fica difícil formar novos cidadãos, ter bom índice no Ideb se temos tantas aulas paradas. Se as ações são inevitáveis, que ocorram antes de iniciar o período escolas. É o apelo que faço”.
Crivella chamou a população carioca para denunciar os atos de Witzel. “Quando vemos as forças de segurança subindo o morro e dando tiro para todo lado, é o momento que a consciência do povo carioca precisa se erguer e fazer uma denúncia. Nas mil comunidades da nossa cidade, desgraçadamente, cresceu o crime, o tráfico, o horror. Com teias doentias nas quais caíram meninos e meninas enganados. Achando que, com dinheiro, iriam se libertar das tristezas e frustrações. Só que nas comunidades também há muita honradez, dignidade e amor ao próximo. Há uma população enorme que vive décadas vivendo terríveis adversidades”, disse.