O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), integrante da comissão encarregada de discutir o pacote anticrime do juiz Sérgio Moro, afirmou na segunda-feira (23), ao JN, que é contra a ampliação das regras do conceito de ‘excludente de ilicitude’ na legislação porque, segundo ele, “a lei de hoje é suficiente para responder a todas as necessidades da ação das forças da Segurança Pública”.
As excludentes de ilicitude estão previstas no artigo 23 do Código Penal brasileiro. São elas: o estado de necessidade, a legítima defesa, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito.
No projeto são acrescentados parágrafos que ampliam as salvaguardas da ação policial. São eles: § 1º O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. § 2º O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.
“Ampliar regras de excludente de ilicitude na prática é dar licença para matar”, observou o parlamentar. Na opinião do deputado, o Código de Processo Penal “já prevê os mecanismos de proteção aos agentes de segurança pública em seu trabalho de repressão ao crime”.
A inclusão deste tópico no projeto anticrime elaborado por Sérgio Moro é resultado do empenho pessoal e da insistência de Jair Bolsonaro que, já na sua campanha eleitoral, prometia implantar esse dispositivo na política de segurança pública. Segundo ele, a excludente de ilicitude permitiria que os policiais pudessem agir livremente em seu trabalho de repressão.
Desde que começou essa discussão, um número enorme de pessoas inocentes, em boa parte jovens e crianças, foram baleadas, e parte delas foram mortas, vitimas da transgressão à lei estimulada tanto por Bolsonaro quanto pelo governador do Rio, Wilson Witzel. Este último chegou a defender a ação de atiradores de elite em helicópteros contra as comunidades pobres do Rio de Janeiro. Essa atitude, que levou terror às favelas do Rio, ocasionou a morte de inocentes e fez com que deputados denunciassem o governador na ONU com responsável pelas mortes ocorridas nas comunidades.
A menina Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, é a quinta vitima infantil desta insanidade só este ano. Ela foi morta na noite de sexta-feira (20), baleada nas costas ao lado do avô e da mãe, dentro de uma Kombi, no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Outras 15 crianças foram baleadas neste período na Região Metropolitana do Rio.
O episódio da morte de Ágatha causou uma comoção no país inteiro e teve repercussão internacional. O governador do Rio e Jair Bolsonaro não se manifestaram até a segunda-feira, e, quando o fizeram, foi para defender a continuidade de sua estúpida política de segurança. Essa atitude truculenta e desumana gerou indignação e repúdio de toda a sociedade. O estímulo à violência policial por parte dos governos do Rio e dom governo federal entraram em cheque. O projeto anticrime de Moro passou a ser intensamente questionado no Congresso.
O deputado Orlando Silva também se pronunciou sobre o ocorrido. “O governador do Rio de Janeiro pratica uma política de segurança genocida. Não há outro nome quando forças policiais são instruídas a sobrevoar ou adentrar comunidades atirando antes de perguntar. Deve ser denunciado e pagar por seus crimes contra a Humanidade”, denunciou.
“Quando uma criança de 8 anos é morta a tiros pelo Estado todos nós morremos um pouco. É inumano não se condoer. Até quando?”, disse Orlando Silva, que integra o grupo de trabalho que discute no Parlamento o pacote anticrime enviado pelo governo.
Contestando a versão oficial de que teria havido troca de tiros entre policiais e bandidos no Complexo do Alemão na sexta-feira, o motorista da Kombi e o avô de Ágatha protestaram. “Não teve tiroteio nenhum. Foram dois disparos que ele deu. É mentira!”, gritava, muito abalado o motorista da Kombi (que ajudou a socorrer a menina) e que viu um policial atirando.
“Mais um na estatística. Vai chegar amanhã e dizer que morreu uma criança no confronto. Que confronto? Confronto com quem? Porque não tinha ninguém, não tinha ninguém. Ele atirou por atirar na kombi. Atirou na kombi e matou minha neta. Isso é confronto? A minha neta estava armada por acaso para poder levar um tiro?”, disse Aílton Félix, o avô de Ágatha.
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