No marco da comemoração do 69˚ aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o ex-prisioneiro político porto-riquenho Oscar López Rivera, que passou 36 anos encarcerado – 12 deles em solitária – fez uma exposição sobre as injustiças cometidas diariamente nos presídios norte-americanos. Este sistema penal – denunciou – se encontra em grande medida nas mãos de grandes interesses econômicos e atenta, particularmente, contra os setores mais vulneráveis da sociedade, ao mesmo tempo em que fracassa estrepitosamente em servir de ente reabilitador para aqueles que caem em suas garras.
“O sistema privado de prisões nos Estados Unidos é o que verdadeiramente converte o preso em uma mercadoria. Isso reflete algo que muitas vezes esquecemos e que a décima terceira emenda da Constituição dos EUA diz que a abolição da escravatura se aplica somente àqueles escravos que não estão presos, aqueles que estão presos não foram libertados. Essas pequenas palavrinhas são interessantes porque o sistema de prisões dos Estados Unidos ainda tem este sistema de escravidão. Não podemos nos esquecer disto”, alertou López Rivera, na atividade organizada pelo Comité Pró-Direitos Humanos de Porto Rico.
O trabalho forçado a que são expostos os confinados em prisões privadas – sistema que a administração de Barack Obama anunciou em agosto de 2016, no final do seu segundo mandato, que seria 2016 eliminado gradualmente– ajuda a gerar parte considerável dos ganhos de um setor que, já em 2014, superava U$ 629 milhões em lucros. Uma margem de lucro que, ressaltou o líder nacionalista, o preso e suas famílias não veem um único centavo.
Por outro lado, denunciou que “os cárceres têm um sistema em que se um familiar manda [por exemplo] U$ 100 a um preso, esse dinheiro não vai diretamente ao preso”. López Rivera frisou que o montante vai para um banco comercial, onde nunca ganha pela aplicação. “O banco sim ganha muito com esse volume de capital adicional que tem para investir”, sublinhou.
“Nós fizemos um cálculo de que pelo menos 100.000 destes presos federais recebem US$ 100 mensais. Assim, imagine a quantidade de dinheiro que os bancos dispõem em seus cofres às custas das famílias dos presos”, assinalou Rivera, durante o ato no Centro de Estudos Avançados de Porto Rico e do Caribe.
DISCRIMINAÇÃO
O líder nacionalista reiterou a enorme discriminação que recebem os negros e latinos do sistema penal norte-americano. Ambas compõem uma quantidade desproporcional dos cerca de 2,3 milhões de encarcerados nos Estados Unidos, a cifra mais alta do mundo.
Na visão de López Rivera, a transformação da estrutura penal nos EUA começou durante a administração de Richard Nixon, na década de 1970, mas aumentou com Ronald Reagan, nos 80. O início da chamada “guerra contra as drogas” foi combinado com uma crescente imigração hispana, vista como “perigosa” no país, para aumentar exponencialmente a população carcerária.
“O modelo da Califórnia [onde Reagan foi governador de 1967 a 1975] era o que mais presos per capta tinha nos Estados Unidos. E foi com essa mentalidade que esse senhor chegou a Washington como presidente e fez possível a privatização de prisões e a imensa quantidade de presídios que se construíram”, sublinhou.
“Quando entrei no cárcere, em 1981, havia 25.000 presos federais. Agora há mais de 200.000”, acrescentou o independentista, cuja sentença foi comutada em janeiro.
López Rivera condenou a atitude “hipócrita” dos Estados Unidos com os latinos há décadas, quando se apresentam como “Meca” do mundo. “Muitos acreditaram, incluindo muitos porto-riquenhos. Ofereciam uma mentira, pois quando os latino-americanos imigravam se davam conta que não era nenhuma Meca e terminavam nessas prisões”, declarou, frisando que geralmente são “os mais vulneráveis” e não os “verdadeiros traficantes”, quem sofre as consequências do esquema penal estadunidense.
Alertando sobre as deploráveis condições em que os EUA mantêm confinados os seus presos, López Rivera apontou que isso se deve a que estes não têm as mínimas garantias, o que limita as suas possibilidades de acesso a tratamentos médicos, recreação ou comunicação com seus familiares.
“O preso tem direito a três comidas ao dia e uma cama, o resto são privilégios, que podem perder-se quando se ganha a antipatia de um carcereiro. A maioria dos presos tem enfermidades e sua saúde está por um fio. O mais triste que pode haver é um preso doente, porque jamais receberá o tratamento que necessita”, assinalou.
Acima de tudo, destacou, as prisões estadunidenses “desumanizam”, fracassando no dever de reabilitar, pois não oferecem qualquer perspectiva de reintegração, “Todo preso pode se reabilitar, todo preso pode transcender o que foi anteriormente, porém necessita de ajuda”.
López Rivera aproveitou a oportunidade para fazer um chamado à libertação da porto-riquenha Ana Belén Montes, sentenciada em 2002 a 25 anos de prisão acusada de espionar em favor do governo cubano; e de Nina Droz, presa desde que foi acusada por fatos relacionados à greve de Primeiro de Maio desde ano.