Ação de Ciro Gomes e do PDT quer interromper processo de transferência do controle acionário da empresa de aviação brasileira para a norte-americana Boeing
O Ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu um prazo de dez dias, a contar de 23/10, para que o presidente Jair Messias Bolsonaro dê explicações ao tribunal sobre a transferência do controle acionário da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer S/A) para a empresa norte-americana The Boeing Company.
A decisão de Barroso foi tomada dentro da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 627, ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). Um dos autores da ação é o ex-governador Ciro Gomes (PDT) e o relator é o ministro Luís Roberto Barroso.
O governo brasileiro é detentor de uma ação especial da Embraer, conhecida como “golden share”, que lhe dá o direito de vetar qualquer decisão da empresa que coloque em risco interesses estratégicos do país. A transferência do setor de jatos comerciais, parte nobre da Embraer, para a Boeing, é considerado por especialistas como uma medida que afronta a soberania do Brasil.
O governo Bolsonaro não fez uso desse direito apesar da Embraer, a maior empresa privada de alta tecnologia do Brasil e campeã mundial de vendas de aeronaves com até 150 lugares. A empresa também participa de projetos militares com verbas públicas como a fabricação do cargueiro KC-390, a maior e mais moderna aeronave militar do hemisfério sul.
O ministro Barroso determinou também que, em seguida, sejam ouvidas a Advocacia-Geral da União e o Procurador-Geral da República, no prazo sucessivo de cinco dias.
O ex-governador do Ceará e ex-ministro da Fazenda, Ciro Gomes, um dos autores da ADPF 627, afirmou que “mesmo detendo o poder de veto, a União permitiu a transferência de uma atividade estratégica nacional para a iniciativa privada, de modo a perder a garantia que o resultado dessas atividades permaneçam subordinadas aos interesses do país”.
Ciro Gomes lembrou que “a Embraer S/A nasceu como fruto de vários fatores, a saber: a existência de uma base qualificada de técnicos e engenheiros, formados no ITA ou que trabalharam no CTA, com bom trânsito pela FAB; um contexto econômico favorável; um mecanismo de renúncia de Imposto de Renda, que poderia ser revertido para investimento em ações; o poderio dos militares durante a Ditadura de 1964; e a existência de base industrial apta a dar-lhe o devido suporte”, diz ele.
Para o ex-governador, “a venda para a Boeing é um crime de lesa pátria e precisa ser barrada”.
Informações do site do STF dão conta que “a ação questiona que a União, ao permitir a venda da empresa para a Boeing, não utilizou seu poder de veto autorizado por ações de classe especial (golden share), previstas no artigo 17, parágrafo 7º, da Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas).
Essas ações dão ao Estado o direito de barrar decisões estratégicas no âmbito de companhias privatizadas. O partido sustenta que, apesar de a Embraer ter sido privatizada em 1994, a União manteve a posse de golden share com fundamento na defesa da soberania nacional e dos interesses estratégicos do país”.
O PDT denuncia que “a negociação em curso busca fragmentar a parte lucrativa da Embraer e transferi-la para a nova companhia a ser criada (NewCo), que absorverá 100% das operações e dos serviços da aviação comercial e ficará sob o controle acionário, operacional e administrativo da Boeing, cabendo à Embraer “o ínfimo percentual de 20% das ações”.
Para o partido de oposição, “a União, ao não utilizar seu poder de veto na Assembleia Geral Extraordinária de acionistas realizada em 26/2, ofendeu os princípios constitucionais da soberania e do desenvolvimento nacionais”.
Outro argumento levantado por Ciro Gomes é o de ofensa aos princípios do valor social do trabalho e da busca do pleno emprego, diante de notícias de que a Embraer vai conceder férias coletivas em janeiro de 2020 a todos os seus empregados no Brasil (cerca de 15 mil) a fim de preparar a transferência do controle da divisão de aviação comercial.
Ainda conforme o PDT, a negociação ameaça a existência do setor de defesa da Embraer, pois o setor de aviação militar e de desenvolvimento tecnológico depende dos recursos gerados pelo de aviação comercial.
O partido pede a concessão de medida liminar para suspender a negociação entre a Boeing e a Embraer. No mérito, requer que o STF anule o processo de venda da empresa e determine ao governo federal que se manifeste em observância aos direitos previstos em golden shares. A própria realização da assembleia que aprovou a operação é alvo de pedido de nulidade na ação.
O aviador e professor do ITA, Wagner Rocha, denuncia que a negócio está sendo apresentado como uma joint venture, mas, na verdade, segundo ele, não passa de uma cisão da Embraer com entrega do setor lucrativo da empresa para a Boeing.
O presidente da Associação Brasileira de Investimentos (Abradin), o economista Aurélio Valporto, também destaca que a venda “atende a interesses inconfessáveis” e é prejudicial aos acionistas da empresa.
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