Moshe Menuhin e seu filho Yehudi, o maior violinista do século passado, defenderam a igualdade e a justiça para os palestinos como premissa para a paz na região. Condenando o regime de apartheid israelense, Moshe declarou: “judeus deveriam ser judeus, não nazistas”
GRACE HALSELL*
Moshe Menuhin, um dos primeiros anti-sionistas, uma vez escreveu para mim, “judeus deveriam ser judeus – não nazistas”. Ele estava falando sobre a opressão israelense aos palestinos.
Sem dúvida Moshe Menuhin, com quem eu me correspondi por um período de 12 anos até sua morte, ficaria contente em saber que seu filho, um violinista famoso, tem a mesma firmeza ao se posicionar contra o sionismo. E de fato, Yehudi Menuhin tem, a meu ver, mostrado ainda mais coragem do que seu pai. Nesta era, o sionismo está infinitamente mais forte e mais perigoso do que quando Moshe Menuhin se expressou. E também, o pai foi um dos vários grandes filósofos liberais judeus anti-sionistas que alertaram contra o sionismo. Mas Yehudi Menuhin resiste virtualmente sozinho na sua causa anti-sionista, e isto é de fato verdade em seu terreno, a música.
Em 1971, eu tive a oportunidade de visitar Yehudi Menuhin depois de um concerto que ele deu com a orquestra sinfônica de Detroit. Eu fui até os bastidores com uma amiga. Dorothy Johnson, uma mulher rica e influente que apoiava a arte, principalmente a sinfônica de Detroit. Ela conheceu pessoalmente Yehudi Menuhin e sua esposa Diana, ex-atriz inglesa e dançarina de balé. Os dois, Menuhin e sua esposa foram acolhedores e gentis. Diana falava mais. Alta e atraente, ela foi aberta e franca se referindo ao poder dos sionistas para diminuir o número de concertos que o seu marido poderia dar. Diana Menuhin disse depois que isso ficou revelado, que Yehudi Menuhin sentiu haverem dois lados do conflito no Oriente Médio e que, especialmente depois de haver dado um concerto para beneficiar órfãos palestinos, seus agendamentos caíram dramaticamente.
Nessa época, eu achei difícil de entender como qualquer um cancelaria a performance do, talvez, maior violinista vivo porque ele não estaria dando a Israel seu apoio cego e total. Agora, ainda que um quarto de século mais tarde, eu percebo que, nos anos que se seguiram, pessoalmente não vi o nome de Menuhin listado como solista em qualquer sala de música dos Estados Unidos.
Menuhin, nascido em Nova Iorque, mudou-se para a Inglaterra se tornando um cidadão britânico em 1985. E a Inglaterra fez dele Lord Menuhin. Ele tem uma escola para músicos na Inglaterra e uma academia na suíça para jovens músicos talentosos, aos quais ele freqüentemente conduz, e ajudou a fundar uma série de festivais de música. Ele é detentor Prêmio da Paz Nehru e é embaixador da boa vontade pela UNESCO.
Yehudi Menuhin nasceu em 1916 de pais judeus russos que emigraram separadamente através da Palestina. Alarmado com o crescimento do sionismo militante, Moshe Menuhin deu voz ao sentimento de tantos judeus como Martin Buber, Judah L. Magnes, Albert Einstein e Hannah Arendt, todos os quais se identificaram como não sionistas mas como integrantes do judaísmo.
Moshe Menuhin expressou vários temas que o seu filho endossou de forma consistente:
Justiça para os árabes: “O ensinamento do judaísmo profético que eu recebi do meu avô” disse Moshe Menuhin, “não permite que eu me transforme em uma pessoa que odeia os árabes. Os judeus e árabes podem e devem se tornar bons vizinhos e colaborar conjuntamente em todos os sentidos. E assim que os árabes ganhem seu Estado político e liberdade (na Palestina) e, na medida em que o mundo se concentra cada vez mais na paz, justiça e ajuda mútua, as linhas de fronteira deixarão de ter qualquer significado”.
“Igualdade Absoluta”
Yehudi Menuhin, estava seguindo os passos do pai quando, dirigindo-se ao Knesset [parlamento israelense] na ocasião de recebimento da maior honraria israelense pelas suas realizações enquanto músico, declarou, em 1991: “Vocês devem amar se desejam ser amados, vocês devem confiar para serem confiáveis, servir para serem servidos”. Ele acrescentou que se os Palestinos possuírem um Estado separado ou se junto com os israelenses em um Estado Federado, uma coisa é certa: Entre palestinos e israelenses, “tem que haver reciprocidade absoluta, igualdade absoluta”.
Sem exclusividade: Logo cedo, Moshe Menuhin discursou contra a idéia de judeus exigindo Jerusalém como uma cidade exclusivamente judaica: “Os judeus no mundo nunca precisaram de Jerusalém para suas vidas espirituais”. Por 2000 anos, cada pai apontou a seu filho, “foi a diáspora que deu bens espirituais para aqueles poucos judeus que viveram em paz com os árabes na Palestina Árabe. Com a chegada da nova ordem mundial de natureza civilizada, tais demandas de influência sobre centros espirituais se tornaram arcaicas e fora de época. O melhor de todas as nações e raças pertence a toda a humanidade, e as fases negativas da evolução vai descartá-las como o lixo ‘espiritual’.”
Em uma entrevista de 1996, Yehudi Menuhin novamente ecoou os sentimentos de seu pai: “A idéia de Jerusalém como uma cidade exclusivamente judaica é impensável porque muitos grupos diferentes se sentem leais a ela, religiosa e politicamente, e todos que tentaram tratar Jerusalém como sua foram à ruína.”
Moshe Menuhin disse que deixou Israel por que viu que os sionistas estavam adorando não a Deus mas a seu próprio poder. E uma vez na América, disse que os judeus deste país deveriam antes de tudo ser americanos – não conferindo lealdade prioritariamente a uma terra estrangeira. Ele estava esperançoso de que isso passaria.
Em uma entrevista anterior neste ano, Yehudi Menuhin disse a um repórter da Reuters que se entristeceu pela renovação da guerra no Oriente Médio, “por que Israel precisa de amigos e a reação ao presente desencadeamento de matança indiscriminada não vai dar a Israel quaisquer amigos.”
Em uma bonita autobiografia, Viajem Inacabada, Yehudi Menuhin conta como ele começou a tocar violino quando tinha quatro anos de idade. O leitor pode imaginar um pequeno garoto com bermuda tendo a confiança de se apresentar diante de músicos distintos e de anunciar que eles deveriam lhe dar ouvidos. Ele estreou como violinista com apenas 7 anos de idade. Aos 13, já havia se apresentado em Paris, Londres, Nova Iorque e Berlim. Em Berlim, sua apresentação foi saudada pelo físico Albert Einstein.
Um repórter da Reuters, Roger Jeal, escreveu, em Londres, que Yehudi Menuhin era, provavelmente, o músico mais bem pago do mundo “antes de estender sua atuação à condução e a lecionar.” Alguém poderia pensar se a mudança nas quantias que recebia – e na quantidade de concertos que tocava – não aconteceu porque ele cada vez mais acrescentava à apresentação de violino a fala sobre maior entendimento e justiça – não apenas para judeus – mas para toda a Humanidade.
Este ano, Yehudi Menuhin completou 80 anos. Eu o saúdo como um de meus grandes heróis. E me parece que o pai Moshe Menuhin teria muito orgulho de seu filho.
* Texto originalmente publicado pela revista Washington Report on Middle East Affairs