(HP, 02 a 04/03/2916)
A conspiração – não há como chamar por outro nome – do governo Dilma para entregar as reservas de petróleo do pré-sal às petroleiras dos EUA e Europa (Chevron, ExxonMobil, Shell, BP, BG, Total) resumiu notavelmente a luta em nosso país: qual a diferença entre Serra e Dilma? Uma vez que a careca não é uma diferença essencial, talvez seja a arrogância…
A Petrobrás foi capaz de descobrir o pré-sal e extrair petróleo de todos os poços que perfurou nessas reservas. Entregá-las aos monopólios estrangeiros nem ao menos conta com a já esfarrapada desculpa de outros tempos: a da suposta capacidade técnica dos alienígenas.
Nem mesmo existe aquela utilizada por Fernando Henrique ao quebrar com o controle nacional sobre o petróleo: a do risco exploratório. No pré-sal, não existe risco. O petróleo já foi descoberto. Pela Petrobrás.
Porém, qual é a política industrial de Dilma? Obviamente, acabar com a indústria nacional, sobretudo pelo estrangulamento com juros e desnacionalização monopolista. Em dezembro, a produção (física) industrial voltou ao nível de janeiro de 2009 e o emprego industrial estava -16% em relação a junho de 2018.
Essa política, a de tornar o Brasil uma colônia que exporta petróleo ou minério de ferro e importa gasolina, diesel, plásticos – e qualquer produto industrializado, mesmo que seja café torrado, trilhos, ou, pior ainda, pesquisas de opinião sobre o vírus zika na Paraíba – tem como grande meta (?) tornar o país algo como era na época anterior ao governo Wenceslau Braz (1914-1918), ou, talvez – a julgar pela infestação de Aedes aegypti -, como era na época anterior ao governo Rodrigues Alves (1902-1906).
O que publicamos nesta página é a resposta do fundador da Petrobrás, Getúlio Vargas, a uma homenagem de operários e industriais nacionais, ocorrida em 11 de novembro de 1940, no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.
Nessa época, a Petrobrás ainda não fora fundada – o que ocorreria em outubro de 1953, após uma longa batalha, nas ruas e no Congresso.
Mas o pensamento de Getúlio já era bastante claro.
Ele condena “o errôneo conceito econômico do primeiro período republicano, que nos impunha o agrarismo como fatalidade geográfica. (…) os arraigados preconceitos que vigoraram em matéria econômica durante cinquenta anos e que nos chumbavam à situação de país semicolonial, votado, fatalmente, a vender produtos da terra e comprar manufaturas.
“Já em várias oportunidades sublinhei”, diz Getúlio, “a verdade bem conhecida a respeito da dependência em que ficam os países produtores de matérias-primas em relação às potências industriais”.
Completamente avesso a discursos pneumáticos (aqueles cujo conteúdo é composto de ar – ou de “vento estocado”, como diria uma praticante contumaz do gênero), o presidente Vargas se detém em analisar a mentalidade anti-industrial:
“Os especiosos argumentos que alimentavam o tema dos agraristas sistemáticos eram, em resumo, assim concebidos: não temos combustíveis minerais – carvão e petróleo – e, consequentemente, apesar da abundância de ferro, não podemos ser um país industrializado; resta-nos exportar os minérios como matéria-prima e comprar as máquinas; o nosso parque fabril deve reduzir-se a pequenas indústrias de consumo, concentradas nas zonas de maior densidade demográfica, sob a proteção das barreiras alfandegárias.
“As pesquisas dos dois últimos anos destruíram, por completo, essas ideias falsas. O petróleo, que se proclamava inexistente em território nacional, jorrou nos poços de Lobato e, graças à persistência do governo, dará, em breve, uma boa quota do consumo atual. Como as prospecções são recentes e não se improvisam as instalações dessa natureza, atacamos o problema por outro lado, lançando a Estrada de Ferro Brasil-Bolívia, que nos levará a incrementar a produção nesse país amigo, pelo acesso fácil aos seus vastos e conhecidos lençóis de combustível líquido. Quanto ao carvão, viu-se, em dez anos, decuplicada a sua produção, como resultado das medidas governamentais, e inteiramente assegurado o fornecimento de coque metalúrgico para a indústria siderúrgica”.
Note o leitor que Getúlio estava completamente consciente do objetivo da industrialização “completa”. O que se segue quase parece destinado a desmoralizar certas teorias sobre a suposta “industrialização restringida”, que seria característica da sua época, em oposição a uma industrialização “ampla” (alguns usam, mesmo, o termo “pesada”), que seria aquela trazida ao país pelas multinacionais – sobretudo automobilísticas.
Getúlio não chegou a conhecer essas aberrações teóricas, de resto inteiramente submissas, neocoloniais. Pelo contrário, diz ele em 1940:
“Com tais premissas, não pode haver dúvida sobre o êxito das nossas indústrias básicas, que permitirão ao país agrário, preso aos azares do mercado mundial, bastar-se a si mesmo. Isto quer dizer, noutros termos: capacidade para fabricar máquinas em geral, de modo que a própria agricultura, de extensiva e rotineira, possa passar a intensiva; possibilidade de forjarmos os instrumentos da nossa defesa, motores para os nossos aviões, navios para a frota, trilhos, locomotivas e automóveis para as estradas.
“Falando, neste momento, aos homens que vivem precisamente votados ao labor industrial, não lhes falamos apenas ao raciocínio mas também ao seu sentimento de brasileiros. Ferro e carvão para produzir o aço das nossas máquinas, petróleo para movimentá-las: são as aquisições fundamentais desta fase da vida nacional”.
Nada disso, evidentemente, pode convencer quem tem uma cabeça de lacaio a não ser lacaio. Mas é suficiente para – se fosse preciso (mas sempre é) – aquilatar a dimensão microbiana da atual ocupante do Planalto e de seu entorno. Assim como a grandeza de Getúlio.
Aliás, a malta aboletada agora no poder, sempre odiou Getúlio, Jango e qualquer coisa que tivesse parentesco com eles. Mas, no momento em que o povo os repudia, de repente resolveram se aproveitar da memória dos nossos heróis.
Tivemos bastante dúvida em colocar nesta introdução tantas citações – trechos que, quase todos, o leitor, depois, lerá outra vez no próprio texto.
Mas a verdade é que ler duas vezes (ou até mais) esses trechos não poderá fazer mal algum a nenhum brasileiro.
Por outro lado, o leitor que não ler o texto, acreditando que tudo está nessas citações, cometerá um erro triste, que somente servirá para que não tome conhecimento de algo indispensável à cultura de um brasileiro – ainda que apresentemos o discurso de Getúlio em forma condensada (aqueles que quiserem a íntegra, ela está em “Getúlio Vargas”, org. Maria Celina D’Araujo, Perfis Parlamentares nº 62, Ed. Câmara, Brasília, 2011, pp. 411-428).
Sendo assim, terminamos com a avaliação de Getúlio sobre os 10 anos decorridos desde a Revolução de 30:
“A atividade deste decênio (…) revela um fato de importância transcendente: o valor da produção industrial mostrou-se superior ao da produção agrícola. Isto quer dizer que o país atingiu sua fase de crescimento equilibrado, forrando-se, pouco a pouco, à dependência econômica, que é característica dos produtos exclusivos de matérias-primas e gêneros de alimentação. Já atingimos o grau de adiantamento suficiente nas indústrias de transformação, e, por felicidade, vimos o nosso esforço coroado de êxito no preparo das bases de uma etapa superior do seu desenvolvimento”.
C.L.
GETÚLIO VARGAS
Só há uma classe em antagonismo permanente, cuja nocividade é preciso combater e reduzir ao mínimo: a dos homens que não contribuem para o engrandecimento do país, a dos ociosos, a dos parasitas.
Até 1929, o Brasil, em matéria de organização política, era o domínio da ficção eleitoral; na economia, o laisser faire, a não intervenção do Estado, contrastava com o ambiente mundial de controle e planeamento; nas finanças, a desordem e a dissipação erigidas em princípio, com o abuso do crédito externo a que raros delegados do poder não sucumbiram, salvaguardados pela transitoriedade dos mandatos; na educação, a rotina; no serviço público, a clientela política.
Os estados e os municípios, com poucas exceções, não passavam de feudos em que se processava a sucessão política como se fosse a de bens privados. Negócios públicos e assuntos domésticos tinham soluções paralelas, quando não ocorria os últimos determinarem a solução dos primeiros.
E esse mal-estar da sociedade brasileira – o protesto silencioso das consciências honestas e altivas, o generalizado descontentamento do povo –, tudo isso veio traduzir-se, afinal, no movimento revolucionário de 1930. Porque, é preciso assentar de uma vez por todas, aquela jornada não foi um levante militar nem uma querela eleitoral resolvida pelas armas: foi um movimento empolgante, espontâneo e profundo – instrumento necessário da reconstrução nacional.
A sua vitória exprimia uma determinação inflexível das forças sociais. O Brasil que queria progredir, crescer, civilizar-se, não podia suportar por mais tempo as instituições caducas, as praxes e formalismos viciosos, que deformavam toda a vida nacional e impediam seu crescimento e expansão.
A partir de 1930, retomamos o ritmo de crescimento da Primeira Guerra Mundial, passamos a compreender o verdadeiro objetivo da nossa expansão, repudiando o errôneo conceito econômico do primeiro período republicano, que nos impunha o agrarismo como fatalidade geográfica e nos levou aos males da monoprodução.
Os revolucionários de outubro convenceram-se de que o lugar-comum de país essencialmente agrícola era uma expressão falsa, convindo apenas aos interesses da usura internacional, à política dos grupos domésticos e aos industriais sustentados pelos favores aduaneiros.
Já em várias oportunidades sublinhei a verdade bem conhecida a respeito da dependência em que ficam os países produtores de matérias-primas em relação às potências industriais, mostrando como, em época de violentas perturbações sociais, é precário o destino dos povos impossibilitados de armar-se e defender-se.
Aplicamos, por isso, as melhores atenções do governo à correção das graves deficiências que afetavam as bases da nossa economia.
Na esfera das finanças públicas e da administração, esforços sem paralelo fizeram-se para o desenvolvimento equilibrado do país, através de empreendimentos de caráter reprodutivo, melhoria de serviços públicos e verificação exata dos ônus e obrigações existentes.
No que diz respeito à defesa nacional, nosso esforço não tem, igualmente, precedentes.
Construindo, reconstruindo ou ampliando instalações, aumentando o patrimônio público com aquisições de grande vulto, conseguimos arrecadar, em 1939, o duplo das rendas de 1930.
A rede ferroviária, que atingia 32.000 quilômetros em 1930, foi acrescida de 3.000 quilômetros, sem contar a reforma quase total do material fixo e rodante, porque, em algumas estradas, não se substituíram trilhos nos últimos trinta anos.
A eletrificação da Central do Brasil, melhoramento sempre adiado, teve afinal início e prosseguirá, como até aqui, financiada com os recursos nacionais.
Os 113.000 quilômetros de rodovias existentes estão elevados atualmente a 226.000. As rotas aéreas em tráfego, que eram de 7.245 quilômetros em 1929, são hoje oito vezes mais extensas, atingindo 56.000 quilômetros. As linhas telegráficas aumentaram de 5.000 quilômetros, e a rede de radiocomunicações, que contava 80 estações em 1930, dispõe agora de 120 postos principais de emissão, espalhados por todo o país, além das emissoras particulares, que de 5 passaram a 64.
Com o aparelhamento de portos gastou a União nesse período mais de 120.000:000$000, e, para a frota mercante do Estado, foram adquiridos 22 vapores de passageiros e carga, com a capacidade de 117.000 toneladas, além das despesas de 50.000:000$000 com a encampação do Lloyd Brasileiro.
O trabalho de valorização do solo, pela açudagem e irrigação das zonas semiáridas e dessecamento das áreas pantanosas, assumiu caráter de realização ininterrupta e metódica. No Nordeste, as obras contra as secas não se reduzem a trabalhos de engenharia hidráulica: visam a transformação econômica da região, dando estabilidade às populações, garantindo-as contra os flagelos e facilitando o contato com o litoral e os outros centros produtores do país.
Possui igual alcance econômico o saneamento das terras baixas do estado do Rio. Essa vasta região, antes abandonada e inabitável, está sendo transformada no celeiro natural da metrópole brasileira. Foram saneados 3.000 quilômetros quadrados de terras, em grande parte já ocupados por culturas produtivas, e breve ficarão prontos mais 1.700, além de 4.000 quilômetros de rios desobstruídos.
A inversão de dinheiros públicos nessas obras soma algumas centenas de milhares de contos e virá beneficiar a economia geral e a saúde de mais de 2 milhões de brasileiros.
O problema da educação foi atacado sob todos os seus aspectos. Os serviços educacionais, que consumiam, até 1930, 6% das despesas públicas, absorvem, atualmente, mais de 10%. O ensino primário passou a receber orientação uniforme, conjugando-se os recursos da União, dos estados e municípios, para imprimir-lhe a maior amplitude possível. O resultado é que, em 1930, as escolas do país eram frequentadas por 2 milhões de alunos, enquanto a população escolar, em 1939, atingia 4 milhões.
A nacionalização do ensino e do professorado constitui iniciativa vitoriosa. Fecharam-se as escolas de língua estrangeira, substituindo-as por escolas nacionais. Os ensinos secundário, superior e profissional passaram por completa remodelação, com o fim de melhorá-los em qualidade e torná-los acessíveis a maior número de estudantes.
Em 1931, existiam 177 colégios; atualmente, 657. Organizou-se a Universidade do Brasil, erigida em padrão do ensino superior, proibindo-se o funcionamento das escolas livres e não reconhecidas. Os cursos profissionais aumentaram consideravelmente. O ensino comercial conta 278 estabelecimentos, contra 83 em 1930, e o ensino industrial passou por completa remodelação, construindo-se 15 estabelecimentos modernos na capital federal e nos estados. Instalaram-se também as Escolas de Ciência e Filosofia e de Educação Física, que não constavam dos currículos existentes.
A preocupação de levantar o nível sanitário das populações sempre esteve presente nas resoluções governamentais. Temos procurado combater, sem medir sacrifícios, todas as causas de depauperamento do homem e das suas resistências físicas. As endemias, a lepra, a tuberculose, a sífilis e o câncer são normalmente visados pelo nosso aparelhamento de assistência hospitalar e profilática, articulado em todo o território nacional. Mantém-se o combate profilático à febre amarela e conseguiu-se dominar o alastramento da malária produzida pelo mosquito africano.
Além das ampliações dos serviços existentes e que foram desenvolvidos, com hospitais novos, centros de saúde e organizações de higiene, gastaram-se 80.000:000$000 com a malária, sendo metade dessa importância nos dois últimos anos; concederam-se 38.000:000$000 de subvenções a instituições privadas de filantropia; despenderam-se 50.000:000$000 no combate à lepra, construindo, reconstruindo e ampliando 38 unidades, entre leprosários, colônias e preventórios.
Para o ataque à tuberculose, edificaram-se 12 sanatórios, com capacidade de 4.200 leitos, no custo de 23.000:000$000.
É preciso referir, ainda, o que se vem fazendo com o objetivo de prevenir as doenças. As obras de saneamento e abastecimento d’água têm sido ampliadas em todos os centros urbanos do país, destinando-se-lhes recursos especiais, o que muito contribui para a melhoria das condições higiênicas gerais.
Também, nos últimos anos, além dos serviços novos de educação e higiene, promoveu-se incansável campanha para a boa alimentação popular, e, no setor das indústrias, instalam-se refeitórios capazes de alimentar os trabalhadores, sadiamente e por preços módicos.
Generalizam-se, igualmente, os cuidados pela saúde infantil. Fundaram-se centros de puericultura e instituiu-se o amparo legal à família, visando estimular as proles numerosas.
É oportuno, finalmente, lembrar que os progressos deste decênio têm o mais decidido cunho nacional.
São obra de brasileiros para brasileiros, tanto no que respeita ao trabalho humano, como aos valores econômicos. Tudo se fez com os nossos próprios recursos. Pequeno tem sido o afluxo de capital estrangeiro e, igualmente, o de imigrantes. Entre 1920 e 1930, entraram cerca de 200 milhões de libras de empréstimos a longo prazo e um milhão de imigrantes; no decênio findo, tivemos apenas 290.000 imigrantes e nenhum empréstimo.
As únicas utilizações do crédito público no exterior limitaram-se às transações de base puramente comercial, feitas, em 1938 e 1940, com o Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos, a prazos curtos, e no montante de 30 milhões de dólares. Como é sabido, a primeira operação de 5 milhões foi destinada totalmente à aquisição de material ferroviário, e a segunda, para a montagem da grande usina siderúrgica de Volta Redonda.
Internamente, entretanto, fez-se a mobilização possível de capitais, dando em resultado que o Banco do Brasil, cujos empréstimos à produção, no ano de 1929, foram de 585.000:000$000, emprestou, em 1939, um milhão e 100 mil contos, e as Caixas Econômicas, que dispunham de 500.000:000$000 de depósitos em 1929, chegaram a quase 2 milhões de contos em 1940.
Além disso, entraram na corrente circulatória da finança nacional um milhão e 845 mil contos de réis, montante das reservas dos institutos de seguro social.
A organização de assistência ao trabalhador é obra exclusiva da Revolução de 1930. Antes, bem o sabeis, o assalariado não tinha amparo legal e as suas reivindicações, ainda que justas, eram “casos de polícia”.
Possuímos uma legislação trabalhista adaptada às nossas necessidades sociais e das mais completas, compreendendo: a proteção ao trabalhador nacional, pela fixação dos 2/3 e igualdade de salário em relação ao estrangeiro; a jornada normal de 8 horas, excluídas as indústrias insalubres; a garantia do repouso dominical e de férias remuneradas; o salário mínimo; a proteção contra a despedida injusta; a proteção especial do trabalho da mulher, especialmente a gestante; a proteção ao trabalhador menor de 18 anos; a proteção contra os acidentes e as doenças profissionais; a garantia do ensino profissional para os aprendizes dos estabelecimentos industriais; a criação dos refeitórios para operários; a proteção a diversas modalidades de trabalhadores intelectuais; o reconhecimento dos contratos coletivos e possibilidade de sua extensão a todos os profissionais da mesma categoria; a Justiça do Trabalho.
Mas essa assistência não se limita às providências de ordem legal. Abrange também o amparo econômico.
PREVIDÊNCIA
Em 1930, existiam 43 caixas de aposentadorias e pensões, com 142.000 associados, cujo salário anual, base da contribuição, era de 472.000:000$000.
Em 1939, essas organizações abrangiam 6 institutos, com 1.550.000 associados e o salário de 4.500.000:000$000, e 90 caixas, com 290.000 associados e o salário de 1.100.000:000$000, que distribuíram cerca de 783.000:000$000 de benefícios através de aposentadorias, pensões a herdeiros e socorros médico-hospitalares, sendo que, até 1930, o total desses benefícios era, apenas, de 105.000:000$000.
Além disso, com os recursos reservados às carteiras prediais, iniciou-se o programa de construção de lares para os trabalhadores. Na capital federal e nos estados, já são numerosas as vilas próprias confortáveis.
O homem do trabalho, no Brasil, pode considerar-se um elemento perfeitamente integrado na vida social. Ganhou em dignidade política e conseguiu ver estabilizado o seu esforço, com a garantia do presente e a segurança do futuro da prole.
PRODUÇÃO
A produção total monta a 27 milhões de contos, evidenciando grande aumento na parte industrial. A parte agrícola, ainda muito presa à monocultura, representa uma parcela de cerca de 9 milhões de contos, enquanto os produtos animais valeram 3 milhões, mais ou menos, e os minérios, aproximadamente um milhão.
A produção industrial revela um surto ininterrupto. De 4 milhões e meio em 1930 passou a 12 milhões, valendo tanto quanto a produção total daquele ano.
A tonelagem de transporte do comércio exterior e da cabotagem também cresceu animadoramente. De 2 milhões de toneladas de frete para o exterior, passamos a 4 milhões, enquanto o intercâmbio dentro do país, por via marítima e fluvial, passou de 1.300.000 toneladas a 3 milhões e meio.
Nas indústrias de base, o mesmo ritmo acelerado pode observar-se: 35.000 toneladas de ferro e 25.000 de aço eram os nossos totais. Agora tivemos, em 1939, 150.000 toneladas de ferro e 110.000 de aço. O cimento, importado em larga escala naquele tempo, é por nós produzido na quase totalidade. De 80.000 toneladas, passamos a 700.000, em pleno ritmo de crescimento.
O carvão nacional, cuja produção era de 100.000 toneladas em 1929, ultrapassou o milhão, no ano findo. O álcool combustível, resultado da iniciativa governamental em 1932, subiu de 19 milhões de litros, naquele ano, a 320 milhões, em 1939, representando economia de 65.000:000$000 em nove anos.
Por outro lado, no cômputo geral, vimos os produtos do reino mineral, que atingiam escassamente 100.000:000$000, renderem 900.000:000$000 em 1939.
Já tive ocasião de acentuar que a divisão das fontes de riqueza deve procurar melhor equipartição entre os três reinos naturais, evitando-se que continue, como até aqui, a preponderância absoluta dos produtos de origem vegetal. Enquanto estes atingiram cerca de 10 milhões de contos, os do reino animal chegam a 3 milhões e os minerais a um milhão.
Exploração mais equilibrada do nosso potencial diminuirá a importância das crises de preços. No mercado mundial, raramente ocorrem quedas simultâneas nas cotações dos produtos vegetais, animais e minerais, e, assim, teremos sempre uma exportação menos sujeita a violentas oscilações.
A atual guerra na Europa, que ameaçou, no fim de 1939, o nosso equilíbrio econômico com o fechamento de todos os mercados importadores daquele continente, veio demonstrar, de modo incontestável, a razão do nosso empenho em impulsionar o crescimento do mercado interno. Tendo sido o último trimestre de 1939 desanimador, conseguimos, entretanto, pronta recuperação nos nove meses apurados este ano.
Por sua vez, as importações aumentaram de 150.000:000$000. Os itens da importação são, porém, muito expressivos: aumentaram em ferro e aço, em combustíveis, em veículos automóveis, produtos químicos e celulose. Na exportação, cresceram os valores dos produtos animais, dos minérios, dos oleaginosos e das manufaturas.
Os algarismos que expressam o aumento do comércio interior são, todavia, tranquilizadores. Os negócios aceleram o ritmo em vários setores de atividade, e os capitais em giro crescem. As trocas interestaduais são maiores e oferecem plena compensação às perdas do comércio exterior.
As indústrias novas aproveitando matéria-prima mineral são numerosas; entre elas cumpre mencionar a da celulose, que está sendo ampliada para ficar em condições de produzir em quantidade e qualidade o que baste às nossas necessidades, inclusive o papel de imprensa.
Este surto magnífico, que justifica o otimismo geral, não se operou por certo espontaneamente, sem o apoio direto do poder público. Pelos institutos de crédito, facilitaram-se fundos para a instalação e ampliação de indústrias que interessavam à defesa nacional ou concorriam para assegurar o equilíbrio da nossa balança comercial. A mobilização de capitais nacionais, o desenvolvimento dos bancos regionais, bem como o auxílio direto a diversas lavouras – café, cacau, mate, arroz, açúcar – contribuíram para a estabilidade da nossa economia.
Atualmente, é diretiva assente já traduzida em fatos estender às Repúblicas sul e centro-americanas a exportação de manufaturas e adquirir matérias-primas que provenham de fontes mais distantes de abastecimento.
Devemos chamar a atenção dos industrialistas para a necessidade de cooperarem com o governo na abertura de novos mercados, padronizando os seus produtos e lançando marcas que satisfaçam aos consumidores.
Para conservar esses mercados, faz-se mister persistência e boa vontade, porque cada dia mais se estreitam os laços de solidariedade econômica e política das Américas.
NOVAS BASES
A atividade deste decênio, depreende-se claramente dos algarismos enunciados, revela um fato de importância transcendente: o valor da produção industrial mostrou-se superior ao da produção agrícola. Isto quer dizer que o país atingiu sua fase de crescimento equilibrado, forrando-se, pouco a pouco, à dependência econômica, que é característica dos produtos exclusivos de matérias-primas e gêneros de alimentação.
Já atingimos o grau de adiantamento suficiente nas indústrias de transformação, e, por felicidade, vimos o nosso esforço coroado de êxito no preparo das bases de uma etapa superior do seu desenvolvimento.
O Estado Novo venceu os arraigados preconceitos que vigoraram em matéria econômica durante cinquenta anos e que nos chumbavam à situação de país semicolonial, votado, fatalmente, a vender produtos da terra e comprar manufaturas. Os especiosos argumentos que alimentavam o tema dos agraristas sistemáticos eram, em resumo, assim concebidos: não temos combustíveis minerais – carvão e petróleo – e, consequentemente, apesar da abundância de ferro, não podemos ser um país industrializado; resta-nos exportar os minérios como matéria-prima e comprar as máquinas; o nosso parque fabril deve reduzir-se a pequenas indústrias de consumo, concentradas nas zonas de maior densidade demográfica, sob a proteção das barreiras alfandegárias.
As pesquisas dos dois últimos anos destruíram, por completo, essas ideias falsas. O petróleo, que se proclamava inexistente em território nacional, jorrou nos poços de Lobato e, graças à persistência do governo, dará, em breve, uma boa quota do consumo atual. Como as prospecções são recentes e não se improvisam as instalações dessa natureza, atacamos o problema por outro lado, lançando a Estrada de Ferro Brasil-Bolívia, que nos levará a incrementar a produção nesse país amigo, pelo acesso fácil aos seus vastos e conhecidos lençóis de combustível líquido. Quanto ao carvão, viu-se, em dez anos, decuplicada a sua produção, como resultado das medidas governamentais, e inteiramente assegurado o fornecimento de coque metalúrgico para a indústria siderúrgica.
Com tais premissas, não pode haver dúvida sobre o êxito das nossas indústrias básicas, que permitirão ao país agrário, preso aos azares do mercado mundial, bastar-se a si mesmo. Isto quer dizer, noutros termos: capacidade para fabricar máquinas em geral, de modo que a própria agricultura, de extensiva e rotineira, possa passar a intensiva; possibilidade de forjarmos os instrumentos da nossa defesa, motores para os nossos aviões, navios para a frota, trilhos, locomotivas e automóveis para as estradas.
Falando, neste momento, aos homens que vivem precisamente votados ao labor industrial, não lhes falamos apenas ao raciocínio mas também ao seu sentimento de brasileiros. Ferro e carvão para produzir o aço das nossas máquinas, petróleo para movimentá-las: são as aquisições fundamentais desta fase da vida nacional.
EXTERIOR
A projeção internacional do Brasil ampliou-se de forma notável nos dez últimos anos e exprime a justificada confiança com que os outros países encaram as nossas atitudes de correção e lealdade.
Chamados a intervir em dois importantes diferendos internacionais na América do Sul, vimos coroadas de êxito as nossas gestões no incidente de Letícia e na guerra do Chaco. Tomamos parte relevante nas três reuniões pan-americanas de Buenos Aires, Panamá e Havana, onde os nossos pontos de vista alcançaram, sempre, aprovação, e, há pouco, lançamos a ideia, recebida com manifestações de geral regozijo, de reunir, na Amazônia, uma conferência das nações limítrofes interessadas nos problemas de tráfego da grande artéria fluvial.
VALORIZAÇÃO DO HOMEM E DA TERRA
As realizações já ultimadas, o grande esforço despendido para organizar a economia e tirar maior rendimento das atividades produtivas constituem apenas as premissas da obra maior que é a reconstrução nacional.
Viajando e conhecendo por observação direta toda a extensão do nosso território, senti de perto as necessidades de cada região, facilitando-se, assim, o planeamento geral das iniciativas do poder público.
Quando fizermos, proximamente, a reunião dos delegados estaduais do poder central, na Conferência da Economia e Administração, poderemos assentar quais as tarefas mais urgentes de cada região.
No Centro, a carência de transportes, o aproveitamento das vias fluviais e os meios de acesso às riquezas do subsolo serão as preocupações dominantes, conjugadas com os esforços para acelerar o povoamento.
No Norte, o reagrupamento das populações, o combate às endemias, a valorização e industrialização dos produtos nativos, com a melhoria das comunicações e transportes, constituirão núcleo do esforço geral da União, dos estados e municipalidades.
No Nordeste, onde já são vultosas as inversões de dinheiro público em obras de fixação da população, é preciso prosseguir nos rumos traçados – açudagem, irrigação, estradas e policultura.
No Sul, onde se acham localizadas as maiores lavouras e cerca de 80% das indústrias, persistiremos na obra encetada, de apoio aos empreendimentos produtivos.
Todos esses trabalhos isolados, dirigidos segundo o critério das regiões geoeconômicas, denotam a realidade que precisamos modificar com empenho sistemático: o Brasil ainda não constitui um corpo econômico homogêneo.
Até agora, não foi possível articular completamente a faixa litorânea com o Leste, nem o Norte com o Sul, independentemente do caminho marítimo.
A unificação de processos de produção, a nivelação técnica e a homogeneidade econômica dependem, em última instância, de dois problemas: o da industrialização intensiva, com o fabrico de máquinas, que é consequência da grande siderurgia, e a exploração do combustível líquido mineral em larga escala, tornando possível alimentar as nossas máquinas sem recorrer à importação de carburantes.
Vencidos esses grandes obstáculos de natureza material, equipado satisfatoriamente o país e melhorado o nível técnico, poderemos, então, abordar as enormes tarefas de sanear, educar e civilizar; numa palavra: valorizar o homem e a terra.
O que vi e o que existe no país reclama a atenção e o interesse de todos os brasileiros – na administração, nos negócios, no comércio, na indústria.
Pela vastidão do país, mal dotado de transportes e comunicações, existem núcleos excelentes de povoamento, aos quais só falta melhorar a capacidade de produção e valorizar o esforço pela subsistência.
O fraco poder aquisitivo desses núcleos, fechados no estreito círculo da economia doméstica, está em função do isolamento e da carência de escolas e conhecimentos técnicos. É nossa obrigação reanimar-lhes o crescimento, elevar-lhes o nível de vida pela educação, pelo saneamento, pelo trabalho remunerativo. Entre eles se encontram, como bem sabeis, famílias prolíficas e laboriosas sem estímulos para criar e produzir.
O problema da infância é, em nosso país, dos mais urgentes. À geração que dirige a vida nacional cumpre enfrentá-lo corajosamente.
Precisamos dominar as endemias para que, dentro em pouco, a média de crescimento da população melhore e o seu rendimento econômico alcance os coeficientes dos países civilizados.
Para a consecução desses objetivos, invoco o concurso das classes produtoras, empregados e empregadores. Lembro-lhes a conveniência de não deixarem as fábricas sem escolas de ofício e a necessidade de organizarem o repouso do trabalho e o aproveitamento das férias em condições sadias e agradáveis.
Ao concluir estas considerações e consignar os meus agradecimentos pela solidariedade compreensiva e certa que ofereceis, desejo dizer que tudo quanto se tem feito e o muito que resta fazer constituem apenas meios para alcançarmos objetivos mais altos.
Reformas políticas, empreendimentos industriais, tarefas educacionais não teriam sentido se não se processassem em função de um ideal superior. E esse ideal é o de realizar a unidade moral e a unidade econômica da nacionalidade, consolidando e acrescendo o seu poder defensivo.
Os brasileiros, de um extremo a outro do nosso vasto território, devem sentir-se em perfeita fraternidade, unidos pelos vínculos culturais, morais e econômicos.
Quando, em todos os recantos, em todas as latitudes, cada brasileiro mobilizar as suas energias no empenho decidido de formar uma verdadeira comunidade de idioma, de sentimentos, de interesses e de ideais, poderemos exclamar com orgulho: o Brasil é uma grande e poderosa nação.