Bernie Sanders, senador e pré-candidato a presidente dos Estados Unidos pelo partido Democrata, fez a declaração de repúdio ao racismo um dia após o esfaqueamento de cinco judeus na casa do rabino Chaim Rottenberg, quando se comemorava a festa de Hanukah, a festa das luzes (nela, durante oito dias, os judeus comemoram a libertação de Jerusalém de invasores acendendo oito velas da Hanuchiah, o candelabro)
Em ato, no dia 29, na cidade de Des Moines, em Iowa, Bernie Sanders prometeu “trabalhar para varrer todas as formas de racismo e intolerância” enquanto acendia a última das oito velas de Hanukah.
“Vamos juntar todos, não vamos permitir que nos dividam”, afirmou o senador, que é judeu, ao acender, com uma tocha, a oitava vela da Hanuchiah.
Sanders relacionou o aumento de incidentes antissemitas (a exemplo do recente ataque a uma sinagoga em Pittsburg) ao “crescimento de crimes de ódi neste país”. Ele mencionou um incidente, no mesmo Estado do ato, que se realizava em Iowa: “Vimos aqui, nesta cidade, alguém jogando seu carro contra uma criança, porque ela era latina (como são chamados nos EUA os imigrantes mexicanos e da América Central). Vemos judeus sendo esfaqueados em Nova Iorque, por serem judeus; vemos pessoas agredidas por serem muçulmanos”.
“Temos que confrontar esse pico de violência racial. Temos que dizer não a intolerância religiosa, não ao racismo, não ao que nos divide”, acrescentou.
No sábado, um agressor esfaqueou cinco pessoas na casa de um rabino ortodoxo hassídico ( o hassidismo é a manifestação dos conceitos iluministas entre os judeus na superação dos soturnos rituais medievais, com a introdução de elementos até ali considerados profanos, a exemplo da alegria e da dança nas festividades judaicas). O rabino, parentes e amigos celebravam a Hanukah, no bairro nova-iorquino de Monsey, hoje com maioria de judeus ortodoxos como moradores.
O governador do Estado de Nova Iorque, Andrew Cuomo, visitou a residência do rabino e condenou o ato, classificando-o de “terrorismo”
O suspeito, Grafton Thomas, fugiu da cena do crime, mas a polícia nova-iorquina o prendeu após localizar o seu carro no bairro do Harlem.
O ex-vice presidente, Joe Biden, declarou que “o horrendo antissemitismo rasga a alma de nossa nação. Temos que nos unir para lutar contra estas chamas de ódio”.
A senadora Elizabeth Warren, que também se destaca na disputa pela indicação democrata à Presidência, declarou: “Dói meu coração pelas vítimas deste horrível ataque. É, infelizmente, o mais recente de uma série de ataques antissemitas em Nova Iorque e Nova Jersey. Temos que combater o antissemitismo e deixar claro que não há espaço para a odiosa intolerância religiosa em nossa sociedade”.
Pete Buttigieg, que também busca a indicação para candidato democrata a presidente, esceveu: “Isso não pode ser tolerado. Na manhã do [ultimo dia de Hanukah, vamos todos nos dedicar nossas reflexões a garantir que a luz vença a escuridão” e, referindo-se ao período nazi-fascista, proclamou: “Nunca mais”.
COMUNIDADE JUDAICA SE RECUSA A SUCUMBIR AO ÓDIO RACISTA
Nas noites anteriores ao crime, aconteceram três outros incidentes atingiram judeus na região.
“Estamos genuinamente apavorados, mas eu rejeito, em absoluto, este tipo de noção e sentimento de que descendentes de africanos sejam antissemitas”, declarou o judeu ortodoxo, Aron Wieder. “Não há qualquer correlação deste tipo. Muitos líderes da comunidade afro-norte-americana já condenaram o antissemitismo e trabalharam lado a lado com judeus na luta contra o racismo e pelos direitos civis ao longo dos anos”.
“Os da comunidade afro-descendente, provavelmente podem se identificar com os da comunidade Judaica, mais do que os demais, porque eles passaram e passam por incidentes similares aos que a comunidade judaica agora está tendo que lidar”, acrescentou Wieder.
Em Israel, o presidente do partido Israel Beiteinu (Israel nossa casa), Avigdor Lieberman, abertamente racista e que, ao final das últimas eleições, negou-se a apoiar o candidato vitorioso para formar governo, Benny Gantz, alegando que este tinha apoio de partidos árabes, afirmou agora que “a imigração para Israel é a principal solução conta o antissemitismo”.
A declaração foi considerada infeliz por diversos judeus integrantes da comunidade de Monsey, a exemplo de Chaim Leibowitz: “Não acreditamos que Israel tem a solução para o antissemitimo. Se temos problemas de animosidade com não judeus, sejam quem for, muçulmanos, cristãos, negros ou brancos, a forma correta de enfrentamento é estender a mão em favor do amor, da paz e da harmonia”.
“Ninguém aqui acredita que Israel é mais seguro do que a América, isso é simplesmente estupidez. Israel se supunha como um abrigo seguro para os judeus, mas se olharmos as estatísticas, todo mundo vê que muito mais tragédias acontecem lá, nas últimas décadas, do que aqui”, acrescentou Leibowitz.
“O que temos que fazer é estender a mão, sentar em torno de uma mesa e conversar, e discutir para encontrarmos o caminho correto para vivermos em harmonia e paz. É a única solução, se combatermos o ódio com ódio, estamos juntando óleo ao fogo”, disse ainda o religioso.
Os ortodoxos de Nova Iorque também denunciam a campanha de Lieberman que tenta ganhar votos lançando judeus seculares contra religiosos. Um dos moradores de Monsey, que pediu anonimato ao jornal israelense Haaretz, condenou o direitista Lieberman, dizendo que “políticos devem, independente do apoio que recebam, de um ou outro setor da sociedade, saber que representam todos os seres humanos”.
Para Jaime Brener, coordenador do Observatório Judaico de Direitos Humanos no Brasil Henry Sobel, “o acontecimento é trágico, se inscreve dentro de um discurso de ódio racial, que foi processado pelo próprio presidente dos Estados Unidos, mas também por vários outros líderes políticos como Orban, na Hungria; Salvini, na Itália e Bolsonaro e seguidores, aqui no Brasil. No entanto, é preciso observar que diversos membros da comunidade judaica se sentem seguros porque vários destes dirigentes professam simpatia por Israel, como é o caso de Trump e Bolsonaro. Mas, quando o discurso xenófobo cresce, ele pega todo mundo, todos os ódios, traz lá do fundo os piores preconceitos enraizados”.
“Então”, prossegue Brener, “lamentavelmente, a comunidade judaica foi vítima dessa vez, como de outras vezes foram os negros e assim por diante. É fundamental que se diga que ninguém pode ficar alheio ao discurso de ódio racista, não importa quem for atingido primeiro, índios, negros, imigrantes, judeus: ele atinge a todos, em especial às historicamente vítimas da discriminação, mas também, pela degeneração que provoca, a toda a sociedade”.
NATHANIEL BRAIA