“Hoje não, pera aí. Noivado é noivado. Tem que ter um tempo. Vou continuar conversando. Noivando, noivando”, respondeu a atriz Regina Duarte na quarta-feira (22), quando questionada se já havia aceitado o convite para assumir a Secretaria Especial de Cultura do governo.
A atriz tentou não aparecer publicamente durante sua viagem à Brasília, entrou e saiu do aeroporto por um portão para funcionários.
Os jornalistas perguntaram se a secretaria Especial da Cultura voltaria a ser um ministério.
“Não sei, mas não acho importante falar disso neste momento”, disse Regina Duarte.
Em Brasília, a atriz se reuniu com o ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio, para conversar sobre a estrutura atual da Secretaria, e com os ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Jorge Oliveira (Secretaria-Geral).
A situação do governo Bolsonaro, sempre envolvido em polêmicas, e a confusão que é a Secretaria de Cultura deixam a atriz com dificuldade para tomar sua decisão.
No começo de seu governo, Jair Bolsonaro extinguiu o Ministério da Cultura, transformando a pasta em uma Secretaria Especial, que ficaria inicialmente no Ministério da Cidadania.
Em novembro, a Secretaria foi transferida para o Ministério do Turismo, que é chefiado por Marcelo Álvaro Antônio, investigado por ter formado um esquema de candidaturas laranjas no PSL de Minas Gerais nas eleições de 2018.
O clima na Secretaria está pesado. A assessora especial Dênia Érica Gomes Ramos Magalhães foi exonerada na quarta-feira. O secretário-adjunto João Paulo Soares Martins também foi exonerado. Ele respondia interinamente pelo órgão após a saída de Roberto Alvim.
A Secretaria confirmou em nota a exoneração de Martins, mas disse que “não comentará o ato”.
A cultura sob Bolsonaro está perseguida, cerceada e censurada. Recentemente a ex-jogadora Maria Isabel Barroso Salgado, da Seleção Brasileira de vôlei, publicou uma carta aberta com críticas severas ao desmonte da área de cultura. “Depois de um ano de governo Bolsonaro, preciso expressar meu horror com o que tem acontecido com a cultura”, escreve Isabel.
“É estarrecedor saber que nosso cinema é premiado lá fora e atacado aqui dentro; ver o ataque brutal à casa de Rui Barbosa, com as exonerações dos pesquisadores que eram a alma e o coração daquela instituição. E como se não bastassem esses exemplos de barbaridade, assistimos ainda o constante flerte do governo com a censura”, diz Isabel no texto.
Em outubro do ano passado, Bolsonaro defendeu “filtrar”, isto é, censurar obras culturais. “Com o dinheiro público não veremos mais certo tipo de obra por aí. Isso não é censura. Isso é preservar os valores cristãos, tratar com respeito a nossa juventude, reconhecer a família como uma unidade que tem que ser saudável para o bem de todos. Essa é nossa linha”, disse
Pela internet, Jair Bolsonaro afirmou que iria cancelar todo o financiamento para produções audiovisuais com tema LGBT e citou projetos que estavam participando de editais do governo.
Isso fez com que o antecessor de Roberto Alvim na Secretaria Especial de Cultura, Henrique Pires, pedisse demissão por não concordar com a censura.
“Isso é a gota d’água, porque vem acontecendo. E tenho sido a voz dissonante interna”, disse Henrique Pires em agosto do ano passado. “Eu tenho o maior respeito pelo senhor presidente da República, tenho o maior respeito pelo ministro [Osmar Terra, do Ministério da Cidadania, onde a Secretaria estava ligada] mas não vou chancelar censura”, ressaltou.
“Eu não concordo com a colocação de filtros em qualquer tipo de atividade cultural. Não concordo como cidadão e não concordo como agente público. Você tem que respeitar a Constituição”, completou Henrique Pires.
Em outubro de 2018, durante a campanha eleitoral, num vídeo publicado no seu perfil no Facebook em apoio a Bolsonaro, Regina Duarte falou que “reprimir criação artística é coisa de ditadura”. E que esperava do novo governo “censura nunca mais”. “A arte tem que ser livre”, frisou.
Jair Bolsonaro convidou a atriz após ter que demitir Roberto Alvim por conta do repúdio generalizado à sua apologia ao nazismo.
Em vídeo publicado nas redes sociais da Secretaria, anunciando o Prêmio Nacional das Artes, o ex-secretário parafraseia e imita o visual do ministro da propaganda de Hitler, Joseph Goebbels.
Foi Roberto Alvim quem agrediu a atriz Fernanda Montenegro, quando era diretor da Fundação Nacional de Artes (Funarte). Ele disse que Fernanda Montenegro era “sórdida”, “intocável” e “mentirosa”. E pregou o fim da classe teatral brasileira.
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