O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse na sexta-feira (27) que a linha de crédito emergencial de R$ 40 bilhões para as pequenas e médias empresas pagarem salários por dois meses, anunciada pelo governo, “é tímida” e “não vai resolver nada”.
“Acho que esse financiamento, que eu não acho ruim, porque, pela informação que eu tenho, a taxa de captação é a mesma do empréstimo, tem uma carência, um prazo para pagar, e a garantia majoritária do governo, mas ainda é tímida. 20 bilhões por mês não vai resolver nada”, afirmou o presidente da Câmara.
A linha de crédito é voltada para empresas com faturamento anual entre R$ 360 mil e R$ 10 milhões. Maia questionou o fato de empresas com faturamento menor, as microempresas, ficarem de fora, assim como algumas grandes empresas que também vão passar por dificuldade. “Como é que faz com o resto? Porque têm empresas maiores, que também vão ter dificuldade. Têm microempresas que ficaram de fora”, afirmou.
“O que o governo deveria fazer é o que os outros países estão fazendo, a Grã-Bretanha virou completamente há 15 dias a sua política. Os americanos fechando agora um pacote no Congresso de 2 trilhões de dólares com políticas focadas em todos os segmentos, incluindo os mais vulneráveis, no pagamento de salário, na renda mínima”, defendeu Maia, em evento com empresários do Grupo Lide.
De acordo com a medida anunciada, o empréstimo, exclusivo para a folha de pagamento, terá 6 meses de carência e 36 meses de prazo para pagar e os juros serão de 3,75% ao ano, sem a cobrança de spread bancário. E só poderá ser usado no pagamento dos salários dos trabalhadores. Durante dois meses, as empresas não poderão demitir os funcionários.
Ainda assim, a uma semana do fechamento da folha, o financiamento só estará disponível para os empresários que precisam garantir o salário do funcionário entre uma e duas semanas.
O Tesouro bancará R$ 17 bilhões do programa e os bancos outros R$ 3 bilhões, por mês. “O risco será dividido em 85% para o governo e 15% para o setor bancário”, disse Campos Neto. A operação do programa será feita em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e bancos privados.
A medida do governo veio após forte pressão do setor produtivo que defendia uma linha de crédito exclusiva para pagamento da folha de salários, já que as medidas anunciadas na semana anterior, via BNDES e BC, não estavam chegando às empresas. Os bancos, além de segurar o crédito, aumentaram os juros e reduziram os prazos para pagamento dos empréstimos.
Bancos estão empoçando o dinheiro
Segundo relatos de representantes do setor fabril, associações de empresas e executivos de empresas grandes, médio e pequeno porte, os bancos não estão repassando a clientes os recursos liberados pelo BC para reforçar o caixa dos bancos e evitar que falte dinheiro para empréstimos às empresas.
Eles também afirmam que em meio à pandemia do coronavírus, os maiores bancos aumentaram as taxas juros e estão segurando dinheiro para empréstimos, que deveriam ser usados para manter serviços de empresas, pagar funcionários e comprar novos equipamentos para suprir a demanda provocada pelo trabalho de casa.
O crédito para investimentos teve alta de dois pontos percentuais e em outras operações com capital de giro, antecipação de recebíveis e até de empréstimo de longo prazo, que estavam em negociação já algum tempo e em vias de serem liberados, as taxas dobraram e até triplicaram, denunciam os empresários.
Segundo o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roriz Coelho, uma grande empresa com baixíssimo risco para o sistema financeiro tinha acesso a juro de 6% ao ano, mas agora, essa empresa paga juros de 12%, e além disso, ainda tem que apresentar uma série de garantias adicionais.
Roriz Coelho questiona ainda o fato de os bancos não estarem repassando a clientes, tanto empresas quanto consumidores, os recursos liberados pelo Banco Central para reforçar o caixa dos bancos e evitar que falte dinheiro para empréstimos, que podem aliviar às empresas neste momento de crise. Há algum tempo, o BC vem liberando os chamados depósitos compulsórios – parcela de depósitos que – por determinação do BC – são retidos pelos bancos para reduzir o dinheiro em circulação. Desde fevereiro foram liberados mais de R$ 200 bilhões.
“Eu acho que esse dinheiro, de uma forma ou de outra, tem que chegar às empresas, ou vai empoçar nos bancos, que estão fazendo mais exigências. Precisa haver garantia de que esse dinheiro irá para ajudar na folha de pagamento, no capital de giro. O dinheiro precisa ser carimbado”, disse Roriz à Folha de SP.
O vice-presidente do Mercado Pago, Túlio Oliveira, também afirma que “os empresários sentem que os bancos estão represando dinheiro e cobrando caro por ele. Os juros subiram duas vezes e meia para a antecipação de recebíveis em relação ao que cobravam antes da pandemia de coronavírus”, declarou Oliveira, em entrevista ao Uol.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, além da cobrança de juros altos e da dificuldade de crédito nos bancos, seus associados também relatam que há discricionariedade entre os setores.
“Os bancos estão diferenciando os segmentos e dando preferência para aqueles que estão funcionando efetivamente, como os de alimentos e bebidas. Para os setores cuja expectativa é de queda de consumo e imprevisibilidade de retorno, os ratings [notas dadas pela capacidade de pagamento] setoriais estão caindo. Isso é normal em uma economia regular, mas estamos vivendo uma economia de guerra”, afirmou o executivo.
Fernando Pimentel destacou também que as linhas para capital de giro ou para rolagem de dívidas estão com juros maiores e prazos menores de pagamento. Ele disse que os prazos em linhas de capital de giro caíram de 180 para 60 dias e as taxas passaram de CDI (Certificados de Depósito Interbancário) mais 0,47% ao mês para CDI mais 1%. Nos dois casos, as operações são garantidas com recebíveis.
“Os bancos também anunciaram que os clientes que pagam as dívidas em dia poderiam suspender os pagamentos por 60 dias. Isso ainda não começou. Nós propomos que seja criado um fundo garantidor de crédito pelo Tesouro Nacional para que as operações sejam feitas com as taxas antes dessa pandemia”, disse Pimentel.
Empresas de infraestrutura de internet, que precisam ampliar os serviços para atender nova demanda de home office (trabalho de casa), também estão encontrando dificuldades para ter acesso a crédito com o objetivo de ampliar a capacidade das redes.