Entre os dias 23 de fevereiro e 11 de abril, a cidade de São Paulo registrou 1.207 mortes confirmadas ou suspeitas de coronavírus (Covid-19), segundo a Secretaria Municipal da Saúde. Os dados fazem parte de um mapa divulgado pela pasta que mostra a distribuição dos óbitos por distrito.
O balanço aponta que a Covid-19 chegou às regiões mais vulneráveis da capital paulista e o resultado foram muitas mortes, com o aumento de 81,7% do número de óbitos em uma semana. Passaram de 428 na quarta-feira da semana passada para 778 na terça desta semana.
Somente na Brasilândia, bairro da zona norte da cidade, foram registrados 33 óbitos no intervalo de sete dias.
O estudo mediu os casos entre 9 e 15 de abril.
O mapa apresenta legenda que vai do alaranjado forte ao vermelho para localidades com 25 mortes ou mais. Estas cores só aparecem em bairros das zonas norte e leste. Para se ter uma ideia da gravidade da situação na zona norte, ela foi dividida pela prefeitura em 18 bairros – em 11 deles o número de óbitos foi de 17 pessoas ou mais.
O reflexo do alastramento da Covid-19 na zona norte aparece na rede pública de saúde. O hospital Geral da Vila Nova Cachoeirinha tem 86% dos leitos de UTI ocupados.
De acordo com o mapa, no recorte por regiões da cidade, a Zona Leste lidera o total de mortes da capital paulista, com 499 óbitos. Na Zona Norte, o registro é de 289 mortes, enquanto na Zona Sul foram 253, na Zona Oeste 91 e no Centro 61 óbitos.
A Zona Leste também concentra a maior concentração populacional da cidade. No caso das mortes destaque para os bairros de Sapopemba (28), Itaquera (27), Jardim São Lucas (24), Cangaíba (22) e Cidade Tiradentes (22). Por outro lado, os distritos da região que registraram uma menor quantidade de óbitos confirmados ou suspeitos de coronavírus foram o Brás (4), Pari (7) e o Jardim Santa Helena (7).
No levantamento anterior, as regiões de Lapa e de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, eram as que concentravam mais casos de coronavírus confirmados até 31 de março.
A situação é o começo de um cenário que deve ser agravar conforme a Secretaria estadual de Saúde, que informou estimar que os leitos de UTI dos hospitais públicos ficarão lotados a partir da metade de maio.
Os hospitais de campanha devem suportar o aumento da demanda por mais tempo e a expectativa é que as vagas sejam completamente ocupadas em julho. Para evitar o colapso do sistema, a Secretaria de Saúde tenta abrir mais dois mil leitos de UTI. A falta de profissionais de saúde e respiradores são os principais percalços da prefeitura.
Internações por síndromes respiratórias disparam
Segundo dados do Infogripe fornecidos pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), somente em três semanas de março, São Paulo registrou mais internações por síndromes respiratórias que em todo o ano passado.
De 8 a 28 de março, 9.759 pessoas foram internadas por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) no estado de São Paulo. Em todo o ano de 2019, foram 9.701 internações.
Desses casos, 1.727 foram confirmados como Covid-19 e 234 foram diagnosticados como outros vírus. Outros 963 testaram negativo, não testaram ou não tinham a informação. Outros 5.664 pacientes ainda aguardam o resultado dos exames.
O levantamento não considera a última semana disponível no sistema, de 29 de março a 4 de abril, porque a estimativa é menos precisa no período mais recente.
O InfoGripe leva em conta o que já foi inserido no sistema nacional do SUS e faz uma estimativa dos casos que ainda não entraram com base no histórico de cada local.
O número de internações começou a crescer rapidamente a partir do início de março. Na última semana de fevereiro, foram registradas 196 internações por SRAG em SP. De 1 a 7 de março, o número cresceu para 367. Na semana seguinte foram 1.430 casos.
“Já estamos vivendo um impacto nos serviços de saúde, e a tendência é que isso piore nas próximas semanas”, diz a pneumologista Patricia Canto Ribeiro, da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fiocruz.
“Porque não só a pandemia ainda não chegou no seu pico, e vai ter cada semana um aumento do número de casos, como também, com o avançar do tempo frio, vai ter um aumento das outras viroses.”
Patricia explica que o novo coronavírus chega no momento em que o tempo começa a esfriar, e já há um aumento do número de internações por doenças respiratórias virais.
“Você tem o pior cenário. Somam-se as duas coisas: internações esperadas, vamos dizer assim, que ocorrem todos os anos, acrescidas de um número muito grande de internações não esperadas (de coronavírus), que é exatamente o que sobrecarrega os serviços de saúde”.
“Esse dado não me surpreende nada”, diz Jaques Sztajnbok, médico supervisor da UTI do Hospital Emílio Ribas. Ele afirma que a maior parte dos casos de Covid-19 ainda não foi confirmada e é registrada como SRAG.
“A gente está vivendo uma coexistência de dois picos epidemiológicos, influenza e Covid-19. A vacina da gripe foi adiantada, então esse surto a gente consegue prevenir e diminuir. O que me faz imaginar que o que está aparecendo mesmo é o coronavírus.”
O coordenador do Infogripe, Marcelo Gomes, ressalta que as unidades de saúde privadas que não informavam os casos ao sistema nacional passaram a informar, o que leva a um aumento do número de casos. No entanto, afirma ele, esse número deveria mudar na primeira semana em que o sistema privado aderiu em massa à notificação, mas não nas seguintes.
“Como em geral a estimativa de pessoas atendidas por planos de saúde varia entre 30%-50% no país, isso por si só não parece ser suficiente para explicar a diferença tão grande observada no sistema, mesmo supondo que nenhum hospital da rede privada reportasse em anos anteriores e agora todos tenham aderido”, diz Gomes.
“Portanto, é razoável supor que esse aumento tão brusco, em tão pouco tempo, é devido justamente à natureza do novo coronavírus, que tem apresentado maior facilidade de propagação do que os vírus influenza e, até o momento, tem apresentado maior percentual de casos graves e óbitos”.