“Essa crise nos dá a oportunidade de enterrar esta ortodoxia liberal, fiscalista, que vem impondo barreiras institucionais ao aumento do investimento público”, afirma o economista
Em webconferência promovida pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), sobre “o Efeito da COVID-19 na economia brasileira”, José Luis Oreiro, economista e professor adjunto do departamento de economia da Universidade de Brasília (UnB), afirmou que a política econômica de Paulo Guedes, ministro da Economia, “já estava na contramão do resto do mundo, antes da pandemia”. Segundo Oreiro, diversos países já estavam dando sinais de abandono às políticas fiscais de austeridade e rediscutindo o papel do Estado para estimular a atividade econômica.
“Nós aqui no Brasil estávamos na discussão errada. Enquanto estavam rediscutindo o papel do Estado e da política fiscal nos países desenvolvidos, caso Estados Unidos e países da Europa, o Guedes estava com uma agenda, totalmente na contramão do resto do mundo, além de ultrapassada”, disse Oreiro, afirmando que “o raciocínio do Guedes é tosco”.
Oreiro destacou que agendas liberais, como a de Guedes, já estavam em declínio antes da pandemia e com a atual crise chegará ao grande final, no sentido que às políticas que vão ser adotadas em todos os países do mundo, para lidar com os efeitos da crise do coronavírus, vão ser financiadas pelo Estado, através de grandes obras de infraestrutura, o que é totalmente contrário ao que o liberalismo defende.
“Depois de passado os efeitos da pandemia, que nós não sabemos quanto tempo irá durar, o fato é que as economias irão estar muito debilitadas, ou seja, vão estar com um problema crônico de insuficiência de demanda. Neste contexto, o Estado vai ter que fazer grandes projetos de obras de infraestrutura, para poder ativar a demanda agregada e gerar empregos”, defendeu o economista.
Oreiro também disse que antes da pandemia, governos – como, o norte-americano e o japonês, por exemplo – já estavam criando medidas para trazer de volta empresas aos seus países, e que depois da crise, esses governos também criaram medidas que proíbem a emigração de empresas nacionais para outros países.
Em abril, o governo do Japão anunciou que estaria disposto a gastar mais de US$ 2 bilhões para que empresas japonesas, que estão na China, topem transferir suas produções de volta ao Japão. Também após a pandemia do coronavírus, a Alemanha bloqueou a compra de empresas alemãs por companhias estrangeiras, com o objetivo de conter prejuízos na sua economia. Já a França e Itália debatem estatizar empresas para impedir que companhias nacionais quebrem ou que sejam compradas por especuladores estrangeiros, que aproveitam a atual fragilidade destas empresas para abocanhá-las.
Oreiro afirmou que esse movimento dos países desenvolvidos para conter os efeitos da Covid-19 em suas economias faz com que a chamada globalização dê vários passos para trás, o que vai afetar o ritmo do comércio mundial. Nesta conjuntura, Oreiro vê uma oportunidade para o Brasil começar a sua reindustrialização, abandonar a austeridade fiscal e elevar o investimento público.
“É o que diz a experiência histórica, o que diz a experiencia empírica, de que sem indústria não há possibilidade de desenvolvimento econômico. Um País que é apenas vendedor de comodities agrícolas ou minerais, ou seja, soja e minério de ferro, não vai gerar emprego e renda em quantidade suficiente para 210 milhões de pessoas. Sem indústria o Brasil não retoma a sua trajetória de desenvolvimento”, destacou.
“Essa crise também nos dá a oportunidade de enterrar esta ortodoxia liberal, fiscalista, que vem impondo barreiras institucionais ao aumento do investimento público. É fundamental, para que nós podemos lidar com um mundo pós pandemia, que seja revogada a Emenda Constitucional 95, do teto de gastos públicos”, defendeu o economista.
ANTONIO ROSA