CARLOS LOPES
Não há, portanto, nenhuma novidade na traição, na passagem para o lado do inimigo, no transformismo de certos líderes antes progressistas – ou próximos disso – em serviçais do que antes combatiam.
Nesse sentido, mais geral, o PT não inovou, ao aderir ao neoliberalismo.
Sem recuar até Judas e as trinta moedas, não é por acaso que uma das principais obras de Lenin, após a Revolução Russa, tenha o título de “A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky”.
Karl Kautsky fora, durante décadas, o principal teórico da “Internacional Socialista”, a II Internacional, e uma referência, como marxista, do próprio Lenin (como se pode ler em “Que Fazer?”, de 1902) – até que se tornou um traidor da revolução, ao ceder à pressão imperialista, e, especialmente, à pressão da ala direita da social-democracia alemã, que aderiu abertamente ao inimigo, quando apoiou, em 1914, a guerra imperialista.
O próprio Marx, que conheceu Kautsky durante o tempo em que este residiu na Inglaterra, não tinha boa opinião sobre ele. Em carta a uma de suas filhas, Jenny, escreveu Marx sobre Kautsky: “É um medíocre de estreita visão, super-sábio (tem só 26 anos), muito arrogante, hábil em certo sentido, se ocupa muito de estatística, mas desta não saca nada que seja muito claro, pertence por natureza à tribo dos filisteus, mas, quanto ao resto, é a seu modo um sujeito decente” (cf. Carlos Marx/Frederico Engels, Correspondencia, Editorial Cartago, Buenos Aires, 1973, p. 316, carta de 11/04/1881).
Para Marx, o então jovem Kautsky era representante de uma praga que ele odiava visceralmente: o “marxismo acadêmico”. Havia apenas uma coisa que fazia com que Marx o tolerasse: o respeito por sua mãe, a escritora austríaca Minna Kautsky, amiga de Wilhelm Liebknecht, Franz Mehring, e, depois, Rosa Luxemburgo.
A trajetória de Kautsky mostrou que Marx, essencialmente, estava certo. Mas seu julgamento foi feito quando Kautsky era muito jovem. Ao mesmo tempo, Engels, como diz Marx na carta para a filha, “suavizou sua opinião sobre este Kauz, desde que descobriu que ele era um bom bebedor” [‘Kauz’ é um trocadilho com o nome de Kautsky – significa, em alemão, esquisito ou esdrúxulo].
Foi como discípulo de Engels, após a morte deste, que Kautsky ascendeu a principal teórico da II Internacional.
BASILEIA
Desde a unificação alemã, após a vitória da Prússia contra a França na batalha de Sedan, em 1870 – e, principalmente, depois que Bismarck, em 1890, se afastou do governo alemão, devido a divergências com o novo imperador, o Kaiser Guilherme II – uma nova guerra europeia, uma guerra imperialista, entre, de um lado, a Inglaterra e a França, e, do outro lado, a Alemanha e seus aliados, tornou-se uma ameaça (e uma possibilidade) crescente.
A ameaça de guerra imperialista era um resultado direto da degeneração do capitalismo nos países centrais em domínio de cartéis e monopólios. Acabava, portanto, o período pacífico de desenvolvimento capitalista (1870-1918), aquela época que alguns chamaram injustamente de “belle époque” – pois somente foi pacífica (que o digam os africanos e asiáticos) entre os países centrais e somente foi “bela” para aquela burguesia que povoa os quadros de Renoir.
Em 1907, o Congresso Socialista Internacional de Stuttgart (VII Congresso da II Internacional) aprovou uma resolução, redigida pelo então líder do Partido Social-Democrata Alemão, August Bebel, com emendas de Lenin e Rosa Luxemburgo, sobre a luta contra a guerra imperialista:
“Em caso de que, apesar de tudo, a guerra seja desencadeada, eles [os operários dos vários países e seus representantes nos parlamentos] devem procurar por todos os meios aproveitar a crise econômica e política provocada pela guerra para fazer agitação entre as massas populares e acelerar a derrubada da dominação capitalista de classe”.
Em 1910, o Congresso Socialista Internacional de Copenhague (VIII Congresso da II Internacional) reafirmou a resolução sobre a guerra imperialista de três anos antes, com um adendo que tornava “obrigatório para os partidos socialistas, e seus representantes nos parlamentos, exigir que seus governos reduzissem os armamentos e resolvessem os conflitos entre Estados mediante arbitragens, exortando os operários de todos os países a organizar atos contra o perigo de guerra”.
Em novembro de 1912, às vésperas da guerra imperialista que seria desfechada dois anos depois, o Congresso de Basileia (Congresso Socialista Internacional Extraordinário), convocado exclusivamente para tirar uma posição comum dos partidos socialistas diante da guerra, considerada quase inevitável, aprovou por unanimidade um manifesto que dizia:
“A qualquer momento, os grandes povos europeus podem ver-se lançados uns contra os outros, e este crime contra a humanidade e a razão não pode ser justificado, nem minimamente, com o pretexto de interesse popular de nenhum gênero… Seria uma loucura se os governos não compreendessem que a só ideia da monstruosidade que implica a contenda mundial promoverá a ira e a indignação da classe operária. O proletariado considera um crime disparar uns contra os outros para contemplar os lucros dos capitalistas, para contemplar as ambições dinásticas, para contemplar o cumprimento dos acordos diplomáticos secretos”.
O HOMEM
Em agosto de 1914, quase todos esses senhores que, durante quase uma década, aprovaram resoluções contra a guerra imperialista – inclusive, no caso dos sociais-democratas alemães, também em congresso nacional (Congresso de Chemnitz, setembro de 1912) – traíram tudo o que fora dito desde 1907.
O Partido Social-Democrata era, a partir de 1912, a maior bancada do parlamento alemão, o Reichstag, com 110 deputados.
No dia 27 de julho de 1914, cumprindo com os compromissos estabelecidos nos congressos de Stuttgart (1907), Copenhague (1910), Basileia (1912) e Chemnitz (1912), os sociais-democratas organizaram dezenas de manifestações, em Berlim e outras cidades, contra a guerra.
Naquele momento, a Sérvia – que a Áustria-Hungria considerava culpada pela execução, em Sarajevo, do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono austríaco – já rejeitara o ultimato de Viena, apelando, em sua defesa, ao czar da Rússia. Esperava-se a declaração de guerra dos austríacos (o que aconteceu no dia seguinte, 28 de julho).
Dois dias após as manifestações contra a guerra, no dia 29 de julho, a direção da II Internacional (Bureau da Internacional Socialista) reuniu-se em Bruxelas – e reafirmou as resoluções anteriores contra a guerra imperialista: “Será dever dos trabalhadores de todas as nações em questão intensificar ainda mais suas manifestações contra a guerra, pela paz e visando a solução do conflito austro-sérvio por meio de arbitragem internacional”.
Mais além, a decisão do Bureau conclamava os partidos socialistas alemão (SPD) e francês (SFIO) a “exercer a mais enérgica pressão sobre os governos de seus respectivos países” (cf. Lawrence Sondhaus, “A Primeira Guerra Mundial: História Completa”, Contexto, 2013, trad. Roberto Cataldo Costa).
Entretanto, ponto importante, a declaração de guerra da Alemanha, em apoio à da Áustria-Hungria, somente foi emitida no dia 1º de agosto.
Além disso, a maior parte dos dirigentes da social-democracia alemã estava em férias (inclusive Kautsky, Ebert, Bernstein e Scheidemann) – e, como observa um dos principais historiadores que se dedicaram a essa época, havia uma ilusão geral, expressa até por Rosa Luxemburgo, de que o conflito entre a Sérvia e a Áustria seria resolvido sem se alastrar pela Europa ou pelo mundo (cf. Gilbert Badia, “Le Spartakisme – les dernières années de Rosa Luxemburg et de Karl Liebknecht 1914-1919”, Paris, L’Arche, 1967).
Porém, a coisa mudou a partir do dia 1º de agosto – ou seja, a partir da declaração de guerra pelo Kaiser e seu chanceler, Bethmann Hollweg, em apoio à Áustria-Hungria, contra a Rússia, França e Inglaterra.
Mas é verdade que desde o dia 29 de julho – portanto, antes da declaração de guerra pelo Kaiser – a direção da social-democracia enviara um emissário a Bethmann Hollweg, para garantir ao governo alemão que “nada tinha a temer em relação a manifestações ou greves”.
A expressão pública mais nítida, mais escandalosa, dessa traição, foi a política de “união sagrada” da social-democracia alemã com a burguesia imperialista de seu país, para massacrar o proletariado de outras nações.
Não foi um caso único – na Europa, os únicos partidos que ficaram contra a guerra, e honraram seus compromissos anteriores, foram os bolcheviques, na Rússia, e os “maximalistas”, na Itália. Todos os outros integrantes da II Internacional apoiaram as burguesias imperialistas de seus países em uma guerra imperialista, um banho de sangue monstruoso, que até hoje horroriza os seres humanos a uma simples menção.
No dia 3 de agosto, “se reúne em Berlim a direção social-democrata para se definir sobre a atitude a tomar frente à solicitação de créditos militares que o governo se dispõe a apresentar no dia seguinte no Parlamento. Votar a favor de tais créditos é aceitar o regime e aprovar a guerra”.
Na reunião, com a presença da bancada parlamentar (e de Kautsky, convidado como teórico oficial do partido), o Partido Social-Democrata resolve aprovar os créditos de guerra pedidos pelo governo: “Este voto de aprovação constituía uma flagrante violação do programa e dos compromissos estabelecidos nos congressos internacionais, especialmente no de Basileia” (G. Badia, op. cit.).
Apenas 14 deputados (em 110), nessa reunião, foram contra a aprovação dos créditos para a guerra imperialista.
Mas todos eles (inclusive Karl Liebknecht), no dia seguinte, votaram a favor dos créditos, em nome da “disciplina partidária”.
Era óbvio que quem quebrou a disciplina partidária foram aqueles que eram a favor de aprovar os créditos, pois isso era uma infração do programa do partido, e, também, das resoluções da II Internacional, da qual o Partido Social-Democrata alemão era parte – e força principal.
No entanto, essa “maioria” de traidores na direção do partido e na bancada parlamentar, conseguiu, momentaneamente, impor sua posição àqueles que não concordavam com ela – e votaram, portanto, contra a sua consciência – em nome da “disciplina partidária”!
Para isso servem certas “fidelidades partidárias”, notabilizadas, aqui no Brasil, pela ditadura, e depois retomadas pelo PT, PMDB e outros…
Aqui vemos como a traição, durante um curto momento, pôde confundir até mesmo um revolucionário da estirpe de Liebknecht. Na verdade, ele não acreditou, no primeiro instante, na traição, devido ao seu inimaginável tamanho. Daí a sua declaração, nesse momento, de que “a minoria [que era contra a aprovação dos créditos] dá por descontado que, em tudo mais, o partido manterá uma política de oposição, uma política de luta de classes, inclusive durante a guerra” (cf. Karl Liebknecht, “Klassenkampf gegen den Krieg!”, Hoffmanns, Berlin, 1919, p. 16; nesta preciosíssima coletânea, há um relato circunstanciado – e impressionante – dos acontecimentos a que nos estamos referindo).
Considerando o que ocorreu depois – o assassinato de Liebknecht por essa “maioria” – a sua declaração, quando da primeira votação dos créditos de guerra, parece de uma ingenuidade espantosa, mais ainda quando se considera que ele – além de filho de um dos fundadores do partido, Wilhelm Liebknecht – era deputado desde 1908, portanto, deveria conhecer muito bem a sua bancada e a direção do partido.
Para termos uma ideia da perplexidade causada pela traição dos sociais-democratas, foi somente em 13 de setembro, portanto, mais de um mês depois da primeira votação dos créditos, que Rosa Luxemburgo escreveu a Franz Mehring, primeiro biógrafo de Marx e um dos líderes da ala esquerda do partido: “Considero que é impossível calar”.
Rosa Luxemburgo estava se referindo a declarações públicas, na imprensa, pois, dentro do partido, a luta fora desencadeada desde o dia 3 – na reunião da direção do partido e da bancada, e, depois, nos encontros em bairros operários, onde Karl Liebknecht era muito popular, assim como na juventude social-democrata. Porém, entre os dirigentes, o único novo apoio veio de Stuttgart, cidade operária em que a esquerda do partido tinha maioria – a principal dirigente social-democrata nessa cidade era Clara Zetkin.
Entre agosto e dezembro de 1914, Liebknecht publicou 10 artigos, explicando seu voto, a 4 de agosto, a favor dos créditos de guerra. Em janeiro de 1915, escreveu a um amigo:
“… tentei, antes de 4 de agosto, fazer todo o possível para convencer a bancada parlamentar de que devia votar contra os créditos. Em relação a separar-me de meus amigos políticos mais próximos, membros da ala esquerda, não me pareceu adequado nesse momento — ninguém podia imaginar ainda os extremos a que se ia chegar. A 3 e a 4 de agosto ia tudo de mal a pior. Só dispúnhamos de algumas horas, de alguns minutos, e, para desespero e horror nosso, percebemos, de repente, que a ala esquerda se desintegrara. Foi assim, com raiva, que me submeti, em 4 de agosto, à maioria, coisa que lamentei profundamente; estou disposto a receber qualquer tipo de reprimenda que me diga respeito” (cit. por G. Badia, op. cit.).
Eis um homem.
A dois de dezembro de 1914, há uma segunda votação dos créditos de guerra. Apesar de, na discussão da bancada social-democrata, 17 deputados terem se manifestado contra a aprovação, somente Liebknecht tem coragem de levar a sua posição até o fim, votando contra:
“… esta guerra não é desejada por nenhum dos povos envolvidos, não foi declarada para favorecer o bem estar do povo alemão e de nenhum outro.
“É uma guerra imperialista, uma guerra pelo domínio do mercado mundial, pela repartição de importantes territórios de exploração para capitalistas e financistas. (…) é uma guerra provocada pelos partidos alemães e austríacos favoráveis à guerra, na escuridão do semifeudalismo e da diplomacia secreta, para obter vantagens sobre seus oponentes. Ao mesmo tempo, essa guerra é um esforço para desorganizar e dividir o crescente movimento da classe operária.
“O slogan ‘Contra o czarismo!’, tão usado na Alemanha, como na França e na Inglaterra se usa ‘Contra o militarismo!’, foi inventado para a ocasião, para deturpar as mais nobres inclinações, as tradições, os ideais revolucionários e as esperanças do povo, e mobilizar os instintos mais ignóbeis, com o intuito de agitar o ódio chauvinista contra os povos.
“A Alemanha, cúmplice do czarismo, não tem nenhuma autoridade para se levantar como libertadora dos povos. A libertação tanto do povo russo, como do alemão, deve ser obra de suas próprias mãos.
“A guerra não é, tampouco, em defesa da Alemanha. Suas bases históricas e seu curso, desde o início, tornam inaceitáveis as pretensões do governo capitalista, de que o propósito pelo qual demanda créditos é a defesa da Pátria.
“Uma paz imediata, uma paz sem anexações, que não seja humilhante para ninguém, é o que devemos exigir. (…) Somente uma paz baseada na solidariedade internacional da classe operária e na liberdade de todos os povos pode ser uma paz duradoura.”
Liebknecht não conseguiu que a bancada social-democrata o deixasse falar no plenário do Reichstag. Assim, consignou seu voto por escrito.
No dia seguinte, a direção social-democrata o acusou de “falta de disciplina” e remeteu o caso à bancada, para que Liebknecht fosse punido. Começava uma campanha contra ele, que teve como asseclas mais repugnantes os dirigentes sindicais sociais-democratas.
Kautsky teve uma atitude ainda mais indigna e covarde: “Esse desgraçado do Karl está caindo no ridículo. Sua decisão [de votar contra os créditos de guerra] pode levar a uma cisão definitiva”, escreveu ele a Victor Adler.
Morreram 21 milhões de pessoas, militares e civis, na I Guerra Mundial. Somente entre os soldados alemães, recrutados em sua maioria na classe operária, foram um milhão e 800 mil mortos, número só excedido pelos mortos entre os soldados russos (2 milhões).
Essas pessoas morreram como carne de canhão em uma disputa entre dois grupos de monopólios imperialistas pelo domínio do mundo.
E Kautsky achava que Karl Liebknecht estava sendo “ridículo”, porque, ao defender os interesses da Humanidade e do povo alemão, colocava em perigo as vantagens pessoais que a cúpula social-democrata, inclusive o próprio Kautsky, conseguira da burguesia alemã…
Na reunião com a bancada social-democrata no parlamento, a 3 de agosto de 1914, Kautsky apresentou a proposta de apoiar a guerra imperialista, votando a favor dos créditos de guerra, em troca do compromisso do governo alemão – isto é, dos monopólios alemães, do Kaiser e outros bandidos – de que não haveria “conquistas” territoriais.
Isso ele não achava ridículo.
O CÃO
Há 100 anos, em 1918, Friedrich Ebert, principal líder dos sociais-democratas alemães – depois primeiro-ministro e depois presidente da Alemanha -, diante da revolução já triunfante, tentou salvar a monarquia do Kaiser, e, depois, como fosse impossível, disse ao então chanceler, príncipe Max de Bade: “Se o imperador não abdica, a revolução social é inevitável. Eu não quero essa revolução. Eu odeio essa revolução, como odeio o pecado” (cf. Gilbert Badia, “Les Spartakistes – 1918: l’Allemagne en révolution”, Éditions Aden, Bruxelles, 2008, p. 63).
Ebert era, como Lula, um ex-operário.
Toda a carreira de Ebert, apesar de todos os desvios, fora em nome, precisamente, da “revolução social”. Devido a ser, supostamente, o “partido da revolução social”, os sociais-democratas se tornaram, já em 1912, antes da I Guerra Mundial, o maior partido da Alemanha (tiveram, sozinhos, 34% dos votos para o Reichstag, nas eleições daquele ano).
Em 1918, Ebert foi eleito presidente do conselho revolucionário de Berlim – ao invés de Karl Liebknecht, que acabara de sair da prisão, onde estava desde 1916, condenado por se opor à Guerra Imperialista.
[Ebert e seus comparsas estabeleceram, para impedir a eleição de Karl Liebknecht, Rosa Luxemburg, e outros revolucionários, como delegados ao Congresso dos Conselhos Operários e Soldados, realizado em dezembro de 1918, um casuísmo, segundo o qual só eram elegíveis os candidatos dos trabalhadores que fossem “ligados” a uma empresa (cf. G. Badia, op. cit., p. 308). Obviamente, Ebert & cia. tinham ligações com os monopólios alemães, que lhes forneciam os documentos para que fossem candidatos. Liebknecht, representante dos trabalhadores alemães no Parlamento (Reichstag) desde 1908, foi eliminado por essa cláusula de barreira.]
Alguns meses antes, Ebert fora membro do comitê eleito pelos operários após a eclosão da greve geral de janeiro de 1918. Depois de sufocada a revolução, em janeiro de 1919, quando os sociais-democratas metralharam multidões de operários em toda a Alemanha, assassinando cinco mil trabalhadores, inclusive mulheres e crianças, Ebert justificou sua participação:
“Eu me juntei à direção do movimento com a intenção de parar rapidamente a greve e impedi-la de prejudicar a Alemanha” (cf. G. Badia, op. cit., p. 22).
Nessa mesma época, janeiro de 1918, do outro lado da fronteira, na França, o grande humanista Romain Rolland escreveu: “Os Scheidemann e os Ebert são lamentáveis prisioneiros da reação; já estão encaixados dentro das forças conservadoras, às quais têm recorrido contra seus irmãos inimigos”.
Gustav Noske, também da direção do Partido Social-Democrata Alemão, foi menos sutil que Ebert, ao açular e armar os “corpos voluntários” (“freikorps”, aquela ralé que depois fundou e se reuniu no partido nazista) contra os revolucionários, inclusive com a tortura e assassinato de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, em janeiro de 1919.
Nas próprias palavras de Noske, em seu livro de memórias, sobre o banho de sangue que sufocou a revolução alemã:
“Em uma grande excitação, porque o tempo estava se esgotando, nosso pessoal pedindo armas na rua, eles estavam [os demais sociais-democratas] parados no escritório de Ebert. Eu exigi que uma decisão fosse tomada. Alguém disse: ‘Então, você faz isso!’. Ao que eu respondi brevemente: ‘Tudo bem! Alguém tem de ser o cão sanguinário! Eu não me esquivo da responsabilidade!’” (Gustav Noske, Von Kiel bis Kapp – zur Geschichte der deutschen Revolution, Verlag für Politik und Wirtschaft, Berlim, 1920, p. 68).
À frente dos grupos de assassinos, Noske conduziu uma caça a antigos membros de seu próprio partido (“spartakistas” e “independentes”, que depois se fundiram no Partido Comunista da Alemanha).
Ebert, eleito presidente da Alemanha pela Constituinte de Weimar, em fevereiro de 1919, é o atual patrono da fundação do Partido Social-Democrata da Alemanha.
A Fundação Friedrich Ebert, no Brasil, tem uma relação privilegiada, há muitos anos: o PT.
ORIGINAIS
É forçoso reconhecer que nem Ebert nem Noske, apesar de continuarem na direção do Partido Social-Democrata – Ebert morreu em 1925, mas Noske sobreviveu ao nazismo – jamais pretenderam que enganar os trabalhadores, traí-los e assassiná-los, fosse um ato “de esquerda”.
Pelo contrário, seu anticomunismo, que acabou por levar a Alemanha ao nazismo, era explícito.
Já Lula, o PT, e quejandos, apresentam seus atos de corrupção, de roubo contra a Petrobrás e os fundos de pensão das estatais, embrulhados em bandeiras vermelhas – como se fossem atos absolutamente legítimos, em prol dos trabalhadores e do povo brasileiro.
Quando esses atos são insustentáveis publicamente, limitam-se a negar que existe o que todos estão vendo que existiu – e, nisso, se parecem mais com os nazistas do que com Ebert e Noske.
(continua)
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