Alguns escribas dos bancos inventaram a nova narrativa pseudocientífica da “dominância fiscal”, conceito que não passa de uma artimanha para intensificar o assalto aos recursos públicos e sufocar a sociedade
Nos últimos dias temos visto alguns operadores dos cassinos financeiros e outros antros de jogatina e parasitismo econômico, e seus escribas de aluguel, difundirem um novo conceito, o da “dominância fiscal”. Seria, segundo eles, “uma situação na qual a autoridade monetária perde o controle sobre a trajetória da inflação em razão de uma forte expansão dos gastos públicos”.
Como ninguém é bobo, eles fazem questão de enfatizar que esses “gastos públicos”, que estariam em “forte expansão”, não são as despesas com o pagamento dos juros, que estão beirando um trilhão de reais ao ano e são responsáveis por 90% do aumento da dívida pública. É o povo que está consumindo muito.
O “excesso” de gastos, segundo esses senhores, estaria no salário mínimo, nas aposentadorias, no abono salarial, nos fundos da Saúde e Educação, nos investimentos, no BPC (Benefício de Prestação Continuada), etc.
Uma nova e inusitada forma de chantagear o governo por mais cortes nas verbas sociais e nos investimentos públicos. Alegam que os cortes anunciados recentemente pelo governo no BPC, no salário mínimo, no abono salarial, no Fundeb e outros, são insuficientes.
Esses escribas de aluguel escondem muito bem os gastos bilionários com juros. Eles só falam em déficit primário. Ou seja, gastos com o povo. É o método usado por eles para espremer a população. Querem, com essa conversa mole, extrair mais recursos da sociedade e dos investimentos para engordar os seus cofres.
Os propagandistas do caos partem de uma premissa errada. A de que o Brasil vive uma crise fiscal. Não é verdade. A relação dívida/PIB do Brasil está estável e longe dos níveis de países do G20, que superaram os 100% do PIB. O Brasil está na media desses países.
Estes são os casos, por exemplo, do Japão, com 255%, Singapura, com 168%, Estados Unidos, com 122% e Canadá, com 108%. A taxa do Brasil, de 84%, está abaixo do Reino Unido (98%) e da Zona do Euro (87%) e semelhante à China (83%) e à Índia (82%), dados citados recentemente pelo professor Nilson Araújo de Souza.
O chamado déficit primário, ou seja, a diferença entre o que se arrecada em impostos e contribuições e os compromissos do governo com o presente e o futuro da sociedade brasileira não representam nem 10% do déficit nominal do governo.
Os cortes urgentes devem ser feitos nos juros, principal gasto público e causa central do aumento da dívida pública. Querer cortar da sociedade, como defendem esses picaretas, é tentar fazer o rabo balançar o cachorro. E o Banco Central está trabalhando insistentemente nesta direção.
Os “apertos” sociais já estão em níveis extremamente restritivos, como alerta o empresário Rafael Lucchesi, diretor da CNI: “Nós temos uma politica fiscal que já vinha perdendo fôlego. Nós já vínhamos tendo uma redução do dispêndio”.
“O segundo semestre de 2024 já vai ter uma redução de 1,8% frente ao segundo semestre do ano passado. Fora isso, na mesma semana que o governo anuncia um pacote de redução de despesas, com R$ 30 bi de redução em 2025 e R$ 41 bi de redução em 2026, política essa proposta pelo Banco Central, sugerida pelo Banco Central, de maneira totalmente paradoxal há esse aumento de 1% na Selic”, acrescentou Lucchesi, referindo-se ao recente aumento de juros decidido pelo BC.
A alegação de um suposto “descontrole inflacionário”, não passa de mais uma falácia. É o próprio Lucchesi que também contesta esse “descontrole”:
“O Brasil tem uma inflação relativamente baixa, de 4,6%. Lembro que em 2022 a inflação estava em 12% e a taxa Selic em 13,25%. Então, nós precisamos de mais prudência, de uma compreensão mais ampla da realidade, das decisões do Banco Central. Elas estão em desacordo com o quadro econômico e elas estão se contrapondo aos interesses do desenvolvimento sustentável que é uma das premissas que o Banco Central deve observar nas suas decisões”, disse o empresário.
O que concluímos disso tudo é que a tal “dominância fiscal” não passa de mais uma sem-vergonhice inventada pelos bancos para intensificar a pressão por juros mais altos e mais transferências de recursos da sociedade para engordar seus cofres. É mais um “conceito” tirado da cartola para envolver os desavisados e a opinião pública em apoio à sua ganância desenfreada.
Urgente, nesse momento, é reduzir a ciranda financeira e liberar recursos para investimentos produtivos. O Brasil está estagnado há décadas. Bastou um crescimento na faixa de 3%, para o mundo do rentismo impor um pacote ao governo que transformará esse crescimento num verdadeiro voo de galinha.
Talvez a intenção seja pior do que um voo de galinha. É o que alertou a jornalista Flávia Oliveira, da Globo News, ao noticiar a decisão desta semana do Copom (Conselho de Política Monetária). “O Banco central quer produzir uma recessão”, disse ela.
SÉRGIO CRUZ