O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), alertou que o uso indiscriminado da cloroquina no tratamento da Covid-19 pode fazer com “que morra muita gente em casa com arritmia”.
Bolsonaro anunciou que vai mudar o protocolo para uso da cloroquina no tratamento da Covid-19 também para casos leves.
Mandetta lembrou que estudos feitos mostraram que “33% dos pacientes que estavam em hospital, monitorados com eletrocardiograma contínuo, tiveram que suspender a cloroquina porque deu arritmia que poderia levar a parada [cardíaca]”. “Esse número assustou, é alto”, declarou o ministro em entrevista para a Folha de S. Paulo.
“E aí você começa a ter um problema. Se todos os velhinhos tiverem arritmia, vão lotar o CTI, porque tem muito mais casos de arritmia que complicação de Covid. E vou ter que arrumar CTI para isso, e pode ser que morra muita gente em casa com arritmia”, advertiu.
O ex-ministro afirmou que o impacto no Ministério da Saúde da demissão do segundo ministro em menos de um mês foi negativo para a pasta.
Para ele, o “Ministério da Saúde está hoje uma nau sem rumo” por conta disso.
“Este último mês foi perdido, sem nenhuma ação positiva por parte do ministério. Tinha pedido para toda a minha equipe que permanecesse e ajudasse o ministro [Nelson Teich]”, disse.
“O natural numa situação dessa é o novo ministro colocar a visão dele e pedir para a equipe executar. Mas o que assistimos foi a demissão de todo o segundo e o terceiro escalão do ministério, sem colocar ninguém no lugar. Isso é o pior dos mundos. O Ministério da Saúde está hoje uma nau sem rumo. Foram 30 dias de um ministério ausente”, afirmou.
Mandetta declarou que as medidas tomadas por ele no ministério foram enfraquecidas com a atitude de Bolsonaro contrárias a elas. “Quando começam essas medidas e o presidente começa a fazer uma leitura diametralmente contrária ao discutido no SUS, ficou difícil”.
“É difícil coordenar um sistema como ministro se o presidente dá outra mensagem”, completou.
“Ele claramente entendia que a crise econômica advinda da saúde era inaceitável, por mais que alertássemos que era uma doença muito séria e que o número de casos poderia surpreender”, contou. “Nada do que está acontecendo hoje é surpresa para o governo federal”, completou.
O ex-ministro alertou que entre os estados a situação mais preocupante é a do Pará. “A situação mais complexa é o Pará, estado que provavelmente vem agora com um número muito alto de casos, dobrando muito rápido e com sistema de saúde que vai ter que se desdobrar para atender”, disse.
Na avaliação do ministro, as medidas de distanciamento foram funcionaram. “Em São Paulo e no Rio, as três semanas iniciais [de isolamento] foram fundamentais. Foram duas semanas com taxa de isolamento acima de 70% e outra com 60%. Aquilo diminuiu a taxa de contágio e salvou milhões de vidas”.
Para ele, o “lockdown” (parada total) pode ser necessário em alguns locais, dependendo do momento. “Se falar de Manaus, Belém, Fortaleza, o “lockdown” vai se impor. Mas tem outros locais em que pode continuar trabalhando e aumentar gradativamente [a restrição]. O que tem que saber é qual o momento”. “Tínhamos colocado no começo que, se passar de 80% a ocupação de leitos, tem que começar a considerar [“lockdown”]. Mas tem estado trabalhando com 98% e deixando o povo andar na rua”, criticou.