O mais longo “shutdown” da história dos EUA – a paralisação parcial do governo por falta de aprovação do orçamento -, 43 dias, foi encerrado na quarta-feira (12), com a assinatura, pelo presidente Donald Trump, de projeto de lei aprovado pelo Congresso, que garante as verbas até 30 de janeiro.
Na Câmara, a aprovação foi por 222 votos a 209. No Senado, graças à capitulação de oito dos 47 senadores da oposição, a matéria foi, afinal, votada no domingo (9), alcançando a cláusula regimental de três quintos dos votos (60) para ser apreciada.
No entanto, a Casa Branca não ficou interriamente livre dos transtornos, o acordo aprovado na Câmara prorroga o financiamento do governo até 30 de janeiro de 2026. Ou seja, o Congresso terá de aprovar um novo orçamento antes dessa data para evitar outra paralisação no início do próximo ano.
O texto impede que Trump demita servidores até 30 de janeiro. Ele também garante o funcionamento do programa de assistência alimentar conhecido como “SNAP” até 30 de setembro de 2026.
A principal exigência da bancada democrata era a restauração das verbas para a Saúde, que os oito senadores trocaram por uma promessa de apreciação em dezembro no Senado, mas sem nenhuma garantia.
O fim do shutdown ocorre às vésperas do feriado de Dia de Graças, um dos mais importantes do país. Durante a paralisação parcial, 1 milhão de servidores públicos ficaram forçosamente licenciados ou tiveram de trabalhar sem receber, enquanto numerosos serviços públicos ficaram sem funcionar. Trump suspendeu o pagamento do auxílio-alimentação SNAP, uma espécie de Bolsa Família norte-americana, ameaçando de fome parte dos 42 milhões de beneficiários. Milhares de voos foram cancelados devido à falta de controladores nos aeroportos, entre outros contratempos.
Em meio às proclamações de “vitória” de Trump, começa o debate sobre a situação real de seu governo, às vésperas de um ano de eleição intermediária que pode alterar o controle do Congresso, e dadas as pesadas derrotas da semana passada, na prefeitura de Nova York, nos governos estaduais da Virgínia e Nova Jérsei e na Califórnia, no caso, um referendo contra o “redistritamento” anunciado pelos trumpistas para compensar que, históricamente, no meio de mandato a situação perde cadeiras para a oposição.
APROVAÇÃO DERRETE 24 PONTOS PERCENTUAIS
E, de novo, “é a economia, estúpido” que vale, advertem os especialistas. Segundo pesquisa Reuters/Ipsos de outubro, a aprovação de Trump entre os norte-americanos preocupados com a economia despencou para 38%, quando era, em janeiro, de 62%.
Em resumo, a aprovação de Trump derreteu impressionantes 24 pontos percentuais.
Na avaliação de especialistas, a crescente preocupação com a alta de preços nos supermercados e os aluguéis extorsivos, assim como com o emprego, foi determinante nas eleições da semana passada. Sob o tarifaço de Trump, o café subiu quase 19% e a carne mais de 8% em um ano.
Mais: 44% dos eleitores independentes, de acordo com a sondagem da Ipsos, apontam o posicionamento dos candidatos sobre a economia como o fator decisivo na hora de escolher o voto. São 40% entre os republicanos e 33% entre os democratas. O que possivelmente explica porque Trump acaba de tirar da cartola o suposto “dividendo do tarifaço” de US$ 2.000 para cada contribuinte.
A pesquisa Reuters/Ipsos mostrou que 50% dos norte-americanos responsabilizavam os republicanos pela paralisação, enquanto 43% culparam os democratas.
CAPITULAÇÃO PROVOCA CRÍTICAS
A principal questão que levou ao fechamento parcial do governo foi a recusa de Trump de restaurar as verbas para a Saúde, cortadas com a aprovação, sem qualquer negociação com os democratas e atropelando o ritual legislativo, da sua Lei Grande e Bonita BBB (na sigla em inglês).
Na BBB a queda de arrecadação decorrente do corte de impostos para ricos é compensada pela tesourada nos recursos para atendimento à saúde da população. As despesas médicas nos EUA são a principal causa de falência pessoal no país.
Condenando o conchavo dos oito senadores com o governo de Trump, o senador Bernie Sanders denunciou que Trump “aumenta os planos de saúde para mais de 20 milhões de americanos dobrando e, em alguns casos, triplicando ou quadruplicando. As pessoas não podem pagar isso quando já estamos pagando os preços mais altos do mundo pelos cuidados de saúde. Número dois, abre caminho para que 15 milhões de pessoas sejam expulsas do Medicaid e do Affordable Care Act”.
“Tudo isso foi feito”, continuou Sanders, “para dar US $ 1 trilhão em incentivos fiscais para o 1% mais rico”. “O que a eleição mostrou é que o povo americano quer que enfrentemos o trumpismo – sua guerra contra os trabalhadores, seu autoritarismo”, disse ele. “Isso é o que as pessoas queriam, mas esta noite não foi o que aconteceu.”
O acordo causou indignação nas bases e entre congressistas, que argumentaram que o recuo veio quando a posição dos democratas pela restauração das verbas da Saúde saía fortalecida pela vitória nas eleições da semana passa.
“Os americanos suportaram a dor da mais longa paralisação do governo na história por um ‘acordo’ que não garante nada sobre a saúde”, disse o deputado Summer Lee (D-Pa.). “Se os republicanos quisessem votar para estender os subsídios, eles já teriam feito isso. Capitular é inaceitável.”
O PAPEL DE SCHUMER
Tornaram-se públicos os questionamentos sobre o papel desempenhado pelo líder da minoria, Chuck Schumer. Formalmente, ele votou “não” no acordo.
Mas, como assinalou o portal Common Dreams, “ainda assim, é amplamente entendido que foi ele a força motriz por trás da elaboração do acordo e apoiou em particular os oito legisladores – nenhum dos quais está enfrentando a reeleição em 2026 – para cruzar a linha.”
EPSTEIN VOLTA PARA ASSOMBRAR TRUMP
Já quanto ao estado de espírito nas hostes trumpistas depois das eleições da semana passada, é bom lembrar a declaração do ex-guru do primeiro mandato de Trump, Steve Bannon, aconselhando seus companheiros republicanos a capturarem as instituições do país “ou estaremos todos presos depois de 2028”.
A “vitória” de Trump no fim do shutdown foi um tanto ofuscada pelo fato de que, para reabrir a Câmara, foi preciso dar posse à deputada democrata Adelita Grijalva, a peça que faltava para atingir o quorum de votação da exigência de divulgação dos arquivos do pedófilo Epstein. E, coincidentemente, veio a público e-mail em que Epstein diz: “eu sei o quão sujo Donald é”, sobre Trump. ·











