Rússia e Ucrânia concluíram neste sábado (7) a ansiada troca de prisioneiros, com os dois aviões com 35 libertados a bordo cada partindo simultaneamente de Moscou e Kiev, ação que foi recebida com aclamação internacionalmente e considerada um “primeiro passo” para consertar as relações entre os dois povos irmãos, até aqui num beco sem saída desde o golpe de Maidan da CIA em 2014. A comissária russa de Direitos Humanos, Tatyana Moskalkova, elogiou a medida, que considerou uma “ação histórica humanitária em larga escala”.
As negociações vinham ocorrendo desde que o novo governo de Kiev tomou posse, com os próprios presidentes russo Vladimir Putin e ucraniano, Volodymir Zelensky, discutindo os acertos em dois telefonemas. A troca de prisioneiros gera a expectativa de que os acordos de Minsk para pacificação na Ucrânia, que estavam bloqueados sob o governo Poroshenko, sejam finalmente cumpridos.
O regime Poroshenko – saído do golpe de estado da CIA em Kiev que levou ao poder neonazistas e oligarcas russofóbicos, cuja repressão aos ucranianos falantes de russo no leste provocou um levante armado e o plebiscito de reunificação da Crimeia à Russia – perdeu feio para Zelensky nas eleições de presidente de março, e voltou a apanhar nas eleições de julho para renovação do parlamento.
Zelensky disse que a troca bem-sucedida ajudará a “desbloquear o diálogo” com Moscou. Dmitry Peskov, porta-voz de Putin, disse que o Kremlin está “satisfeito por os cidadãos russos terem voltado para casa”. Segundo o Ministério das Relações Exteriores russo, o evento mostra que as relações entre Moscou e Kiev podem melhorar além do seu estado “sem saída” atual.
O líder ucraniano considerou essa troca um primeiro passo para deter “esta guerra horrível” no leste do país. Putin, que tem insistido que é preciso cumprir fielmente os acordos de Minsk para solução da crise no leste ucraniano, considerou o intercâmbio como um grande avanço “até à normalização das relações bilaterais”. No Fórum Econômico do Extremo Leste em Vladivostok, Putin já havia sinalizado na quinta-feira que a troca de presos era iminente.
O jornalista Kirill Vyshinsky, chefe da sucursal em Kiev da agência de notícias russa Ria Novosti, cuja prisão arbitrária havia sido denunciada até mesmo pelo representante da Organização pela Cooperação e Segurança Europeia para a liberdade de imprensa, o ex-ministro francês Harlem Désir, foi recebido efusivamente pelo presidente da agência russa, Dmitri Kiseliov.
Por mostrar os crimes das tropas ucranianas e falanges nazistas no leste ucraniano, Vyshinsky havia sido encarcerado sob acusação de ‘traição’. Ele havia sido libertado sob fiança no final de agosto, após mais de um ano de detenção, gesto que demonstrou que as negociações estavam evoluindo. Mesmo tendo sido trocado, o jornalista prometeu comparecer a uma audiência na Ucrânia “para provar a inocência”.
Também foi trocado Vladimir Tsemakh, que liderou a defesa antiaérea da República Popular de Donetsk, acusado por Poroshenko de “terrorismo”, cuja liberação era contestada pelos promotores holandeses do caso MH17 – aqueles a quem o primeiro-ministro malaio Mahathir Mohamad acusou de tendenciosidade para “fazer a Rússia de bode expiatório”, numa ‘investigação’ estranha em que o país cujo avião foi derrubado e com passageiros de nacionalidade malaia a bordo, foi colocado para escanteio, enquanto o regime de Kiev – no rol dos suspeitos – tinha poder de veto.
Em Kiev, foi comemorada a volta de 24 marinheiros ucranianos, capturados após um incidente no estreito de Kersh no ano passado, nas imediações da recém construída ponte ligando a Crimeia ao resto da Rússia, uma provocação cometida pelo então presidente Poroshenko, na tentativa de gerar uma crise que permitisse a ele, como foi denunciado, suspender as eleições, quando era evidente que iria perder de lavada, o que se comprovou nas urnas.
Também foi trocado Oleg Sentsov, sentenciado na Rússia por planejar ataques terroristas na Crimeia, o que ele nega. “Demos o primeiro passo … agora precisamos dar todos os outros”, afirmou Zelensky.
A primeira-ministra Ângela Merkel, cujo país, ao lado da França e da Rússia, patrocina no chamado Formato Normandia os acordos de Minsk, assinalou que a troca de prisioneiros oferece “um sinal de esperança” e conclamou todos os lados a continuarem a trabalhar duro pela paz.
O presidente francês Emmanuel Macron congratulou-se com a “libertação mútua de detidos”, que considerou “passo decisivo para retomar um diálogo construtivo, que deverá continuar nas próximas semanas”.
Macron acrescentou que a França e a Alemanha “intensificarão seus esforços no âmbito do formato da Normandia para alcançar mais progressos e implementar o aspecto político dos acordos de Minsk”.
O secretário-geral do Conselho da Europa, Thorbjorn Jagland, também saudou a troca. “Este é um passo encorajador para a reconciliação” de Moscou e Kiev. Otimismo compartilhado pela comissária da União Europeia para relações internacionais, Federica Mogherini, que augurou que os lados usem essa troca de prisioneiros para “resolver o conflito”. Pelo Twitter, o presidente dos EUA, Donald Trump, parabenizou Moscou e Kiev, apontando o evento como “talvez um primeiro passo gigante para a paz”.
A.P.